domingo, 17 de julho de 2016

Opinião do dia – Roberto Freire

Há enormes desafios pela frente e um longo caminho a percorrer até que o Brasil encontre o porto seguro. Vivemos um momento em que são fundamentais o compromisso e a responsabilidade da classe política para encontrarmos as soluções dos graves problemas que afligem a população. A eleição de um presidente da Câmara que resgata a autoridade moral do cargo é um passo muito importante para o país continuar no rumo certo. Depois de tantos anos de irresponsabilidade e desmantelo, ninguém interromperá a marcha da sensatez que nos levará adiante.

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Roberto Freire é deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS. ‘Marcha da sensatez’, Diário do Poder, Brasília, 15/7/2016

Pauta de Temer está pronta para ser votada

• Medidas para recuperação do País estarão na agenda do Congresso após volta de recesso

Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Com a eleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) para a presidência da Câmara após a renúncia de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o governo do presidente em exercício Michel Temer pretende deslanchar sua agenda econômica. Levantamento do Estado aponta que a maioria das propostas para retirar o País da crise já encaminhada pelo Executivo aguarda votação da Casa.

O líder do governo na Câmara, deputado André Moura (PSC-SE), admitiu que a situação de Cunha dificultou a aprovação da agenda de Temer. “Lógico que atrapalhou, foi um período de muita instabilidade e incerteza”, disse. Ele avaliou que, entre o afastamento de Cunha por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), em maio, e a eleição de Maia, a Casa conviveu com quatro “presidentes” com influência política e administrativa: o próprio Cunha, Waldir Maranhão (PP-MA), Fernando Giacobo (PR-PR) e Beto Mansur (PRB-SP).

Moura já marcou uma conversa com Maia para discutir e acertar a pauta de votações após o recesso. Ele espera aprovar na primeira quinzena de agosto propostas da agenda do Palácio do Planalto: o projeto de lei que desobriga a Petrobrás de ser operadora exclusiva do pré-sal; a renegociação da dívida dos Estados; e o projeto de lei da governança em fundos de pensão.

Contudo, a proposta que é o eixo do ajuste fiscal de Temer – a PEC do teto dos gastos – só deverá ser votada pelo plenário da Câmara, em um cenário otimista, em setembro. A tramitação foi prejudicada em parte porque a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) estava focada em votar um recurso contra a cassação de Cunha.

As reformas da Previdência e trabalhista também serão pautadas logo, mas somente após a decisão final sobre o impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff.

Oposição. O líder do PT na Câmara, Afonso Florence (BA), afirmou que, apesar do apoio de parte da bancada para eleger Maia, a legenda vai se opor à agenda de Temer. “Seremos contra qualquer retirada de direitos econômicos, trabalhistas e sociais. O ônus do ajuste tem de cair sobre os mais ricos”, disse Florence, que pedirá a Maia que se comprometa a pautar a votação da proposta de taxação de heranças e fortunas.

O petista espera que Maia não reproduza o padrão de gestão de Cunha que, a seu ver, usou o poder do cargo para impor suas pautas.

Acordo propõe acelerar impeachment de Dilma

• Acusação e defesa da presidente afastada estão dispostas a reduzir número de testemunhas em plenário; medida impede paralisação do Senado

Fábio Fabrini e Gustavo Aguiar - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A defesa da presidente afastada Dilma Rousseff está disposta a um acordo com a acusação para diminuir a quantidade de testemunhas a serem ouvidas na fase final do processo de impeachment. A redução evitaria que a sessão de julgamento, prevista para começar em 25 de agosto, se prolongue e paralise o Senado no segundo semestre.

Dilma é acusada de participação em cinco fatos que podem configurar crime de responsabilidade – as pedaladas fiscais no Banco do Brasil e a edição, supostamente ilegal, de quatro decretos orçamentários. Conforme o entendimento de técnicos do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Senado, o Código do Processo Penal admite que defesa e acusação arrolem, cada uma, cinco testemunhas para cada um dos fatos. O total de convocados, portanto, pode chegar a 50 – 25 para cada lado.

A situação preocupa senadores pró e anti-impeachment. Se indicado esse número de depoentes, o processo poderá se arrastar pelo mês de setembro, criando embaraços. As sessões consumiriam dias ou semanas, sem nenhuma outra votação no plenário. Todos os 81 membros da Casa estão aptos a inquiri-los. Não há limite de perguntas a serem feitas para cada um.

Transição. Outra questão em debate é a sucessão do presidente do STF, Ricardo Lewandowski. Ele comandará o julgamento, que equivale a uma sessão de júri, caso o processo avance na comissão do impeachment e, em seguida, no plenário. A equipe do ministro estuda o impeachment desde abril e está familiarizada com o processo. Em 10 de setembro, ele será substituído em suas funções pela ministra Cármen Lúcia. A transição poderia implicar algum atraso no processo ou mesmo mudanças no entendimento sobre a forma de conduzi-lo.

O ex-advogado-geral da União José Eduardo Cardozo, que representa Dilma no processo, disse que concorda com a redução do número de testemunhas. Ele já conversou a respeito com o presidente da comissão do impeachment, senador Raimundo Lira (PMDB-PB), e planeja tratar do assunto com Lewandowski. O objetivo é chegar a um consenso sobre a quantidade de testemunhas.

“As testemunhas, uma parte delas já ouvimos. Acho que, nesse momento do plenário, temos de levar apenas aquelas que são mais importantes. Tenho total interesse de sentar e conversar (com a acusação)”, afirmou Cardozo. Ele considera que muitos depoentes poderão se repetir, caso todos sejam ouvidos na fase final. “O importante, para nós, é fazer a prova da defesa, e não o número de pessoas.” Segundo ele, não há interesse em “procrastinação”.

Impacto. Para setores do PT, um desfecho mais ou menos célere do impeachment não vai interferir, necessariamente, no resultado do processo, mas poderá criar problemas em meio às eleições deste ano. A exposição do julgamento prejudicaria candidaturas do partido para prefeituras e Câmaras municipais.

A defesa de Dilma avaliou convocar como testemunha o procurador da República Ivan Marx, do Ministério Público Federal, em Brasília. Em pareceres enviados à Justiça, Marx concluiu que as pedaladas fiscais não foram operações de crédito. O argumento de que as manobras foram “empréstimos ilegais” é uma das bases do processo. “Os pareceres mostram que nossa tese jurídica é correta e sustentável”, disse Cardozo.

A acusação alegou que seu interesse é em um quadro enxuto de depoentes e em um desfecho célere. 

“Nós não arrolaremos nem cinco testemunhas. Os crimes estão mais do que provados. Imprimir alguma racionalidade a esse processo só depende deles”, afirmou a jurista Janaina Paschoal, signatária do pedido de impeachment.

Para 50% dos brasileiros, Temer deve ficar; 32% pedem volta de Dilma

Fernando Canzian – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Entre a volta da presidente afastada Dilma Rousseff (PT) ao poder e a permanência do interino Michel Temer (PMDB), 50% dos brasileiros avaliam que, para o Brasil, seria melhor que o peemedebista continuasse no cargo até 2018. Apenas 32% achariam melhor que Dilma retornasse ao Palácio do Planalto.

Os 18% restantes responderam "nenhum", preferiram uma eleição, deram outras respostas ou disseram não saber.

Na primeira avaliação do governo Temer realizada pelo Datafolha em pesquisa nos dias 14 e 15 de julho, o interino tem, dois meses depois de assumir, uma taxa de aprovação similar à de Dilma antes de deixar o cargo:

14% consideram sua gestão ótima ou boa. No início de abril, 13% tinham a mesma opinião sobre o governo Dilma.

A reprovação a Temer, porém, é muito inferior à de Dilma . Ele é visto como ruim ou péssimo por 31%, cerca de metade do atribuído a Dilma (65%) antes de ser afastada.

A diferença é explicada pelo índice dos que consideram a gestão Temer regular (42%), em patamar superior ao obtido pela petista (24%). Parcela de 13% não soube opinar sobre a gestão do interino.

Em relação a levantamento feito em abril (antes do afastamento de Dilma) e que procurou medir as expectativas dos brasileiros sobre um futuro governo Temer, houve uma diminuição de sete pontos na taxa de ruim/péssimo (que passou de 38% na ocasião para 31% agora).

Já o índice de regular subiu nove pontos, de 33% para 42%. O de ótimo e bom variou de 16% para os atuais 14%.

Um dado que chama a atenção é que um em cada três brasileiros (33%) não sabe o nome do atual ocupante do cargo da Presidência da República. Questionados, 65% respondem corretamente que Michel Temer é o ocupante do cargo. Outros 2% citaram nomes errados.

Impeachment
A pesquisa mostra também que o afastamento definitivo de Dilma pelo Senado é defendido por 58% dos brasileiros, e 35% se opõem à saída. Há ainda 3% que declaram ser indiferentes em relação à situação, e 3% não opinaram.

Em abril deste ano, quando consultados sobre o afastamento da petista pela Câmara dos Deputados, 61% defendiam o impedimento da presidente, e 33% eram contrários à medida.

Independente da posição sobre o assunto, 71% acreditam que Dilma será afastada definitivamente da Presidência da República, e para 22% ela não será afastada. Há ainda 7% que preferiram não opinar sobre o tema.

Com margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou para menos, o Datafolha ouviu 2.792 eleitores em 171 municípios.

Otimismo com economia tem melhor patamar desde 2014, diz Datafolha

Fernando Canzian – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - As expectativas dos brasileiros sobre o futuro da economia do país e em relação à sua situação pessoal deram um salto nos últimos meses e atingiram o maior patamar desde dezembro de 2014.

Segundo nova pesquisa Datafolha realizada nos dias 14 e 15 de julho, os brasileiros estão mais confiantes em relação à queda da inflação, à diminuição do risco de ficar desempregados e ao aumento do poder de compra.

Na comparação com fevereiro, antes do início do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) e da posse do governo interino do presidente Michel Temer (PMDB), o Índice Datafolha de Confiança (IDC) registrou melhora em cinco dos sete indicadores que compõem o índice geral.

No conjunto, o IDC registrou 98 pontos, uma alta de 11 pontos em relação a fevereiro. Esta é a melhor pontuação desde o final de 2014, quando chegou a 121 pontos.

Este foi o terceiro levantamento consecutivo em que o índice apresentou melhora.

O maior salto, de 34 pontos entre fevereiro e agora, foi em relação à expectativa de avanço da situação econômica do país, que passou de 78 para 112 pontos.

Em relação à perspectiva pessoal dos entrevistados, o aumento foi de 17 pontos, passando de 128 para 145.

Pela metodologia do Datafolha, índices acima de 100 são considerados positivos e abaixo disso, negativos.

Recessão
A melhora na percepção dos brasileiros em relação à economia no geral e à sua situação pessoal coincide com uma expectativa de agentes do mercado financeiro, do comércio e da indústria de que o pior da recessão possa estar ficando para trás.

Nas últimas semanas também foram registradas quedas contínuas na cotação do dólar frente o real e valorização do índice Bovespa, principal termômetro do mercado de ações no país.

Datafolha: cresce otimismo com a economia

• Pesquisa também mostra que entrevistados preferem Michel Temer na Presidência à volta de Dilma

- O Globo

Os brasileiros estão mais otimistas em relação ao futuro da economia, segundo pesquisa Datafolha divulgada ontem no site do jornal “Folha de S.Paulo”. A confiança dos entrevistados está associada à queda da inflação, à diminuição do risco de desemprego e ao aumento do poder de compra. É o maior índice de otimismo medido pelo instituto desde dezembro de 2014.

A pesquisa também avaliou o momento político do país. Metade dos brasileiros prefere o presidente interino, Michel Temer (PMDB), na Presidência à volta de Dilma Rousseff (PT). Apenas 32% dos 2.792 eleitores ouvidos querem a petista no comando do país. Outros 18% responderam que não gostariam de nenhum dos dois no cargo ou defenderam a convocação de outra eleição. Nesse grupo também está incluído quem não quis responder à pergunta.

Sobre a economia, o Índice Datafolha de Confiança (IDC) cresceu 11 pontos nos últimos cinco meses, registrando 98 pontos, a melhor pontuação desde o final de 2014, quando chegou a 121 pontos. Segundo a “Folha”, o IDC registrou melhora em cinco dos sete indicadores que compõem o índice geral.

O maior salto foi em relação à expectativa de avanço da situação econômica do país, em que o IDC passou de 78 para 112 pontos. Em referência à perspectiva pessoal dos entrevistados, o aumento foi de 17 pontos, de 128 para 145. Pela metodologia do Datafolha, índices acima de 100 são considerados positivos e, abaixo, negativos.

O levantamento aponta que os problemas do cotidiano como emprego, poder de compra e inflação continuam sendo considerados negativos. Mas todos os índices melhoram na comparação com levantamento feito em fevereiro deste ano.

Pela primeira vez desde abril de 2015, o número de entrevistados pelo Datafolha que acreditam que a situação econômica do país vai melhorar superou aqueles que acham o contrário: 38% deles estão no primeiro grupo, enquanto 30% estão no segundo. Os que creem que vai continuar como está correspondem a 27%. Nos últimos meses, segundo 64% dos entrevistados, a situação econômica do país piorou; para 8% melhorou; e 26% acham que ficou como estava.

Em relação ao governo Temer, a avaliação é similar à de quando Dilma foi afastada: apenas 14% acham sua gestão ótima ou boa. Em abril, 13% tiveram a mesma opinião em relação à petista. Já a reprovação pessoal do peemedebista é muito inferior à de Dilma, quando ela ainda estava no cargo: 31% a 65%, respectivamente.

A pesquisa mostrou também que uma parcela de 32% dos brasileiros cita espontaneamente a corrupção como o principal problema do país. Na sequência aparecem saúde (17%), desemprego (16%, índice mais alto desde março de 2009), violência e falta de segurança (6%) e educação (6%). Em dezembro de 2014, após a reeleição de Dilma, apenas 9% viam a corrupção como o principal problema.

O Datafolha fez ainda uma nova rodada da disputa eleitoral para 2018, com quatro cenários. Em todos, o ex-presidente Lula lidera no primeiro turno, mas perde em eventual segundo turno contra a ex-senadora Marina Silva (Rede) ou contra o ministro da Relações Exteriores, José Serra (PSDB). Quando o candidato tucano é o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, ou o senador mineiro Aécio Neves, Lula parece tecnicamente empatado no segundo turno.

A rejeição de Lula também foi a maior entre os nomes testados pela pesquisa. O petista aparece com 46% de rejeição; Aécio e Temer, com 29%; José Serra e Jair Bolsonaro, com 19%; e Marina, com 17%. A margem de erro da pesquisa é de 2 pontos percentuais, para mais ou menos.

O ocaso de Lula: desprestígio, abandono e suspeitas

• Seis anos depois de deixar o poder, petista convive com o descrédito político, o sumiço dos amigos e os inquéritos da Lava Jato

Por Thiago Bronzatto, de Caruaru, e Daniel Pereira - Veja

Às 7h50 da última quarta-feira, um segurança do ex-presidente Lula chegou ao Aeroporto Oscar Laranjeira, em Caruaru, no agreste de Pernambuco. Diligente, comunicou que um Gulfstream G200, avião executivo de luxo e alta performance, estava a caminho da cidade. Minutos depois, dois representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o vice-prefeito Jorge Gomes (PSB) estacionaram seus carros no local. Estavam apreensivos, porque não havia militantes para oferecer uma recepção calorosa a Lula. “Eles vão chegar. Pode ficar tranquilo”, disse um dos líderes do MST ao segurança, tentando amenizar a tensão. Uma hora mais tarde, só oito pessoas aguardavam o ex-presidente. “Vamos partir para o plano B. Acho melhor receber o Lula no hotel. Manda o pessoal para lá”, ordenou o guarda-costas. Em seguida, ele trancou a porta de entrada do saguão do aeroporto, que é público, para evitar que alguém fotografasse o deserto que aguardava Lula, aquele que já foi um dos políticos mais populares do mundo. “O cara”, como disse o presidente americano Barack Obama, numa ocasião em que se encontraram.

Lula desembarcou às 9h13 acompanhado do senador Humberto Costa (PT-PE). Driblou as poucas pessoas curiosas que o aguardavam e deixou o aeroporto pelos fundos. “Pensei que ele fosse ao menos pegar na minha mão e me cumprimentar”, reclamou Augusto Feitosa, funcionário do aeroporto. Os tempos são outros. A popularidade e o prestígio de Lula também. Caruaru é testemunha dessa transformação. Em 27 de agosto de 2010, o então presidente desembarcou no mesmo Oscar Laranjeira ao som de uma orquestra formada por estudantes de uma escola pública. O saguão estava lotado. Sorridente, Lula abraçou eleitores e posou para fotos ao lado de autoridades como Fernando Haddad, então ministro da Educação, hoje prefeito de São Paulo, e a então primeira-¬dama do Estado de Pernambuco, Renata Campos. Em seu último ano de mandato, Lula beneficiava-se do crescimento econômico, que atingiu 7,5% em 2010. Nem o céu parecia lhe servir de limite. “Se a gente continuar mais dez anos do jeito que está, daqui a pouco chega a Caruaru e pensa que está em Paris, em Madri, de tão chique.”

Caruaru continua Caruaru. Figura entre as doze piores cidades para viver no Brasil. E Lula deixou de ser Lula. Lidera no quesito rejeição entre os nomes cotados para disputar a Presidência em 2018. Na quarta-feira passada, Lula discursou em Caruaru num auditório com capacidade para setenta pessoas. A plateia era formada por militantes do MST e da CUT, que preferiram tomar o café da manhã do hotel a esperar o petista no aeroporto. A programação previa uma coletiva de imprensa. Não ocorreu. Só Lula e áulicos falaram. Mas o ex-presidente mantém um fotógrafo e uma equipe de documentaristas, sempre a postos para captar as melhores cenas. Enquanto estava no hotel, um militante rompeu o cerco de seguranças e tirou uma foto com Lula, mas a equipe do ex-presidente o obrigou a apagá-la. A imagem mostrava uma garrafa de uísque ao fundo. Não pegaria bem nas redes sociais, foi a justificativa apresentada.

Depois do evento, Lula saiu pela garagem, num carro com os vidros fechados, e percorreu um trajeto de apenas 400 metros até o trio elétrico que o esperava para um novo discurso. “Ele parece estar meio distante do povo, com um olhar desconfiado”, observou a funcionária pública Conceissão Pessoa. Em cima do trio elétrico Pantera Fashion, Lula discursou para 2.000 pessoas. Cinco ônibus, com capacidade para cinquenta passageiros, foram fretados por 1.000 reais cada um, pagos em dinheiro vivo, para postar a claque diante da estrela petista. A programação da semana passada, por exemplo, previa uma passagem pela cidade do Crato, no Ceará, onde ele receberia o título de doutor honoris causa da Universidade Regional do Cariri. A segurança fora informada de que estava sendo organizado um protesto de alunos contra a concessão da honraria. A visita foi cancelada.

Em Caruaru, Lula foi ainda a um assentamento agrário do MST. Uma banda de pífanos, também contratada por cerca de 1.000 reais, animou a festa. À mesa, famílias convidadas puderam se servir de macaxeira, jerimum, cuscuz, carne guisada e suco de acerola. Lula bebia cachaça e água. Estendia o braço direito para o alto, com o punho cerrado, e discursava contra o “golpe” que derrubou Dilma. No fim da tarde, às 17 horas, o ex-presidente partiu para o Recife no avião de prefixo PR-WTR, o mesmo que as empreiteiras Odebrecht e OAS usavam para transportá-lo ao exterior. À noite, na capital pernambucana, num evento em praça pública, Lula criticou o presidente interino Michel Temer e o juiz Sergio Moro, que em breve julgará um pedido de prisão contra ele. Falou à plateia e também à equipe que produz um documentário sobre o “golpe”. Com a chuva, os militantes começaram a se dispersar, e Lula teve de encerrar o espetáculo.

Mordomia: carros oficiais a serviço da família de Dilma

• Reportagem de ISTOÉ flagra Paula Rousseff e Rafael Covolo, filha e genro da presidente afastada, utilizando veículos pagos pelo governo para cumprir compromissos pessoais

Sérgio Pardellas – IstoÉ

Como tantas outras Paulas filhas deste País, Paula levanta cedo da cama com o tilintar do despertador. Não raro, o marido, Rafael, já está de olhos abertos. Pela manhã, ela mantém uma rotina nada estranha à maioria das pessoas de classe média. Vai ao cabelereiro, faz compras para abastecer a despensa de casa, reserva uns minutos para o pilates e uma ida rápida à clínica de estética, e, eventualmente, dá uma passadinha no pet shop. Depois de almoçar, leva o filho à escola. À tarde, dirige-se ao trabalho, obrigação já cumprida pelo marido de manhã. Como tantas outras Paulas filhas deste País, Paula seria apenas mais uma brasileira se não carregasse em sua assinatura o sobrenome Rousseff.

Perante à lei, filhos de presidente da República são iguais a todos. Ombreiam-se aos demais cidadãos. Não deveriam merecer distinção ou receber tratamento especial, salvo em alguns casos de excepcionalidade. Mas a filha de Dilma, que hoje se encontra afastada, ou seja, nem o mandato de presidente exerce mais, não se constrange em cultivar uma mordomia ilegal. Diariamente, Paula Rousseff Araújo desfruta de uma regalia. A máquina do Estado a serve, bem como ao seu marido e filhos. As atividades narradas acima, como uma frugal ida ao cabelereiro, ao pilates e ao pet shop, são realizadas a bordo de um carro oficial blindado com motorista e segurança. Em geral, um Ford Fusion. Acompanha-os invariavelmente como escolta um Ford Edge blindado com dois servidores em seu interior, um deles um agente de segurança armado. O mesmo se aplica ao genro de Dilma, Rafael Covolo, e aos dois netos. No total, oito carros e dezesseis pessoas integram o aparato responsável pela condução e proteção da família da presidente afastada. Trata-se de um serviço VIP.

Uma outra esquerda é possível - Luiz Sérgio Henriques*

- O Estado de S. Paulo

Entre nós, o principal partido de esquerda parece não ter percebido, mesmo no plano retórico, as características estruturais da sociedade brasileira, que traz em si, 'morfologicamente', a pluralidade de classes e grupos sociais e suas respectivas representações políticas

Não se tem muita noção, por ora, do que restará do sistema partidário após o fulminante conjunto de ações que se originaram em Curitiba há pouco mais de dois anos e lançaram luz inédita sobre o financiamento da atividade política, tema crucial para as relações entre governantes e governados e para a própria qualidade da democracia. Constatamos, assustados, que tal sistema andava funcionando em bases praticamente autorreferenciais. Entre outras coisas, pouco se conhecia sobre financiadores, lobbies, interesses legítimos ou escusos que contribuíam para dar forma à representação.

Como ninguém é ingênuo, sabia-se que os controles estavam falhando. Impossível ignorar o caráter espetacular das campanhas ou os abusos de marketing, com seus magos capazes de explorar cinicamente medos irracionais e suscitar expectativas ainda menos razoáveis. Agora, no entanto, a exposição dos males tem sido impiedosa e parece não poupar nenhuma força ou personalidade relevante. O celebrado artigo do juiz Sergio Moro sobre a Operação Mãos Limpas, convém lembrar, foi publicado em 2004, no começo da era petista, quando a percepção de haver algo podre no reino da Dinamarca ainda não havia sido imensamente ampliada com os fatos que levaram à Ação Penal 470 e às investigações atuais sobre a ocupação da Petrobrás e outras empresas públicas, com fins de reprodução de mandatos e manutenção de máquinas partidárias – para não falar das situações de enriquecimento pessoal que daí derivam por gravidade.

O impacto de investigações dessa natureza não pode ser subestimado. Na Itália, de um modo ou de outro, foi simplesmente a pique a sensação de imobilidade que rodeava um “sistema de poder” congelado durante décadas.

Em tal contexto “eterno”, seria quase absurdo prever o fim da Democracia Cristã, um partido que não era simplesmente “de direita”, para usar o jargão de que hoje se abusa, mas também canalizava para a vida pública os tradicionais valores solidaristas do mundo católico; e também difícil acreditar que o centenário Partido Socialista, de um “animal político” voraz como Bettino Craxi, morto no exílio, iria ser tragado no turbilhão.

Interessa-nos pouco aqui saber se o PT e o ex-aliado subalterno, o PMDB, com toda a marca que já deixaram na vida brasileira, o primeiro por mostrar ser plenamente plausível a “via pacífica” ao governo, o segundo por encarnar a resistência democrática ao autoritarismo, vão seguir o caminho do redimensionamento ou o da dissolução no rastro das investigações. Nesta altura, pouca gente pode prever quem serão os mortos e os sobreviventes, bem como o tamanho da tarefa de reconstrução do sistema partidário antes que se dissemine o vírus letal da antipolítica ou se agrave a sensação de que “ninguém nos representa” e “o voto não conta, todos são iguais”.

Exercícios inúteis de futurologia à parte, mais concreto já deveria estar sendo o trabalho autocrítico por parte da esquerda, dentro ou fora dos partidos. Diferentemente da situação italiana, e talvez para surpresa de muitos hoje seduzidos por um anticomunismo primário, o que nos faz falta são grupos políticos capazes de se reorientar à maneira do antigo PCI, que antes mesmo das Mãos Limpas, e não por motivos judiciais, mas culturais e políticos, havia tomado o caminho do reformismo, requalificando-se como “partido democrático” e acolhendo outras vertentes reformistas, inclusive de inspiração católica, para começar uma história diversa.

Entre nós, o principal partido de esquerda parece não ter percebido, mesmo no plano retórico, as características estruturais da sociedade brasileira, que traz em si, “morfologicamente”, a pluralidade de classes e grupos sociais e suas respectivas representações políticas. Para dar-se conta desse dado teria sido necessário preparar-se culturalmente para uma visão institucional sofisticada, cujo horizonte não se deixasse contaminar por um diagnóstico catastrófico da crise – grave – do nosso tempo e, por isso, não reiterasse contraposições caducas, como, para dar um exemplo que vale por todos, aquela que renitentemente opõe avanços “substantivos” e mecanismos “formais” do voto, dos partidos, das instituições.

Numa palavra, mais uma vez o aparato conceitual de tantos políticos e intelectuais “altermundistas”, brasileiros ou não, opôs democracia social e democracia política, como se a segunda fosse um obstáculo à primeira – e obstáculo a ser removido por mecanismos plebiscitários, apelos à mitologia de “assembleias constituintes originárias” e a concepções de “contra-hegemonia” alheias ao Estado Democrático de Direito, horizonte ineliminável de nossa época.

A nosso ver, por se inserir de modo acrítico em tal rede conceitual e virar as costas para a complexidade do País é que o petismo no poder se moveu tão desastradamente no plano institucional e no social. Se defino o Parlamento como assembleia de “picaretas”, disponho-me, ato contínuo, a cooptá-los, dispensando os processos de persuasão e aliança e tornando-me assim agente de degradação ainda mais acentuada. E se me autodefino, autoritariamente, como a irrupção dos pobres na vida social e na história do Estado, divido grosseiramente a sociedade em casa grande e senzala, pobres e ricos, amigos e inimigos – simulacro de luta de classes que, no entanto, mal arranha a desigualdade, afasta a esquerda de qualquer possibilidade dirigente e termina por preparar seu estatuto minoritário por muitas décadas.

Nas instituições e na sociedade, o resultado só podia ser desastroso. Ter feito esse tipo de aposta terá sido o pior dos males causados pelo petismo à esquerda e, sobretudo, ao País. Seja qual for o destino do partido e de seu máximo – e solitário – chefe, resta começar de novo: uma outra esquerda há de ser possível. E dela, certamente, o Brasil não pode abrir mão.
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*Luiz Sérgio Henriques é tradutor e ensaísta, um dos organizadores das Obras de Gramsci no Brasil

Olimpíada, redução de danos – Fernando Gabeira

- O Globo

Eduardo Paes reconheceu, numa entrevista ao “Guardian”, que a Olimpíada é uma oportunidade perdida. Crise econômica, corrupção, violência urbana, vamos nos mostrar ao mundo num momento de grande fragilidade. Foi bom que aceitasse algo que repisamos há muito tempo. Ele mencionou a sucessão de problemas como se fossem fatos naturais, acontecendo em sequência.

Esqueceu de falar da visão megalomaníaca dos dirigentes da época e dos seus profundos erros que nos colocaram nessa situação de hoje. Mas, no momento, isso é secundário. A Olimpíada já está aí, o país embarcou nela: não há retorno. A única saída que nos resta é uma política de contenção de danos, uma tentativa de evitar que o desgaste seja tão grande.
É um objetivo mais modesto, defensivo. No momento, não me parece impossível, desde que se concentre nas questões básicas. A segurança que é um problema cotidiano no Rio pode ser aliviada com a presença das tropas federais. A experiência mostrou isso a partir da Conferência Rio-92.

Todos os grandes eventos internacionais foram realizados sem grandes incidentes no Rio. Embora a situação da polícia seja mais delicada no momento, a presença de tropas federais representa um importante fator psicológico. Ela tende a transmitir a sensação de segurança e desencorajar ações criminosas de maior amplitude. Outro tema que pode nos dar algum alívio: telecomunicações.

Embora as conexões no Brasil não sejam grandes coisas, comparadas com o Japão, por exemplo, a tecnologia e a infra existentes podem garantir um resultado satisfatório. Resta a mobilidade urbana, que motivou um grande número de obras. Uma das principais, a linha 4 do metrô, talvez seja concluída a duras penas. Será preciso mais tempo e dinheiro para transformá-la num legado durável. Um dos problemas mais sérios é a quebradeira do estado.

Todo o serviço de saúde pública, inclusive hospitais de referência, está em crise. Como a crise na saúde é antiga, nos momentos mais graves a solução de emergência que existia era usar leitos dos hospitais particulares. Num certo momento, como nos surtos de dengue, isso funcionou, como escape, mas o governo deixou de pagar aos hospitais, perdendo sua credibilidade. Aí está um problema que existe também em relação aos outros serviços públicos. Além de sua decadência material, não se pagam com regularidade os funcionários. Um dos grandes desgastes que o Rio viveu foi a manifestação de policiais no Galeão. Seu cartaz de protesto dizia: “bem-vindos ao inferno”. Uma ação desse tipo atinge um pequeno número de turistas desembarcando. Mas a imagem que corre o mundo expressa com muita clareza a dimensão do nosso drama. O Brasil se lançou, através dos dirigentes delirantes, numa aventura global: atrair a Olimpíada e mostrar não só a prosperidade mas nosso crescente nível de organização.

Considerada a porta de entrada e símbolo do Brasil no exterior, o Rio de Janeiro era uma visão do paraíso. É uma grande surpresa para quem não acompanha os fatos no país deparar-se com um cartaz dos próprios policiais nativos afirmando que aqui é o inferno. Esse episódio é apenas uma demonstração de que, como os governantes que trouxeram a Olimpíada, por seu erro de avaliação, conseguiram o resultado simetricamente oposto ao que projetaram. O calote nos funcionários é o dado inquietante. Precisa ser resolvido para que uma política de redução de danos seja bem-sucedida. Existem críticas na sociedade, mas existe também uma grande vontade de ajudar, encarnada pelo volume e disposição dos voluntários. A boa vontade das pessoas, mesmo nesse episódio de delírio do poder, é a grande esperança de êxito numa política de contenção de danos.

Se, depois de tudo, a Olimpíada transcorrer normalmente — isso é o termômetro de seu êxito como evento esportivo — já será uma grande vitória. Um tipo de vitória que aumenta a autoestima para enfrentar os novos e difíceis tempos pós-Olimpíada. Se a sociedade conseguir neutralizar os estragos de uma decisão delirante, terá cumprido um excelente papel e, quem sabe, pode até estimular a modéstia de seus futuros governantes. As críticas continuam válidas, tanto que o próprio Eduardo Paes, um dos mais otimistas, reconheceu que vivemos um momento péssimo para realizar Olimpíada. Mas na vida, como na política, existem os fatos consumados. Diante deles, a fase da revolta, da negação, acaba dando lugar a um ajuste com a realidade.

A Olimpíada está aí. A imagem do país e da cidade já sofreu muito com a decisão equivocada. Agora, é necessário desejar que seja um êxito esportivo, sem incidentes. Quem sabe o Brasil possa demonstrar através dela que viveu uma grande crise, foi ao fundo do poço, e começa agora o longo caminho da reconstrução. Isso é inteligível não só pelos atletas que vivem fases diferentes em suas vidas. Não passaremos a imagem de um país poderoso e eficaz, como se queria no passado. Mas mostraremos que, mesmo apesar de um desastre econômico, político e moral, demos a volta por cima e terminamos a prova como aqueles atletas de maratona: com a língua de fora, quase desmaiando. Mas chegam.

As eleições e um olhar pós-impeachment – Gilvan Cavalcanti

As eleições municipais marcadas para próximo 2 de outubro serão realizadas em um novo cenário. Em primeiro lugar, pela confirmação do impeachment de Dilma Rousseff, ou seja, seu afastamento definitivo da presidência da República. E, o vice-presidente Michel Temer, deixará de ser presidente provisório e permanecerá até o fim do mandato, em 2018. Não é pouca coisa. Em segundo lugar, não existirão mais as atenções, as festas, as competições esportivas das olimpíadas. Os turistas estrangeiros e nacionais já estarão de volta às suas origens. A opinião pública terá seus olhos para outros temas. A realidade do cotidiano voltará a bater forte.

Nessas eleições, ainda, podemos afirmar que ocorrerão de formas diversas, se levarmos em conta, o tamanho e a importância das cidades. Nas cidades de menor porte será dominada por temas locais. Nas cidades maiores e, principalmente, nas capitais os pesos dos temas estarão divididos: questões locais e nacionais. O Rio de Janeiro pertencerá entre as cidades que o peso das questões nacionais, certamente, será muito grande. Aqui, estarão presentes e relembradas as grandes manifestações de rua que a cidade protagonizou nos últimos anos, rompendo a inercia de um longo tempo: a insatisfação do modo de governar e de representação. A operação Lava-Jato, também, repercutirá na opinião dos cariocas. Foi ela que permitiu afetar as forças e grupos dominantes na cidade, associados aos governos Lula/Dilma, com a descoberta da enorme corrupção em estatais, principalmente, na Petrobras, etc.

Forte influência terá a responsabilização dos governos do PT e seus associados pelos graves efeitos sociais da crise econômica: desemprego, inflação, estagnação e baixo investimento. Não é novidade para os habitantes do Rio de Janeiro que a fação do PMDB local foi o maior defensor do governo Lula/Dilma. Ajudou e contribuiu para a narrativa fantasiosa que o País, o Estado e Município viviam num mundo maravilhoso. O resultado está aí, para todo mundo vê. A população vai esquecer? Vai ser enganada com novas fantasias? A conjuntura é outra, são outros tempos. Acredito que o eleitorado irá cobrar responsabilidades dos atuais dirigentes do PMDB-Rio, recusando a continuidade dessa aliança no governo municipal.

Espero, de outro lado, que não surjam ataques grosseiros ao novo governo Temer e seus aliados tipo: “governo golpista”, “reacionários e contra os pobres”.

Confio que encontraremos meios democráticos para superar a atual crise política, econômica e ética, sem precedentes, legados pelos governos petistas e aliados. Estou convencido que podemos instigar para conduzir as próximas eleições e induzir debates elucidativos dos problemas da cidade e de seus habitantes.

Para isso é necessário escolher uma alternativa ao que aí está e dirige a cidade. Uma alternativa que olhe para o futuro, sem retrovisor, sem visão dualista, dicotômica: o bem e mal, pobres e ricos, esquerda e direita, etc.

Seria uma ótima contribuição para disputar e derrotar o pessimismo, o radicalismo, o catastrofismo e estimular a confiança na política e nas suas instituições. E, reafirmar o compromisso com a democracia como valor permanente e universal, a defesa e fortalecimento da democracia representativa baseados nos valores da ética, do mérito e da igualdade.

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Gilvan Cavalcanti de Melo é membro do diretório nacional do PPS e da executiva estadual do Rio de Janeiro

Acima dos partidos – Ferreira Gullar

- Folha de S. Paulo

Quem lê as críticas que, com frequência, faço aqui a Lula, Dilma e ao petismo em geral, pode deduzir que pertenço a algum partido político que se opõe ao PT. Estará enganado, já que não pertenço a nenhum partido e, se critico o PT, o mesmo faria com qualquer outro partido que praticasse os erros que ele praticou nesses 14 anos de governo.

É certo que fez também coisas certas, mas, infelizmente, após os primeiros anos no governo, tomou o caminho errado, certamente pelo propósito de manter-se indefinidamente no poder.

Os outros partidos, de modo geral, com raras exceções, não são tampouco nenhuma flor que se cheire, como é o caso do PMDB, que, não por acaso, foi aliado dos petistas até poucos meses atrás.

É verdade, porém, que tanto o PMDB como os demais partidos, diferem do PT num ponto, pelo menos: é que este, de inspiração populista —na linha do bolivarianismo— ambicionava apropriar-se do poder para sempre, donde as medidas desastrosas por ele adotadas, que conduziram o país à situação lamentável em que se encontra.

Os demais partidos, que aceitam o jogo democrático, admitem a alternância de poder, determinada pela norma democrática. Por exemplo, Fernando Henrique Cardoso, findo seu segundo mandato, passou a faixa presidencial a Luiz Inácio Lula da Silva, mas este, ao contrário, tentou reeleger-se uma terceira vez e, só porque não o conseguiu, elegeu Dilma Rousseff em seu lugar.

Fez isso certo de que voltaria ao poder quatro anos depois e só desistiu desse intento ao constatar a herança maldita que lhe cairia nas costas. Foi por isso que fez dela candidata a um segundo mandato. Ele percebeu que suceder Dilma seria um desastre, e foi o que aconteceu no segundo mandato dela, que resultou no impeachment.

Ela foi afastada e Michel Temer, seu vice, assumiu o governo como presidente interino, conforme a Constituição.

Sucede que os petistas —para os quais as leis só valem quando os beneficia— passaram a chamar de golpe o que é um procedimento legal. Foram para as ruas pedir a saída de Temer, quando este ainda não tinha completado um mês no governo. Sabem muito bem que o impeachment é um procedimento constitucional, mas, como não aceitam ter de deixar o poder, fingem não saber.

Sabem também que Dilma já não governava o país, e que muito menos poderia fazê-lo agora, se voltasse ao governo. Ainda assim, tudo fazem para inviabilizar o governo de Michel Temer, muito embora saibam que, se o conseguissem, levariam o país à debacle total. É que o PT não atua visando o interesse nacional, e sim o seu próprio interesse. Ao contrário do que costuma dizer Dilma, o lema de "quanto pior, melhor" é deles, petistas, e não de seus adversários.

De minha parte, como disse no começo desta crônica, não pertenço a nenhum partido e, por isso mesmo, quando critico os petistas não o faço por razões partidárias, mas visando o interesse do país, da sociedade, dos cidadãos, conforme meu ponto de vista, claro.

Essas são igualmente as razões que determinam minha atitude em face do presidente Michel Temer. Não o conheço pessoalmente nem tenho qualquer simpatia especial por ele. Admito mesmo que, se fosse o caso de votar nele para a Presidência da República, dificilmente o faria. Apesar disso, ao contrário dos petistas, torço para que ele tome as medidas acertadas, que nos tire deste buraco negro em que Dilma Rousseff nos meteu.

Este é o ponto para o qual gostaria de chamar a atenção do leitor. O Brasil enfrenta um dos piores momentos de sua história, com mais de 11 milhões de desempregados, inflação alta, produção industrial estagnada e um déficit orçamentário dos mais altos do mundo.

Tal situação exige dos políticos, e particularmente do governo central, medidas acertadas e urgentes para evitar que esse estado crítico se agrave. E nós sabemos que, se isso ocorrer, os mais atingidos serão precisamente aqueles que vivem de seu trabalho e, portanto, do crescimento da economia.

Atuar com o propósito de dificultar a adoção de tais medidas é atentar contra os setores mais carentes da sociedade, e é lamentável que isso seja feito por políticos integrantes de uma instituição que se intitula Partido dos Trabalhadores.

Do meu ponto de vista, não é Temer que importa, nem se é este ou aquele partido que ocupe o governo. Importa é sairmos do atoleiro.

O mundo e os refugiados - Celso Lafer*

- O Estado de S. Paulo

O século 20 foi caracterizado como uma era de extremos pelas rupturas, tanto criativas quanto destrutivas, na vida das pessoas num mundo que foi crescentemente se interconectando. Esses extremos, para o bem e para o mal, se prolongam no século 21.

No plano das relações internacionais, a permanência da destrutividade da violência, que a inovação tecnológica amplia e irradia, é um dos dados mais constantes da dinâmica dos extremos. Essa violência expressa as dificuldades da diplomacia em encontrar interesses comuns e compartilháveis. Revela como o sistema internacional não tem sido capaz de bem lidar com o mundo caleidoscópico que resultou dos desdobramentos do término da guerra fria.

Neste mundo, a globalização das emoções, dos ressentimentos e das paixões se conjuga e frequentemente se sobrepõe à razoabilidade dos interesses dos povos e dos Estados.

É o caso do resultado do plebiscito da Grã-Bretanha, em prol da saída da União Europeia. Essa decisão deixa de lado a convergência da reciprocidade de interesses. Explicita a corrosão dos valores que impulsionaram uma das poucas utopias bem-sucedidas da segunda metade do século 20: a lógica da construção, juridicamente acordada, e não imposta, de uma Europa próspera e em paz. A ressonância da candidatura presidencial de Donald Trump nos EUA insere-se nessa moldura, na qual a mobilização interna das emoções deixa em segundo plano a articulação dos interesses americanos no mundo.

A vigência das emoções se vê intensificada também porque as memórias dos povos e dos seus dirigentes nem sempre são compartilháveis. Daí conflitos de valores e perspectivas que dificultam o papel da convergência universalizadora de receios e esperanças. A narrativa da memória da Europa, por exemplo, é muito distinta da do mundo muçulmano e árabe. O desagregador unilateralismo fundamentalista do Estado Islâmico e a intensificação da ação do terrorismo transfronteiras almejam a propagação do medo, que não se amolda aos critérios da razoabilidade diplomática da solução pacífica dos conflitos.

Pode-se dizer que o sistema internacional contemporâneo vive a instabilidade desordenada proveniente da interação de forças centrípetas e centrífugas e está permeado pelos desdobramentos, que têm impacto na dinâmica global da alteração das relações de poder. Na Ásia, as que resultam da primazia da China e da emergência da Índia. No Oriente Médio, as provenientes de um novo e mais significativo papel que passaram a desempenhar na região o Irã e a Turquia.

Nada disso põe em questão com tanta profundidade o valor e o papel de uma comunidade internacional, tal como preconizada no preâmbulo da Carta da ONU, quanto o problema dos refugiados. Com efeito, as nações não estão unidas para efetivamente conterem por uma ação conjunta a emergência em larga escala de uma crescente população de excluídos do mundo.

Estão se repetindo em novos termos no século 21 componentes dos extremos do século 20 que geraram, com o flagelo da guerra e os fanatismos das emoções do poder cego, tantas pessoas sem lugar no mundo.

Na discussão dos extremos no século 21 cabe um paralelismo com os do século 20. Lembro, assim, a análise de Hannah Arendt a respeito daqueles que na Europa pós-1.ª Guerra Mundial se viram, por obra dos totalitarismos, expulsos da trindade Estado-povo-território, tornaram-se indesejáveis não documentados em quase todos os lugares e tidos como descartáveis – ponto de partida dos campos de refugiados, facilitadores dos campos de concentração.

Foi a reação diplomática a essas catástrofes que levou à “ideia a realizar”, que está na origem da ONU, de institucionalizar uma comunidade internacional atenta aos direitos fundamentais e à dignidade do ser humano. Partiu-se conceitualmente do pressuposto kantiano de um direito à hospitalidade universal, lastreado na hipótese de que a violação do direito num ponto da Terra seria efetivamente sentida em todos os demais. É esta a “ideia a realizar” de uma comunidade internacional tuteladora do direito à hospitalidade universal que está hoje em questão de maneira dramática.

Na perspectiva do efeito destrutivo atual dos extremos, cabe sublinhar a trágica precariedade que assola a vida de pessoas nas regiões do que pode ser qualificado de o arco da crise. No Oriente Médio e em partes da África há Estados falidos (como o Iraque e a Líbia), Estados em estado pré-falimentar, conflitos e guerras civis que se prolongam com intervenções extrarregionais, como a que desagrega a Síria, a precariedade e artificialidade de fronteiras interestatais, que instigam conflitos étnicos e religiosos. Tudo isso, em conjunto, vem catalisando a existência dessa enorme população de excluídos do mundo comum, refugiados que fogem do arco da crise, sem encontrar destino e acolhida.

O número de pessoas que buscam asilo, estão internamente deslocadas nos seus países ou são refugiadas por obra de guerras e perseguições se elevou de 59.6 milhões em 2014 para 65.3 milhões de pessoas no final de 2015. Isso significa que uma em cada 113 pessoas da população mundial está fora do mundo comum e não tem acesso ao direito à hospitalidade universal. Cerca de 51% de refugiados do mundo são crianças, muitas separadas dos pais e viajando sozinhas à procura de destino. A situação da Síria, a do Sudão do Sul, a do Iêmen, do Burundi, da República Centro-Africana são forças alimentadoras desse fluxo de pessoas de países de baixa renda que enfrentam essa dura realidade.

O limbo em que se encontram os excluídos do mundo comum, mais tenebroso que os círculos do inferno de Dante, é, na perspectiva de uma razão abrangente da humanidade, a mais grave tensão difusa que permeia a vida internacional.

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*Professor emérito do Instituto de Relações Internacionais da USP; foi ministro das Relações Exteriores no governo Fernando Henrique Cardoso

Rio, cidade segura - Merval Pereira

- O Globo

Olimpíada terá centro de inteligência internacional. Uma prova de obstáculos. Assim o ministro da Defesa, Raul Jungmann, define a situação da segurança pública no Rio de Janeiro para a Olimpíada, num país em crise econômica e política e num estado oficialmente em situação de calamidade.

O ministro da Defesa garante que todos os procedimentos estão sendo cumpridos, e o caderno de encargos do Comitê Olímpico Internacional (COI) está sendo respeitado rigorosamente em relação à segurança. Pela primeira vez na Olimpíada haverá um centro internacional de inteligência, com a presença de representantes de serviços secretos e de inteligência de 106 países já confirmados.

A primeira questão a resolver na segurança era a salarial. Se o dinheiro da União não chegasse, cinco dias depois toda a frota do governo estadual estaria paralisada, porque as locadoras não recebiam há meses e iam retirar os carros, segundo o governador em exercício, Francisco Dornelles.

O presidente da Petrobras, Pedro Parente, mandou avisar que a estatal suspenderia no dia 14 deste mês todo o fornecimento de combustível. A crise econômica fez com que a situação da segurança no Rio se agravasse a partir de março, por falta de dinheiro para combustível, para pagamentos de viaturas e compra de armas.

As forças de segurança decidiram então dar visibilidade ao papel das Forças Armadas e da Defesa, porque começou a se instalar um clima de terra de ninguém. A frase do prefeito Eduardo Paes para a CNN sobre a segurança ser “terrível” consolidou a sensação de insegurança.

Ficou decidido que seria preciso comunicar tudo o que estava sendo feito, para reduzir o efeito psicológico da frase do prefeito. Como os militares têm obsessão por planejamento e organização, e uma cultura voltada para isso, o ministro Jungmann garante que tudo o que o COI determinou foi feito.

Começar a comunicar essa situação, a mostrar as tropas nas ruas, o trabalho do Centro de Integração e Controle, foi uma maneira de fazer uma contranarrativa para garantir que a segurança não ia ficar à matroca. O governador Dornelles pediu aumento do efetivo do Exército, e foram deslocados mais 3.500 homens, para que a polícia pudesse fortalecer o trabalho nas comunidades.

Um patrulhamento ostensivo começou muito antes do que estava previsto. Num dia normal, há cerca de 7 a 8 mil policiais fazendo o policiamento no Rio de Janeiro. Durante os Jogos, serão cerca de 50 mil homens.

O histórico mostra que há uma queda de 33% na violência quando as Forças Armadas estão fazendo o patrulhamento. Segundo o Ministério da Defesa, só veio a elite, gente treinada que esteve no Haiti, na Maré, paraquedistas, fuzileiros navais. O ministro Gilmar Mendes, como presidente do Tribunal Superior Eleitoral, já está se mexendo para pedir que permaneçam no estado até as eleições municipais.

Embora desde 2007 grandes eventos internacionais tenham acontecido no Rio sem problemas, as autoridades não relaxaram na organização da Olimpíada. Mesmo com as incertezas provocadas pelo terrorismo, têm mantido uma relação de troca de informações com todos os sistemas de inteligência mundo afora.

A embaixadora dos EUA esteve recentemente com Jungmann e disse que os serviços de inteligência dos dois países estão bem alinhados, e que não há nenhum indicativo potencial de ação de terrorismo durante os Jogos do Rio.

Com relação à denúncia de que havia um brasileiro sendo treinado para um ataque à delegação da França, ela soou estranha às autoridades brasileiras que vêm trabalhando há mais de dois anos com o serviço secreto francês. Nunca lhes foi informado nada a respeito.

Diante do atentado em Nice, na França, será ampliado o número de barreiras, de pessoal cuidando dos setores, mas aumentará também o desconforto dos cidadãos que forem aos Jogos, para aumentar a segurança. Uma das delicadezas da segurança é que os ingressos são impressos on-line, e a checagem vai ser rigorosa para evitar ingressos falsos.

O ministro Jungmann reconhece que os problemas da Força Nacional demonstram que sua organização tem que ser revista. O ministro da Justiça, Alexandre Moraes, tem um projeto para dar caráter permanente a ela, como acontece nos Estados Unidos com a Força Nacional.

Atualmente, ela tem apenas 200 homens permanentes, e depois tem que recrutar nos estados, contar com a boa vontade dos governadores. Na opinião do novo governo, a Força Nacional permanente deveria assumir o papel de controle da ordem e das fronteiras, para atuar em conflitos internos sem que o Exército precisasse intervir.

Por todas as medidas tomadas, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, concorda com a nova frase do prefeito Eduardo Paes, que agora diz que o Rio será, durante a Olimpíada, a cidade mais segura do mundo.

Travessura do destino – Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

É aquela história que todo mundo sabe, não é preciso contar, sobre o mês de agosto. Assume ares de fato por causa de acontecimentos nefastos ocorridos na política do Brasil, mas o confronto com a realidade não sustenta a lenda. Turbulências não escolhem data, basta conferir no arquivo da memória.

O destino não tem comando e, por isso, faz das suas. No tocante ao nosso pedaço, a mais recente é a coincidência entre o julgamento de dois processos no Congresso: o do impeachment de Dilma Rousseff, no Senado, e o da cassação do mandato de Eduardo Cunha, na Câmara. Ambos ocorrerão nesse mês que se avizinha, dando margem ao livre curso das crendices.

Desta vez, fundadas em fortes e inevitáveis simbolismos se acrescentarmos à conjunção de fatores a realização da Olimpíada no Rio de Janeiro, cuja escolha marcou o auge da euforia da era do PT no poder. O então presidente Luiz Inácio da Silva esteve na cerimônia, em Copenhague (Dinamarca), onde, junto com o então governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes, festejou o fato. E o fez como proprietário do feito, bem ao seu feitio.

Passados sete anos desde aquele eufórico outubro de 2009, o ambiente é de agonia para os três personagens, embora não apenas para eles. Lula assiste ao ocaso de seu partido, Cabral vive no ostracismo (na melhor das hipóteses deve torcer para que a Justiça o deixe sossegado no esquecimento) e Paes dedica-se a falar mal do Rio; evidentemente naquilo que é da esfera do Estado, a fim de se distanciar por razões eleitoreiras do projeto político do qual foi parceiro e que agora sucumbe à crise entre outros motivos por imprevidência e improbidade.

Caso Deus se mantenha fiel à sua propalada nacionalidade e proteja seu país de origem da sanha terrorista, dará tudo certo nos Jogos Olímpicos. Na Copa do Mundo o Brasil deu um show fora do campo. Não obstante os superfaturamentos de contratos como sustentáculos da corrupção, o espetáculo foi de beleza inequívoca. Queira nosso brasileiro mais famoso e poderoso que a maravilha se repita na cidade que carrega o epíteto. Seria bonito de ver e de viver. Considerando o poder do patrono e a torcida geral, assim será.

Já para Dilma Rousseff, Eduardo Cunha e o PT o cenário adverso é uma certeza. Obra coletiva, em boa medida resultado da produção de seus autores. Dilma e Cunha vão se submeter a tribunais de juízos anteriormente formados.

A Câmara vai tirar o mandato de seu ex-presidente não só porque condena os atos dele, mas primordialmente pelo desconforto da companhia e por razão da oportunidade de tentar “zerar” o déficit de imagem junto à população.

Com o PT o caso é de absoluta exaustão. Dilma em seu período de afastamento faz propostas entre o inexequível e puramente cínico. Sugere a realização de eleições gerais e acena com a possibilidade de manter a equipe econômica de Michel Temer. Lula diz sandices nas quais queira o bom senso que ele não acredite realmente. Exemplo: segundo o ex-presidente, estava tudo correndo bem no governo Dilma, até que a eleição de Cunha para a presidência da Câmara pôs tudo a perder.

Outro exemplo para finalizar: “Só serei candidato se o Brasil não der certo”. Ou Lula não quer realmente se candidatar ou torce para que o País dê errado.

Crueldade universal. Os atentados terroristas em geral sinalizam a celebração do hediondo, ninguém discorda. A matança de Nice tem um simbolismo, porém, de característica específica. Ocorreu no dia em que a França celebrava a passagem da revolução de lema igualdade, fraternidade e liberdade. Com isso, exibiu o quanto o mundo está cada vez mais desigual. Desprovido de afeto e prisioneiro do rancor.

Curto-circuito à vista – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

No slogan bolado por marqueteiros, a estatal Furnas Centrais Elétricas se apresenta como "a energia que impulsiona o Brasil". Fora da propaganda, a empresa tem impulsionado escândalos em série. A disputa por seus contratos está por trás das maiores crises políticas recentes: o mensalão e o impeachment de Dilma Rousseff. Um novo curto-circuito começa a ser montado pela gestão de Michel Temer.

A guerra pela estatal precipitou os choques entre o deputado Roberto Jefferson e o governo Lula. Os fusíveis se queimaram quando o Planalto decidiu substituir o diretor Dimas Toledo, que era ligado ao tucanato mineiro e também prestava serviços ao PTB. Irritado, Jefferson passou a contar o que sabia sobre a distribuição de mesadas no Congresso.

No segundo mandato de Lula, Furnas passou à influência do deputado Eduardo Cunha. Sua cruzada contra a presidente Dilma Rousseff começou quando ela decidiu tirá-lo de perto dos cofres da estatal. "Dilma teve praticamente que fazer uma intervenção na empresa para cessar as práticas ilícitas, pois existiam muitas notícias de negócios suspeitos e ilegalidades", contou o ex-senador Delcídio do Amaral aos procuradores da Lava Jato. "Esta mudança na diretoria de Furnas foi o início do enfrentamento de Dilma Rousseff com Eduardo Cunha", acrescentou.

Delcídio também ligou o senador Aécio Neves a suspeitas de desfalques na estatal durante o governo Fernando Henrique Cardoso. O Supremo Tribunal Federal instaurou inquérito para investigar o tucano.

Na semana passada, Temer anunciou que entregará Furnas à bancada do PMDB na Câmara, um aglomerado de aprendizes de Cunha. "Vou devolver a estatal a eles. Furnas pode ser mais expressiva politicamente do que o Turismo. Tem Chesf, Eletronorte, Eletrosul, Itaipu...", disse o interino ao jornal "O Estado de S. Paulo". No dialeto de Brasília, "expressiva politicamente" quer dizer isso mesmo que você está pensando.

Nervos na Olimpíada – Miriam Leitão

- O Globo

Mundo virá para a Olimpíada do Rio com os nervos à flor da pele. Quem fizesse um cenário bem negativo, quando o Rio foi escolhido para sediar a Olimpíada de 2016, não teria chegado a tanto. A realidade tem sido mais forte. O mundo virá para o Rio com os nervos à flor da pele. O Brasil receberá atletas e visitantes com um medo novo, o do terrorismo, e com velhos problemas aflorados. O Rio está em calamidade fiscal declarada pelo governador e o país tem dois presidentes.

Faltando 20 dias para o começo dos jogos, a França teve o terceiro ataque terrorista em 18 meses. O atentado em Nice lembra que qualquer coisa pode virar arma de destruição. Um caminhão numa avenida lotada de famílias comemorando o dia nacional, por exemplo. A imaginação de quem faz a segurança tem que superar a capacidade da mente doentia do terror.

O pano de fundo da nossa Olimpíada será este. A radicalização das tensões no mundo no meio de uma onda de terrorismo em grande escala. O Brasil, que sempre se considerou distante desse tipo de problema, agora precisa se preparar meticulosamente para proteger a nossa população e os atletas olímpicos. É o caso, sem dúvida, de fazer o que está sendo feito: rever todo o protocolo e dobrar todas as medidas de segurança.

Não são fatos comparados, mas aqui vivemos as nossas próprias mazelas. Era para ser diferente. Ser o momento em que comemoraríamos a limpeza da Baía de Guanabara, como aconteceu na Baía de Sydney. Ou a apresentação de uma cidade renovada, como aconteceu em Barcelona.

A segurança no Rio passou por um ciclo virtuoso em que pela primeira vez em muitos anos o morador da cidade pôde circular por áreas antes dominadas pelo tráfico. Os moradores dos bairros onde há mais violência tiveram pela primeira vez a presença do Estado. Flertamos com a esperança de resolver um problema que parecia insolúvel. Hoje há um desânimo como se tudo tivesse se perdido. Não é verdade, mas a sensação de retrocesso está no ambiente da cidade e nas estatísticas de mortes.

O desmonte das boas notícias do Rio ocorreu por erro na gestão das contas públicas. Aproveitou-se uma elevação de receitas temporárias para aumento de despesas permanentes. O Rio foi o estado que teve o maior aumento de gastos com a folha salarial, segundo a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi.

Haverá ganhos permanentes no setor de transportes do Rio, mas muito menores do que o programado. Houve a recuperação do centro do Rio e isso será um importante legado, mas a sombra da dúvida de corrupção em algumas das obras paira sobre o contribuinte, o pagador de todas as contas.

Um dos planos que o Rio e o Brasil tinham era o de aproveitar os grandes eventos internacionais aqui e alavancar a indústria do turismo. Havia exemplos de sucesso. O maior deles foi o de Barcelona.

Segundo dados do Banco Mundial, o número de visitantes na Espanha cresceu quase 70% nos dez anos antes da Olimpíada de Barcelona e dobrou nos 10 anos seguintes. Na Grécia também houve isso, apesar de a Olimpíada de Atenas estar na lista das que deixaram mais problemas. No caso, uma grande dívida. O Brasil teve apenas um pequeno aumento de 10% de turistas no ano da Copa. O professor Mauro Rochlin, da FGV, acha que o exemplo do Rio vai esvaziar o interesse de países emergentes de sediar um evento desse porte.

— O foco nos grandes eventos foi uma escolha equivocada do país. O caderno de encargos é extenso e muito caro. O Brasil convidou o mundo para apresentar os problemas que não conseguiu resolver — diz Rochlin.

A Olimpíada pode dar certo ou dar errado. Montreal ficou com uma dívida que levou 30 anos para pagar. Sydney tirou nove milhões de metros cúbicos de lixo de 160 hectares de vias navegáveis. Atenas ficou marcada por desvios e fraudes nas obras. O Rio está imerso em uma crise desconcertante, com atrasos de salários de funcionários, policiais fazendo manifestações em aeroportos carregando cartazes onde se lê “Bem-vindo ao inferno”, e com o prefeito Eduardo Paes avaliando que os jogos foram uma oportunidade desperdiçada.

Ninguém imaginou cenário tão difícil. E no meio de tudo há até o fato exótico de submetermos as autoridades estrangeiras ao constrangimento de não saber que presidente cumprimentar. Mesmo assim, eles chegarão: os visitantes e os anéis olímpicos. É esperar e torcer.

O sujo e os mal lavados - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

O Brasil foi o queridinho do mundo nos anos Lula, depois deu uma cambalhota e voltou a ser visto como um país atolado em mazelas históricas, potencializadas pelas várias crises. Mas, se os brasileiros fazem autocrítica, às vezes exagerada, é a hora de perguntar aos demais países, sobretudo aos ricos: quem atira a primeira pedra? Todos convivem com graves problemas.

A Turquia, um dos países mais fascinantes do mundo, sofre um real golpe de estado: tanques nas ruas, soldados e policiais guerreando, civis recrutados, centenas de mortos, tudo empurrando o país para tempos nebulosos e atraindo recriminações internacionais. Como o Brasil, o país foi ao céu e desceu ao inferno, mas por motivos bem diferentes. Só por má informação ou má-fé tentariam usar a ruptura democrática lá para reavivar a tese do golpe cá. Um golpe militar é o oposto de um impeachment institucional.

De comum, foi-se o tempo em que um orgulhoso Brasil e uma Turquia com prestígio político em alta se deram as mãos para um salto ousado: a mediação, em 2010, entre Irã e o mundo desenvolvido, na busca de uma solução para o programa nuclear iraniano. A ONU jogou um balde de água fria na articulação (para mais tarde patrocinar um acordo semelhante), mas Brasil e Turquia pelo menos tinham espaço para agir. E agora, o que sobrou do orgulho e da pretensão de ambos?

E o mundo rico não está melhor. A França acaba de cometer uma indiscrição, ao dizer publicamente que o Estado Islâmico preparava um atentado contra a delegação francesa na Olimpíada do Rio, esquecendo-se de avisar ao principal interessado: o governo brasileiro. E, enquanto se preocupava com o Brasil, o inimigo dormia ao lado.

País símbolo de liberdade, igualdade e fraternidade no mundo moderno, a França acaba de sofrer dois dos mais cruéis e covardes atentados, um em Paris, com 129 jovens mortos, e outro agora em Nice, exatamente na festa do 14 de julho, matando mais de 80 jovens, velhos, adultos e crianças. No mínimo, a inteligência e as forças militares e de segurança francesas estão levando um banho (de sangue) do Estado Islâmico e até de malucos que podem ou não agir por grupos terroristas ou crenças desvirtuadas. Mas ela não está sozinha.

O que dizer do 11 de Setembro, que atingiu as Torres Gêmeas, o coração e a alma da maior potência mundial? E do ataque a uma casa noturna LGBT em Orlando, também nos EUA, que pode ter sido um ato solitário ou uma ação coordenada com o terrorismo internacional?

Também não podem atirar a primeira, nem a segunda, nem a terceira pedras contra as mazelas brasileiras a Bélgica, a Indonésia, o sofrido Paquistão e a pouco conhecida Burkina Faso, todos eles alvos de atentados que mataram e feriram centenas de pessoas neste ano, que mal chegou à metade. A própria Turquia não passou incólume a isso. Foram dois atentados graves desde janeiro, um em Ancara, assumido por um grupo curdo radical, outro no aeroporto da linda Istambul, atribuído ao EI.

Ao largo do terrorismo, vieram o Brexit, que jogou a União Europeia e o Reino Unido no escuro, e ameaça Donald Trump, que está empatado com Hillary Clinton nos EUA, para confirmar que o mundo anda mesmo de pernas para o ar, com excesso de ataques terroristas e uma dramática falta de grandes líderes. Trump, Berlusconi, Sarkozy?! Portanto, calma lá antes de falarem mal do Brasil.

O Brasil deixou até de ser “o país do futebol”, voltou a ser o dos tiroteios urbanos, baías contaminadas, zika, dengue, chikungunya e H1N1 e ganhou um acréscimo: o campeão da corrupção – pelo menos até que os demais deflagrem também suas Lava Jatos. Só falta a Olimpíada atrair um inédito ataque terrorista. Mas quem mesmo pode atirar a primeira pedra? Aliás, se depender dos órgãos de inteligência dos países ricos, é melhor a gente rezar. Ou chorar.

De ramon.mercader@edu para j.vaccari@pol - Elio Gaspari

- O Globo

Companheiro Vaccari,

Você não é Ramon Mercader. Como eu, houve poucos no mundo. Matei o Leon Trotsky em 1940, passei 20 anos na cadeia e não contei o que todos sabiam: acabei com o velhote a mando do Stalin. Quando saí da prisão, você tinha 2 anos, e quando morri, em 1978, você tinha acabado de se filiar ao sindicato dos bancários de São Paulo. Eu era um velho de 65 anos, e você, um garoto de 20. Não vou tomar seu tempo contando minha história porque, se você não leu “O homem que amava cachorros”, do cubano Leonardo Padura, peça-o a sua família. O final do livro não presta, mas de resto é coisa fina, sobretudo para quem está preso.

Vaccari, eu era do aparelho de segurança soviético, você era do braço do sindicalismo bancário petista, coisas inteiramente diversas. Daqui, já percebi que você, o José Dirceu e dois diretores da Petrobras (Duque e Zelada) estão em silêncio. No seu caso, a condenação está em 15 anos e deve aumentar. Se você tiver que pagar cinco anos em regime fechado, sairá da cela em 2020, aos 62 anos. Admiro sua resistência e seu vigor ideológico, mas escrevo-lhe para dizer que são fúteis.

Na cadeia, eu sabia que tinha sido condecorado com a Ordem de Lenin. Ao sair, fui proclamado “Herói da União Soviética”. Vivi bem em Moscou e em Cuba. Você nunca será um “Herói do PT”. Sua família sofre com sua prisão, enquanto minha mãe estimulava meu silêncio. Tudo o que o PT pode lhe oferecer são algumas visitas discretas de parlamentares. Não ouvi ninguém louvar publicamente seu silêncio. Durante os 20 anos que ralei, eu sabia que no dia 1º de maio a União Soviética desfilava seus foguetes na Praça Vermelha. Graças a artes do PT (e suas), o presidente do Brasil chama-se Michel Temer, e Dilma Rousseff vai morar em Porto Alegre.

Os empreiteiros que atendiam teus pedidos disseram coisas horríveis a teu respeito. Estão no conforto de suas tornozeleiras eletrônicas, e posso supor que as solícitas OAS e Odebrecht colocarão mais cadeados nas tuas grades. Todos viverão com patrimônios superiores ao teu. Eu morri com saudades de Barcelona, a cidade onde nasci, mas, quando os comunistas espanhóis ofereceramme ajuda para visitá-la, queriam que eu contasse minha história. Morri em Cuba sem rever a Catalunha, e minhas cinzas foram para Moscou.

Valeu a pena? Não sei, mas garanto que, no teu lugar, eu chamaria o Ministério Público para uma conversa exploratória.

Saudações socialistas

Ramon Mercader

Vai dar? – Samuel Pessôa

Folha de S. Paulo

A maior patologia de nossa economia é uma dívida pública que cresce de forma explosiva. Se a proposta de emenda constitucional (PEC) que limita o crescimento do gasto público à inflação passada e inúmeras outras medidas complementares forem aprovadas, provavelmente até a primeira metade dos anos 2020 a dívida estabilizar-se-á em 90% do PIB ou um pouco mais. Em seguida, se tudo der certo, iniciará trajetória de queda. Vai dar?

Se não der, necessariamente passaremos por um episódio de aceleração inflacionária que será tão mais elevada quanto mais indexado for o gasto público.

Nos últimos 25 anos, o gasto público real, excluindo juros, cresceu a 6% ao ano para um PIB que avançou por volta de 3,5% anuais. Assim, é evidente que qualquer saída de um desastre requererá a limitação da taxa de crescimento do gasto público. É esse o objetivo da PEC.

Há algum tempo parecia impossível o Tesouro rolar dívida nos níveis mencionados acima. E, evidentemente, se inúmeras reformas não forem feitas, não será possível, pois a dívida será explosiva.

No entanto, se fizermos a lição de casa, é possível que o mercado financie o Tesouro nos níveis mencionados. Cada vez mais se consolida a visão de que o cenário para os próximos anos para as economias desenvolvidas será de baixo crescimento e juros reais muito baixos. Há apetite para investir nos emergentes.

Além da PEC de controle dos gastos, existem outras medidas necessárias para estabilizar a dívida pública em algum nível minimamente financiável. Há o projeto de lei complementar da renegociação das dívidas dos governos estaduais e as contrapartidas; a urgente reforma da Previdência; o fim das aposentadorias especiais de servidores públicos; o fim do abono salarial, que caducou diante de todo o pacote de programas sociais existentes; a constitucionalização do dispositivo que permite ao setor público cortar salários em momentos de crise aguda, simultaneamente à redução da jornada de trabalho, entre outros.

As estimativas pessimistas de evolução da dívida pública, atingindo níveis acima dos 90% do PIB, já consideram que a recuperação da receita com a retomada do crescimento será muito aquém do que se imagina. As bases tributárias mais importantes para a arrecadação —massa salarial e consumo—, que produziram as receitas extraordinárias entre 2002 e 2011, não crescerão muito acima do PIB na próxima recuperação cíclica, como foi o caso naquela oportunidade.

Somando tudo, uma ruptura que parecia quase certa até alguns meses atrás poderá ser evitada se muita coisa ocorrer. Vai dar? Difícil saber, mas os sinais de que nosso presidencialismo de coalizão retorna lentamente ao seu curso normal —após as disfuncionalidades acumuladas em mais de 13 anos de petismo— aumentam as chances.

Temos um presidente que sabe operar nosso sistema político —encontrar a medida correta entre o varejão e o compartilhamento de poder— e que tem um rumo, o de criar as condições para que seja restabelecida a estabilidade macroeconômica, destruída no primeiro mandato da presidente Dilma. No passado, essas condições foram suficientes para permitir ajustes e construir a estabilidade macroeconômica.

Se fizermos a lição de casa, se o mundo continuar paciente, com sorte vai dar.

A recuperação da confiança – Editorial / O Estado de S. Paulo

Em entrevista exclusiva publicada no Estado de sexta-feira, 15, o presidente em exercício Michel Temer manifestou a disposição de “desidratar essa coisa de Centrão” com o objetivo de promover a unificação da base situacionista na Câmara dos Deputados. Além de fortalecer a relação de independência e harmonia entre os Poderes Executivo e Legislativo, o fim do Centrão ajudaria a sanear as práticas fisiológicas que têm desvirtuado a missão constitucional da Casa de representação popular no Parlamento.

Algo melhor – Editorial / Folha de S. Paulo

A mais recente pesquisa Datafolha mostra que a retomada da confiança na economia não se restringe aos agentes econômicos, mas já se dissemina pela população como um todo, apesar de a maioria também reconhecer que ainda estamos no pior momento de uma gravíssima recessão.

O governo de Michel Temer (PMDB) aparece com aprovação tão escassa quanto a da última avaliação da presidente Dilma Rousseff (PT) antes de ser afastada (14% a 13%), mas sua reprovação, de 31%, é menos que a metade da votada à antecessora, 65%. Ampla parcela, 42%, ao definir a gestão até agora interina como regular, sugere uma atitude de compasso de espera.

A origem do governo Temer foi atribulada. Embora sobrassem motivos de interesse público para o impeachment, faltava um delito insofismável; as pedaladas fiscais pareceram a muitos tecnicalidade invocada como mero pretexto. A pesquisa divulgada neste domingo pela Folha evidencia que cerca de um terço da população continua a negar legitimidade ao processo que gerou o novo governo.