segunda-feira, 3 de abril de 2017

Reforma onera trabalhador urbano, diz estudo

Por Fabio Graner | Valor Econômico

BRASÍLIA - O governo não está explicitando os problemas no setor previdenciário e divide de maneira regressiva os ajustes que propõe na reforma da Previdência em tramitação no Congresso, penalizando a geração de emprego e a formalidade. A avaliação é dos economistas Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central na gestão de Armínio Fraga, e Felipe Ohana, ex-secretário de política econômica do ministério da Fazenda, em nota técnica obtida pelo Valor.

O estudo simulações até 2030 com os dados da previdência urbana e mostra que, quando se considera a relação entre receitas e despesas somente para aqueles que se aposentam por tempo de contribuição, há superávit e ele se mantém ao longo do tempo.

Esse saldo positivo, de acordo com os autores da nota, é consumido por pensão por morte e outros seguros previdenciários. Em 2030, o exercício mostra um déficit de R$ 151 bilhões no segmento urbano, considerando apenas aposentadoria por tempo de contribuição, por idade sem subsídio, pensão por morte e demais seguros. Nessa projeção não está incluída a aposentadoria por idade com subsídio, que ocorre quando há apenas 15 anos de contribuição, e que também é um fator de déficit no INSS.

Os autores destacaram ao Valor que, com a proposta de reforma, o governo corre o risco de desarticular todo o sistema de aposentadoria por tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 para mulheres) para poder pagar subsídios e seguros incluídos no sistema previdenciário - como a aposentadoria rural (que eles consideram assistência) e os seguros, como pensão por morte, auxílio-doença e aposentadoria por invalidez - e que são subfinanciados.

"Se a decisão é fazer assistência social, a teoria econômica diria que o faça com base nos tributos sobre rendimento dentro de regras de progressividade", destacam. "Sem subsídios, praticamente não haveria o déficit, em 2016, apesar de o país atravessar a maior crise de desemprego - e por consequência de arrecadação previdenciária - de sua história", dizem. Os economistas também consideram que a reforma vai achatar os benefícios para quem está no regime de tempo de contribuição.

Para Freitas e Ohana, a estratégia da reforma está equivocada porque sobrecarrega o trabalhador urbano e não expõe claramente as questões a serem discutidas com a sociedade, como a questão da previdência rural. Eles ressaltam que o maior déficit é da previdência rural, que arrecada somente entre 7% a 7,5% do valor dos benefícios que concede, e absorve 22% do gasto total dos benefícios previdenciários do RGPS. E que isso precisa ser tratado com toda a sociedade.

"O que não faz sentido algum é atribuir os ônus desse assistencialismo aos contribuintes urbanos da Previdência, simplesmente adotando a designação de "previdência social" para uma coisa que é simplesmente assistência social. Sem tirar o mérito desse tipo de política, o que se defende é mandar a conta a quem de direito", afirmam. "A mistura acaba funcionando como cortina de fumaça, confundindo as origens e a natureza das deficiências de recursos, dificultando a identificação dos diagnósticos e, por conseguinte, o estudo das mudanças a serem propostas", afirmam.

"Em resumo, a proposta do governo ao misturar as duas Previdências cria cortina de fumaça que parece pretender ocultar a verdadeira filosofia da proposta: estabilizar a razão 'déficit/PIB' do conjunto das previdências urbana e rural, em nível não revelado, colocando a conta para os beneficiários, trabalhadores que se formalizam e contribuem", destacam. "A sociedade no seu conjunto não é onerada na reforma do governo. A conta fica para a geração de emprego e, particularmente, para os assalariados na formalidade" dizem, avaliando ainda que o princípio da reforma proposta parecer ser: "Contribua para a Previdência, mas não se aposente".

Na visão dos economistas, é possível tratar separadamente a aposentadoria por tempo de contribuição de outros benefícios e auxílios. Eles lembram que a Alemanha e o Chile são países que cobram à parte os seguros. Para Freitas e Ohana, não tem sentido uma mulher ou homem sozinhos e sem filhos, por exemplo, contribuir para pensão por morte, por exemplo. "Os beneficiários diretos teriam que arcar com os prêmios, só que em valor significativamente mais elevado, uma vez que se incorporam as pensões por morte aos seguros que, aliás, poderiam ser de adesão voluntária e com prêmios em função dos valores segurados", completam.

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