sexta-feira, 28 de julho de 2017

Os tucanos planejam o dia seguinte | César Felício

- Valor Econômico

Temer deve escapar, mas é uma página virada na história

É muito mais provável que Michel Temer termine o seu mandato do que venha a perdê-lo por ação do Congresso. Nenhum observador acredita na aprovação pela Câmara da autorização para que o Supremo processe o presidente e dificilmente o panorama irá se alterar quando Rodrigo Janot apresentar a segunda denúncia, nas próximas semanas.

O Congresso brasileiro certamente é um dos mais desprestigiados do mundo, mas seus 513 deputados não são um ajuntamento, uma turba que se move de lá e pra cá ao sabor da pressão das bases. Ele se move e forma suas maiorias por ações coordenadas de lideranças que sabem, fazem a hora e não esperam acontecer. No Palácio do Planalto, Temer luta para manter o seu foro privilegiado. No front adversário não há estado-maior e nem comandantes.

Neste sentido Temer está em melhor situação do que seus colegas na sinistra galeria dos presidentes mais impopulares da história brasileira. Na faixa dos 70% de desaprovação auferidos ontem na pesquisa do Ibope encomendada pela CNI também se colocam antecessores como Dilma Rousseff, Fernando Collor e, mais remotamente, José Sarney e João Figueiredo.

Em todos os quatro casos anteriores de Presidências falidas, havia uma oposição organizada, que se alimentava das manifestações populares ao mesmo tempo que as incentivava e conseguia articular na frente de repúdio ao governante interesses econômicos e políticos divergentes.

No caso de Dilma e Collor, a combinação foi letal e o presidente caiu. Sarney e Figueiredo, por motivos que não cabe discutir aqui, resistiram até o fim. Em todos os casos, entretanto, a sucessão presidencial foi marcada pela ascensão do bloco opositor.

A escrita com Temer pode ser diferente a depender da economia. Cada um dos presidentes do grupo citado acima foi protagonista de um momento extremamente crítico da economia. Temer também é. Mas há sinais que permitem imaginar que 2018 será um ano economicamente mais ameno que este, com alguma reação no PIB e no nível de emprego. Ou seja: não necessariamente o sucessor de Temer será um opositor radical e é nessa esperança que sua base aliada se agarra, acima de tudo o PSDB.

Os últimos movimentos de Geraldo Alckmin, João Doria e Rodrigo Maia mostram que na base aliada já se trabalha com o pós-Temer. O presidente é um caso terminal, sua popularidade jamais se recuperará, ele já virou um novo Sarney e um novo Figueiredo. Caberá a Temer em 2018 ser influente na opção pemedebista em relação a qual aliança irá fechar no próximo ano, quando muito. O governador paulista, o prefeito paulistano e o principal dirigente do DEM colocaram sobre a mesa as suas fichas para a eleição presidencial de 2018.

Rodrigo Maia sinalizou que o preço que o DEM cobrará para fechar uma aliança com o PSDB será muito, muito alto. Não há mais espaço para chapas presidenciais puro-sangue e cadeiras cativas para os tucanos na disputa pelos principais governos estaduais. Neste sentido se entende o lançamento da candidatura ao governo paulista do deputado estadual Rodrigo Garcia. Assim como a possível candidatura do vice-governador Márcio França (PSB), é material para negociar. Do mesmo modo aí está a explicação para as constantes menções a uma candidatura ao Bandeirantes do senador tucano José Serra. Não será fácil para Alckmin arquitetar um pacote em que ele concorra ao governo federal e Doria ao estadual, ainda que um cenário deste está longe de ser impossível.

O DEM quer herdar os despojos pemedebistas para governar o Rio de Janeiro e o apoio de todos para peitar o PT na Bahia com ACM Neto. O PSB sonha em viabilizar o ex-prefeito de Belo Horizonte Marcio Lacerda em Minas Gerais.

PSDB, DEM e PSB agem em relação a 2018 como se a Operação Lava-Jato fosse um problema dos petistas e do esquadrão do PMDB. Não lhes diz respeito, salvo pela difícil situação em que se encontra o senador Aécio Neves.

A explicação para tanto conforto poderá ser conhecida no fim de setembro, quando passar pelas duas casas do Congresso a nova reforma política. Lá deverá estar a blindagem que delimita a crise onde está, que estanca a sangria, em um grande acordo nacional, com o Supremo, com tudo. A fórmula para a divisão do tempo no horário eleitoral e do fundo de recursos para campanhas tende a asfixiar Marina Silva e Bolsonaro ainda há de se arrepender de não ter apostado na criação de um partido só para si. Nada mais duvidoso que depender da bondade do pastor Everaldo e de Valdemar Costa Neto para assegurar o passe da candidatura presidencial. Lula pode ser abatido por dois desembargadores de Porto Alegre, que votam em uma turma de três integrantes.

Em um passo fulminante, podem ser neutralizados o líder nas pesquisas, o segundo colocado e a candidata que está em terceiro lugar. Sobra Ciro Gomes. De acordo com um interlocutor de Alckmin, o quinto colocado nas sondagens está na posição mais sólida, por mais paradoxal que seja: tem retaguarda partidária tranquila no PDT, discurso claro e é atingido muito de raspão na onda de escândalos. Seu irmão foi citado na delação da JBS e isso por enquanto é tudo.

Como se pode ver, o raciocínio na base aliada de Temer é que pactuar com o eleitorado em 2018 também não é algo assim tão importante. Faz-se uma aposta irrestrita na incapacidade da oposição canalizar de modo viável a insatisfação popular.

Uma eleição presidencial de 2018 em que o primeiro colocado chega ao topo do pódio porque os carros de todos os competidores foram quebrando terá um problema de legitimidade mal resolvido.

Caso um governista ganhe em 2018, terá mais capital político que Temer para aprofundar as reformas, mas em situação instável: a maré de denúncias não tende a passar e os passos em Brasília terão que ser medidos.

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