quinta-feira, 14 de abril de 2016

Opinião do dia – José Serra

Sem truculência, mas com determinação, será preciso pôr limites à pressão de corporações poderosas sobre as finanças públicas. O patrimonialismo que grassa no setor estatal terá de ser coibido. As políticas sociais devem ser mantidas, mas nos trilhos da eficiência e da inovação. As condições de crescimento do País terão de ser recriadas com base na lisura, na competência e na interação equilibrada dos agentes públicos e privados.

Os próximos meses, sendo otimista, ainda serão de incerteza e sacrifícios para um povo já sofrido. Virar esta página exigirá estabelecer um mínimo de confiança do povo nas instituições democráticas. Eis o maior desafio das lideranças políticas, sociais e intelectuais dispostas a plantar o futuro, em vez de se agarrar aos escombros do passado.
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José Serra é senador (PSDB-SP). ‘Depois da Nova República’, O Estado de S. Paulo, 14/4/2016

PSD e PTB abandonam governo; Planalto admite situação crítica

Debandada de parlamentares cresce e Planalto já reconhece situação crítica

• Auxiliares de Dilma e até o ex-presidente Lula reconhecem, em privado, que a perda de apoios deixou o cenário ainda mais desfavorável ao governo no Congresso

Vera Rosa e Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Palácio do Planalto e líderes governistas no Congresso consideram que a situação política da presidente Dilma Rousseff no Congresso se agravou de maneira drástica com a debandada de partidos importantes da base aliada.

A oposição dizia já ter os votos necessários, 342. Na contabilidade do Planalto nesta quarta-feira, havia 188 votos pró-Dilma. O Estado, porém, apurou que Dilma não contava com os votos necessários (171) e que, em privado, o governo reconhecia a situação crítica e apostava nas ausências.

Outro ponto de preocupação dos governistas era o silêncio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao Senado. Em conversas reservadas, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse que não conversa com o petista desde março. O líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), também afirmou não ter sido procurado por Lula. Nos bastidores, o comentário é que o ex-presidente considera muito difícil barrar a abertura do processo de impeachment na Câmara no domingo. Tudo está sendo feito, porém, para evitar uma “derrota humilhante”.

Segundo um auxiliar de Dilma, o Palácio do Planalto não pode ser humilhado porque, se isso ocorrer, não há chance de reverter o cenário no Senado.

Até esta edição ser concluída, o Placar do Impeachment do Estado marcava 332 votos a favor do impeachment e 124 contra. Só nesta quarta-feira, 31 deputados anunciaram mudança de posicionamento, sendo 26 pelo afastamento da presidente. Embora avalie a situação de Dilma como “muito complicada”, Lula não jogou a toalha. Nos encontros que tem mantido com políticos, recorre a uma frase de impacto: “Pense que você será responsabilizado pelo que acontecer neste país”.

Mas os movimentos do ex-presidente provocam dúvidas até no Planalto. Na sexta-feira, ao participar de encontro com estudantes e profissionais da Educação, em São Paulo, Lula reiterou críticas a Dilma e à política econômica do governo.

Debandada na Câmara já eleva pressão no Senado

• PSD de Kassab também orienta bancada a votar pela saída de Dilma

Oposição pressiona Renan Calheiros para que a votação ocorra ainda em abril; se impedimento for aprovado por deputados e autorizado por senadores, presidente será afastada por 180 dias

A debandada de partidos do governo continua a isolar ainda mais a presidente Dilma, levando integrantes do Planalto a já admitir derrota na votação de domingo na Câmara. Ontem foi a vez de o PSD do ministro Gilberto Kassab (Cidades) orientar a bancada a votar pelo impeachment, o que deve ser seguido por 30 dos 38 deputados. A oposição voltou suas baterias para o Senado e pressiona o presidente Renan Calheiros a acelerar o rito: quer que a votação para autorizar a abertura do processo ocorra ainda em abril. Se autorizada, a presidente é afastada por 180 dias, e o vice Michel Temer assume. Em entrevista, Dilma propôs um pacto caso o impeachment seja barrado. “Se eu perder, estou fora do baralho”, afirmou ela.

Pressão sobre o Senado

• Oposição cobra Renan a marcar ainda neste mês votação que pode afastar presidente

Cristiane Jungblut, Júnia Gama, Maria Lima - O Globo

-BRASÍLIA- Com as contas cada vez menos favoráveis ao governo na Câmara para barrar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no domingo, as atenções começam a se voltar para o Senado, que dará a palavra final sobre o processo. Caso os senadores aceitem uma decisão dos deputados favorável à instalação do processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff será afastada por até 180 dias, prazo máximo para a conclusão do julgamento.

Já surgem pressões sobre o presidente do Senado e do Congresso, Renan Calheiros (PMDBAL), para que não haja atrasos que deixem o “país em suspenso". Senadores da oposição e alguns da base trabalham para evitar protelação, mas há divergências na Casa. Alguns desejam que o processo seja votado na última semana de abril, após o feriado de Tiradentes. Outros, na segunda semana de maio.

Mesmo senadores aliados ao governo admitem que, aprovado na Câmara, o processo de impeachment dificilmente será barrado no Senado, devido à pressão para que o assunto seja rapidamente resolvido. Porém, há a preocupação de se cumprirem as regras para evitar a judicialização do processo pelo governo e pelo PT.

Desde ontem, Renan passou a ser pressionado para definir o cronograma no Senado e, principalmente, agilizar a instalação do impeachment e o imediato afastamento da presidente. Apesar de ter atuado nos últimos tempos para ajudar o governo, Renan vem adotando postura cautelosa em relação à discussão.

Grupo ligado a Temer quer encurtar prazos
O calendário oficial feito por técnicos do Senado indica que a aceitação do processo de impeachment seria votado em plenário no máximo até 10 de maio. Mas os partidos negociam encurtar prazos. O grupo ligado ao vice-presidente Michel Temer quer abreviar esse calendário, votar a aceitação do processo de impeachment e afastar a presidente entre 26 e 27 de abril, ou seja, dez dias após a votação de domingo. Outros, até na oposição, acham que isso deve ocorrer na primeira semana de maio, por volta do dia 4.

— A esta altura, não farei nada que manche minha biografia — disse ontem Renan a senadores da oposição, quando questionado se iria tentar alongar os prazos para beneficiar Dilma.

Mais cedo, Renan disse aos líderes que não gostaria de encurtar os prazos porque isso iria “desequilibrar o processo”.

O senador Romero Jucá (PMDB-RR), que também preside o PMDB eé a principal voz de Temer no Congresso, disse que, se o impeachment passar na Câmara, o Senado precisa decidir a questão com rapidez.

— Quanto menos tempo o Senado levar para definir a questão da admissibilidade e do afastamento, melhor para o país. Se passar na Câmara, haverá um hiato. Haverá uma vacância, uma falta de legitimidade para a presidente governar. O presidente do Senado não é superior aos fatos e, por isso, vai atuar de forma isenta — disse Jucá.

Cabe ao Senado decidir sobre o impeachment. O PMDB, partido de Temer, será responsável por indicar o relator, que deve ser o líder na Casa, Eunício Oliveira (CE), embora ele ainda resista a aceitar o posto. A presidência da comissão deverá ser do PSDB, que tem 11 senadores e lidera o segundo maior bloco parlamentar.

A interlocutores, Renan disse que se surpreendeu com o crescimento do movimento pró-impeachment na Câmara.

— O Renan convive muito bem com os senadores, cultiva uma boa relação com todos e, por isso, muitas vezes, há vistas grossas para as coisas que ele faz. Mas, no caso do impeachment, ele vai ter que seguir o regimento direitinho. Se começar a enrolar, as jaulas vão ser abertas em cima dele — afirma um senador de um partido da base favorável ao impeachment.

Senadores do PT vão trabalhar para que os prazos sejam cumpridos no limite. Lindbergh Farias (PT-RJ) diz que a comissão deve usar todos os dez dias a que tem direito para analisar o processo.

Presidente do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) defende um rito rápido. Ele quer que já na segunda-feira o processo seja lido no plenário do Senado. Propõe a instalação da comissão processante nas próximas 48 horas e, ao final de dez dias, a votação em plenário do afastamento de Dilma.

— O Senado tem que tomar logo uma posição, o Brasil está paralisado, e a reconstrução não pode esperar mais — disse Aécio.

Entre senadores, já há maioria favorável ao processo

• Marta Suplicy e Delcídio são alguns dos parlamentares que pretendem votar contra Dilma

Manoel Ventura* - O Globo

-BRASÍLIA-. Levantamento feito ontem pelo GLOBO mostra que já há votos suficientes no Senado para dar prosseguimento ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, caso o plenário da Câmara dê parecer favorável, em votação no domingo, ao impedimento da petista. Já são 43 os senadores que se manifestaram pelo impeachment, enquanto 18 se disseram contrários. Os 20 restantes estão indecisos ou não quiserem informar seu posicionamento.

O número supera a maioria absoluta da Casa (41 senadores). Para que o Senado dê início ao processo e Dilma seja afastada por 180 dias, é necessária apenas maioria simples — metade mais um dos senadores presentes em plenário. A votação final, para destituir a presidente, requer dois terços da Casa.

A maioria dos 20 senadores que não quiseram declarar voto ou se disseram indecisos é do PMDB, que desembarcou do governo mas ainda não encaminhou oficialmente uma posição sobre o impeachment. Entre eles, estão caciques do partido, como Edison Lobão (MA), Eunício Oliveira (CE), Jader Barbalho (PA) e Renan Calheiros (AL). Apenas dois peemedebistas são contrários ao impeachment: João Alberto Souza (MA) e Roberto Requião (PR).

Quem também se declarou indeciso foi Walter Pinheiro (sem partido-BA), recém-saído do PT. O partido, com 11 senadores, e o PCdoB e a Rede, com um cada, são os únicos que integralmente apoiam Dilma. PSDB e DEM, que juntos têm 15 senadores, votam fechados pelo impedimento.

Cristovam Buarque (PPS-DF), João Capiberibe (PSB-AP) e Roberto Rocha (PSB-MA) estão indecisos, apesar de seus partidos apoiarem o impeachment. Lídice da Mata (PSB-BA) é contrária ao afastamento de Dilma.

Dois ex-petistas engrossam o coro do impeachment : Delcídio Amaral (sem partido-MS), delator na Operação Lava-Jato e atualmente de licença, e Marta Suplicy (PMDB-SP), ex-ministra de Dilma. (*Estagiário sob supervisão de Flávia Barbosa)

Com PSD, oposição afirma já ter votos para impeachment

Após adesão do PSD ao impeachment de Dilma, oposição já fala em vitória

Isabel Fleck, Débora Álvares, Ranier Bragon, Rubens Valente, Gustavo Uribe e Valdo Cruz - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Um dia depois de a maior parte do PP anunciar adesão ao impeachment, o PSD do ministro Gilberto Kassab (Cidades) também definiu nesta quarta-feira (13), por maioria, orientar no domingo (17) o voto favorável à abertura de processo contra a presidente Dilma Rousseff.

Em reunião na Câmara que contou com a presença de Kassab em seu início, de 28 a 30 dos 38 deputados que devem votar se manifestaram contra a permanência da petista, segundo relatos.

A decisão do PSD fez a oposição já contabilizar 349 votos a favor do impeachment, mas o Palácio do Planalto, mesmo sabendo que o clima piorou e corre sério risco de derrota, ainda acreditava chegar a 180 votos a favor, acima dos 172 necessários para escapar do impeachment.

No final da noite desta quarta, a presidente Dilma convocou uma reunião no Palácio da Alvorada para tentar uma última estratégia para salvar o seu mandato.

Entre interlocutores do ex-presidente Lula, o clima era de desolação e apreensão diante da avaliação de que a debandada de aliados começou muito cedo.

Na reunião do PSD, de acordo com deputados, Kassab mais ouviu do que falou e afirmou que respeitaria a decisão da maioria da bancada. Depois, ele se encontrou com Dilma e falou sobre a decisão do partido. Kassab deve permanecer no cargo até segunda-feira (18).

"A decisão é mudar o encaminhamento de voto liberado para o apoio ao relatório pela admissibilidade [do impeachment]. A bancada, porém, respeitará absolutamente o voto de cada parlamentar que pense diferente", disse o deputado Rogério Rosso (DF), líder da sigla.

Vitória improvável
Com isso, integrantes do Palácio do Planalto já veem como improvável uma vitória no domingo, mas mantêm a tentativa de investir nas conversas deputado a deputado como última tentativa de salvação.

Para ser aprovado, o relatório favorável à abertura de processo de impeachment precisa ter pelo menos 342 dos 513 votos.

A oposição afirma já ter 349 votos para a destituição de Dilma, sete a mais do que o mínimo necessário.

No PR (Partido da República), dono da quinta maior bancada na Câmara, há uma disputa de números que expõe o racha na legenda.

Enquanto o bloco de parlamentares favoráveis ao impeachment afirma ter pelo menos 28 votos, contra 12 pró-governo, o comando partidário arrisca um placar mais favorável ao Palácio do Planalto, com 19 votos pró-impedimento, 18 em apoio a Dilma e 3 indecisos.

Oficialmente, o PR diz que apoia o governo, mas não fechou questão em relação ao voto do domingo. O PTB decidiu por 15 votos a 4 orientar o voto favorável ao impeachment no domingo.

Já o líder da bancada do PDT, deputado Weverton Rocha (PDT-MA), anunciou que fechou questão e orienta o voto contra o impedimento.

Planalto
Com o revés no PP e no PSD, integrantes do governo dizem que, se houver uma vitória no domingo, ela será apertada e dificultará a retomada da governabilidade na nova fase da gestão petista.
Nas palavras de um auxiliar presidencial, só haverá êxito se o governo produzir algum fato positivo ou uma demonstração de força até sexta-feira (16).

Pelas contas palacianas, contabilizando 18 votos do PMDB e 18 votos do PR, haveria cerca de 180 votos, um pouco acima do limite para barrar o processo de impeachment, que é de 172 votos no plenário.

Nos dois partidos, no entanto, os números são avaliados como "irreais". No PR, fala-se em no máximo 15 votos e, no PMDB, aposta-se em cerca de 10 votos.

PMDB
Com o respaldo do vice-presidente Michel Temer, o PMDB deve orientar em reunião de sua bancada nesta quinta-feira (14) voto favorável ao impeachment de Dilma, mas com respeito a posições contrárias isoladas.

A decisão foi acordada em reunião entre Temer e o presidente do PMDB no Rio de Janeiro, Jorge Picciani, pai do líder da bancada, Leonardo Picciani (RJ), que votará contra o impeachment.

Senado deve votar admissão de impeachment em maio

Por Vandson Lima e Ribamar Oliveira – Valor Econômico

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff deverá ter seu afastamento votado no Senado até o dia 15 de maio, caso a Câmara dos Deputados autorize a abertura do processo de impeachment no domingo.

A debandada de aliados do governo levou senadores a aumentar as pressões sobre o presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros (PMDB-AL), para que a Casa tenha um desenho claro de todos os passos do impeachment. Salvo questionamentos em relação à representação dos partidos, a assessoria técnica já dispõe de um calendário adiantado do processo.

Aprovado pelos deputados no domingo, o pedido será remetido ao Senado na segunda. Na terça, será feita a leitura da denúncia em plenário e, no mesmo dia, após a ordem do dia, será eleita a Comissão Especial responsável pela condução dos trabalhos, com 21 integrantes. As vagas serão preenchidas de acordo com a representatividade dos partidos no Senado.

Na quarta-feira, a comissão elegerá seu presidente e o relator. Maior partido da Casa, o PMDB ficará com umas dessas vagas. Ao relator, caberá elaborar o parecer pela admissibilidade do processo que, se aceito pelo plenário, provocará o afastamento de Dilma do cargo.

Por conta disso, emissários do vice-presidente Michel Temer iniciaram uma articulação para que Eunício Oliveira (PMDB-CE) ficasse com a função. "Quem escolhe qual dessas posições ficará com o PMDB é o líder da bancada, no caso, eu. Mas não tenho intenção de avocar a vaga para mim. Ficará com outro pemedebista", garantiu Eunício.

A outra cadeira no comando dos trabalhos será alvo de disputa intensa. Tanto o PT quanto o PSDB contam com 11 senadores em exercício. Ironicamente, o PT pode perder o posto se um dos ministros de Dilma resolver sair em sua defesa: o senador Donizeti Nogueira (PT-TO) é, na verdade, suplente da ministra de Agricultura, Kátia Abreu (PMDB-TO).

Se ela voltar para o Senado, o PT passa a ter 10 senadores e os tucanos ficarão com a vaga. Pemedebistas favoráveis à destituição de Dilma trabalham para que o líder do PSDB, Cássio Cunha Lima (PB) seja o escolhido.

O relator terá até 10 dias úteis para apresentar seu parecer. Se usar todo o prazo, o relatório será votado por volta do dia 5 de maio na comissão - uma quinta-feira. Cumprido prazo de 48h para o documento ir a plenário, o Senado definiria o afastamento de Dilma, em votação por maioria simples (metade mais um) no máximo, até os dias 10 ou 11 de maio.

Renan deu a entender ontem que pretende ser rigoroso no cumprimento do rito. "Tudo tem seu tempo. O impedimento também. É importante que se observem os prazos. Se o presidente da Casa não for isento, não guardar independência, ele desequilibra o processo. Não é meu propósito", disse o pemedebista.

Presidente do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) está entre os que recorreram a Renan. "Aprovado no domingo, acredito que em 15 dias, estourando 20 dias, esse processo será votado no Senado e, a partir daí, seja a presidente afastada", afirmou. Para Aécio, não há mais necessidade de que novas consultas sejam feitas ao Supremo Tribunal Federal (STF) - há o temor de que Renan use dessa prerrogativa para esticar o prazo. "Nosso sentimento é de que o Brasil tem pressa. O resultado de domingo deve ter consonância com uma decisão rápida do Senado. Os brasileiros estão pagando a conta. Chegou a hora da presidente, constitucionalmente, pagar a sua", concluiu.

No entorno do vice-presidente Michel Temer, há grande preocupação com os movimentos de Renan. A expectativa deles era de que em uma semana o Senado pudesse decidir a contenda. Agora, receiam que o cronograma de Renan pode se adiar ainda além da previsão de Aécio, com a votação ocorrendo em torno de 15 de maio.

Os políticos mais próximos do vice-presidente dizem que essa demora vai prejudicar o país, pois, caso a Câmara dos Deputados aceite o pedido de impeachment no domingo, haverá um prazo muito dilatado em que Temer ainda não poderá falar como presidente. "Nesse período, o risco é de que ocorram movimentos especulativos que prejudiquem o país", disse um aliado do vice.

A atual queda da cotação do dólar já faria parte dessa rodada especulativa, desencadeada pela mudança de humor do mercado com a possibilidade de Temer assumir a presidência. "Isso [a rápida valorização do real] não é saudável, pois é fonte de problemas para o Brasil", acrescentou. Para o aliado do vice-presidente, essa forte e rápida valorização do real vai afetar os exportadores brasileiros, praticamente o único setor da economia que está em franca recuperação.

Após novas baixas, governo admite não ter votos para vencer

• PSD e PTB orientam bancadas a defender afastamento de Dilma

Isabel Braga, Letícia Fernandes, Eduardo Bresciani, Jeferson Ribeiro e Catarina Alencastro - O Globo

-BRASÍLIA- Após a debandada de mais dois partidos da base aliada — PSD e PTB encaminharão voto “sim” pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff —, o Palácio do Planalto passou a admitir ontem que não tem o número necessário para barrar o impeachment. Embora a versão oficial seja de que o governo conta com cerca de 200 votos, reservadamente auxiliares da presidente que participam da articulação política junto ao Congresso contabilizam com segurança apenas 160 votos, ou seja, 12 a menos do que o necessário para impedir a derrota no plenário da Câmara. Para tentar conter a debandada, Dilma resolveu fazer pressão, pessoalmente, sobre parlamentares que ainda apoiam o governo a fim de assegurar os votos que precisa.

No PMDB, deputados que estavam apoiando o governo admitem a redução drástica de votos em favor de Dilma. A bancada peemedebista se reúne hoje e deve formalizar o voto pela saída da presidente do cargo. Há uma ação forte de deputados do PMDB, com o aval do grupo do vice-presidente Michel Temer, com ameaças de negar legenda aos candidatos a prefeito que ainda resistem em ficar contra o impeachment. O avanço no apoio ao impeachment fica claro pela evolução dos deputados que declaram seus votos na enquete do GLOBO. Em apenas um dia, o número dos pró-impeachment saltou de 304 para 329, enquanto os contrários foram de 110 para 113.

Em reunião ontem, com uma passagem relâmpago do ministro da legenda, Gilberto Kassab (Cidades), a bancada do PSD oficializou o voto a favor do impeachment. Pelas contas dos deputados, apenas 8 dos 38 mantinham disposição de votar contra o impedimento. Não haverá punição a quem votar contra. Até ontem à noite, Kassab (Cidades) não tinha anunciado se deixaria o cargo diante da decisão da legenda.

— A bancada vai encaminhar pela admissibilidade, para que vá para o Senado, porém, respeitará os parlamentares que têm divergência — disse o lider do PSD, Rogério Rosso (DF).

No PTB, 15 votam a favor do impeachment, e 4 estão indefinidos, segundo o líder interino, Wilson Filho (PB). Indagado sobre a posição do ministro Armando Monteiro (Indústria e Comércio) e sua permanência no cargo, Wilson Filho afirmou:

— Ele é senador. O momento de expressar opinião sobre impeachment será quando chegar ao Senado.

No PMDB, a ofensiva foi para tentar barrar a ação de caciques do partido nos estados, principalmente no Nordeste, que pressionam os deputados a votar contra o impedimento. Aliados do líder Leonardo Picciani (RJ) admitiam ontem que o número de votos contra o impeachment tinha caído muito e que poderia ficar entre 8 e 5, da bancada de 65.

Oposição diz ter 349 votos
No balanço feito ontem, a oposição garante ter obtido sete votos a mais do que os 342 necessários para aprovar o impeachment em plenário. Segundo o deputado Mendonça Filho (DEM-PE), o balanço revela 349 votos a favor do impedimento, 127 contra e 37 indecisos.

— Vamos para uma vitória acachapante, redentora! E o viés é de alta, mais votos podem vir até o domingo — disse Mendonça.

Ciente da dificuldade que enfrenta entre os parlamentares, Dilma recebeu líderes da base que estiveram com o ministro Ricardo Berzoini (Secretaria de Governo), ontem no Planalto, e marcou para hoje café da manhã no Palácio da Alvorada com os 27 deputados que votaram contra o impeachment na comissão especial.

Partidos 'nanicos' também devem romper com Dilma

• Com 33 deputados, anúncio de grupo formado por Pros, PEN, PHS, PSL e PTN deve ser feito nesta quinta

Adriano Ceolin - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Os chamados "partidos nanicos" da Câmara deverão anunciar nesta quinta-feira, 14, apoio ao impeachment da presidente Dilma Rousseff. Com 33 deputados, o grupo é formado por Pros, PEN, PHS, PSL e PTN.

"Já temos garantidos cerca de 25 votos a favor do afastamento da Dilma", afirmou a deputada Renata Abreu (PTN-SP). Segundo a parlamentar, o objetivo do grupo é conseguir 27 dos 33 votos.

O Palácio do Planalto contava com os votos do PTN, pois o líder da bancada, Aluisio Mendes (MA), havia indicado recentemente o novo presidente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). "O Aluisio continua com o governo", afirmou Renata Abreu.

A decisão dos "nanicos" ocorre um dia após o PP abandonar a base aliada. Indicado pelo partido, o ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi, entregou sua carta de demissão nesta quarta-feira.

A bancada do PSD também decidiu apoiar o impeachment. Presidente nacional da sigla, o ministro Gilberto Kassab (Cidades) não conseguiu fazer com que os deputados ficassem ao lado de Dilma. Na segunda-feira, Rogério Rosso (DF), que liderou o PSD recentemente, votou contra a presidente na Comissão Especial do Impeachment.

Entre os partidos do chamado "centrão", só sobrou o PR. Indicado pela sigla, o ministro Antonio Carlos Rodrigues (Transportes) afirmou que ficará com Dilma "até o fim". Liderança informal da sigla, o ex-deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) tem auxiliado o ministro.

Dentro da bancada do PR, porém, tem aumentado a corrente em favor do impeachment. Na última segunda-feira, o deputado federal Maurício Quintella (AL) decidiu deixar a liderança do PR para poder votar a favor do impeachment Dos 40 deputados, pelo menos a metade já cogita votar contra Dilma.

Senado acha difícil reverter eventual derrota de Dilma na Câmara

Mariana Haubert, Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Senadores da base aliada avaliam que o resultado da votação do processo de impeachment na Câmara no domingo (17) será fundamental para garantir ao governo alguma margem de negociação no Senado, onde a maioria já se declara disposta a afastar a presidente Dilma Rousseff.

Para os governistas, para que o governo ganhe algum fôlego para angariar apoio no Senado, será necessário que ao menos 150 deputados federais votem contra o impeachment no domingo.

O Planalto também considera fundamental abrir vantagem na Câmara. Nas palavras de um assessor presidencial, "batalha de verdade é no domingo" e se ela for perdida, o Palácio do Planalto "sairá derrotado da guerra".

Afastamento
A maioria do Senado, porém, já declara intenção de votar pelo afastamento da presidente. Levantamento feito pela Folha com os 81 senadores nesta quarta (13) registra 42 (52%) pró-impeachment, o suficiente para que o processo seja aberto e Dilma, afastada por 180 dias.

Outros 18 senadores afirmaram que votarão contra o impeachment. Disseram-se indecisos 9 parlamentares, 7 preferem não declarar o voto e 5 não responderam até a conclusão desta edição.

Nas contas dos senadores governistas, há 27 votos pró-Planalto. Eles contam ainda 12 senadores indecisos, mas avaliam que a maioria destes tende a votar com a oposição.

O rito no Senado
Se a Câmara aprovar o pedido de abertura do impeachment, o processo será enviado para o Senado na segunda (18) e deverá ser lido em plenário na terça (19).

Uma comissão formada por 21 titulares e 21 suplentes será formada seguindo a proporcionalidade dos partidos ou blocos partidários.

A comissão terá dez dias corridos para apresentar um relatório pela admissibilidade ou não do processo de impeachment.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), avalia, segundo aliados, que essa votação poderia acontecer no dia 10 de maio.

Senadores da oposição e da própria base do governo, no entanto, acreditam que o afastamento da presidente pode acontecer ainda no final de abril, com votação no dia 27, por exemplo.

O parecer será votado em plenário e precisa de maioria simples para ser aprovado. Se isso acontecer, Dilma é afastada por 180 dias e o vice-presidente Michel Temer (PMDB) assume o comando do país.

Nesse período, o Senado analisará os elementos para o impedimento e a defesa da presidente e haverá o julgamento final. Para aprovar a perda do mandato nessa etapa são necessários 54 votos.

Ofensiva de Temer
A estratégia do grupo do vice-presidente para viabilizar a conclusão do impeachment tem sido reproduzir no Senado a ofensiva realizada na Câmara, com partidos da base aliada que têm recebido ofertas do Palácio do Planalto, como PP, PR e PSD. As siglas têm 14 senadores, dos quais 4 não declaram o voto e 1 se diz indeciso, segundo o levantamento da Folha.

A cúpula do partido também não pretende abrir processo de expulsão dos ministros Eduardo Braga (Minas e Energia) e Hélder Barbalho (Portos), que desrespeitaram decisão para entregar os cargos. O primeiro tem mandato de senador e o segundo é filho de Jader Barbalho (PMDB-PA), que ainda não anunciou posição oficial.

PSD e PTB devem votar pelo impeachment

Por Thiago Resende, Raphael Di Cunto e Fabio Murakawa – Valor Econômico

BRASÍLIA - Num efeito cascata, o PSD e PTB na Câmara também anunciaram ontem que, em ampla maioria, votarão a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff. As novas deserções na base aliada foram firmadas um dia depois de o PP romper com o governo. Hoje, é a vez da bancada do PMDB tomar uma posição: por larga margem oposicionista, o líder da sigla, Leonardo Picciani (RJ), cuja aliança com o Palácio do Planalto dá sinais de ruptura, deve ter que orientar o grupo a votar contra a presidente, apesar de manter sua opinião pelo arquivamento do processo.

Do PSD, o governo esperava que o líder da bancada, Rogério Rosso (DF), iria liberar a bancada. Mas, diante da pressão de dissidentes, estimada em cerca de 30 dos 38 deputados, o partido "marcará" no painel de orientação a favor do impeachment. Rosso defende a abertura de processo contra Dilma.

"Essa é uma votação que tem que ser marcada uma posição. PSD não se sentiria confortável em manter liberado", explicou o líder, que costumava participar das reuniões semanais da base de apoio ao governo realizadas no Palácio do Planalto. Não houve fechamento de questão no PSD. Assim, deputados que votarem pela continuidade de Dilma não serão punidos.

Presidente licenciado do partido, o ministro das Cidades, Gilberto Kassab, participou da reunião que deu aval à decisão dos deputados. "Ele disse que a bancada é soberana", relataram parlamentares. Segundo Rosso, a permanência de Kassab no ministério é questão pessoal dele.

Outro líder que frequentava o Planalto, Jovair Arantes (PTB-GO) reuniu a bancada, que decidiu também pela orientação a favor do impeachment. Jovair é o relator do pedido de deposição de Dilma e recomendou a abertura de processo contra ela. Dos 19 petebistas, apenas quatro não devem seguir a indicação. Eles também não serão punidos.

"Fechar questão não é o melhor caminho. É o convencimento. Vamos caminhar para a direção de anunciar que a bancada majoritariamente vota pelo impeachment. E vamos tentar mudar esses votos", disse Jovair.

O resultado é, de certa forma, favorável ao governo, que conta com quatro a cinco votos ligados ao ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Armando Monteiro (PTB-PE), ou ao PT nos Estados e poderia perde-los se o partido ameaçasse punir os infiéis.

Interlocutores do Planalto sustentam que ainda há votos suficientes para a Câmara barrar o pedido de impeachment. Tabela informada pelo vice-líder do governo, Silvio Costa (PTdoB-PE), aponta 203 deputados favoráveis ao arquivamento da denúncia contra Dilma - número suficiente para derrubar o pedido. A oposição, porém, diz ter 349 votos. São necessários 342 deputados para o processo de impeachment avançar.

Mesmo no PDT, partido que reafirmou a posição contra a deposição da presidente, há entre cinco e oito deputados, de um total de 20, que podem contrariar a decisão da cúpula. O líder da sigla na Câmara, Weverton Rocha (MA), disse que foi fechada questão contra o impeachment. "Se não votar segundo a orientação partidária em maio tem reunião do diretório, a quem caberá resolver isso", declarou. Logo depois, o deputado Sergio Vidigal (PDT-ES) - um da ala dissidente - anunciou, em nota, que votará contra Dilma.

Hoje, o foco deve ser a reunião da bancada do PMDB. Cresceu a pressão para que o partido feche questão em favor do impeachment, mas, segundo fontes, a executiva do partido vai aguardar a decisão dos deputados.

"A ampla maioria vem pedir para que se feche questão. Assim, alguns deixariam de votar constrangidos pelo impeachment. Mas não queremos confrontar ninguém. É melhor buscar o acordo sem o fechamento de questão. A bancada vai dizer", informou um aliado do vice-presidente Michel Temer.

As investidas de Temer e de integrantes do partido têm reduzido cada vez mais o apoio a Dilma no PMDB. Ontem, os deputados Alberto Filho (MA), ligado ao ex-presidente José Sarney, e Newton Cardoso Júnior (MG), muito próximo de Picciani, declararam publicamente apoio ao impeachment. O grupo pressiona também para que o ministro da Aviação Civil, Mauro Lopes (MG), que é deputado licenciado, não deixe o cargo para votar.

Nas contas dos oposicionistas, o governo hoje contaria com apenas oito votos dos 67: o dos ministros da Saúde, Marcelo Castro (PI), e da Ciência e Tecnologia, Celso Pansera (RJ); de Picciani; três do Pará ligados ao senador Jader Barbalho; do deputado Carlos Bezerra (MT); e de João Marcelo (MA), aliado de Sarney e que votou contra o parecer na comissão.

Picciani já reconheceu a aliados que, como estratégia para não ver a liderança ser ameaçada, deixará que - até o grupo mais ligado a ele - costure quase que a unanimidade pelo impeachment. Mas quer evitar o fechamento de questão.

Lula admite a aliados que situação do governo se tornou difícil

- Valor Econômico

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou preocupação e admitiu a aliados, em reuniões nesta quarta-feira (13), que a situação atual do governo é difícil.

Lula passou o dia recluso no quarto do hotel onde está hospedado para articular apoios ao governo e tentar barrar o impeachment no Congresso.

Com uma agenda cheia, recebeu diversos parlamentares, como os senadores Humberto Costa (PT-PE) e Lindbergh Farias (PT-RJ), o governador de Minas Gerais Fernando Pimentel (PT), o deputado petista Vicente Cândido (SP) e um grupo do PCdoB, dentre os quais estava o deputado Orlando Silva (SP).

Políticos que estiveram com ele definem sua aparência como "cansaço" e "abatimento".

Depois de diversos partidos declararem voto pelo impeachment, como o PP e o PSD, até o ex-presidente, que assumiu pessoalmente a articulação para barrar o processo, admitiu a dificuldade da situação, mas tem passado aos aliados a mensagem de que é possível ainda reverter o quadro.

Aos parlamentares que estiveram com ele, pediu que ajudem procurando o maior número de deputados possível até domingo e enfatizou que é preciso continuar trabalhando.

O recado aos indecisos é que, caso o governo vença o impeachment, Lula se tornará ministro e mudará a atual gestão, dando espaço aos aliados.

O ex-presidente mandou recado ao Palácio do Planalto para que seja objetivo na oferta de cargos e, por outro lado, tem recebido lista com nomes de parlamentares a serem procurados em busca de apoio.

Durante a manhã, ainda houve um protesto dentro do hotel, com a entrada de um homem vestido de "pixuleco", o boneco de Lula representado como presidiário. Um funcionário pediu que o homem se retirasse, sob o argumento de que não são permitidos protestos no local.

Depois da Nova República - José Serra*

- O Estado de S. Paulo

Brasileiros, começamos hoje a viver a Nova República. Deixemos para trás tudo o que nos separa e trabalhemos sem descanso para recuperar os anos perdidos na ilusão e no confronto estéril. Estou certo de que não nos faltará a benevolência de Deus” 

- Tancredo Neves, discurso de posse na Presidência da República, lido pelo vice-presidente José Sarney em 15/3/1985

O fecho do discurso de Tancredo consagrou a denominação de uma nova etapa da nossa História: a Nova República. O desenlace do atual processo de impeachment marcará o fim dessa etapa. Desde o ano passado vivemos o pior de dois mundos: a ordem existente agoniza e nada ainda tomou o seu lugar. Uma fase especialmente mórbida, que põe a mostra tudo o que ficou de pior na nossa sociedade.

A Nova República não chegou a materializar a utopia desenhada por Tancredo, mas trouxe avanços importantes.

Na política, a tutela militar deu lugar à participação eleitoral e social das massas populares, com plena liberdade de organização e manifestação e prevalência do Estado de Direito. O presidencialismo de coalizão, arranjo em que o presidente da República obtém maioria no Congresso mediante distribuição de cargos e verbas orçamentárias, garantiu uma governabilidade problemática, mas efetiva.

Na economia, vencemos a superinflação e a insolvência externa, depois de sofrermos seus piores efeitos. A consolidação de novas fronteiras agrícolas coincidiu com a modernização produtiva: o Brasil conta hoje com um agronegócio altamente competitivo. A participação do petróleo importado no consumo total desabou de 80% em 1980 para 40% em 2000 e 20% em 2010, eliminando antiga restrição externa ao crescimento.

A pobreza e as distâncias sociais diminuíram; os indicadores de renda, saúde e educação melhoraram. Fundamentos de um Estado de bem-estar foram assentados com a ampliação das matrículas no ensino fundamental, programas de transferência de renda, a implantação do SUS e do FAT/seguro-desemprego.

Na coluna dos passivos, o Brasil não alcançou, nesse período, condições de crescimento de longo prazo. Em contraste com os 260% de expansão entre 1950 e 1980, o PIB per capita aumentou 50% nas três últimas décadas. Até meados dos anos 90, a superinflação e o desequilíbrio externo travaram a economia. Em seguida, o receio da perda da estabilidade conquistada pelo Plano Real e as sucessivas crises financeiras internacionais retardaram o impulso expansivo.

A grande oportunidade para o desenvolvimento sustentado foi desperdiçada, mesmo, pelo governo Lula. A bonança externa do período, decorrente da elevação dos preços das exportações de alimentos e matérias-primas, foi dissipada pelos aumentos exponenciais da importação de bens de consumo e do turismo externo, em vez de fortalecer a competitividade da economia. Isso resultou de decisões erradas de política monetária e cambial, que levaram a sobrevalorização do real ao paroxismo. O investimento na infraestrutura de energia e transportes e a elevação da carga tributária completaram a receita perfeita para a rápida desindustrialização. O déficit comercial de manufaturados saltou de praticamente zero em 2006 para US$ 81 bilhões em 2010 e US$ 120 bilhões em 2014. Ah, sim, foi nesse período que se armou a ruína da Petrobrás – loteamento, corrupção e investimentos mal feitos e megalomaníacos.

O governo Dilma herdou os custos: taxa de câmbio megavalorizada, déficit em conta corrente em ascensão, infraestrutura indigente, Petrobrás arruinada. Mais: a queda incessante da indústria comprometeu o desempenho da arrecadação tributária. Os gastos públicos permaneceram rígidos. A bonança externa acabou.

Com inépcia só superada pela teimosia, seu governo não conseguiu elevar os investimentos na infraestrutura em parcerias com a área privada. Promoveu isenções de tributos caríssimas e ineficientes. Reprimiu os preços de combustíveis e energia elétrica com fins eleitorais, acumulando desequilíbrios nas empresas produtoras e pressões inflacionárias. Resultado: colapso nas contas públicas e mergulho de 9,1% do PIB per capita em dois anos, levando à perda de 3,5 milhões de empregos. As expectativas ruins dos agentes econômicos passaram a cumprir como nunca o papel de profecias que se autorrealizam.

A perda de popularidade na esteira da crise econômica e o isolamento autoimposto da presidente implodiram o presidencialismo de coalizão. Um governo tíbio, adoentado, entrou em fase terminal quando a Lava Jato expôs o aparelhamento de empresas públicas para desfrute dos donos do poder e seguidores. Mazela antiga, como se sabe, mas que assumiu extensão e intensidade inusitadas no admirável mundo novo petista.

Esta recapitulação põe em perspectiva os tremendos desafios do dia seguinte ao desenlace do processo de impeachment. A Nova República acabou. A benevolência divina não nos negará a oportunidade de erguer sobre seus escombros uma nova ordem política e econômica. Mas, como disse Jorge Luis Borges, “até os milagres exigem precondições”. Para que Deus nos ajude serão indispensáveis mudanças no sistema eleitoral e a adoção do parlamentarismo, tornando o Legislativo mais responsável e permitindo, sem traumas, a rápida substituição de governos ruins.

Sem truculência, mas com determinação, será preciso pôr limites à pressão de corporações poderosas sobre as finanças públicas. O patrimonialismo que grassa no setor estatal terá de ser coibido. As políticas sociais devem ser mantidas, mas nos trilhos da eficiência e da inovação. As condições de crescimento do País terão de ser recriadas com base na lisura, na competência e na interação equilibrada dos agentes públicos e privados.

Os próximos meses, sendo otimista, ainda serão de incerteza e sacrifícios para um povo já sofrido. Virar esta página exigirá estabelecer um mínimo de confiança do povo nas instituições democráticas. Eis o maior desafio das lideranças políticas, sociais e intelectuais dispostas a plantar o futuro, em vez de se agarrar aos escombros do passado.
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*José Serra é senador (PSDB-SP)

Impeachment, exigência da realidade - Carlos Siqueira

- Folha de S. Paulo

O Brasil vive a mais grave crise de sua história republicana, resultante da falência de aspectos políticos, econômicos, sociais, federativos e éticos do país.

Esta crise teve origem ainda no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, quando o PSB cumpriu o seu papel, na pessoa do então presidente da sigla Eduardo Campos (1965-2014), e advertiu a mandatária sobre os graves problemas que seriam gerados pela ausência de diálogo político e pelos equívocos e irresponsabilidades cometidos na economia.

Lamentavelmente, não fomos ouvidos e nenhuma mudança de rumo aconteceu.

Reeleita, a presidente cuidou de prover novos ingredientes a uma receita já desastrada. Para espanto de todos, iniciou o novo mandato com a proposta de um ajuste fiscal de viés claramente liberal e conservador, que incluiu a diminuição de direitos previdenciários e trabalhistas e cortes nos programas sociais.

Contrariou o programa de governo que não escreveu, mas que verbalizou fartamente por meio de sua publicidade, evidenciando as fragilidades até então negadas.

Nos aspectos que envolvem diretamente a vida dos cidadãos e compõem o pano de fundo do processo de impedimento ou "juízo político", como dizem de forma mais apropriada os hispânicos, nosso país acumula derrotas sob o comando da presidente Dilma.

O governo tenta sem sucesso pôr em prática uma política econômica de tendência tristemente conservadora, que valoriza e beneficia de forma excessiva o setor financeiro, em detrimento da produção, do trabalho e do emprego.

Sacrifica o futuro do país ao desmontar a política de ciência, tecnologia e inovação, destruindo assim, em pouco tempo, um esforço que até certo ponto vinha sendo bem-sucedido. Liquida a indústria nacional, cuja participação no PIB regride a patamares de 50 anos atrás.

Enfraquece ainda mais a Federação, cujas consequências na prestação de serviços básicos à população já estão muito evidentes.

Dessa forma, despreza a agenda política progressista, ao banir para a condição de verniz de discurso as reformas política, agrária, urbana, federativa e tributária.

Entrega simultaneamente ao trabalhador, por exemplo, o corte de mais de 9 milhões de postos de trabalho e a limitação de direitos trabalhistas, com destaque para o seguro-desemprego.

Igualmente grave é a explosão da dívida pública, que perigosamente aproxima-se de R$ 3 trilhões, comprometendo parcela significativa do orçamento da União.

O impasse em que se encontra o país, entretanto, não resulta apenas dos aspectos de natureza política. A simples leitura do bem fundamentado parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) revela que a presidente cometeu crime de responsabilidade ao editar decretos de aumento de despesa sem autorização do Congresso, desrespeitando a Constituição e a lei orçamentária.

Portanto, não há dúvida de que ao descalabro governamental somam-se aspectos legais. A inaceitável narrativa do "golpe" beira o ridículo.

Diante desta sombria realidade, a dinâmica política impõe ao PSB apoiar o processo de impeachment que ora tramita na Câmara dos Deputados, única saída constitucional e legal, no momento, para que nosso país tenha um governo de transição, a exemplo do que realizou o presidente Itamar Franco.

Um governo que coloque o país nos trilhos e inicie a tarefa de reconstrução nacional, unindo a nação e promovendo a necessária coesão social e política, visando enfrentar a herança, esta sim maldita, do atual governo.
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Carlos Siqueira é presidente nacional do PSB (Partido Socialista Brasileiro)

A caminho da definição - Merval Pereira

- O Globo

Não há a menor necessidade de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para definir o rito do processo do impeachment no Senado, pois ele já foi decidido anteriormente. Entre o recebimento da autorização da Câmara para o processo de impeachment, até a votação da comissão especial no Senado, o máximo previsto é de cerca de 15 dias úteis.

Se confirmada a data de 11 de maio que informalmente o presidente do Senado, Renan Calheiros, está marcando para a votação da admissibilidade, estaremos dentro deste prazo, com um pouco mais de largueza, e nada indicaria uma vontade de postergar o processo.

O que pode retardar esse calendário é uma provável ação governista no STF questionando algum aspecto do processo da Câmara, como o ministro José Eduardo Cardozo vem insinuando constantemente. O recurso da Advocacia-Geral da União (AGU) pode se concretizar se no dia 20 o Supremo decidir favoravelmente à nomeação do ex-presidente Lula para a Casa Civil da Presidência.

Neste caso, retardar o processo pode dar a Lula mais tempo para tentar reverter o resultado no Senado, que neste momento tem maioria simples para aceitar o processo de impeachment, mas ainda não há declarados votos suficientes para condenar a presidente Dilma.

Parece fora de propósito que o Senado rejeite o processo, ele tendo sido aprovado por uma maioria qualificada de pelo menos 342 votos no plenário da Câmara, e por isso o trabalho do ex-presidente Lula pode ser praticamente inútil.

Entre a provável aprovação no plenário da Câmara no domingo 18 — caso não haja uma reviravolta e a votação seja interrompida por alguma liminar, o que é improvável, mas possível —e a votação na comissão do Senado no dia 11 de maio, Lula terá 23 dias (ou mais, se um eventual recurso for aceito), incluindo fins de semana e feriados, para tentar evitar uma decisão que hoje parece a consequência lógica.

Se estiver à frente da Casa Civil, terá um fôlego para trabalhar. Se, ao contrário, o STF tiver decidido que ele não pode assumir o ministério, devido ao desvio de finalidade cometido pela presidente Dilma, ele estará exposto em toda sua fragilidade política atual, e a presidente Dilma a caminho de responder a um processo de obstrução da Justiça.

Perdida essa batalha, depois de afastada a presidente, o julgamento tem até 180 dias para ser realizado, e tanto Dilma quanto Lula ficarão ao relento para defender o mandato que estará sendo julgado no Senado, sob a presidência do ministro Ricardo Lewandowski.

Lula, além disso, terá que se dividir entre Dilma e sua própria sobrevivência nos processos a que responde. Paralelamente, as investigações da LavaJato, em outra dimensão, continuarão a revelar as entranhas da candidatura de Dilma em 2014 e a atuação de pessoas ligadas a ela, como Giles Azevedo, seu principal assessor, e o ministro Edinho Silva, arrecadadores junto às empreiteiras; ou como a sua amiga ex-ministra Erenice Guerra e o ex-senador Gim Argello, que pode fazer uma delação premiada.

Mesmo que não constem da ação de impeachment que está em julgamento, cada revelação envolvendo a presidente com os escândalos da Petrobras retira dela o único ativo que ainda tenta explorar, a de que uma mulher honesta está sendo condenada por um bando de ladrões. Ladrões e picaretas a quem ela, num gesto magnânimo, ontem ofereceu o diálogo se vencer no domingo.

Segregada no Palácio Alvorada, cercada por movimentos sociais como o MST e a UNE e a CUT, que prometem permanecer em vigília, a presidente Dilma tentará manter a resistência ao que quer registrar na História como um golpe. Essa disposição, no entanto, tende a arrefecer diante da realidade que continuará se desenrolando longe de seu abrigo de presidente afastada.

Ter se classificado ontem como “carta fora do baralho” se perder a disputa no plenário no domingo pode demonstrar que essa resistência não será tão intensa quanto alguns preveem. Talvez até mesmo o PT prefira abreviar essa espera para partir para a oposição contra o novo governo Temer, sem ter de ter ao mesmo tempo o ônus de continuar apoiando Dilma.

A salvação de Temer - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

No ritmo que novas declarações a favor do impeachment de Dilma Rousseff têm sido registradas no placar atualizado pelos jornalistas do Estado, não será surpresa se a oposição superar os 380 votos no domingo. Algo como quatro dúzias de deputados além do necessário para enviar o processo da Câmara ao Senado, e - se ratificado pela maioria simples dos senadores - provocar o afastamento da presidente dentro de provavelmente um mês.

Essa margem pode aumentar ainda mais no dia da votação, caso se repita o “efeito manada” que ocorreu no impedimento de Fernando Collor, em 1992. À medida que percebem o placar se aproximando dos 342 votos fatais, deputados trocam de lado ou descem do muro - para não ficar mal com o futuro presidente e aumentar a chance de cavar uma boquinha no novo governo. É mais forte do que eles.

Contando-se que Dilma manterá a palavra e não renunciará, Temer se muda do prédio anexo para o 3.º andar do Palácio do Planalto em quatro semanas como interino. A presidente afastada permanece morando no Palácio da Alvorada, ganhando metade do salário - embora haja o risco de despejo judicial. A precariedade dos dois presidentes, do provisório e da futura ex, durará até o Senado julgar o impeachment em caráter definitivo. Pode levar 180 dias para Temer levar a mulher Marcela do Jaburu para o Alvorada.

Enquanto isso, a partir de 11 de maio, uns dias a mais ou a menos, o que sobrou do PT estará livre para voltar a ser oposição, e tentar acordar sindicatos e movimentos sociais de uma dúzia de anos de sonambulismo bolsista. Antecipando-se a esse retorno, há dias Lula trocou os bastidores pelos palanques, já em campanha para a próxima eleição, seja ela quando for.

Do outro lado, PMDB, Temer e associados sairão das sombras dos anexos para a exposição permanente na vidraça do governo. À sua frente, uma crise econômica só equivalente em tamanho a seu apetite pelo poder. Invertem-se os papéis, segue a novela.

Na Esplanada dos Ministérios, uma operação de salvatagem estará em curso. Enquanto milhares de petistas esvaziam as gavetas e desocupam cargos que lhes pareciam permanentes, outros tantos de apadrinhados pelo PP, PSD, PR e até pela banda minoritária do PMDB tentarão convencer o futuro ministro Eliseu Padilha que sempre foram temeristas, e não temerários. Seus padrinhos lutarão para manter o que já tinham, o que conseguiram nas últimas semanas, mais as sobras de quem está de saída. São 21.765 cargos de confiança federais, dos quais 5.680 para não concursados.

Não longe dali, outro resgate estará em andamento, no Tribunal Superior Eleitoral, onde Gilmar Mendes e seis ministros julgarão a cassação da chapa Dilma/Temer por financiamento ilegal na campanha eleitoral de 2014. Bastam quatro deles para abreviar o mandato do presidente interino, ou, alternativamente, salvá-lo - caso engulam a tese de que Temer se elegeu vice sozinho, sem os votos nem os reais de Dilma. Em último caso, basta um deles sentar indefinidamente sobre o processo, como já fez antes.

No Congresso, outra operação de salvação já está em curso, com Eduardo Cunha no timão. Envolve dezenas de deputados e uma penca de senadores citados, denunciados ou réus na Lava Jato - fora outras operações policiais menos rumorosas. Com Dilma na galeria de ex-presidentes, esperam que a pressão popular diminua, para que a Justiça possa voltar ao seu ritmo habitual, e eles ganhem o tão sonhado direito ao esquecimento judicial.

Assim, de salvação em salvação, o futuro governo começa a se organizar. A atrapalhá-lo, o mesmo problema que tem tudo para impedir Dilma: a economia. Quando o eleitor deixa de ser consumidor, ele se lembra da corrupção e de todas as mazelas que afligem o seu dia a dia. Ou Temer dá um jeito de melhorá-la e logo, ou vai descobrir que nem Cunha salva.

O pós-impeachment com Michel Temer. E com Dilma/Lula dividindo o governo - Jarbas de Holanda

Se o processo de impeachment for aprovado pelo plenário da Câmara, no próximo domingo, não o último mas o maior obstáculo a vencer, a perspectiva do governo Temer passará a dominar amplamente os círculos políticos. Com o reforço do apoio dos meios empresariais. E carente de um salto significativo de legitimidade social, desafio que será dificultado, de um lado, pelo envolvimento do PMDB com as investigações do petrolão e paralelas, como principal cúmplice do PT nos mandatos Lula e Dilma; e, de outro, pela guerra contra o novo governo que será deflagrada pelo lulopetismo. Num contexto em que o enfrentamento das causas da aguda crise econômica e do enorme descontrole populista das contas públicas terá de ser desencadeado sob fortes reações do PT e seus aliados esquerdistas. Uma implicação desses problemas será a necessidade de maior relacionamento do presidente Temer com o PSDB e demais partidos da atual oposição.

Mas a expectativa (e a cobrança de urgência) de tal enfrentamento, por parte de amplo leque de forças políticas e sociais, dados os múltiplos e crescentes efeitos dessas crises, evidenciam a incapacidade de gestão e de respostas a elas pela presidente Dilma, constituindo a motivação básica do apoio ao processo deimpeachment como caminho necessário para a troca de governo. Com apostas de que o novo contará com respaldo político-partidário para assegurar um padrão satisfatório de governabilidade, hoje praticamente inexistente, e para desencadear reformas estruturais prioritárias. E com a de que conviva bem, política e institucionalmente, com as investigações contra a corrupção, avaliadas por expressiva maioria da sociedade como instrumento relevante para mudança das relações econômicas público-privadas.

Em contraposição a esse cenário (agora para a barragem dele no Congresso ou por meio de recursos ao Judiciário e, sendo isso frustrado) o lulopetismo está usando e usará todas as armas possíveis. Entre elas, o balcão de negócios (comandado pessoalmente por Lula) em troca de votos (ou ausências) de deputados nas decisões da Câmara sobre o referido processo; um “pacotão doimpeachment”, de medidas econômicas de estímulo ao consumo, financiadas pelos bancos públicos e com o uso de recursos do FGTS – medidas que, efetivadas, redundarão em novas pedaladas fiscais; e ataques de extrema agressividade desferidos ontem pela presidente Dilma contra Michel Temer, qualificado de chefe de conspiração e traidor. E, à frente, ações violentas – de invasão de terras e bloqueio de estradas e vias urbanas contra o “governo golpista que assaltou o poder”, proclamadas por líderes dos “movimentos sociais” vinculados ao PT até em evento realizado no Palácio do Planalto com a presença da presidente. Medidas e ameaças às quais se somará, confirmado oimpeachment, a implementação de proposta articulada por Lula e pelo presidente do Senado, Renan Calheiros: a de “eleições gerais”. Que serviria para manter a precária legitimidade inicial do governo Temer. E que tem um objetivo bem maior: uma “reforma político-institucional” que inclua o bloqueio e o esvaziamento da operação Lava-Jato. Prioridade comum dos dois articuladores.

Cabe, porém, prever que a concretização de tais ações “contra o golpe das elites e da mídia reacionária”, que a CUT e o MST têm antecipado, começará a inviabilizar-se com a perda dos milhares de cargos e de vultosos recursos da máquina federal, usados inclusive para financiamento e aliciamento dos “movimentos sociais” esquerdistas. E com um efeito, incontrolável, doimpeachment de Dilma na vida do PT: o desencadeamento de agudo confronto entre a Executiva nacional lulista e os defensores de propostas de refundação do partido ou montagem de outro.

Um governo Dilma/Lula – O cenário de continuidade do mandato de Dilma – cuja viabilidade perde consistência dia a dia –, ao mesmo tempo em que contrariará e chocará a grande maioria da sociedade, manterá acesa a crise política, com o Executivo ainda mais fragilizado diante do Congresso e na condição de alvo direto da operação Lava-Jato. E agravará as crises econômica e fiscal, com desconfiança ainda maior dos investidores internos e externos e do conjunto do mercado, bem como com um aprofundamento do descontrole das contas públicas. Num governo em que uma presidente decorativa terá de submeter-se por inteiro ao controle de Lula (ser este conseguir continuar escapando do juiz Sérgio Moro). Como presidente de fato que, na tentativa tresloucada de resposta ao crescente desemprego partirá, depois de troca da direção do Banco Central, para o uso das reservas cambiais do país. Ou seja, um cenário trágico para o qual, muito provavelmente, está se configurando a alternativa.

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Jarbas de Holanda é jornalista

Não vai ter pacto – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

Dilma e Temer estão em guerra aberta, mas afinaram o discurso em um único ponto. A presidente e o vice prometem um grande pacto nacional caso saiam vitoriosos da batalha do impeachment.

"O meu primeiro ato pós-votação é a proposta de um pacto, de uma nova repactuação, sem vencidos nem vencedores", disse a presidente, na entrevista de ontem no Planalto.

"A grande missão é a da pacificação do país, da reunificação do país. É preciso um governo de salvação nacional", conclamou o vice, no áudio que vazou sem querer querendo.

A ideia soa bem, mas tem tudo para ser a primeira promessa descumprida por quem vencer a votação na Câmara. A razão é simples: a sociedade e as forças políticas acordarão mais divididas na segunda-feira.

Se ficar no cargo, Dilma continuará a governar em minoria no Congresso. Isso significa que ela não terá os votos necessários para aprovar reformas ou aumentar tributos.

Esse apoio poderia ser buscado num ambiente de concertação, mas Dilma estará rompida com o vice e a oposição, que chamou de golpistas. Ainda enfrentará a ira de quem foi às manifestações de amarelo e dos empresários que bancaram uma campanha milionária para derrubá-la.

Temer tem mais chance de começar uma nova gestão com maioria no Congresso, mas duelará com uma oposição aguerrida, liderada pelo PT e amplificada por sindicatos e movimentos sociais. Sua ação ostensiva para chegar ao poder aumentará o ressentimento dos derrotados.

Junte isso à "Ponte para o Futuro", que prevê arrocho e cortes de direitos trabalhistas, e imagine as greves e barricadas que vêm por aí. Mesmo que costure um acordão com o andar de cima, Temer precisará recorrer à polícia para conter os insatisfeitos.

Aconteça o que acontecer, o Brasil da semana que vem deve ter a cara da Esplanada dos Ministérios no domingo: dividida por grades de ferro para tentar evitar que as diferenças sejam resolvidas a socos e pontapés.

Vitória de Pirro - Maria Cristina Fernandes

• Moderados perderam assento numa capital federal radicalizada

- Valor Econômico

A capital das conciliações suprimiu, por tempo ainda indeterminado, assento para os moderados. Brasília hoje é dos radicais. Dos que propõem impeachment face a um duvidoso crime de responsabilidade e daqueles que ameaçam dar o troco com oposição incessante e incendiária a quaisquer medidas de um eventual governo Michel Temer.

A ameaça de contestação de movimentos sociais e sindicatos à legitimidade de sua posse levou o entorno do vice-presidente a cogitar, como primeira medida, o reajuste do Bolsa Família, programa que, a despeito da fama adquirida entre os acampados da Fiesp, consome apenas 0,5% do orçamento.

As boas intenções do 'pacificador' da nação, como o vice se anunciou em sua minuta de pronunciamento, não vai desmontar as barricadas de Brasília. É uma esquerda pré-constituinte de 1988 que tende a emergir se a presidente Dilma Rousseff vier a ser impedida de governar, numa radicalização derivada, em grande parte, da incapacidade de transitar pelos acordos da política e lhes dar eficácia.

Em todos os mapas de votação que circulam no mercado, o único voto garantido do PMDB do Rio em defesa da presidente é o do líder do partido na Câmara, o deputado Leonardo Picciani. A escolha do deputado para a liderança encabeçou a estratégia do governo para tomar o PMDB da aliança entre o vice e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. O deputado assumiu com o aval da cúpula de um dos Estados mais beneficiados por verbas federais na era petista.

O prestígio do PMDB do Rio é proporcional ao tamanho da bancada. São 12 parlamentares, a maior do partido. O investimento para conquistá-los teve um retorno próximo de zero, tanto para o mandato de Dilma quanto para os cidadãos fluminenses que experimentam, no dia a dia de hospitais falidos e salários em atraso, o desastre da maior gestão pemedebista do país.

Ao PT que aprovou a contribuição de inativos, o fim da aposentadoria integral de servidores e seguiu, durante a maior parte de seu tempo no poder, a cartilha da responsabilidade fiscal, não se lhe apresentem, se derrotada Dilma, idade mínima para a Previdência, leis trabalhistas ou desvinculação de gastos sociais. Esqueça-se a nova carta ao povo brasileiro que se burilava no bunker lulista.

A nova agenda de esquerda pode não ter os mesmos cento e poucos votos que a presidente conseguirá levar ao plenário no domingo, mas ameaça manter os decibéis que, nas últimas semanas, alimentou as palavras de ordem das plenárias não-vai-ter-golpe. Não parece ser outra a razão por que o economista Arminio Fraga tanto hesita em assumir um eventual Ministério da Fazenda.

Os desastres da negociação política do governo, rebatidos com a sordidez da aliança da oposição com o deputado Eduardo Cunha, que pode virar vice-presidente da República antes de se tornar réu, extrapolou os limites da paciência dos moderados da capital federal.

Um integrante do primeiro escalão do governo que não é petista nem investigado na Lava-Jato e é ponte frequente entre os extremos da capital federal, já avisou que, desta vez, está fora. Não contem com ele para aproximar os campos em disputa. O tempo, avisa, é dos cartuchos.

Se a Câmara autorizar o Senado a julgar a presidente Dilma Rousseff, o país teria de uma a duas semanas sob o governo de uma presidente sub júdice e de um vice ainda desinvestido de faculdades constitucionais para agir. Foi sob este clima que circulou ontem, em Brasília, sob negativas oficiais, a especulação de que o país poderia assistir à decretação de um Estado de Defesa.

O recurso extremo tem que ser autorizado pelos Conselhos da República e da Defesa Nacional, que nunca se reuniram sob a vigência da atual Carta, e ratificado, em 24 horas, pela maioria absoluta do Congresso Nacional. O Conselho da República suspende garantias constitucionais sob a justificativa de garantir a ordem pública 'ameaçada por grave e iminente instabilidade institucional'. O tema frequentou conversas de Temer com emissários das Forças Armadas.

É este o clima que leva a se dobrar a aposta de que o ex-ministro Nelson Jobim voltará à Esplanada seja qual for o desfecho da votação de domingo. Aliados de Temer confessam desconforto com a profusão de prisões preventivas e delações, mas teóricos da conspiração nele veem poderes ainda maiores. Jobim seria capaz de aliciar ministros do Supremo, transferir delegados da Polícia Federal e negociar, no Congresso, projetos de lei que esterilizem a Lava-Jato.

Uma grande parte dos teóricos mora em Curitiba e, agora que Dilma está para cair, temem o nome de seu sucessor para o Ministério da Justiça. O atual, a despeito de já ter conversado com o ex-delegado da Polícia Federal, Paulo Lacerda, um dos artífices da independência da PF no início da era petista, ainda não mexeu uma palha. Até porque tem sua posse contestada pelo Judiciário.

Jobim já não tem tantos amigos no Supremo. Gilmar Mendes tornou-se seu desafeto desde o dia em que vazou conversa com Lula. Marco Aurélio Mello e Celso de Mello não eram de sua turma quando dividiam o mesmo plenário. Cármen Lúcia lhe é indiferente. Luís Roberto Barroso, Luiz Edson Fachin, Luiz Fux, Rosa Weber e Dias Toffoli não lhe devem a indicação para o cargo.

O presidente da associação nacional dos procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, não alimenta os temores de seus colegas de Curitiba. Descrê que a Lava-Jato corra risco de retrocessos. Quaisquer tentativas nesse sentido, diz, seriam denunciadas com alarde pelo ministério público.

Robalinho não exibe a mesma certeza em relação a projetos que tramitam no Congresso e podem vir a evitar novas operações do gênero. O procurador não apenas teme a celeridade desses projetos como a morosidade daquelas que ficaram conhecidas como as "10 dez medidas para acabar com a corrupção", apresentadas pelo MP.

De Chicago, o juiz Sergio Moro anunciou que a Lava-Jato pode chegar ao fim até dezembro. Se o juiz sair de cena e a opinião pública cansar da vigilância, as decisões referentes à operação que hoje estão no Supremo podem deixar de se guiar pelo velocímetro de Curitiba.

No melhor das hipóteses, as radicalizações da capital federal continuarão a ser moduladas pelo futuro da operação que, talvez por coincidência, deu à sua última etapa, a prisão de um ex-senador da cama e cozinha dos pemedebistas até outro dia abrigados no Palácio, o nome de 'Vitória de Pirro'.

O reino por um bote salva-vidas – Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

O Poder Executivo já esteve na situação de água de ladeira abaixo quando ficou claro que a presidente Dilma Rousseff perdia as condições objetivas para governar. Agora, o cenário é de fogo de morro acima no Congresso Nacional, onde nada parece segurar a corrida de deputados – e até de senadores – em prol do impeachment da presidente.

O resultado a ser exposto no placar eletrônico após a votação nominal marcada para o próximo domingo já não é mais de total imprevisibilidade. Muito menos de tendência favorável, conforme o governo desenhava dias atrás e a presidente, certamente por dever de ofício, continuou desenhando na entrevista de ontem em que a única ideia que apresentou para o caso de escapar do impedimento foi a proposição de um pacto nacional.

Nada do que Dilma fez até agora deu certo. Nem o abandono de qualquer pudor na negociação da partilha do Estado que um dia quis convencer as pessoas de que estaria disposta a “faxinar”, nem a abertura das portas do armazém para uso do ex-presidente Luiz Inácio da Silva.

Mais que sintomático, é um indicador da direção dos ventos o fato de o Palácio do Jaburu atrair quantidade crescente de parlamentares, enquanto a visitação aos Palácios do Planalto e da Alvorada praticamente se resume aos convidados a aplaudir os discursos de Dilma dia sim, outro também, e ao cada vez menor número de políticos engajados na organização da resistência.

Os últimos moicanos, partidos médios e governistas do PMDB que tinham jurado fidelidade eterna vêm mudando de ideia em ritmo acelerado desde a aprovação do pedido de impeachment na comissão especial da Câmara. E quando notórios interesseiros nas benesses publicadas (ou não) no Diário Oficial viram as costas a quem ainda detém a posse da caneta é sinal de que o descrédito, a desconfiança e o cheiro de chicote queimado tomou conta do ambiente.

É surpreendente que a presidente que trata a todos de maneira ríspida – mesmo e até mais agora quando senta praça na beira do abismo –, que vocifera no Palácio, que não viu problema algum na campanha eleitoral agressiva e desleal para com os adversários e os eleitores e que sempre fez questão de falar sozinha, é de cair o queixo que ainda se imagine em condições de comandar o diá- logo nacional e apresentar soluções para a crise econômica, política, social e moral.

Se fosse capaz disso – nessa incapacidade inclua-se Lula – não teria deixado as coisas chegarem ao presente ponto. Ou melhor, não teria ela construído o desacerto fenomenal que se instalou no Brasil. Ademais, a presidente propõe um pacto sem agenda. Não diz no que consistiria pelo simples motivo de que não é a reconstrução da normalidade o intento real. Trata-se, antes, de falácia semelhante àquelas ditas na campanha para se reeleger.

Agora repete o truque na tentativa de “pacificar” os que querem o impeachment, convencê-los a dar ao PT a chance que o partido tanto desperdiçou. Na campanha deu certo. Agora Dilma Rousseff conta com a desvantagem de ter suas palavras desmentidas pelos próprios gestos. Por essas e todas as outras, a proposta soa como um desejo de que a sociedade compactue com a incompetência, a corrupção como método de financiamento de sustentação no poder, a incúria e o desapreço à ética.

“Se ganhar, proponho um pacto; se perder, sou carta fora do baralho”, disse a presidente, talvez sem notar que a rainha está fora do jogo em qualquer das hipóteses.

Dilma fora da casinha - Luiz Carlos Azedo

• Lula e o PT se preparam para uma retirada organizada da Esplanada, com um discurso político que visa manter sua candidatura a presidente da República em 2018

- Correio Braziliense

Com todo respeito, a presidente Dilma Rousseff está fora da casinha, como diria Maria Clara, a filha de um amigo meu. Sua entrevista ontem, às vésperas da votação do pedido de impeachment, foi um desastre para os que ainda tentam reverter a oposição nas ruas e articular uma base com mais de 172 deputados para resistir ao afastamento. Que falta faz o marqueteiro João Santana, que continua preso em Curitiba; era ele quem tirava Dilma das cortas nos momentos de crise.

Desta vez, as declarações de Dilma não ocorreram num ato do tipo “nós com nós” que sua assessoria organiza quase todos dias no Palácio do Planalto. Dilma conversou com jornalistas do primeiro time de Brasília no Palácio do Planalto. E voltou a denunciar os golpistas: “Não importa se é um pedreiro, engenheiro, professor ou empresário. É golpista”, disparou. Depois, porém, propôs um amplo pacto se o impeachment não for aprovado pelo Congresso. Pacto com quem, cara-pálida? — indagaria o índio Tonto, o amigo do Zorro.

Dilma explica: “A crise no país é tão grave que não há solução que não seja por meio de um pacto”. Segundo ela, o acordo que pretende propor deve envolver todos os setores da sociedade — governo, oposição, empresários e trabalhadores. “Sem vencidos nem vencedores”, disse. Ou seja, ela quer fazer um acordo com os “golpistas”. Só que agora é tarde, a base na Câmara foi volatilizada, pelo conjunto da obra e pelo desprezo com que sempre tratou os políticos de sua própria base.

Dilma ignora o sentimento das ruas e a ampla coalizão pró-impeachment que se formou na Câmara, com PMDB, PSDB, PP, PRB, PSD, DEM, PTB, SD, PSB e PPS, o que levou o PT, PCdoB e PDT ao isolamento. Erra quando atribui o processo de impeachment a dois adversários apenas: o “senhor presidente da Câmara” e o vice-presidente Michel Temer. Segundo Dilma, haveria uma “sociedade”entre ambos, pois Cunha será o vice-presidente da República, caso o impeachment seja aprovado. É meia verdade: se não for cassado antes disso, Cunha deixará o comando da Casa em janeiro.

Dilma continua perdida em relação à crise econômica. Em vez de rever os próprios erros, persiste na narrativa de que a crise política é que causou a recessão, o desemprego e a inflação. “Nós estamos diante de uma situação em que há uma interação entre uma instabilidade política profunda, que há 15 meses afeta o país. Portanto, há uma interação entre a crise política com a econômica. Não digo que a crise econômica decorre da política, mas é bem intensificada”.

Sua análise da situação da economia é “rudimentar” e “desqualificada”. Essas são as duas palavras que usou para detonar a política de superavit fiscal do ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, em reunião ministerial do governo Lula. “Não acho que tenham sido por conta das medidas anticíclicas as nossas mazelas. Nós adiamos a crise. Quando há quebra no ciclo econômico, a crise aparece. Nós temos disfunções. Nós precisamos ultrapassar essas disfunções. Acredito que tivemos um aprofundamento da crise derivado do fato de que, ao fazer a política anticíclica, derrubamos demais a arrecadação do país”, resumiu.

Retirada
A base do governo na Câmara se desmilinguiu. Depois do desembarque do PP, ontem foi a vez do PSD fazer a mesma coisa. O ministro das Cidades, Gilberto Kassab, presidente da legenda, porém, pretende permanecer no cargo até a votação do impeachment. Há um certo cinismo na demonstração de lealdade.

A débâcle do governo Dilma mudou o eixo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que até hoje não conseguiu tomar posse como ministro na Casa Civil, pois sua nomeação está sub judice por causa da Operação Lava-Jato. Lula tentou recompor a base do governo Dilma várias vezes, como uma espécie de Sísifo, aquele personagem da mitologia grega condenado a repetir a mesma tarefa eternamente: ele empurra uma pedra até o topo da montanha, mas toda vez que está quase chegando lá, a pedra rola ladeira abaixo.

Na verdade, a estratégia de Lula já não é salvar o mandato de Dilma, que será uma “carta fora do baralho” se o impeachment for aprovado, como a presidente da República admitiu ontem. Lula e o PT se preparam para uma retirada organizada da Esplanada, com um discurso político que visa manter sua candidatura a presidente da República em 2018. Petistas admitem que se sentirão mais confortáveis na oposição a Temer, caso o vice-presidente assuma o poder, do que se forem obrigados a dar sustentação ao pacto proposto por Dilma na entrevista de ontem.