terça-feira, 9 de maio de 2017

Lula agora tenta adiar depoimento

Defesa quer três meses para analisar documentos incorporados ao processo; delator diz que não tratou de propina com petista

A dois dias da data marcada, o ex-presidente Lula recorreu ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região para tentar adiar seu depoimento ao juiz Sergio Moro, em Curitiba. Os advogados do petista pediram pelo menos três meses para analisar documentos da Petrobras incorporados ao processo no fim de abril. Enquanto isso, querem que os prazos do processo sobre o tríplex do Guarujá sejam suspensos. Moro, que já havia negado o adiamento, ontem também rejeitou o pedido da defesa para que o depoimento seja gravado por câmera móvel. Para ele, os advogados de Lula tentam transformar a audiência em “evento político-partidário”. O empresário Ricardo Pessoa, da UTC, disse que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari cobrava propina “de obra a obra”. Pessoa disse, porém, que nunca tratou do assunto diretamente com Lula.

O tempo de Lula

Defesa do ex-presidente tenta adiar depoimento e pede três meses para analisar papéis

Cleide Carvalho e Tiago Dantas | O Globo

-SÃO PAULO- Às vésperas do depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao juiz Sergio Moro na Lava-Jato, os advogados do petista tentam adiar a data do interrogatório, marcado para amanhã. A defesa de Lula afirma que precisa de no mínimo três meses para analisar documentos da Petrobras, que somariam cerca de 100 mil páginas e foram incorporados ao processo no fim de abril. Por isso, pediu ontem a suspensão dos prazos do processo em um habeas corpus ajuizado no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que não havia decidido até a noite.

Também ontem, ao negar pedido dos advogados para que o depoimento de Lula fosse gravado por uma câmera móvel, Moro afirmou que a defesa do ex-presidente tenta transformar a audiência em um “evento político-partidário”. À noite, durante evento do Observatório Social do Brasil, em Curitiba, o juiz declarou que “nada é resolvido na audiência” e que não vê motivo para tanta expectativa:

— É uma oportunidade que o acusado tem para se defender no processo e eu tenho basicamente que ouvir e fazer algumas perguntas. O acusado pode inclusive ficar em silêncio ou mesmo mentir — disse Moro. — Nada é resolvido na audiência de interrogatório. Toda essa expectativa não se justifica.

A defesa de Lula tenta adiar o depoimento argumentando que os advogados não tiveram acesso a documentos da Petrobras que estariam relacionados a três contratos da estatal com a construtora OAS, que são alvo de investigação no processo. Lula é acusado de receber da empreiteira um tríplex no Guarujá, litoral paulista, como contrapartida por ter conseguido esses acordos. O advogado Cristiano Zanin Martins afirma ter solicitado os dados em outubro do ano passado. Inicialmente, Moro rejeitou o pedido de inclusão dos dados. Depois, permitiu que as peças entrassem no processo entre 28 de abril e 2 de maio.

“É simplesmente impossível analisar cerca de 5,42 gigabytes de arquivos digitais sem organização e índice, mais de 5 mil documentos técnicos, jurídicos e negociais (estimativa de cerca de 100 mil folhas sem organização e índice) até o próximo dia 10”, afirma o pedido de habeas corpus. Em nota enviada à imprensa, os advogados dizem que a impressão dos documentos ainda não tinha sido concluída ontem, “a despeito da contratação de uma gráfica para essa finalidade”. Para a defesa, como a acusação já conhecia essas informamou não há “paridade de armas".

Outro ponto de discórdia entre o juiz Moro e os advogados de Lula está ligado à gravação do depoimento. Em todas as audiências da Lava-Jato, a câmera fica imóvel e enquadra apenas quem está prestando depoimento, seja ele réu ou testemunha. Na semana passada, os advogados de Lula haviam pedido que a câmera fosse móvel. Eles também tentaram autorização para fazer a própria gravação. Moro negou a solicitação, alegando que o petista quer transformar o interrogatório em “evento político-partidário”. O juiz afirmou que o tribunal vai providenciar a gravação também de imagens de “um ângulo mais amplo” da sala da audiência, que mostrará o réu lateralmente.

Os advogados recorreram ao TRF-4 também contra essa decisão, que classificaram como “mais uma arbitrariedade” de Moro. Eles disseram que pretendem denunciar o magistrado à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pois todo defensor tem direito a filmar a audiência.

Um dos objetivos do PT em gravar o depoimento, segundo o blog do colunista do GLOBO Lauro Jardim, é usar as imagens em eventual campanha de Lula à Presidência . Ao negar o pedido, Moro citou a convocação de militantes petistas para manifestações em Curitiba.

MILITANTES CONVOCADOS, DIZ MORO
“Não se ignora que o acusado Luiz Inácio Lula da Silva e sua defesa pretendem transformar um ato normal do processo penal, o interrogatório (...) em um evento político-partidário, tendo, por exemplo, convocado militantes partidários para manifestações de apoio ao ex-presidente na referida data e nessa cidade, como se algo além do interrogatório fosse acontecer”, afirmou Moro no despacho.

A defesa de Lula informou que é “um grave erro dizer que foram chamados manifestantes para Curitiba, e que quem está agindo como político é o juiz, que conclações, apoiadores por meio de vídeos caseiros”, fazendo menção a um vídeo postado pela mulher de Moro em redes sociais.

Ainda no despacho, Moro disse que a gravação atual, focada somente no depoente, não resulta em prejuízo ao acusado. “A câmera é focada no depoente, acusado ou testemunha porque se trata do elemento probatório relevante e que será avaliado pelos julgadores das várias instâncias. Não há qualquer intenção de prejudicar o acusado ou sugerir a sua culpa com esse foco”.

A defesa de Lula argumenta que o artigo 367 do Código de Processo Civil prevê a gravação como prerrogativa do advogado e a audiência poderá “ser integralmente gravada em imagem e em áudio”. Na opinião de Moro, esse artigo deve ser mais bem avaliado porque não há consenso entre os tribunais, já que o Supremo Tribunal Federal admite apenas a gravação oficial. (Colaborou Marina Oliveira, especial para O GLOBO)

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