segunda-feira, 27 de junho de 2016

Opinião do dia - Anne Hidalgo

A senhora se define como uma mulher de convicções políticas de esquerda. O que é ser de esquerda hoje?

A esquerda deve parar de pensar que sendo de direita ela será moderna. Eu sou social-democrata, europeia convicta. Penso que devemos alcançar um equilíbrio, pois o econômico não funciona sem o social, e acrescento hoje a ecologia. É preciso regulação. Não é verdade que o mercado pode regular tudo sozinho, e se deixarmos que o faça, teremos sociedades extremamente desiguais e inviáveis para o viver junto. As desigualdades geram violência, a pobreza e a miséria produzem também todo este deslocamento de populações, inclusive sensíveis a lógicas de morte, como a do Estado Islâmico. Penso que o homem que tem a palavra mais forte hoje no planeta é o papa Francisco. Deveríamos escutá-lo mais, não de um ponto de vista religioso — eu sou ateia —, mas porque acredito que ele tem a mensagem mais sensata, mais pragmática. O humanismo que ele expressa, e que apoio completamente, é sem dúvida a forma mais razoável do viver junto. Ser de esquerda para mim é ser humanista e não renunciar a estes valores. A modernidade permanece, para mim, deste lado.
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Anne Hidalgo (PSF) é prefeita de Paris, em entrevista, O Globo, 26/6/2016.

Estatais contrataram 56 mil em quatro anos

• Aumento do número de servidores foi de 11% no período de 2010 a 2014

Entre as empresas públicas federais que dependem exclusivamente do Tesouro, as contratações cresceram de 39.443 para 58.553, um salto de 48%

Dados do governo mostram que de 2010 a 2014 o número de servidores de estatais federais cresceu 11%, passando de 497.020 para 552.856. O percentual é ainda maior nas empresas públicas que dependem exclusivamente do Tesouro: 48%, revela Danilo Fariello. É o caso da Embrapa e da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), entre outras. Na mira do governo do presidente interino Michel Temer, a EBC aumentou o número de funcionários em 180%: de 913 para 2.564. O governo trava embates com o Congresso para aprovar uma nova lei das estatais, reformando a gestão e a governança, mas há ceticismo do mercado quanto à sua efetivação.

Estatais federais infladas

• Em quatro anos, número de servidores subiu 11%. Entre as dependentes do Tesouro, 48%

Danilo Fariello - - Globo

-BRASÍLIA- Apesar da propalada dificuldade financeira de várias estatais federais, as 135 que existem país afora continuam infladas, com crescimento constante de pessoal. Dados atualizados do governo mostram que, de 2010 a 2014, o número total de contratados nessas empresas teve um acréscimo de 11,2%, o que representa 55.836 novas contratações. O aumento foi ininterrupto. Mas, se forem levadas em conta as estatais que dependem exclusivamente do Tesouro Nacional — como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), entre outros exemplos — a alta foi de 48,4% no período. Já de 2006 a 2014, o volume de servidores nas estatais aumentou em 30%, e o das dependentes do Tesouro, em 75%. Enquanto o número de funcionários disparou, o volume de investimentos das estatais federais no primeiro quadrimestre caiu ao menor nível desde 2006.

Sem controle, órgãos da União sofrem desvios

Citadas na delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, seis estatais, com menos instrumentos de controle que a Petrobras, sofreram desvios. No Banco do Nordeste, o TCU apontou prejuízo de R$ 683 milhões com esquema de fraudes em empréstimos.

Órgãos federais menos regulados e mais corruptos

• Citados por Sérgio Machado, BNB, Funasa, Dnit, Dnocs, Docas e FNDE são alvo de desvios

Sérgio Roxo, Tiago Dantas - O Globo

-SÃO PAULO- Alvos constantes de disputas políticas, os seis órgãos federais citados na delação de Sérgio Machado acumulam escândalos de corrupção e denúncias de irregularidades em suas gestões. Estariam em situação bem pior que a Petrobras, segundo ele “a madame mais honesta dos cabarés do Brasil”. Em depoimento à Procuradoria-Geral da República (PGR), o ex-presidente da Transpetro surpreendeu ao afirmar que a petrolífera, cujo rombo estimado pela Polícia Federal é de R$ 42 bilhões, era um organismo “bastante regulamentado e disciplinado”. Ele acrescentou que outras unidades do governo têm práticas “menos ortodoxas”.

Um das instituições citadas por Machado foi o Banco do Nordeste (BNB). Investigações dos ministérios públicos Federal e Estadual do Ceará, onde fica a sede da instituição, apontam irregularidades nas concessões de empréstimos, favorecimento de empresas e desvio de recursos para financiar campanhas políticas. Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que apenas o esquema de fraudes nos empréstimos gerou prejuízo de R$ 683 milhões.

Servidor da Justiça custa à União 112% mais em 20 anos

• Enquanto Câmara aprova correções e gratificações, gasto médio de cada funcionário mais do que dobrou; categoria alega aumento de trabalho

Rodrigo Burgarelli - O Estado de S. Paulo

No início deste mês, a Câmara dos Deputados aprovou 15 projetos de lei com aumentos e gratificações para o funcionalismo federal. A aprovação trouxe o debate sobre o salário de servidores para o centro das discussões do corte de gastos planejado pelo governo federal para os próximos anos. Entre os aumentos aprovados, está previsto o reajuste de 41% para funcionários do Judiciário nos próximos quatro anos.

Além disso, os deputados aumentaram uma gratificação que praticamente todos esses servidores recebem – que passará de 90% para 140% do salário-base – e permitiram que quem tenha curso superior receba um adicional de qualificação. Atualmente, o benefício é restrito para pós-graduados.

As propostas precisam ser analisadas pelo Senado. Há resistência de alguns parlamentares, pois as iniciativas foram apresentadas logo após o presidente em exercício Michel Temer levar ao Congresso a previsão de déficit de R$ 170 bilhões para este ano.

Compra de remédios é nova fonte de fraudes na Petrobras

• Programa era apenas para funcionários, mas reembolsou drogas até para cães, diz ‘Fantástico’

- O Globo

Um programa da Petrobras destinado a compra de remédios se transformou em mais uma fonte de fraudes na estatal. Reportagem exibida ontem pelo “Fantástico”, da TV Globo, revelou que o uso ilegal do benefício causou prejuízos mensais de R$ 6 milhões, valor correspondente a um terço dos gastos totais do programa. Levantamento interno apontou 13 mil receitas com reembolso irregular, incluindo até o caso de compra de remédios para o cão de uma funcionária.

O programa, criado para beneficiar cerca de 300 mil funcionários e seus dependentes, custava mensalmente R$ 30 milhões à estatal. Com a crise, a Petrobras mudou o modelo do benefício, chamado de securitização, e contratou a empresa Global Saúde, em setembro do ano passado, para tentar economizar. Como a nova firma passou a receber um valor fixo de R$ 15 milhões, promoveu um pente-fino nos reembolsos e achou mais de 13 mil receitas fraudulentas.

Senadores mostram ‘fatura’ do impeachment

• Parlamentares pedem interferência de Temer em disputas políticas, indicam aliados para cargos e exigem até comando de estatais

Pedro Venceslau e Valmar hupsel Filho - O Estado de S. Paulo

Do apoio do Planalto em disputas locais a indicações para cargos em estatais e até para o comando do BNDES – o maior financiador de empresas do País –, o presidente em exercício Michel Temer está sendo pressionado por senadores em troca de apoio no julgamento do processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. A votação final está prevista para acontecer até o fim de agosto.

Por causa do assédio, Temer tem recebido parlamentares no Palácio do Jaburu para almoços, jantares e reuniões, marcados muitas vezes fora da agenda oficial. Nos encontros, escuta mais do que fala. “O Temer está comprando a bancada. É uma compra explícita de apoio”, disse o senador Roberto Requião (PMDB-PR), peemedebista contrário à saída de Dilma.

Para interlocutores do governo no Senado, o “movimento” nada mais é do que uma lista de demandas. O caso mais pitoresco, segundo relatos de três senadores próximos a Temer, é o de Hélio José (PMDB-DF). Ele pediu 34 cargos, entre os quais a presidência de Itaipu, Correios, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e até o comando do BNDES.

Temer faz ofensiva em aniversário de senador

• Presidente interino vai a fazenda em Goiás atrás de votos pelo impeachment

Gabriela Valente, André de Souza - - O Globo

-BRASÍLIA- Em busca de votos a favor do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, o presidente interino Michel Temer intensifica o corpo a corpo com senadores e ontem deixou sua casa em São Paulo para comparecer ao aniversário do senador Wilder Morais (PP-GO), em Goiás.

Nas conversas com aliados, no trajeto entre a base aérea de Goiás e a fazenda de Morais, Temer fez uma avaliação sobre os votos para a aprovação do impeachment e orientou os líderes a mapearem dificuldades de indecisos e encaminhálas para ele resolver.

Na festa, para cerca de quatro mil pessoas, Temer conversou com vários senadores ao som de músicas de Wesley Safadão e Aviões do Forró. Os senadores Eunício Oliveira (PMDB-CE), Ciro Nogueira (PP-PI), Sérgio Petecão (PSD-AC), José Medeiros (PSD-MT), Hélio José (PMDB-DF) e José Perrela (PRMG) estavam presentes. Para a plateia, fez um rápido discurso. Homenageou o aniversariante e cumprimentou nominalmente todos os políticos importantes que estavam ali, inclusive o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB).

De olho em apoio no Congresso, Temer vai vetar trechos de Lei das Estatais

Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente interino Michel Temer retoma a partir desta semana a nomeação de diretores de estatais dentro de sua estratégia de assegurar apoio no Congresso, depois de sancionar nesta terça-feira (28), com vetos mais técnicos, a Lei de Responsabilidade das Estatais.

Temer vai manter a proibição de nomeação de dirigentes de partidos políticos nas estatais, mas vai vetar, por exemplo, a regra que não permite que o presidente da empresa participe do seu conselho de administração.

Outro veto recairá sobre a responsabilidade dos conselheiros da estatal em votações do conselho de administração. O texto permite a interpretação de que todos podem ser responsabilizados pelas decisões do conselho, mesmo os que votaram contra.

Para impedir a dubiedade, o governo decidiu vetar este trecho, já que a Lei das Sociedades Anônimas permite o voto em separado dos conselheiros contrários a algum ponto em discussão, o que o isenta de responsabilidade.

O imbróglio das doações eleitorais de pessoas jurídicas

• Lava-Jato foi um claro exemplo do perigo em permitir às empresas que financiem campanhas eleitorais

Por Daniel Burg e Tamara Furman – Valor Econômico

Em 19 de setembro de 1995, entrou em vigor a lei 9.096/95, que, em seus artigos 31, 38 e 39, previa a possibilidade de pessoas jurídicas realizarem, desde que observados alguns requisitos, doações para partidos políticos financiarem suas campanhas eleitorais.

Essas doações passaram a ter grande importância para o caixa das agremiações políticas, chegando, nas eleições de 2014, a representar 70% do montante arrecadado por elas e pelos respectivos candidatos.

Com isso - e a badalada Operação Lava-Jato está aí para comprovar o que se diz -, os partidos políticos, em sua grande maioria, passaram a ficar à mercê das vontades destas empresas, fato que contribuiu significativamente para o atual cenário de corrupção no Brasil.

“Político vai pensar mais antes de cometer crime”, diz Janaina Paschoal

Entrevista

Por Andreza Matais – O Estado de S. Paulo

A jurista Janaina Paschoal praticamente se mudou para o Senado nas últimas semanas. É uma das responsáveis pela acusação no processo de impeachment de Dilma Rousseff. Os debates intermináveis não a fazem se arrepender “nem um pouco” de ter iniciado o processo que já afastou a petista. Para ela, isso e a Lava Jato farão a classe política pensar antes de cometer crime. Apesar do desgaste pessoal, ela diz que se houver um conjunto de acusações contra Temer ou outro que o suceder, não descarta tomar a iniciativa novamente.

Rio mistura política, religião e futebol

Por Cristian Klein – Valor Econômico

RIO - Pelo ditado popular, política, religião e futebol não se discute. Mas, no Rio, um bispo licenciado da Igreja Universal e um ex-jogador da Seleção Brasileira estão no centro do debate que pode desbancar a hegemonia das raposas políticas do PMDB na capital.

Com a reviravolta do lançamento da pré-candidatura do senador Romário (PSB), na última segunda-feira, a corrida municipal tornou-se ainda mais afunilada, apesar da alta pulverização.

Na eleição com as regras mais restritivas em décadas - a começar pela proibição do financiamento empresarial - era consenso entre os quase dez concorrentes que a decisão se daria, num provável segundo turno, entre o senador licenciado Marcelo Crivella (PRB) e "mais um".

Todos - da esquerda à direita, de Marcelo Freixo (PSOL), Jandira Feghali (PCdoB) e Alessandro Molon (Rede) passando por Carlos Osorio (PSDB), Indio da Costa (PSD) e Flávio Bolsonaro (PSC) - queriam, e querem, ser esse "um". Mas a entrada em campo de Romário atrapalha os planos dos adversários, sobretudo do candidato da situação, o deputado federal Pedro Paulo Carvalho (PMDB), espécie de primeiro-ministro ao longo dos oito anos de governo do prefeito Eduardo Paes.

A utopia ameaçada – Aécio Neves

Não é o fim do mundo, mas é um mundo pior.

A decisão dos britânicos de retirar o Reino Unido da União Europeia acende luzes de emergência sobre o modelo que se projetava a partir de uma Europa unificada.

Muita coisa está em jogo. Não são apenas consequências econômicas, com repercussão na economia global. Há impactos políticos, sociais e culturais de enorme relevância.

O rompimento britânico é o mais contundente golpe já desferido contra o sonho civilizatório que levou àquela aliança no pós-guerra. Um sonho que reuniu países com séculos de rivalidade em torno da ideia de um mundo sem fronteiras, democracias em diálogo permanente e nações atentas às questões da desigualdade regional.

Não chore pelo PT - Ricardo Noblat

- O Globo

A corrupção é uma ‘serial killer’ que se disfarça de buracos de estrada, falta de medicamentos e pobreza PROCURADOR DALLAGNOL

Para Hiroo Onoda, a 2ª Guerra Mundial só terminou no dia 9 de março de 1974, quando ele emergiu da selva da ilha Lubang, nas Filipinas, e se rendeu ao seu superior, o major Yoshimi Taniguch, que lhe ordenara 30 anos antes resistir até a morte. Depôs a espada e o rifle ferrolho Arisaka, em perfeito estado de revista. Vestia um gasto uniforme de soldado. De volta ao Japão, foi recebido como herói.

ONODA ALISTOU-SE com 20 anos para servir ao Exército imperial japonês, em guerra contra os Estados Unidos, a União Soviética, a Inglaterra e demais países aliados. Foi enviado a Lubang para evitar que a ilha caísse em mãos inimigas. Como ela caiu, ele e mais três soldados se refugiaram nas montanhas para resistir. Dois morreram. Onoda não acreditava que o Japão fora derrotado.

O governo ‘Demer’ - José Roberto de Toledo

• Na opinião pública, a gestão Temer é quase uma extensão da administração Dilma

- O Estado de S. Paulo

A desaprovação a Michel Temer é equivalente à de Dilma Rousseff, segundo pesquisa inédita do instituto Ipsos, divulgada aqui com exclusividade: 70% desaprovam a conduta do interino, contra 75% que desaprovam a da afastada. A desaprovação dele vem crescendo, e a dela, caindo. O pico negativo de Dilma no Ipsos foi em setembro: 90% de desaprovação. O histórico de Temer foi de 61% de desaprovação em fevereiro (quando ainda era apenas vice-presidente) para 67% em maio e 70% agora. A margem de erro é de três pontos porcentuais.

Há uma diferença entre a avaliação da pessoa de Temer e a de seu governo. Desde que assumiu a Presidência, o interino tornou-se mais famoso: a taxa dos que não opinavam sobre ele por desconhecê-lo caiu de 33% em fevereiro para 11% agora. Isso explica em parte por que sua desaprovação cresceu, assim como é o motivo de sua aprovação ter subido de 6% para 19% no mesmo período. Em relação ao governo, porém, aconteceu o contrário.

Braexit, o medo das urnas – Valdo Cruz

- Folha de S. Paulo

Brexit e Brasil, o que um tem a ver com o outro? Nas palavras de um ministro de Temer, muito. Para ele, é um alerta sobre os riscos de se fazer consulta popular ou convocar eleição como resposta a uma tensão política e social, quando surpresas podem sair das urnas.

Argumento, diria, usado em causa própria. O grupo de Temer quer transformá-lo em presidente definitivo. Não tem nenhum interesse numa eleição neste momento. Para ser justo, não só o grupo de Temer, mas PSDB, DEM e, creio, até o PT.

O receio é que se repita aqui a perplexidade que tomou conta do Reino Unido, que dormiu como parte da Europa e acordou fora. Surpresa tão forte para alguns que já se fala em novo plebiscito e até na resistência da Escócia à decisão.

A necessária e improvável reforma - Marcus Pestana

• Há visível esgotamento e uma inviabilização clara do chamado ‘presidencialismo de coalizão’, transformado em ‘presidencialismo de cooptação’

- O Globo

O país está de pernas para o ar. A combinação da mais grave recessão desde 1929 com o maior escândalo de nossa história, desvendado pela Lava-Jato, e seus desdobramentos políticos tem efeito devastador e decreta a falência do atual sistema político.

Não se troca presidente da República como se troca de camisa. Um impeachment é sempre traumático, deixa feridas e cicatrizes. Mas não há nenhum golpe em curso. Crimes fiscais, eleitorais, morais e de obstrução da Justiça foram cometidos. E a lei é para todos. O processo é absolutamente constitucional, e o país saberá construir seu futuro sem retrocessos.

A burrice da inteligência - Marcos Nobre

• A intolerância inteligente levará a novos Brexits

- Valor Econômico

Dez anos atrás, em 2006, deveria ter acontecido no Reino Unido um referendo sobre a proposta de uma Constituição Europeia. Mas, depois da vitória do "não" em referendos na França e na Holanda, em 2005, o então primeiro-ministro Tony Blair adiou indefinidamente a consulta ao eleitorado britânico. Para evitar novas derrotas, a elite política europeia deu uma carteirada tecnocrática. Aprovou, em 2007, o Tratado de Lisboa, que veio a se tornar a base constitucional da União Europeia.

A carteirada foi ameaçada pela rejeição do Tratado em referendo na Irlanda, em 2008, resultado revertido no ano seguinte com a realização de nova consulta sobre o mesmo tema naquele país. Os demais países membros aprovaram o Tratado no âmbito de seus parlamentos, sem recurso a referendos. Assim foi no Reino Unido, que aprovou o texto em 2008. O Tratado entrou em vigor em 2009. Não por acaso, nesse mesmo ano Nigel Farage assumiu a direção do Partido pela Independência do Reino Unido (UKIP), que se tornou a partir daí uma das principais forças políticas a liderar o Brexit.

De cabeça para baixo – Ruy Castro

- Folha de S. Paulo

A mulher e a filha do deputado Eduardo Cunha pediram para ser julgadas pelo STF, e não pela 13ª Vara Federal de Curitiba -leia-se juiz Sergio Moro. O ex-ministro da Comunicação Social Edinho Silva também pediu ao ministro Teori Zavascki que o inquérito aberto contra ele não seja mandado para Curitiba -aliás, se não for querer muito, ele preferiria que Teori levasse o recurso para julgamento na Segunda Turma do STF, da qual o ministro faz parte.

A falsa República - Almir Pazzianotto Pinto

• Ouso afirmar que todas as Constituições brasileiras faltaram com a verdade

- O Estado de S. Paulo

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)”
Constituição da República Federativa do Brasil, artigo 5.º

Na definição do jurista Pedro Nunes, “República é a realização da democracia, o estado no qual há liberdade para todos e perfeita igualdade de direito e deveres dos cidadãos”.

Desde a Constituição de 1891, elaborada sob a influência decisiva de Rui Barbosa, o Brasil adota formalmente o regime republicano. Jamais, porém, foi Estado de Direito Democrático no sentido da igualdade de todos perante a lei.

Tivemos até os dias de hoje oito Constituições, sendo as de 1937, 1967 e 1969 de origem marcadamente autoritária. A primeira, outorgada por Getúlio Vargas em 10/11/1937; a segunda, elaborada à sombra de atos institucionais, no governo Castelo Branco; e a terceira, decretada, sob a vigência do Ato Institucional n.º 5, durante o recesso do Congresso, pelos ministros da Marinha, Exército e Aeronáutica, ocupantes interinos da Presidência da República no afastamento do presidente Costa e Silva.

Quando parar? - Denis Lerrer Rosenfield

- O Globo

O Brasil está sendo lavado a jato. Não há semana, senão dia, em que um novo evento não mostre as entranhas fétidas dos últimos governos petistas, não envolvendo apenas o partido da presidente afastada, mas, também, outros partidos que se locupletaram no assalto ao Tesouro nacional.

Nesta última semana, foi a prisão do ex-ministro Paulo Bernardo e a busca e apreensão na sede nacional do PT em São Paulo, além do envolvimento de outros próceres e ministros do partido. Nas semanas anteriores, foi a cúpula mesma do PMDB e ministros recémnomeados do governo Temer. A abrangência suprapartidária destas investigações e denúncias bem mostra que essas operações não estão a mando de partido nenhum, todos podendo ser igualmente atingidos.

Note-se que esta última operação, denominada Custo Brasil — poderia ser igualmente chamada de Custo PT —, já não se origina na denominada por Lula “República de Curitiba”, mas em São Paulo, envolvendo, além da Polícia Federal, a Receita Federal.

Isto significa que estamos diante de uma efetiva nacionalização da Lava-Jato, espraiando-se por outros estados e seguindo um mesmo padrão de moralidade pública e de operacionalidade. Nada indica que essa operação, desdobrando-se em novos braços, esteja com data definida de término.

A pergunta pelo término desta operação talvez seja uma questão mal formulada, embora possa ter um certo sentido. Mal formulada, porque ela nasce de uma exigência de moralidade pública e de luta contra a corrupção, liderada por setores do Judiciário, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal. Questão, porém, para alguns pertinente, pois para além do fato de toda operação deste tipo dever ter um término, ela pode talvez ter como consequência um enfraquecimento ainda maior do próprio sistema representativo.

Ocorre que a deterioração do sistema representativo não é um efeito da Operação Lava-Jato, mas a sua causa. Partidos políticos, parlamentares, ministros de Estado — e mesmo o ex-presidente Lula — e funcionários públicos e de estatais se aliaram a empresários inescrupulosos, notadamente de empreiteiras, porém não a eles restritos, para o saqueio da coisa pública. A República veio para eles significar cosa nostra.

O Estado brasileiro estava sendo corroído por dentro, aparelhado ideologicamente e partidariamente, quando uma sociedade atuante, graças à sua imprensa e aos seus meios de comunicação, começa a denunciar e noticiar a ruína que estava se aproximando perigosamente.

A atuação de juízes, promotores e policiais federais inscreveu-se, precisamente, neste processo de resistência, procurando reverter a desestruturação completa da coisa pública. Desrespeito à Lei Orçamentária e à Lei de Responsabilidade Fiscal, queda abrupta do PIB, inflação em alta e desemprego galopante são consequências desta República em crise.

Logo, exigir um término à Lava-Jato sem levar em conta as suas causas pode ser um contrassenso, na medida em que ela é efeito. O país deve, antes de tudo, criar condições e mecanismos que impeçam o desvirtuamento da atividade parlamentar e o aparelhamento do Poder Executivo. Ou seja, o Executivo e o Legislativo deveriam começar a tomar medidas políticas que atuem sobre as causas desta deterioração da coisa pública, tornando, neste sentido, desnecessária a própria Lava-Jato e os seus desdobramentos. Uma reforma política seria aqui prioritária.

Se não ocorrer, como tudo indica que não ocorrerá por atingir interesses incrustados nos partidos políticos, nada mais natural que as investigações em curso sigam o seu caminho. Em todo caso, os esquemas desvendados na Petrobras muito provavelmente existem em outras estatais. Outros ministérios continuam também a ser objeto de investigações. Se a faxina continua, é porque existe ainda muita sujeira a ser lavada.

Alguns economistas, que deveriam, aliás, rasgar os seus diplomas, fazem o cálculo de quanto o país estaria perdendo economicamente com a LavaJato. Deveriam calcular o quanto o país perdeu com os governos petistas, com a corrupção e o desvio de recursos públicos. Parece que a miopia ideológica não permite tal cálculo.

No que diz respeito a um eventual enfraquecimento do sistema representativo, cabe preliminarmente observar que a operação Lava-Jato e o seu imenso apoio na opinião pública mostram que determinadas instituições do Estado estão funcionando. A sociedade civil, por sua vez, tornou-se uma protagonista central neste processo de transformação política. De um lado, a representação partidária foi enfraquecida, de outro, certas instituições republicanas e a sociedade civil se fortaleceram.

Contudo, há uma certa apreensão em relação ao fato de que, consoante com a operação Mãos Limpas na Itália, o enfraquecimento dos partidos políticos poderia levar a aventuras políticas, mediante a eleição de um (a) aventureiro(a) em 2018. O risco existe e é próprio de qualquer sistema eleitoral. A vontade popular pode também optar pelo pior. Já o fez, aliás!

Veja-se a situação na qual nos encontramos, tendo se tornado necessário o próprio impeachment da presidente da República, no pleno respeito à Constituição brasileira. O povo poder fazer péssimas escolhas. É da vida política.

Ora, o que não se pode fazer é optar por frear a Lava-Jato e seus desdobramentos mediante novas leis que perpetuem o status quo político e partidário que está sendo, precisamente, submetido a um duro teste de moralidade pública. Não há indícios de que os partidos políticos estejam efetivamente aprendendo com essa nova cena pública brasileira.

A iniciativa cabe precisamente ao novo governo e à representação parlamentar que, com novos exemplos, possam mostrar um novo caminho a ser percorrido, tornando-se a moralidade pública uma bandeira política nacional.

Se isto vier a ocorrer, o término da Lava-Jato será uma consequência deste novo tratamento da coisa pública. Se tardar, ela tenderá a se perpetuar.

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Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Competência e habilidade – Editorial / O Estado de S. Paulo

Em tese, o governo provisório de Michel Temer preenche a seu favor duas precondições para enfrentar com sucesso a crise em que o País está mergulhado: uma equipe econômica comprovadamente competente para apontar os novos rumos e experiência e habilidade políticas do presidente em exercício, essenciais para garantir o apoio do Congresso Nacional a suas iniciativas.

O governo já passou nos primeiros testes no Congresso, com a aprovação de medidas como a Desvinculação das Receitas da União (DRU) e a chamada Lei de Responsabilidade das Estatais. Mas o desafio maior está pela frente, quando o Congresso Nacional tiver que discutir e votar medidas tão relevantes quanto impopulares, como a reforma da Previdência e outras que de alguma maneira afetam os interesses dos assalariados e por essa razão terão sua rejeição imediatamente transformada em bandeiras da oposição lulopetista.

Cuidar das delações – Editorial / Folha de S. Paulo

Para sorte de todos os brasileiros que desejam um país melhor, a Operação Lava Jato alterou o paradigma de combate à corrupção.

Com o apoio da teoria dos jogos, embutida no sistema de delações premiadas, procuradores têm conseguindo revelar os meandros dos esquemas de propina. De forma inédita, condenam-se dirigentes de grandes empreiteiras, enquanto políticos de alta patente se tornam alvo de investigações.

Como seria de esperar, forças poderosas mostram-se dispostas a pôr freio nas operações. Atuam tanto nas sombras -onde, ao que parece, têm fracassado- quanto à luz do dia, por meio de projetos destinados a modificar as leis em vigor.

"Brexit" é novo alerta para o Brasil lidar com fragilidades – Editorial / Valor Econômico

Embora os primeiros impactos sobre o Brasil da decisão do Reino Unido de deixar a União Europeia tenham sido contidos, teremos um longo período de turbulência pela frente. A escolha irracional e assustadora dos britânicos nos relembra que o mundo vive um período incomum de incertezas. Nesse ambiente, é urgente o governo e o Congresso agirem de forma rápida e decidida para corrigir nossas fragilidades domésticas.

Na sexta-feira, depois de o "Brexit" vencer o referendo no Reino Unido, o dólar teve alta de 1,04% ante o real, a Bovespa caiu 2,82% e as taxas de juros de logo prazo registraram um leve aumento. A moderada oscilação dos preços desses ativos esconde o fato de que, para os principais analistas econômicos, a decisão dos britânicos é um passo no escuro, cuja real dimensão não é fácil de estabelecer neste primeiro momento.

Consideração do Poema – Carlos Drummond de Andrade

Não rimarei a palavra sono
com a incorrespondente palavra outono.
Rimarei com a palavra carne
ou qualquer outra, que todas me convêm.
As palavras não nascem amarradas,
elas saltam, se beijam, se dissolvem,
no céu livre por vezes um desenho,
são puras, largas, autênticas, indevassáveis.

Uma pedra no meio do caminho
ou apenas um rastro, não importa.
Estes poetas são meus. De todo o orgulho,
de toda a precisão se incorporam
ao fatal meu lado esquerdo. Furto a Vinicius
sua mais límpida elegia. Bebo em Murilo.
Que Neruda me dê sua gravata
chamejante. Me perco em Apollinaire. Adeus, Maiakovski.
São todos meus irmãos, não são jornais
nem deslizar de lancha entre camélias:
é toda a minha vida que joguei.

Estes poemas são meus. É minha terra
e é ainda mais do que ela. É qualquer homem
ao meio-dia em qualquer praça. É a lanterna
em qualquer estalagem, se ainda as há.
– Há mortos? há mercados? há doenças?
É tudo meu. Ser explosivo, sem fronteiras,
por que falsa mesquinhez me rasgaria?
Que se depositem os beijos na face branca, nas principiantes rugas.
O beijo ainda é um sinal, perdido embora,
da ausência de comércio,
boiando em tempos sujos.

Poeta do finito e da matéria,
cantor sem piedade, sim, sem frágeis lágrimas,
boca tão seca, mas ardor tão casto.
Dar tudo pela presença dos longínquos,
sentir que há ecos, poucos, mas cristal,
não rocha apenas, peixes circulando
sob o navio que leva esta mensagem,
e aves de bico longo conferindo
sua derrota, e dois ou três faróis,
últimos! esperança do mar negro.
Essa viagem é mortal, e começa-la.
Saber que há tudo. E mover-se em meio
a milhões e milhões de formas raras,
secretas, duras. Eis aí meu canto.

Ele é tão baixo que sequer o escuta
ouvido rente ao chão. Mas é tão alto
que as pedras o absorvem. Está na mesa
aberta em livros, cartas e remédios.
Na parede infiltrou-se. O bonde, a rua,
o uniforme de colégio se transformam,
são ondas de carinho te envolvendo.

Como fugir ao mínimo objeto
ou recusar-se ao grande? Os temas passam,
eu sei que passarão, mas tu resistes,
e cresces como fogo, como casa,
como orvalho entre dedos,
na grama, que repousam.

Já agora te sigo a toda parte,
e te desejo e te perco, estou completo,
me destino, me faço tão sublime,
tão natural e cheio de segredos,
tão firme, tão fiel... Tal uma lâmina,
o povo, meu poema, te atravessa.

Nara Leão - Odeon