terça-feira, 2 de maio de 2017

Difícil travessia | Míriam Leitão

- O Globo

A expectativa no governo é de aprovação amanhã do substitutivo do deputado Arthur Maia na Comissão da Reforma da Previdência. O problema depois será a votação em plenário. A avaliação feita entre defensores da reforma é que o governo errou na comunicação e apresentou um projeto tão duro que aumentou a rejeição. “O bode foi grande demais”, admitiu um integrante da base governista.

Todo o esforço agora será para mostrar, no debate parlamentar, que o substitutivo de Arthur Maia é bem diferente do projeto original. De fato há inúmeras mudanças que atenuaram o texto. A resistência maior vem de funcionários públicos que entraram no serviço antes de 2003. A partir daquele ano a reforma do ex-presidente Lula acabou com a integralidade, mas os que haviam entrado antes ficaram com o direito. A proposta é a de exigir que a integralidade (aposentar-se com o salário integral da ativa), só seja possível aos 65 anos.

Sem uma regra de transição, esse item pode ser inclusive contestado judicialmente. Podem alegar que os que entraram depois de 2003 terão regras de transição e eles, não. Os funcionários estão pressionando por mudança nessas normas incluídas no relatório.

Em geral o substitutivo atenuou o projeto original. Em vez de 49 anos para que o trabalhador possa ter direito a 100% do valor do benefício, agora isso se consegue com 40 anos. Em vez de idade mínima igual para homem e mulher, aos 65 anos, mudou-se para que a mulher tenha o direito de se aposentar três anos antes. O Benefício de Prestação Continuada não será mais desvinculado do salário mínimo. A aposentadoria rural será aos 60 anos e com 15 de contribuição, em vez de 25 anos. Aposentadorias para professores com idade mínima de 60 anos, em vez de 65. E de policial com 55 anos. A possibilidade de acumular benefício foi mantida mas apenas para dois salários mínimos. Como dois terços das aposentadorias do INSS são de um salário mínimo, essa regra atende à maioria. Se houver diferença de valor, o pensionista pode escolher o maior benefício.

Com essas mudanças, perdeu-se parte do que o governo planejara reduzir de aumento do ritmo futuro das despesas previdenciárias, mas aumentaram as chances de aprovação da reforma. De qualquer maneira os últimos dias foram desfavoráveis.

A pesquisa do Datafolha mostrando a rejeição às reformas, a baixíssima popularidade do presidente Michel Temer e os ecos das manifestações podem repercutir no andamento dos projetos no Congresso. O ambiente já não era bom, ficou um pouco pior nos últimos dias. Temer nunca teve um índice alto de “ótimo e bom”, mas tinha um grande percentual de “regular”, que migrou para “ruim e péssimo”.

Temer tem testado até agora a fórmula de trabalhar o apoio político, mesmo sendo impopular, valendose do seu conhecimento da articulação parlamentar. E com essa estratégia conseguiu aprovação de projetos difíceis como o do teto dos gastos. Normalmente a rejeição ao presidente provoca a dispersão da sua base partidária. Foi assim com a ex-presidente Dilma. Logo que foi reeleita ela estava com 40% de “ótimo e bom" na pesquisa Datafolha. Em março de 2015 já tinha caído para 12%. E seu “ruim e péssimo" chegou a 60%. E assim ficou até ser afastada, oscilando em torno desses números.

A necessidade da reforma é óbvia para qualquer um que olhe os números objetivamente. No ano passado, o país arrecadou R$ 1,2 trilhão. A Previdência e o BPC consumiram 55% dessas receitas e sobram os outros 45% para todas as outras despesas públicas. A reação contra a reforma é natural porque as regras estão ficando mais rígidas. O papel do governo era mostrar a urgência da reforma. Porém, mesmo parlamentares que, em privado, admitem que a mudança é necessária, temem votar a favor e enfrentar a reação das bases.


Um presidente muito impopular vai tentar aprovar uma reforma necessária, porém impopular. Para piorar, ele ainda tem o hábito de fazer declarações jurássicas quando o tema é mulher. A última pérola foi na entrevista ao Ratinho, de que o governo “precisa de um marido para não quebrar". Quando se pensa que Temer já disse impropriedades suficientes, ele diz outra. Para quem quer ser um reformador, ele deveria começar reformando o seu pensamento.

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