terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

No vazio da lei – Miriam Leitão

- O Globo

Nem punição nem benefício. É isso que a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, acha do novo Regime de Recuperação Fiscal (RRF) proposto pelo governo para os estados cujas contas entraram em colapso. Ela defende a proposta e a negociação que o Tesouro está fazendo com o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul como uma ponte para a normalidade, uma nova chance.

“O Regime proposto preenche uma lacuna na nossa legislação. Sabe-se o que fazer com uma empresa que corre o risco de falência, mas não se sabia o que fazer com um estado insolvente. São medidas duras, mas semelhantes as que uma empresa que entra em dificuldades financeiras tem que enfrentar para resolver suas dívidas e retomar as atividades”, disse Ana Paula.

Argumentei que é benefício, na medida em que o Rio e o Rio Grande do Sul vão deixar de pagar a dívida à União, enquanto outros estados terão que continuar pagando. E que é punição porque tira do administrador estadual qualquer margem de autonomia, já que ele tem que seguir uma dieta cheia de “nãos”:

— É uma suspensão da dívida, que será paga depois, dosada pelas contrapartidas. Todo regime jurídico da relação entre devedor e credor tem uma série de medidas que o devedor tem que cumprir. Os estados vão ter que fazer jus às medidas que a União oferece de não pagamento dos juros da dívida.

Perguntei o que acontece se o Rio não aprovar todas aquelas leis propostas no Termo de Compromisso. Ana Paula disse que as propostas foram apresentadas pelo próprio Rio. A partir disso, foi conduzida uma negociação de três semanas que chegou no texto final. Agora, a Assembleia vai aprovar essas medidas. Quando estiver assinado, e o Rio deixar de cumprir algum ponto, haverá cláusulas de penalidades:

— O estado pode fazer propostas diferentes que cheguem ao mesmo resultado. O Tesouro não estabelece, por exemplo, que a cota extra de contribuição dos servidores tem que ser de 8%. Não coloca uma alíquota específica. O estado é que apresenta medidas que equilibrem a situação fiscal para que ele possa sair do Regime de Recuperação. Foi o planejamento do Rio que concluiu que teria que ser de 8%.

Esses 8% incidirão sobre o salário do servidor, que já terá recolhido uma contribuição de 14%:

— Pelos cálculos do Rio, as duas contribuições arrecadarão R$ 5,7 bilhões, menos do que o déficit previdenciário de R$ 12 bilhões. O plano de recuperação é feito para levar ao equilíbrio. Em alguns estados, pode ser um período mais curto, de dois anos, em outros, pode chegar a três prorrogáveis por mais três anos.

Das penalidades pelo não cumprimento está o direito de o Tesouro arrestar todas as transferências de impostos para o estado. Mas isso já estava no contrato normal da dívida e recentemente o Rio ganhou uma liminar no Supremo impedindo esse arresto.

— Se você observar, a liminar concedida pela ministra Cármen não aceitou inteiramente o pedido do Rio, não estendeu o entendimento e confirmou o contrato. Apenas considerou que, diante daquele pleito específico e da profunda crise do Rio, não permitiu aquele arresto tratado na ação, mas a AGU recorreu e essa liminar foi suspensa — disse Ana Paula.

O ministro Luiz Fux deu 30 dias para que o governo aprovasse uma lei sobre o novo regime, e o Rio aprovasse as propostas na Assembleia. Claramente o tempo é insuficiente. O projeto de lei foi enviado ao Congresso e começou a tramitar. Pode ser pedido urgência urgentíssima, já que o acordo do Rio depende disso, e o Rio Grande do Sul já começou negociação para também ter um acordo. O déficit previdenciário gaúcho é de R$ 9 bilhões e o de Minas é R$ 8 bilhões.

Ana Paula nega que esse projeto de lei seja uma mudança na Lei de Responsabilidade Fiscal:

— Esse regime de recuperação não é uma flexibilização da Lei de Responsabilidade Fiscal. De forma alguma. Ela vem para reforçar a LRF, porque permite o ajuste do estado insolvente para ele voltar a cumprir a lei. Inclusive o RRF incentiva a harmonização contábil. O Rio tinha uma medida de gasto de pessoal incompleta e agora já admite que gasta 70% com pessoal.

Minas Gerais disse que não quer entrar nesse regime. Ana Paula Vescovi disse que a escolha é de cada estado e que Minas está pagando a dívida. Se deixar de pagar, será arrestada, como qualquer outro estado. Secretária do Tesouro diz que Regime de Recuperação dos Estados é ponte para a normalidade Ana Paula Vescovi acredita que agora há legislação para lidar com os estados em dificuldade Rio de Janeiro sofrerá penalidades se o que for aprovado pela Assembleia não for cumprido

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