sábado, 28 de maio de 2016

Opinião do dia – Marco Aurélio Nogueira

Quanto ao eventual aproveitamento da crise para impulsionar o sempre tão acalentado fortalecimento das esquerdas, seria preciso que viessem à tona ao menos duas coisas: a superação do revanchismo e o compromisso explícito com a democracia. Uma esquerda raivosa, dogmática e fanatizada pelas simplicidades do “golpe” e do “ataque à democracia latino-americana” não terá como dialogar nem com o País real nem com as necessidades do futuro. Precisará se livrar daquilo que a puxa para baixo: kirchneristas, bolivarianos, chavistas, a retórica vazia contra o “capital”, o latino-americanismo à moda antiga, o populismo demagógico, a improvisação, o doutrinarismo. Não avançará se permanecer instrumentalizando, em nome de uma democracia mal ajambrada, os espaços e os aparelhos públicos a que tem acesso e controle. E precisará, sobretudo, encontrar meios de multiplicar, nos círculos de esquerda, o número de ativistas que se disponham a fazer da democracia a pátria comum dos reformadores mais radicais ou menos.

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*Marco Aurélio Nogueira é professor titular de Teoria Política e coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais-neai da Unesp. ‘Quinze dias depois’, O Estado de S. Paulo, 28/5/2016

STF proíbe tramitação oculta de casos contra autoridades

• Para Moro, ataques à Lava-Jato são tentativa de volta à impunidade

Em grampo, presidente do Senado, Renan Calheiros, diz ter atuado para impedir a recondução do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao cargo. ‘Eu tentei, mas eu estava só’

No momento em que conversas grampeadas revelam tentativas de interferência na LavaJato, o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, proibiu a tramitação oculta de processos no tribunal, entre eles ações penais e inquéritos envolvendo políticos, como um que investiga o ex-presidente Lula, agora visível no sistema do STF. No tribunal, prevaleceu o entendimento de que a transparência é a regra. O juiz Sérgio Moro, da Lava-Jato, reagiu aos ataques à investigação. Para ele, os diálogos gravados que mostram integrantes da cúpula do PMDB atuando contra a Lava-Jato são “sinais de uma tentativa de retorno ao status quo da impunidade dos poderosos”. Novo grampo mostra que Renan Calheiros, presidente do Senado, tentou evitar a recondução do procurador-geral, Rodrigo Janot.

STF põe fim a processos ocultos

  • Medida atinge inquéritos e ações de autoridades; regra deve ser a publicidade, diz Lewandowski

Isabel Braga - O Globo

BRASÍLIA - O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, decidiu pôr fim aos chamados processos ocultos que tramitavam na Corte, muitos deles envolvendo autoridades. Diferentemente dos processos em segredo de Justiça — que podem ser localizados, mas sem informar detalhes, como os nomes dos envolvidos e as decisões já tomadas —, os processos ocultos sequer apareciam nos mecanismos de busca do STF. Lewandowski destacou que a medida atende aos princípios constitucionais da publicidade, do direito à informação e da transparência, e obedece aos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.

Presidente do Supremo proíbe processos ocultos na Corte

• Com a medida, será possível verificar a existência de investigações contra políticos que hoje não aparecem sequer no sistema do tribunal

Isadora Peron, Gustavo Aguiar e Carla Araújo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, assinou uma resolução proibindo a tramitação de processos ocultos na Corte. Esse tipo de procedimento não aparece sequer no sistema do tribunal e atualmente só pode ser consultado pelo ministro-relator ou a Procuradoria-Geral da República pode acessá-lo.

Com a medida, será possível verificar a existência de investigações contra políticos que hoje estão ocultas no sistema do STF. Os processos poderão continuar tramitando sob segredo de Justiça, mas a população poderá saber, pelo menos, se há ou não uma investigação contra uma autoridade.

Moro alerta para tentativa de manter poderosos impunes

• Juiz de Curitiba rebate críticas de políticos a acordos de delação premiada na Lava-Jato

Renato Onofre e Isabel Braga - O Globo

SÃO PAULO E BRASÍLIA - Durante um seminário em Curitiba, o juiz Sérgio Moro rebateu as críticas de políticos aos acordos de delação premiada na Lava-Jato. Ele condenou dois projetos de lei em tramitação no Congresso: o que propõe a proibição de colaboração premiada por pessoas que estejam presas; e o que defende a suspensão da decisão do Supremo Tribunal Federal que prevê a prisão de réus após a decisão no 2º grau de jurisdição.

— Eu fico me indagando se não estamos vendo alguns sinais de uma tentativa de retorno ao status quo da impunidade dos poderosos — afirmou o juiz.

É a primeira vez que Moro, que conduz os processos em primeira instância relativos ao esquema de corrupção na Petrobras, fala sobre as delações após a divulgação de gravações feitas pelo expresidente da Transpetro Sérgio Machado. Nelas, o presidente do Senado, Renan Calheiros, defende mudanças na lei da delação: “Primeiro, não pode fazer delação premiada preso. Primeira coisa. Porque aí você regulamenta a delação”.

OAB elogia fim de processos ocultos no STF

• A decisão do Supremo Tribunal Federal obriga procedimentos antigos e novos nesta condição a aparecer no sistema interno

Gustavo Aguiar e Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) divulgou uma nota nesta sexta-feira elogiando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de proibir a tramitação de processos ocultos na Corte. A resolução obriga que procedimentos antigos e novos nesta condição passem a aparecer no sistema interno.

"A transparência é um valor salutar para a democracia e para o bom funcionamento do Judiciário. A OAB acompanha com atenção as medidas adotadas por tribunais para ampliar o direito dos cidadãos à informação e resguardar, ao mesmo tempo, os direitos e garantias individuais", diz o comunicado da Ordem assinado pelo seu presidente, Claudio Lamachia.

'PT e PMDB convergem para o arrefecimento da Lava Jato', diz Marina Silva

• Líder da Rede voltou a insistir que 'a melhor saída é o julgamento no TSE'

Gabriela Lara- O Estado de S. Paulo

PORTO ALEGRE - A ex-senadora Marina Silva (Rede) afirmou que as recentes revelações que vieram a público com base em gravações telefônicas mostram que PT e PMDB "convergem" no esforço de enfraquecer a Operação Lava Jato. Em entrevista concedida nesta sexta-feira na capital gaúcha, ela também voltou a defender a cassação da chapa da presidente da República afastada, Dilma Rousseff, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por entender que há elementos trazidos pela própria Lava Jato que indicam que a eleição de 2014 "foi fraudada" pelo uso de dinheiro oriundo do esquema de corrupção em contratos da Petrobras. Embora defenda novas eleições, Marina disse que "ainda não sabe" se concorrerá à Presidência pela terceira vez.

"As revelações feitas de conversas de parte da cúpula do PT e agora de parte da cúpula do PMDB demonstram que qualquer pessoa que tenha conhecimento mínimo do que está ocorrendo da política brasileira sabe que o ponto em que eles (esses dois partidos) se encontram e convergem na mesma profundidade, na mesma proporção, é no arrefecimento da Lava Jato", disse.

Ao MP, ex-deputado diz que Lula atuou em esquema de corrupção

• Em depoimentos para negociar delação, Pedro Corrêa acusa ex-presidente

- O Globo

BRASÍLIA - Condenado no mensalão e na Lava-Jato, o ex-deputado Pedro Corrêa disse em negociação de delação, segundo revista, que o ex-presidente Lula atuou no esquema da Petrobras, da indicação de diretores à divisão de dinheiro entre os partidos. Lula nega. Corrêa disse ter recebido propina por 3 décadas. Em depoimentos de negociação de um acordo de delação premiada, o ex-deputado Pedro Corrêa citou a suposta participação do ex-presidente Lula num acerto com o PMDB e o PP, que pretendiam dividir propina oriunda da Diretoria de Abastecimento da Petrobras. De acordo com a revista “Veja”, num dos depoimentos feitos pelo ex-deputado, ele afirma que o então presidente Lula atuou pessoalmente no esquema de corrupção na estatal, da indicação para nomeação de diretores à divisão do dinheiro entre os partidos políticos.

Renan diz que Lula não foi processado no mensalão por falta de investigação

Rubens Valente – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia "saído", ou seja, não processado no caso do mensalão porque os pagamentos ao marqueteiro Duda Mendonça no exterior não foram investigados a fundo quando vieram a público, em 2005.

A declaração foi feita em uma das conversas mantidas em março passado com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que gravou diálogos e os entregou ao Ministério Público Federal.

Em 2005, Duda, que havia trabalhado na vitoriosa campanha de Lula em 2002, reconheceu, em depoimento prestado à CPI dos Correios, que havia recebido no exterior cerca de R$ 10 milhões em esquema de caixa dois. Na época, Duda afirmou que o dinheiro havia sido transferido pelo publicitário mineiro Marcos Valério Souza, pivô do escândalo do mensalão.

Na conversa com Machado, ocorrida em março passado, que foi gravada como parte de um acordo de delação premiada de Machado com a PGR (Procuradoria-Geral da República), Renan procurou explicar "por que o Lula saiu": "O Duda fez a delação, e disse que recebeu o dinheiro fora. E ninguém nunca investigou quem pagou, né? Este é que foi o segredo".

Na sequência da conversa, Machado afirma que, durante seu governo, Lula "não fez", provável referência a não ter cometido irregularidades, porém "quando chegou no final do governo botou na real". "Caiu na real", concordou Renan.

Segundo Machado, foram feitas "umas merdas, um sítio merda, um apartamento merda", citações ao sítio de Atibaia (SP) frequentado por Lula e a um apartamento da Bancoop, cooperativa de bancários, construído pela OAS no Guarujá (SP).

FH recebe título de doutor honoris causa pela Universidade de Harvard

• Ex-presidente foi homenageado nesta quinta-feira ao lado de oito personalidades

- O Globo

BRASÍLIA - O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso recebeu nesta quinta-feira o título de doutor honoris causa pela Universidade Harvard, em Boston, nos Estados Unidos. A entrega ocorreu durante a formatura da classe de 2016.

O ex-presidente comentou em seu perfil no Facebook a cerimônia e ressaltou que o poeta Octávio Paz e o escritor Carlos Fuentes, ambos mexicanos, únicos latino-americanos que já haviam recebido esse título.

“O prêmio é individual, mas me senti orgulhoso, como brasileiro, de recebê-lo”, publicou na rede social.

Em comunicado, a Universidade Harvard afirma que a concessão do título honorário "reforça os laços da universidade com o Brasil".

Sob ameaça de protesto, FHC cancela participação em evento em NY

Bela Megale, Mario Cesar Carvalho – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Alvo de ameaças de protestos contra o seu apoio ao governo do presidente interino Michel Temer, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso cancelou sua participação num congresso acadêmico em Nova York (EUA).

FHC participaria do principal evento do encontro, um debate na manhã deste sábado (28) com o ex-presidente chileno Ricardo Lagos, que encerraria o 34º Congresso Internacional da Associação de Estudos Latino-Americanos, no aniversário de 50 anos da entidade.

Em carta enviada à entidade nesta sexta (27), FHC rechaça a noção de que a presidente Dilma Rousseff é vítima de um golpe e defende o que "os atuais ventos ideológicos que circulam em certos centros acadêmicos parecem misturar a postura de cientistas com a de ativistas".

"Aqueles que me conhecem sabem que eu fui formado como cientista social numa época que, a despeito de crenças e valores, intelectuais deviam manter a objetividade científica como um valor central em seus desafios acadêmicos".

FHC lembra na carta que foi aposentado compulsoriamente da USP pelo golpe militar de 1964 e que criou um dos centros de resistência ao regime militar, o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento).

FH cancela palestra em Nova York após protestos de intelectuais

• Ex-presidente participaria de debate neste sábado sobre democracia na América Latina

Silvia Amorim – O Globo

SÃO PAULO - Após protestos de intelectuais, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso cancelou sua participação numa palestra neste sábado em Nova York sobre a democracia na América Latina. O evento foi organizado pela Associação de Estudos Latino-Americanos (LASA) em homenagem aos 50 anos da entidade e FH dividiria um painel de debate com o ex-presidente do Chile Ricardo Lagos.

Em carta enviada a LASA, a que o GLOBO teve acesso, FH explica que desistiu da palestra para não dar discurso a “mentes radicais”.

“Eu peço que vocês entendam que a essa altura da minha vida, aos 85 anos, eu não desejo dar pretexto para mentes radicais, dirigidas por paixões partidárias, me usarem em uma luta imaginária ‘contra o golpe’, um golpe que nunca existiu”, escreveu o ex-presidente.

60% das cidades terão rombo nas contas

• Com forte dependência dos repasses de verbas federais, que vêm caindo por causa da crise econômica, boa parte das prefeituras deve fechar o ano no vermelho

Anna Carolina Papp, Luiz Guilherme Gerbelli e Renée Pereira – O Estado de S. Paulo

Num efeito dominó, o rombo dos orçamentos púbicos chegou ao elo mais fraco: as prefeituras. Com caixa mais apertado e pouca capacidade de arrecadação, os prefeitos têm lançado mão de várias medidas para fechar as contas: a lista do ajuste municipal inclui desde a demissão de funcionários até a redução do horário de expediente dos órgãos públicos. O malabarismo, porém, não deve ser suficiente: mais de 60% das prefeituras vão terminar o ano no vermelho, segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM).

A deterioração das contas dos municípios, assim como vem ocorrendo com os governos estaduais, tem como pano de fundo a grave crise fiscal que assola o Brasil. No caso dos Estados, o problema foi agravado pela combinação entre aumento da dívida e crescimento das despesas com pessoal. Nas prefeituras, o nó está na alta dependência das verbas da União. Com arrecadação mais fraca desde o ano passado, os prefeitos têm sido afetados pela queda nos repasses públicos. Hoje apenas 10% dos 5.570 municípios do País têm arrecadação própria suficiente para bancar suas despesas.

Expediente menor para economizar

José Maria Tomazela – O Estado de S. Paulo

Sem conseguir se recuperar da queda de 10% na arrecadação em 2015, a prefeitura de Capela do Alto, interior de São Paulo, decidiu reduzir o horário de expediente para cortar gastos. Desde o dia 16 de maio, o atendimento ao público passa a ser feito das 8 às 11h30. À tarde, das 13 às 17h30, a prefeitura terá apenas expediente interno. A medida foi tomada por decreto.

De acordo com o prefeito Marcelo Soares da Silva (PV), a prefeitura está com quadro reduzido por causa da dispensa de ocupantes de cargos de confiança e não há funcionários para manter o atendimento pleno. Segundo ele, o corte foi necessário após a constatação de um déficit de R$ 500 mil nas contas públicas de janeiro a maio deste ano. No ano passado, R$ 3,4 milhões previstos em orçamento deixaram de entrar nos cofres do município, de 18,5 mil habitantes.

A prefeitura cortou também horas extras e gratificação. Desde o mês passado, quatro diretorias estão sem dirigentes e a Guarda Municipal ficou sem o comandante. O prefeito prevê mais cortes: “Com a queda na arrecadação, o sistema público está insustentável e podemos adotar medidas mais severas.”

Municípios deixam de receber R$ 165 bilhões

• Prefeituras foram afetadas pelas desonerações de IPI e IR nos repasses federais, segundo a Confederação Nacional dos Municípios

Anna Carolina Papp, Luiz Guilherme Gerbelli e Renée Pereira – O Estado de S. Paulo

Pelo menos R$ 165 bilhões deixaram de entrar nos cofres dos municípios nos últimos anos. Desse total, R$ 122,7 bilhões são fruto de desonerações do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Renda (IR), que diminuíram as transferências do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) – uma das principais fontes de receitas das prefeituras. Os cálculos foram feitos pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) no período de 2008 a 2014.

A outra parte refere-se aos chamados restos a pagar – valores empenhados (compromisso de que há crédito para a obra) que não receberam desembolso do Tesouro Nacional e foram transferidos para o ano seguinte. Segundo o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, de 2003 para cá o governo deixou de pagar aos municípios R$ 43 bilhões. No total, são 80 mil empenhos referentes a obras iniciadas e emendas parlamentares. Um reflexo dessa interrupção é a paralisação generalizada de obras Brasil afora. Na prática, isso representa custos maiores dos empreendimentos – que, no final, vão bater no bolso dos contribuintes brasileiros – e serviços deficitários para a população, a exemplo da falta de vagas em creches e escolas, além de lotação em hospitais.

Servidores de 576 cidades estão com salário atrasado

• Em alguns municípios, funcionários estão há mais de seis meses sem receber, de acordo com dados da CNM

Anna Carolina Papp, Luiz Guilherme Gerbelli e Renée Pereira – O Estado de S. Paulo

Os cofres vazios em grande parte das prefeituras do País têm se refletido diretamente nos bolsos dos funcionários municipais. Em 576 cidades, os prefeitos não têm conseguido pagar em dia o salário dos servidores. Desse total, 11% estão com atraso superior a seis meses, segundo levantamento da Confederação Nacional dos Municípios.

No Piauí, por exemplo, algumas prefeituras foram acionadas na Justiça para fazer o pagamento dos funcionários. Esse é o caso do município de Boa Hora, a 156 quilômetros de Teresina. Mergulhada numa forte crise financeira, os servidores públicos estão há quatro meses com salários atrasados. Diante da situação, os professores decidiram fazer greve por tempo indeterminado ou até receberem os pagamentos. A dívida inclui ainda salários de vigias, zeladores e secretários escolares.

Além dos meses em atraso neste ano, há outras pendências na conta da prefeitura: salários em aberto referentes a dezembro de 2012, dezembro de 2014 e a novembro e dezembro de 2015.

Ares do tempo - Cristovam Buarque

• Continuamos emergindo ao passado, não ao futuro

- O Globo

Há uma sensação geral de que o país perdeu o rumo. O incômodo vem de fatos específicos: caos político, corrupção, recessão, desigualdade, violência, epidemias, desemprego, deseducação, falência das contas públicas. Poucos, porém, consideram que estes indicadores de falta de rumo e de decadência têm em comum o fato, ainda mais grave, de que estamos sem sintonia com o “espírito do tempo”, o conjunto de ideias que orientam a humanidade e cada nação para o futuro. É como se, além de rodando no meio do mar, não soubéssemos como inflar as velas do barco na direção dos ares que sopram para o futuro.

Quinze dias depois - Marco Aurélio Nogueira*

- O Estado de S. Paulo

O governo Temer continua a se mexer com dificuldade. A estratégia de blindar a economia e as relações exteriores, dando-lhes estrutura técnica superior, e de negociar o resto para obter maioria parlamentar tem feito com que acerte no atacado, mas erre no varejo. Na escolha dos ministros, mostrou que é prisioneiro do sistema político e permeável às suas chantagens. Com isso, distanciou-se da sociedade. Nem sequer conseguiu entabular relação produtiva com a opinião pública.

O governo está encharcado de alvos fáceis: não se trata só de corrupção, mas de fragilidade política e baixa densidade técnica. Os mesmos que foram “empoderados” por Dilma e a levaram, depois, ao altar dos sacrifícios continuam aí, debochando do Executivo e da sociedade, devidamente “empoderados” por Temer. É um feitiço que não consegue ser controlado por nenhum feiticeiro.

Mistificação eficiente - Merval Pereira

- O Globo

Uma coisa é preciso reconhecer: esses petistas são bons de mistificação na oposição. Só conseguem ficar no poder às custas de acordos espúrios como os que estão sendo revelados nas diversas investigações criminais que atingem em cheio a gestão nos últimos 13 anos.

Mas na oposição, não se vexam com as revelações de seus crimes e partem para o ataque como se não tivessem nenhuma culpa pelo o que aconteceu na Petrobras, assaltada e dilapidada por uma quadrilha de políticos comandada pelo próprio ex-presidente Lula, como mais uma delação premiada, a do ex-deputado Pedro Corrêa, confirma.

Belíndia, RIP - Igor Gielow

- Folha de S. Paulo

O economista Edmar Bacha cunhou nos anos 1970 o termo Belíndia, ficção que externava a nossa miséria distributiva ao combinar no Brasil o conceito de uma nação que unia a Bélgica (o mundo da tal elite) e a Índia (todo o resto).

Esta semana que acaba provou novamente a obsolescência do modelo. A Índia figurativa venceu, e isso não faz justiça à parte Bélgica do país do Sul da Ásia, que é um pujante celeiro de cérebros e inovações –a parte Índia-Índia deixo para outro dia.

O lado B da fita de Lula – Luiz Antônio Novaes

- O Globo

A cronologia das primeiras conversas entre Sérgio Machado, Jucá, Renan e Sarney, divulgadas esta semana, é esclarecedora. Mais do que a defesa do fim da delação premiada para presos, vê-se, dia a dia, que o grampo escancara o planejamento de um acordão para um “golpe”, ensaiado desde a demissão do ministro da Justiça no final de fevereiro. Mas não contra Lula e Dilma — e sim contra a Lava-Jato. E com a inédita participação, num primeiro momento, do PT e do PMDB unidos, se dependesse exclusivamente de Renan Calheiros.

As impactantes gravações de Machado ocorreram por volta de 10 e 11 de março, uma semana após a condução coercitiva de Lula para depor na Lava-Jato. Às vésperas, no dia 8, Lula, em sua versão jararaca, se refugiara em Brasília, onde janta com Dilma e vai no dia 9 à casa de Renan, de quem, ironicamente, ganha um exemplar da Constituição. No dia 10, o MP de São Paulo se antecipa a Curitiba e pede a prisão preventiva de Lula (até hoje no STF). No domingo, 13, o Brasil realiza a maior onda de protestos de sua História — contra Dilma, Lula, o PT e a favor da Lava-Jato e do juiz Sérgio Moro.

Esse primeiro bloco de fatos se fecha na terça-feira, 15, quando, em plenário, Renan desiste, por imposição do DE Medo PSD B, de instalara comissão especial que ele havia cria dopara discutira adoção de um parlamentarismo tupiniquim. Fica evidente nas fitas que fortalecer o Legislativo—e a si mesmo, como presidente do Senado — com um parlamentarismo brando ou branco era o plano Ade Renan. Não só na hipótese sem Dilma e Lula, ideia com que a oposição simpatizara, mas até mesmo com os dois. A dobradinha Lula-Dilma contou, muito mais do que se imaginava, coma articulação de Renan. Entregar o poder presidencialista ao correligionário Temer era o plano B. É por isso que o PT, ao ouvir agora as fitas de Machado, preserva Renan, enquanto faz um carnaval contra as declarações de Jucá, aliado de Temer desde a primeira hora do impeachment, já expelido do governo pela Lava-Jato.

Com o contundente recado das ruas, Renan perde de vez espaço no PMDB para Cunha, a quem cabe prosseguir com o impeachment na Câmara. O PT, em desespero, busca uma solução própria. Dilma, que não aceitou licença ou renúncia, peça-chave do jogo “parlamentarista” coma oposição, anuncia no dia 16 que Lula, com prisão pendente, será ministro da Casa Civil, assumindo o risco de obstrução da Justiça.

Acusação que ficaria evidente horas depois com a divulgação, pelo juiz Moro, do grampo com as conversas recentes de Lula, inclusive com Dilma. Entre tantos outros ataques ao STF e ao MPF, o candidato a primeiro-ministro diz ao prefeito Eduardo Paes, do PMDB, que ele era a única chance que o país tinha de parar “esses meninos” da Lava-Jato. As gravações de Machado, da mesma época mas conhecidas só agora, são o lado B das fitas de Lula. No dia 17, com Lula já empossado e Moro como nunca na berlinda, procuradores e juízes divulgam manifesto alertando para o risco de atentados às investigações, “numa guerra desleal e subterrânea travada nas sombras, longe dos tribunais”.

Naquela tarde, São Paulo reagiu e rugiu como em dia de futebol. Mas, no silêncio dos palácios de Brasília, pensava-se que o Lula de 2016 ainda era o de 2003. Que o poder dos políticos era maior do que o do povo. E que o aperfeiçoamento da democracia contra a corrupção era o mesmo que “ditadura da Justiça”. Ainda assim, concluiu-se, em 17 de abril, o afastamento de Dilma, que o PT espertamente chama de golpe para destruir conquistas e abafar a Lava-Jato. A Temer, herdeiro constitucional da crise, resta torcer pela economia e rezar para que seu nome não apareça de forma irrefutável na boca dos delatores.

Em busca da ditadura perdida – Demétrio Magnoli

- Folha de S. Paulo

A economia política do lulopetismo foi decifrada pela revisão da meta fiscal aprovada no Congresso. O rombo de R$ 170 bi nas contas públicas, fruto da doutrina econômica abraçada por Dilma Rousseff, não inclui as futuras, incontornáveis, capitalizações da Petrobras, da Eletrobras e da Caixa, devastadas por um governo que sempre acusou seus críticos de nutrirem um projeto de destruição das estatais. Submetidas à colonização partidária, as empresas em estado falimentar sustentaram o bloco de poder articulado em torno do PT, financiando a maioria parlamentar governista. Mas, posta diante do impeachment, a esquerda brasileira brada contra um golpe imaginário e convoca o espectro de 1964.

Passo a passo - Ana Maria Machado

• Não consigo estar entre os que celebram fim de um vergonhoso episódio histórico — nem acredito que esteja encerrado

- O Globo

O momento obriga a ir além do simplismo redutor e das palavras de ordem. Força a pensar, tomar consciência do que acontece, tentar examinar causas, imaginar desdobramentos. De certo modo, é como quem sofre de uma doença muito grave e tem de encarar a perspectiva de um tratamento que acena com algumas possibilidades de melhora, mas não garante cura e ainda traz sofrimento e efeitos colaterais devastadores. Nesses casos, as reações individuais variam de uma pessoa para outra. Uns entregam os pontos, outros se rebelam e negam os fatos, outros respiram fundo, tentam ser racionais e seguem em frente. Há quem procure curandeiros, quem vasculhe a internet em busca de informação, quem se coloque confiante nas mãos de especialistas. Talvez a maioria das pessoas alterne essas facetas em momentos diferentes.

Os juízes federais e a Lava Jato – Editorial / O Estado de S. Paulo

Numa demonstração de maturidade institucional, juízes federais superaram antigas animosidades corporativas e reconheceram publicamente a eficiência com que os procuradores da República que integram a força-tarefa da Operação Lava Jato, em Curitiba, vêm combatendo a corrupção e defendendo o império da lei. Depois de enumerar de modo pormenorizado as principais contribuições dos integrantes dessa operação, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) atribuiu nota dez ao seu desempenho, conferindo-lhes o prêmio “Boas Práticas de Gestão” de 2016.
Segundo a Ajufe, os procuradores responsáveis pela Lava Jato teriam mudado os paradigmas de combate aos crimes de improbidade, formação de cartel e lavagem de dinheiro, sempre agindo com transparência e respeito à ordem jurídica. A entidade afirma que eles coordenaram investigações complexas em dezenas de localidades, utilizando de forma inteligente as inovações introduzidas nos últimos anos no direito penal econômico brasileiro, como é o caso do acordo de colaboração.

A importância de um Judiciário independente – Editorial / O Globo

• Gravações revelam a força de instituições republicanas, por definição independentes, mas também alertam para os perigos que rondam a Lava-Jato

A circulação, em capítulos, de gravações feitas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, para sustentar seu acordo de delação premiada na Lava-Jato, já reúne preciosos subsídios para cientistas políticos estudiosos de plutocracias e oligarquias nacionais. Não se tem notícia de registros tão vivos da atuação nos bastidores de personagens como Romero Jucá, Renan Calheiros e José Sarney.

Das gravações de Machado, tido como homem de Renan no grupo Petrobras, emergem, até agora, várias maquinações para tentar livrá-lo, e quem mais for, do temido juiz federal de primeira instância Sérgio Moro, e ainda para tentar influenciar o circunspecto ministro do STF Teori Zavascki, já notabilizado pelo rigor técnico nas decisões que toma. Zavascki é alvo privilegiado desse lobby por ser o relator das denúncias contra deputados federais, senadores, ministros e presidente da República, cujo foro é o Supremo.

Tragédia humilhante – Editorial / Folha de S. Paulo

No último sábado (21), no Rio de Janeiro, uma jovem de 16 anos deixou sua casa para encontrar um garoto com quem se relacionava. Foram à casa dele, em Jacarepaguá. Depois disso, a adolescente só se recorda de ter acordado, no dia seguinte, em outro local. Nua e violentada, estava circundada por cerca de 30 homens armados.

Ampliando os níveis de covardia e abjeção, o estupro foi revelado por um vídeo postado na internet, no qual a jovem aparece inconsciente, exposta e sangrando. Os homens ao redor se vangloriam do crime e debocham da vítima.

A selvageria suscitou campanhas nas redes sociais e repercutiu em publicações de diversos países —e, para tristeza dos brasileiros, não se tratava de caso único.

Match point - Sérgio Augusto

-O Estado de S. Paulo

Nada a ver com o filme de Woody Allen. Com tênis, sim. De um lado da rede, um dionisíaco pintor lombardo; do outro, um apolíneo poeta madrilenho. Não se defrontaram em Roland Garros ou Wimbledon – cujas quadras, aliás, nem existiam –, mas na Piazza Navona, em Roma. Há tanto tempo (1599) que ainda chamavam o jogo de pallacorda e as bolas (pallas) eram feitas de pelos, única parte do morto que não apodrece.

Caravaggio, o pintor, foi um consumado tenista; Francisco de Quevedo, o poeta, além de coxo da perna direita, não sabia sequer empunhar uma raquete. Caravaggio era gay e dissoluto; Quevedo, um rígido defensor do império espanhol e do catolicismo mais retrógrado.

Quem ganhou a partida? Você só saberá na última página de Morte Súbita, romance histórico-ensaístico do mexicano Álvaro Enrigue, lançado esta semana pela Cia. das Letras. Pois só nele essa partida, improvável embora historicamente possível, aconteceu. Como dizem os italianos, “si non è vero, è bene trovato”. Morte Súbita é um achado.

Helena eterna – Ruy Castro

- Folha de S. Paulo

A mulher ao microfone do roof do hotel Mercure Leblon, cantando semana passada para uma plateia de admiradores extasiados, é uma lenda da música brasileira. Nos anos 50 e 60, ela foi uma estrela da noite e do disco, com clássicos que tornou seus, como "Na Cadência do Samba", de Ataulpho Alves, "Prece", de Vadico, e "Mora na Filosofia", de Monsueto, todos com parceiros, e canções feitas para ela, pessoais e intransferíveis, como "Boa Noite, Rio", de Haroldo Barbosa e Luiz Reis, "Verdade da Vida", de Raul Mascarenhas e Concessa Colaço, e "Estão Voltando as Flores", de Paulo Soledade.