domingo, 2 de julho de 2017

‘Enquanto houver bambu vai ter flecha’, diz Janot durante evento

Procurador ainda defende acordo que deu imunidade aos donos da JBS

João Sorima Neto, O Globo

SÃO PAULO - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou ontem que vai continuar no mesmo ritmo de trabalho até o fim de seu mandato, em 17 de setembro, quando passará o bastão para a sua substituta Raquel Dodge.

— Enquanto houver bambu vai ter flecha. Até 17 de setembro a caneta está na minha mão. Dia 18 não está mais. Ainda bem. Vou continuar nesse ritmo que estou — disse o procurador, em palestra mediada pela jornalista Renata Lo Prete, da Globonews, realizada durante o 12º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo promovido pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo investigativo) em São Paulo.

Sobre a decisão a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de soltar o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDBPR), Janot disse que ela “faz parte do processo”. Mas fez questão de dizer que, na sua avaliação, havia provas suficientes para pedir a prisão cautelar do parlamentar afastado, já que se tratava de uma autoridade no “curso de cometimento de crime”. Para ele, a mala com R$ 500 mil que o deputado foi flagrado carregando, “já diz tudo”.

— Houve a decretação da prisão cautelar que estava em curso de cometimento de crime. Mas o STF chegou à conclusão que a cautelar já tinha surtido efeito e houve a revogação. Isso faz parte do processo, cada um tem seu entendimento jurídico. Posso não concordar, mas faz parte do processo — afirmou Janot.

Na sexta-feira, o ministro Luiz Edson Fachin mandou soltar Rocha Loures, determinando o uso de tornozeleira eletrônica.

Janot elogiou, entretanto, outra decisão do Supremo que validou a delação premiada dos controladores da JBS. Para ele, esta decisão foi um ponto de inflexão no uso da delação premiada no país.

— Foi um ponto de inflexão no uso dessa instituição no Brasil (a delação premiada), que já foi estada em outros país, mas ainda é nova no Brasil — afirmou.

PROVA QUASE IMPOSSÍVEL
Janot disse que fazer a denúncia contra o presidente da República, Michel Temer, por corrupção passiva não lhe deu prazer, mas que isso faz parte do cargo. Sobre as críticas de que a denúncia não está bem fundamentada e que não há provas suficientes, Janot recorreu a um ditado antigo dentro da procuradoria.

— Não é possível que para eu pegar um picareta, tenha que tirar uma fotografia dele pegando a carteira do bolso de outro. Ninguém vai passar este recibo. Isso é um tipo de prova satânica, quase impossível. Tem que se olhar a narrativa e ela tem indícios de que é preciso instaurar um processo de produzir provas — afirmou Janot, ao lembrar que não precisa oferecer um caderno de provas para justificar a apresentação de denúncia.
— A narrativa é de uma clareza tão grande... Duvido que se fosse em outro caso a denúncia não fosse recebida.

Sobre as críticas em relação à imunidade concedida aos irmãos Joesley e Wesley Batista, em sua delação premiada, Janot afirmou que sem a delação não teria provas e, sem provas, não poderia fazer nada.

— Não poderia deixar o crime em curso, cometido por altas autoridades, continuar acontecendo. Não posso fingir que não vi. Eu tenho o monopólio da investigação. Se não tivesse dado a imunidade não tinha delação e o crime não cessaria. Estou com a consciência tranquila — garantiu ele, ressaltando que se aparecerem atos ilícitos cometidos antes ou após a delação, que não estejam descritos no processo, o acordo está quebrado.

Janot não disse quando fará novas denúncias contra o presidente Temer, mas que há duas linhas de investigação: de formação de quadrilha e obstrução da justiça.

— Ambas as investigações têm vida própria. Mas uma está mais adiantada que a outra.

ESCOLHA LEGÍTIMA DE DODGE
Sobre sua sucessora na PGR, Raquel Dodge, ele afirmou que a escolha foi legítima, mesmo ela não tendo sido a mais votada pelos colegas na lista tríplice.

Em declarações recentes, Raquel Dodge afirmou que não caberia à PGR oferecer imunidade ou redução de pena para fechar acordos. Isso caberia ao juiz na sentença, no entendimento de Dodge.

— Se o MP não pode oferecer imunidade ou redução de pena vai oferecer o quê? Vou chamar os irmãos Batista e oferecer uma caixa bombons garoto, pão de mel, cachaça e torresmo? A delação é uma instituição nova que está se consolidando no Brasil — defendeu Rodrigo Janot.

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