terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Velha novidade - José Paulo Kupfer

- O Estado de S. Paulo

Diagnósticos e propostas do novo projeto de redução dos spreads repete anteriores

O Banco Central está empenhado em reduzir o spread bancário – a diferença entre o custo de captação dos recursos e o cobrado nos empréstimos –, que é há muito tempo um dos mais altos do mundo. Com o objetivo de baratear o crédito e dar mais eficiência ao sistema financeiro, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, acaba de lançar o “Projeto Banco Central+”, que engloba uma série de reformas regulatórias e administrativas.

Não deixa de ser uma boa notícia – de que adianta, afinal, cortar os juros básicos se, na ponta, os spreads mantêm as taxas nas alturas? Só que essa novidade é velha. As mesmas palavras do período acima poderiam ser usadas, sem tirar nem pôr, para descrever o “Projeto Juros e Spread Bancário”, lançado por Arminio Fraga, então presidente do Banco Central, em 1999. Com algumas poucas modificações, serviriam também para resumir outras tentativas com o mesmo objetivo empreendidas nos últimos 50 anos.

Já houve épocas em que a ênfase para o problema do spread recaía na “cunha fiscal” – o conjunto de tributos incidentes sobre as operações bancárias –, designação hoje em desuso, embora o peso dos impostos e taxas continue alto. Também os custos administrativos, hoje restritos a 5,0% do total, já chegaram a representar 20%. Mas com a economia crescendo ou encolhendo, com maior ou menor comprometimento de renda familiar ou nível de endividamento empresarial, a grande vilã apontada pelos estudos do Banco Central sempre foi – e continua sendo – a inadimplência.

Essa “descoberta”, portanto, também não é nova. Diante da crise de solvência que hoje sufoca famílias e empresas, parece fazer sentido apontar a inadimplência como causa principal dos altos spreads bancários. Ela entra, no estudo atualizado do Banco Central, com o recorde de 53,5% do spread. Mas o que dizer dos estudos relativos a 2006, em que a inadimplência também era a vilã principal, respondendo por 43,4% do spread, quando a economia crescia 4,0% ao ano e a inflação fechou o ano em 3,14%, abaixo do centro da meta de 4,5%, ao tempo em que os juros básicos desabavam de 17,5%, no começo do ano, para 13,25, no final?

Outro ponto que chama a atenção é a estabilidade da fatia do spread que equivale ao lucro do negócio. No levantamento de 2017, a parcela do lucro, na composição dos spreads, alcançou 23,5% do total. Com pequenas variações, é o mesmo porcentual dos estudos anteriores. Os “resíduos líquidos”, como então eram apresentados, variaram, entre 2001 e 2006, por exemplo, entre 24,5% e 19% do total dos spreads.

Trata-se de uma indicação de que a concentração bancária – natural no setor, mas não no grau apresentado no Brasil – é antiga no sistema nacional e promove resistências à redução das taxas de juros cobradas na ponta do tomador do empréstimo. Os dez maiores bancos, num mercado com mais de mil instituições registradas, de fato, respondem por mais de 85% tanto dos ativos quanto dos depósitos totais do sistema.

Ilan divulgou o novo estudo sobre os spreads bancários sem menções à concentração bancária. No rol de medidas administrativas e regulatórias apresentadas – quase todas semelhantes às enumeradas por Arminio Fraga há mais de 17 anos – também não consta nenhuma iniciativa para alterar a simbiose entre o mercado de moeda (sobras de caixa dos bancos) e a estrutura da dívida pública, herdadas do período de hiperinflação, que ajuda a manter juros e spreads nas alturas.

Nada contra as melhorias propostas por Ilan. Mas, se a história ensina alguma coisa, não custa ter cautela com os resultados desse novo esforço.

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