sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Os indícios do que será a nova base do Planalto

Agenda reformista ganha sobrevida com ampliação de apoio na Câmara

Fernanda Krakovics, Gabriel Cariello | O Globo

A divisão de bancadas expressivas da base na votação da denúncia contra o presidente Michel Temer pode esconder, no placar de anteontem, um apoio mais consistente à pauta da Previdência. Rachado quanto à autorização para investigar Temer, o PSDB tem a reforma como uma de suas bandeiras. Pilares da base, DEM e o próprio PMDB também registraram votos dissidentes contra Temer. Em muitas justificativas, parlamentares declararam apoio à agenda econômica, mas votaram pela investigação do presidente por corrupção passiva.

O placar da votação da denúncia deu ao governo indícios do tamanho atual da base aliada, fundamental para fazer avançar a agenda econômica no Congresso, em especial a reforma da Previdência. Na prática, o governo obteve, anteontem, o apoio de 284 deputados, somando os votos a favor de Temer, ausências e abstenções. Embora o número mostre que houve traições na base, o resultado dá ao Planalto um ponto de partida para definir estratégias a fim de obter os 308 votos necessários para aprovação de uma reforma constitucional. E mostrou fôlego do governo para atrair aliados.

— O cálculo de custo-benefício dos parlamentares é distinto (na votação da denúncia e na reforma da Previdência). Portanto, a negociação em torno dos dois temas envolve questões diferentes — avalia o cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.

Cientistas políticos consultados pelo GLOBO avaliam que o governo enfrentará desafios para atingir os votos necessários à aprovação da reforma da Previdência.

Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), lembra que o governo cogita fatiar a reforma para driblar a exposição negativa do tema:

— O governo não tem os deputados (necessários) hoje. A negociação vai ser no corpo a corpo, na base do toma lá, dá cá. Não vejo o governo recompondo a base, a não ser por meio da utilização maciça de atitudes fisiológicas. O que poderia ser feito é separar o que é alteração constitucional do que não é. Assim, o governo aprovaria primeiro questões específicas, como os militares ou trabalhadores rurais, e diria à população: “não somos tão maus”. Em seguida, tentaria fazer uma proposta de consenso mínimo.

Uma das principais dificuldades será convencer os deputados a apoiar um tema impopular em ano pré-eleitoral.

— Tudo indica que, apesar do (Henrique) Meirelles (ministro da Fazenda) dizer que isso vai ser aprovado até outubro, acho que o governo vai ter dificuldades porque a população em geral, a julgar pelas pesquisas de opinião, é majoritariamente contra a reforma da Previdência, porque ela (reforma) não foi muito bem comunicada (pelo governo). O maior problema é que os deputados estão de olho nas eleições de 2018. Muitos acham que, se votarem a favor, vão dificultar sua reeleição — disse o cientista político David Fleischer, da UnB.

A denúncia do procurador-geral, Rodrigo Janot, atrasou o debate referente ao sistema previdenciário, na opinião de Murillo de Aragão, da consultoria Arko Advice.

— O tempo é um inimigo do governo, mas esse tempo pode ser tratado de forma a minimizar o impacto impopular (da reforma). O governo tem desafios de comunicação e de conteúdo. Percebo que o governo tem demonstrado fragilidade na comunicação, já que tem uma popularidade desproporcional à sua capacidade de realização. Essa fragilidade ficou evidente na discussão da reforma, mas no combate à denúncia, o governo mostrou que tem capacidade (de se comunicar bem).

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