quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

TRE cassa Pezão por crime eleitoral

Por 3 votos a 2, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio cassou os mandatos do governador Luiz Fernando Pezão e do vice Francisco Dornelles por abuso de poder econômico e político na eleição de 2014. O TRE determinou ainda a realização de novas eleições no estado. Os dois poderão permanecer nos cargos enquanto recorrem ao Tribunal Superior Eleitoral. Eles são acusados de obter doações de empresas que tinham contratos e recebiam isenções fiscais do estado. “Decisão judicial se respeita”, disse Pezão, anunciando que recorrerá.

Pezão é cassado

• TRE condena governador e seu vice por abuso de poder econômico e político; os dois vão recorrer

Carina Bacelar, Luiz Ernesto Magalhães | O Globo

O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Rio cassou ontem os mandatos do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) e do vice-governador Francisco Dornelles (PP), como antecipou o jornalista Lauro Jardim, em seu blog no site do GLOBO. Por três votos a dois, a chapa foi condenada por abuso de poder econômico e político. Os desembargadores também determinaram que os dois fiquem inelegíveis por oito anos. A assessoria do governo informou que Pezão e Dornelles vão recorrer ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Neste caso, eles podem permanecer nos cargos até que a ação transite em julgado.

— Decisão judicial se respeita. Ainda tem recursos — disse o governador.

O tribunal determinou ainda que sejam realizadas eleições diretas para a escolha dos novos governador e vice-governador. Na ação, a chapa é acusada de ter recebido doações de empresas, principalmente gráficas, que mantinham contratos com o governo e recebiam isenções fiscais do estado. Algumas dessas gráficas teriam também produzido material de campanha para os candidatos numa quantidade maior que o valor declarado em notas fiscais. Elas faziam o esquema em troca de contratos com o governo.

O processo, que corre em segredo de Justiça, foi movido pelo deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) em 2014. Segundo Samara Castro, advogada do deputado e autora da ação, esse tipo de determinação não é usual nesses processos:

— É bom lembrar que o tradicional seria a chamada de eleições indiretas, mas o tribunal votou por eleições diretas. O desembargador André Fontes trouxe uma tese baseada no sistema francês que acabou sendo acatada por outros.

ISENÇÕES FISCAIS SOB SUSPEITA
Samara disse que os valores de doações de campanha para Pezão e Dornelles pelas empresas citadas na ação eram iguais aos de isenções concedidas pelo Executivo.

— Outro esquema citado na ação é adotado por vários políticos: o superfaturamento das gráficas. E isso estava na ação. Eles (os candidatos) pagavam menos, e as empresas faziam mais material com menos dinheiro. Isso em troca de isenções e contratos — disse.

Em nota, o TRE informou que, por maioria dos votos, “o abuso de poder econômico e político ficou configurado uma vez que o governo do Estado do Rio de Janeiro concedeu benefícios financeiros a empresas como contrapartida a posteriores doações para a campanha do então candidato Pezão e de seu vice”. Um dos membros do tribunal, o desembargador eleitoral Marco Couto, afirmou em seu voto que “restou comprovado que contratos administrativos milionários foram celebrados em troca de doação de campanha”. O voto do relator, Fernando Chagas, era pela absolvição da chapa, e foi derrotado.

Dos sete desembargadores do TRE, dois não votaram. O presidente do tribunal, Antônio Jayme Boente, só vota em caso de empate — o que não ocorreu. A desembargadora Fernanda Tórtima se declarou impedida. Anteontem, ela havia pedido vista do processo.

Uma das gráficas citadas na ação é a High Level Signs. Em reportagens publicadas em 2014, O GLOBO mostrou que a Justiça Eleitoral, na época, encontrava divergências entre o material de campanha do PMDB apreendido na empresa e a tiragem declarada ao TRE. Um documento da Coordenadoria de Fiscalização da Propaganda Eleitoral, revelado na ocasião, também dizia que a gráfica, ao mesmo tempo em que produzia propaganda para a coligação de Pezão, manteve relações comerciais com o governo do estado. Só no período de quatro meses daquele ano, a firma recebeu R$ 942 mil do governo em pagamentos de contratos.

REPERCUSSÃO NA ALERJ
Na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), que está prestes a discutir a autorização para que o estado privatize a Cedae, a notícia da cassação surpreendeu deputados. Muitos dizem ser favoráveis à saída de Pezão do governo por um processo de impeachment. O presidente da Casa, Jorge Picciani (PMDB), afirmou que a decisão do TRE em nada muda a rotina dos deputados:

— A tramitação (do projeto da Cedae) vai prosseguir. Cabe lembrar que ele pode recorrer no cargo ao Tribunal Superior Eleitoral. Devo lembrar que a decisão foi numa votação apertada, por três a dois.

Para Picciani, no entanto, a decisão enfraquece ainda mais Pezão do ponto de vista político, além servir de argumento para a oposição pedir o impeachment do governador.

Marcelo Freixo, autor da ação, disse que a decisão do TRE não deve ser comemorada:

— Espero que o TSE confirme a sentença. No meu entendimento, a chapa tem que ser cassada. A gente não comemora porque o Rio de Janeiro está em situação delicada — declarou o deputado. — É um governo que está sem condições de governabilidade e mostra vício de origem. Foram mais de R$ 10 milhões de despesas de gráficas que estão citadas na ação.

POLÍTICOS NO FIO DA NAVALHA
O deputado Luiz Paulo (PSDB), outro crítico das medidas de ajuste fiscal enviadas pelo governo à Alerj, afirmou que o governador não tem condições de terminar o mandato:

— Acho que esse governo não chega até o fim, seja por decisão do TSE ou por um processo de impeachment. Hoje o governador e o vice estão no cargo por um fio de navalha — disse Luiz Paulo, que não descarta que a decisão da Justiça interfira na votação sobre a venda da Cedae.

Segundo especialistas em direito eleitoral ouvidos pelo GLOBO, o processo será agora apreciado pelos sete ministros do TSE. Diferentemente do TRE, na instância superior o presidente da Corte vota em caso de empate ou não. Mesmo que o governador e o vice sejam derrotados no TSE, ainda cabe recurso da defesa no próprio tribunal ou mesmo no Supremo Tribunal Federal (STF). Advogados dizem que essa tramitação costuma ser lenta, pois só no TRE o processo demorou dois anos para ser julgado.

De acordo com o advogado eleitoral e ex-integrante da Comissão de Direito Eleitoral da OABRJ André Miranda, a pena de cassação sempre vem junto com a inelegibilidade.

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