sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Perdido no caos – Editorial | Folha de S. Paulo

Se ainda havia alguma dúvida de que o governo de Michel Temer (PMDB) não sabe como enfrentar o caos carcerário no país, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, cuidou de dissolvê-las.

Em entrevista a esta Folha, o ministro expôs qual é, na sua visão, o maior problema do sistema penitenciário. Superlotação? Tratamento desumano a que se submetem os detentos? Encarceramento excessivo? Injustiça social? Falta de controle por parte do poder público? Avanço das facções criminosas? Fracasso da guerra às drogas?

Eram possíveis todas essas hipóteses —e talvez fosse impossível alçar uma delas à condição de principal. Moraes, contudo, sacou uma resposta surpreendente: o maior problema, para ele, é a corrupção.

O raciocínio não é desprovido de todo sentido. Como explicou aos jornais "O Globo" e "O Estado de S. Paulo", terão pouca valia os melhores equipamentos para evitar a entrada de armas e celulares nos presídios, por exemplo, se os agentes penitenciários fizerem vista grossa.

É verdade. Pode-se acrescentar, todavia, que de nada adiantará a cumplicidade do carcereiro se a prisão não estiver superlotada nem dominada por hordas de celerados.

Chamar a atenção para a corrupção, na verdade, não passa de um truque. Trata-se de se alinhar a certo espírito dos tempos no Brasil, de transformar a questão num problema praticamente insolúvel e de aventar saídas pueris, como "capacitar os agentes penitenciários".

Atirando para todos os lados, o ministro também tachou de pseudoespecialista quem criticou o plano nacional de segurança apresentado pelo governo e, como se enunciasse grande ideia, sugeriu que a visita de advogados de chefes de facções a presídios deveria ser monitorada, inclusive por meio de gravações de suas conversas.

O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Claudio Lamachia, considerou "absolutamente equivocada" a declaração de Moraes. O Instituto de Defesa do Direito de Defesa, por meio de nota, a classificou como "demagógica e populista".

Têm razão as duas entidades. O sigilo das comunicações entre o suspeito e seu advogado, resguardado pela lei, deve ser protegido em nome do direito de defesa.

Advogados que possam ter cometido ilegalidades devem ser investigados e, se condenados, punidos. Daí a criminalizar toda a categoria profissional e retirar mais um direito dos presos vai uma distância enorme que um Estado democrático de Direito, mesmo na luta contra o crime, não pode se mostrar disposto a percorrer.

Diminui-se uma garantia hoje, reduz-se outra amanhã, e logo todos os cidadãos se prostram, indefesos, perante um Estado opressor.

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