terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Opinião do dia: Fernando Henrique Cardoso

É importante repisar isso para mostrar que as políticas de distribuição de renda precisam ser sustentáveis para produzir resultados duradouros. Muito do que foi conquistado desde o Plano Real está hoje ameaçado. Para amenizar o drama da terrível crise atual é preciso manter a rede de proteção social que foi tecida em meu governo e reforçada no governo Lula. Mas é urgente corrigir os desatinos fiscais do lulopetismo, desaparelhar o Estado, reconquistar a confiança da sociedade e retomar a agenda de reformas que o lulopetismo abandonou em favor de anabolizantes pró-crescimento que produziram medonhos efeitos colaterais para o País. Só assim será possível retomar a trajetória que corresponde às aspirações da Constituição de 1988, contra a qual o PT votou, por julgá-la conservadora: um Brasil democrático, não apenas mais desenvolvido, mas, sobretudo, socialmente mais justo.

Há forças capazes de corrigir os desatinos cometidos. Para isso é preciso que lideranças não comprometidas com o lulopetismo, apoiadas pelos grupos sociais que nunca se deixaram ou não se deixam mais seduzir por seu falso encanto, assumam a sua responsabilidade histórica, dentro da Constituição, para fazer o certo em benefício do povo e do País.
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*Fernando Henrique Cardos é sociólogo e foi presidente da República. ‘O certo e o errado’, O Estado de S. Paulo, 7.2.2016

Dilma tenta evitar que TSE use dados da Lava Jato em processo de cassação

Márcio Falcão, Gustavo Uribe – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff tenta evitar que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) admita como prova, em um dos pedidos de cassação contra ela no tribunal, dados da Operação Lava Jato, que investiga esquema de corrupção na Petrobras.

O material foi encaminhado ao tribunal em dezembro de 2015 pelo juiz Sergio Moro, que atendeu a pedido da corregedoria do TSE.

Entre os documentos estão um relatório da Polícia Federal sobre diálogos do dono da UTC, Ricardo Pessoa, e de um executivo da empreiteira, além de denúncias e sentenças ligadas às investigações.

Em sua delação premiada, Pessoa afirmou que, em 2014, foi persuadido pelo ministro Edinho Silva (Comunicação), então tesoureiro da campanha à reeleição de Dilma, a aumentar as doações. Ele disse que foram acertados R$ 10 milhões, mas foram pagos R$ 7,5 milhões porque ele acabou preso na Lava Jato. O ministro, que é investigado no STF (Supremo Tribunal Federal), nega a pressão.

Os dados repassados por Moro foram inseridos em um das duas Aijes (Ação de Investigação Judicial Eleitoral) apresentadas pelo PSDB à Justiça Eleitoral que pedem a perda do mandato de Dilma e de seu vice, Michel Temer.

Depois de receber a documentação, a relatora do caso, ministra Maria Thereza de Assis Moura, pediu para PT, PSDB e Procuradoria-Geral Eleitoral se manifestarem.

A defesa da presidente argumentou que "os requisitos necessários para admissão de tais elementos como prova [...] não estão presentes".

O coordenador jurídico da defesa da campanha petista, Flávio Caetano, disse que as delações premiadas não podem ser utilizadas porque "não têm pertinência" com o que se discute na ação eleitoral, não se referem ao período da campanha presidencial e são provas emprestadas sobre as quais não se garantiu o direito ao contraditório."

Prova emprestada
O Ministério Público se manifestou contra o entendimento de Dilma. "O argumento de que essa documentação não pode ser admitida como prova emprestada não se aplica à hipótese, tendo em vista que as denúncias e sentenças encaminhadas não constituem, em si, prova de qualquer dos fatos nelas referidos", diz o texto assinado pelo vice-procurador-geral Eleitoral, Eugênio Aragão.

"Tais documentos apenas retratam o entendimento dos membros do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário naqueles feitos".

A oposição acusa Dilma e seu vice no TSE de abuso de poder econômico e político e aponta ainda suspeitas de que recursos desviados da Petrobras tenham ajudado a financiar a campanha da reeleição. No total, há quatro ações contra Dilma no tribunal.

Impeachment de Dilma não está ‘morto’, diz Jucá

• Senador defende que PMDB marque suas diferenças com o PT e vê interferência da Lava Jato nas eleições deste ano

Erich Decat e Caio Junqueira - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Cotado para assumir o segundo posto de comando do PMDB a partir de março, o senador Romero Jucá (PMDB-RR), ex-líder no Senado dos governos Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT), considera que o processo de impeachment de Dilma não perdeu força. Em entrevista ao Estado, Jucá ressaltou que em política nada está morto e os desdobramentos de um possível afastamento da presidente serão consequência de uma conjuntura.

Um dos articuladores do acordo de “união” realizado entre a bancada do PMDB do Senado e o vice-presidente Michel Temer, Jucá defende que o partido marque suas diferenças com o PT. Para ele, o PMDB não pode se limitar a ser “o partido governabilidade” e deve investir em bandeiras que estejam articuladas com a realidade. Em relação aos avanços no Congresso de propostas polêmicas com a recriação da CPMF, o peemedebista ressalta que a discussão da criação de impostos não pode ser separada da de corte de despesas pelo governo.

Sobre a Lava Jato, na qual é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal, diz que seus efeitos serão perceptíveis nas eleições municipais deste ano, mas que a operação não deve servir de base para as negociações políticas. Ele é investigado na operação por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e corrupção passiva, acusações das quais ele nega envolvimento.

O impeachment perdeu força no Congresso?

Não acho que perdeu (força). Em política nada está morto. Em política cada dia é uma conjuntura diferente. Impeachment é consequência de um conjuntura. Ela às vezes esquenta, às vezes esfria. Há dois meses a conjuntura do Brasil era outra. Mas não podemos discutir a solução do Brasil apenas após o impeachment porque ninguém sabe se vem, nem quando vem.

O acordo do PMDB do Senado com Temer está relacionado a essa avaliação do impeachment?

Não. Estamos trabalhando pela união do PMDB. O Michel é um ponto de equilíbrio no partido. Mas o PMDB precisa ter claramente bandeiras. O partido tem que ter uma identidade que a população saiba com clareza o que é que aquilo representa.

Mas isso já não foi feito com o documento lançado por Temer com propostas para o País, batizado de ‘Uma Ponte para o Futuro’?

É um documento teórico, não é um documento voltado para a população. Aquele documento precisa ser traduzido em programas para a população.

Então, o documento não é o programa do PMDB?

Não é. Ali tem algumas ideias. O posicionamento será construído. O que vamos fazer no encontro da Executiva é aglutinar, unir o partido, eleger uma Executiva que efetivamente represente as forças que são complementares.

Nesse processo de discussão interna, o PMDB vai buscar se distanciar do PT e do governo?

Queremos marcar as diferenças que nós temos dos outros partidos. Temos diferenças com o PT. Podemos ter equidades, mas temos diferenças também e isso tem que ficar claro para que efetivamente a leitura da população seja justa. Não podemos pagar por erros que não são nossos e não podemos ter também ganhos de ações que não são nossas. O nosso balizamento é a população brasileira, é a cobrança das ruas. Estamos vivendo um outro limiar. Os partidos que não entenderem isso estarão fora do jogo, virarão um dinossauro e vão desaparecer.

Mas haverá uma tentativa de o PMDB mostrar que é diferente do PT?

Acho que isso tem que ficar claro. O que se diz do PMDB é que o partido da governabilidade. Mas governabilidade não tem que ser bandeira de partido porque você está sendo escada para outro partido governar. O PMDB tem que ser um partido da educação, da primeira infância, da qualidade na segurança, na mobilidade urbana. Temos que ter bandeiras que as pessoas identifiquem como condições para elas ascenderem na vida.

O sr. é investigado na Lava Jato e foi relator de MPs com suspeitas de terem sido compradas, alvos de investigação na Operação Zelotes. Qual sua participação nos esquemas?

Não tenho relação com qualquer esquema. Desde o início me coloquei à disposição da PF para quaisquer esclarecimentos. É do meu interesse a celeridade dos processos.

Há uma leitura de que a união com Temer ocorreu devido ao avanço da Lava Jato sobre o PMDB do Senado.

Não tem nada a ver com Lava Jato. Estão sendo feitas as investigações. Se alguém tiver culpa tem que pagar. Houve um processo de investigação de todo mundo, o que é legítimo. Quem está na vida pública tem que dar explicações. Não há nenhum demérito em ninguém ser investigado, o demérito é ser condenado.

O avanço da Lava Jato poderá ter impacto na governabilidade?

Acho que não. A Lava Jato é uma questão grave no quadro político, mas esse dado não pode ser o parâmetro para se tocar as questões políticas, nem de gestão do País.

O avanço dela sobre Lula não pode afetar a governabilidade?

Não posso dar uma resposta porque não conheço os procedimentos de investigação. Seria leviano. Mas se pode dizer que o Lula hoje é um ponto de confronto político, como foi a Dilma no ano passado e ainda permanece. É mais uma frente de embate político.

Acredita que os desdobramentos da Lava Jato terá algum impacto nas eleições 2016?

O impacto para os partidos e as figuras que estão nestes processos já está comprometido. Não tenho dúvida. Quem tiver com qualquer tipo de problema vai ter que se explicar. O desgaste já está acontecendo. Em tese, há um desgaste efetivo mas se vai se prolongar até 2018, não dá para prever.

O que achou da ida da presidente ao Congresso?

Ela colocou algumas questões de reformas estruturantes. Foi um fator positivo ter vindo ao Congresso como uma forma de se colocar para o debate. Tocou em temas que são áridos para o próprio partido dela, portanto, teve um posicionamento corajoso em termo estruturais. Agora, a partir daí vamos ver como isso se transforma em realidade. Nós temos que ver a prática concreta das ideias.

A agenda do governo da reforma da previdência e CPMF contempla o PMDB?

O PMDB vai estudar a reforma. O partido entende que é preciso buscar o equilíbrio fiscal mas que tem que ser preservados os direitos. Temos que resolver o equilíbrio da previdência para que não tenha que acontecer no Brasil o que aconteceu com a Grécia e com a Europa que é cortar pagamentos de aposentados.

E a CPMF?

A CPMF vamos discutir no bojo das reforma estruturantes. A discussão de aumento de receita não pode ser separada da de corte de despesa, senão a população não entende e não passa no Congresso. Temos que discutir corte de despesa, reformas estruturantes e aumento de receita num único pacote porque eles estão interligados. O governo tem que fazer o dever de casa e mostrar para a sociedade que tipo de esforço o governo está fazendo para depois pedir um esforço dela. A questão não é só aumentar imposto, mas reprogramar o gasto público e alocar essa transição. Como vamos fazer isso? O governo vai ter que propor.

Presidente do PT diz que há 'tentativa de linchamento moral' de Lula Carlos Villalba R. - 4.dez.15/Efe BRA123. SAO PAULO (BRASIL), 04/12/2015.- El líder del gobernante Partido de los Trabajadores (PT), Rui Falcao, se reúne con partidarios en la sede de la colectividad hoy, viernes 4 de diciembre de 2015, en Sao Paulo (Brasil) para tomar medidas en defensa de la presidenta del país, Dilma Rousseff, en medio del proceso de juicio político que enfrenta en el Congreso. EFE/Carlos Villalba R. ORG XMIT: BRA123 O presidente nacional do PT, Rui Falcão DE SÃO PAULO 08/02/2016 18h10 Compartilhar3,1 mil Mais opções PUBLICIDADE O presidente nacional do PT, Rui Falcão, publicou artigo no site do partido nesta segunda-feira (8) afirmando que há uma "tentativa de linchamento político e moral" do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com ele, "nuca antes neste país", um ex-presidente foi "tão caluniado, difamado, injuriado e atacado como o companheiro Lula". Na semana passada, o delegado da Polícia Federal Marlons Cajado informou à Justiça Federal em Brasília que há um inquérito em curso para investigar a eventual participação de Lula e outros agentes públicos em um suposto esquema de compra de medidas provisórias em seu governo. O ex-presidente e sua mulher, Marisa Letícia, também foram convocados pelo promotor Cássio Conserino, do Ministério Público de São Paulo, a prestar depoimento na manhã do dia 17, no Fórum da Barra Funda, em São Paulo. O promotor já disse ter indícios para denunciá-los à Justiça por ocultação de patrimônio relacionada à compra de um tríplex no condomínio Solaris, reservado pela OAS à família Lula, em Guarujá. Transações envolvendo o imóvel foram alvos da Operação Triplo X, a 22ª fase da Lava Jato, deflagrada no fim de janeiro. A Lava Jato também investiga benfeitorias executadas por empresas envolvidas no escândalo da Petrobras em um sítio frequentado por Lula e sua família, em Atibaia, no interior de São Paulo. O sítio frequentado por Lula em Atibaia 1 de 11 Jorge Araujo/Folhapress AnteriorPróxima AnteriorPróxima Há duas semanas, a Folha revelou que a Odebrecht, segundo fornecedores, arcou com a reforma do sítio. Uma empresária que forneceu materiais diz que a empreiteira gastou ao menos R$ 500 mil com as obras. A empresa nega. O ex-presidente admitiu frequentar, "em dias de descanso", o sítio em Atibaia, mas afirmou que não é dono da propriedade. Para Rui Falcão, a "tentativa de linchamento político e moral" do ex-presidente "escora-se em denúncias sem provas", como, segundo diz, "virou moda no país nos últimos meses". "Valem as versões, não os fatos. O dever da prova não é mais de quem acusa, mas de quem é acusado, delatado, caluniado. Como diz o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, 'primeiro aponta-se o criminoso, depois vasculha-se o crime'", escreve Falcão. O presidente nacional do PT, que declarou recentemente que Lula é o "plano A para o PT em 2018", diz que há um "consórcio entre a oposição reacionária, a mídia monopolizada e setores do aparelho de Estado capturados pela direita" para converter o ex-presidente em vilão. "O legado de realizações a favor dos mais pobres, a elevação do Brasil no cenário mundial, os sucessos na educação, na saúde, nos programas sociais, na área da infraestrutura, em seus oito anos na Presidência, precisa ser destruído para que Lula não possa retornar em 2018. " Falcão termina o texto convocando a militância do PT e a "combater a escalada golpista e o cerco criminoso ao Lula". "Estou convencido que, assim, mais uma vez a verdade triunfará sobre a mentira."

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O presidente nacional do PT, Rui Falcão, publicou artigo no site do partido nesta segunda-feira (8) afirmando que há uma "tentativa de linchamento político e moral" do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com ele, "nuca antes neste país", um ex-presidente foi "tão caluniado, difamado, injuriado e atacado como o companheiro Lula".

Na semana passada, o delegado da Polícia Federal Marlons Cajado informou à Justiça Federal em Brasília que há um inquérito em curso para investigar a eventual participação de Lula e outros agentes públicos em um suposto esquema de compra de medidas provisórias em seu governo.

O ex-presidente e sua mulher, Marisa Letícia, também foram convocados pelo promotor Cássio Conserino, do Ministério Público de São Paulo, a prestar depoimento na manhã do dia 17, no Fórum da Barra Funda, em São Paulo.

O promotor já disse ter indícios para denunciá-los à Justiça por ocultação de patrimônio relacionada à compra de um tríplex no condomínio Solaris, reservado pela OAS à família Lula, em Guarujá.

Transações envolvendo o imóvel foram alvos da Operação Triplo X, a 22ª fase da Lava Jato, deflagrada no fim de janeiro. A Lava Jato também investiga benfeitorias executadas por empresas envolvidas no escândalo da Petrobras em um sítio frequentado por Lula e sua família, em Atibaia, no interior de São Paulo.

Há duas semanas, a Folha revelou que a Odebrecht, segundo fornecedores,arcou com a reforma do sítio. Uma empresária que forneceu materiais diz que a empreiteira gastou ao menos R$ 500 mil com as obras. A empresa nega. O ex-presidente admitiu frequentar, "em dias de descanso", o sítio em Atibaia, mas afirmou que não é dono da propriedade.

Para Rui Falcão, a "tentativa de linchamento político e moral" do ex-presidente "escora-se em denúncias sem provas", como, segundo diz, "virou moda no país nos últimos meses".

"Valem as versões, não os fatos. O dever da prova não é mais de quem acusa, mas de quem é acusado, delatado, caluniado. Como diz o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, 'primeiro aponta-se o criminoso, depois vasculha-se o crime'", escreve Falcão.

O presidente nacional do PT, que declarou recentemente que Lula é o "plano A para o PT em 2018", diz que há um "consórcio entre a oposição reacionária, a mídia monopolizada e setores do aparelho de Estado capturados pela direita" para converter o ex-presidente em vilão.

"O legado de realizações a favor dos mais pobres, a elevação do Brasil no cenário mundial, os sucessos na educação, na saúde, nos programas sociais, na área da infraestrutura, em seus oito anos na Presidência, precisa ser destruído para que Lula não possa retornar em 2018. "

Falcão termina o texto convocando a militância do PT e a "combater a escalada golpista e o cerco criminoso ao Lula". "Estou convencido que, assim, mais uma vez a verdade triunfará sobre a mentira."

PT afirma que Lula sofre ‘linchamento’ e discute versão sobre sítio em Atibaia

• Presidente nacional da legenda, Rui Falcão, acusa oposição e setores ‘capturados pela direita’ de praticarem violência política e moral contra ex-presidente; sigla avalia que falta uma defesa unificada sobre o caso envolvendo a propriedade rural em SP

Pedro Venceslau, Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O PT reforçou ontem a defesa pública do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alvo de suspeitas de ocultação de patrimônio e de receber favores de empreiteiras investigadas na Operação Lava Jato. Em plena segunda-feira de carnaval, o presidente do partido, Rui Falcão, publicou artigo no qual acusa a oposição e setores “capturados pela direita” de tentarem o “linchamento político e moral” do petista. Ao mesmo tempo em que busca estabelecer uma reação, a cúpula petista avalia que o caso envolvendo o sítio em Atibaia (SP) é o que apresenta maior potencial de desgaste para o ex-presidente pela ausência de uma estratégia clara e definida de defesa.

Em caráter reservado um dirigente da sigla disse ao Estado que o entorno do ex-presidente Lula tratou sua defesa no caso do sítio de forma “amadora”. Petistas reclamam, ainda, da ausência de uma versão consolidada para embasar o discurso da militância. A cúpula da legenda cobra de Lula a contratação de uma equipe de advogados de peso, cuja a presença “intimide” o que chamam de “tentativa de linchamento”. Recentemente, Lula contratou o criminalista Nilo Batista, ex-governador do Rio, para defendê-lo por sugestão do deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), espécie de conselheiro informal do ex-presidente para assuntos jurídicos.

A avaliação recorrente é que a resposta ao episódio do tríplex do Guarujá, no litoral paulista, demorou para acontecer, mas no final foi eficiente e não deixou “pontas soltas”.

Lula e sua mulher, a ex-primeira-dama Marisa Letícia, foram intimados para prestar depoimento como investigados no inquérito do Ministério Público de São Paulo que apura empreendimentos da Cooperativa Habitacional dos Bancários do Estado de São Paulo (Bancoop) assumidos pela empreiteira OAS. Promotores suspeitam que Lula seja o verdadeiro dono do tríplex 164-A do condomínio Solaris, reformado pela empreiteira ao custo de R$ 770 mil.

Em nota recente, o Instituto Lula, presidido por Paulo Okamotto, admitiu que Lula visitou a unidade em 2014 acompanhado do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, e apresentou uma série de documentos reforçando a defesa de que a família do ex-presidente tinha a opção de compra do imóvel, mas desistiu no fim do ano passado. O condomínio Solaris também está na mira da força-tarefa da Lava Jato.

‘Constrangimentos’. Setores do PT, porém, temem que o sítio provoque mais “constrangimentos morais” para Lula. “Não tememos que haja algum tipo de desdobramento penal”, disse o dirigente petista. Na avaliação dele, não há mais como negar que ao imóvel era usado quase que exclusivamente por Lula e sua família.

A Lava Jato e o MP paulista investigam reformas na propriedade rural que está em nome de Fábio Bittar e Jonas Suassuna, dois sócios de um dos filhos de Lula. A suspeita é que as intervenções no imóvel de 173 mil metros quadrados foram feitas de forma informal pela OAS e a Odebrecht para favorecer a família do ex-presidente.

A assessoria do Instituto Lula já admitiu que o petista e familiares utilizam “em dias de descanso” o sítio. “Objetivamente, o sítio não é dele. Não vejo nenhuma ilegalidade no fato de o presidente frequentá-lo. Estão fazendo uma publicidade desproporcional em cima disso”, disse Damous. Nilo Batista preferiu não falar sobre a estratégia de defesa. “Não vou tratar disso pela mídia.”

Por enquanto, o PT tenta emplacar um movimento em “defesa” do ex-presidente por meio das redes e movimentos sociais. O partido lançou nas redes sociais um movimento convocando militantes e simpatizantes a adotar a hashtag #LulaEuConfio. “Lula está sofrendo uma auditoria na vida dele pelo Judiciário, mas não há qualquer ilegalidade que ele tenha cometido”, disse o deputado Paulo Teixeira (PT-SP). “Estão cutucando a onça com vara curta”, afirmou o vice-líder do governo na Câmara, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que se reuniu anteontem com o ex-presidente no apartamento do petista em São Bernardo do Campo. “Lula é o líder do nosso campo político. Haverá reação e repercussão social.”

No seu artigo, Falcão conclamou a militância a combater a “escalada golpista” e o “cerco criminoso” ao ex-presidente.

“Nunca antes neste País um ex-presidente da República foi tão caluniado, difamado, injuriado e atacado como o companheiro Lula. Inconformado com sua aprovação inédita ao deixar o governo, o consórcio entre a oposição reacionária, a mídia monopolizada e setores do aparelho de Estado capturados pela direita quer convertê-lo em vilão”, diz o texto.

O dirigente tem feito apelos para que militantes saiam em defesa do ex-presidente. Na festa de aniversário do partido, nos dias 26 e 27, no Rio de Janeiro, os petistas preparam um ato de desagravo a Lula./ Colaborou Alfredo Mergulhão

Delegado da PF que investiga Lula na Zelotes diz que inquérito ‘é garantia de mais transparência’

Por Fábio Fabrini e Andreza Matais e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

- BRASÍLIA - No ofício à Justiça Federal em que põe o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como investigado da Operação Zelotes, o delegado da Polícia Federal Marlon Cajado faz uma enfática defesa do inquérito policial, segundo ele, “instrumento legal de investigação e inclusive uma garantia de mais transparência”.

“A instauração de novos inquéritos para apurar outras condutas ilícitas atribuíveis à organização criminosa, e até a participação de novos indivíduos à mesma não se trata de nenhuma ilegalidade”, assinala Marlon Cajado. “Entender de outra forma é assumir que a proposição de ação penal preclui a apuração de qualquer outro crime que possa ser atribuído a alguém, ou mesmo a invenção de uma forma extralegal de prescrição da pretensão punitiva do Estado com relação a outras condutas e outras pessoas, as quais podem ser processadas em nova ação penal se assim entender por bem o Ministério Público.”

Para o delegado, quando um inquérito cumpre “o seu desiderato inicial de trazer indícios suficientes de materialidade e autoria, o mesmo deve ser relatado e proposta a ação penal”.

O inquérito é uma peça policial quase sempre contestada por advogados de investigados que não admitem a sua importância.

O documento que cita Lula foi enviado dia 2 ao juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara Federal, em Brasília, para rebater críticas de advogados de que haveria um inquérito paralelo investigando os mesmos fatos já denunciados à Justiça.

O delegado afirmou que o inquérito em curso na Zelotes apura se mais agentes públicos estão envolvidos no suposto esquema de “compra” de medidas provisórias, entre eles o ex-presidente Lula.

Cajado conduz desde o início a Zelotes, investigação sobre compra de medidas provisórias que teriam beneficiado setores da indústria com incentivos fiscais.

Ele destacou a imprescindibilidade do inquérito ao rebater afirmação de defensores de alvos da Zelotes. Esses advogados, em petição à Justiça Federal em Brasília, afirmaram a existência de inquérito paralelo na PF.

“O que de fato acontece é que uma investigação criminal pode ocorrer em mais de um procedimento policial e judicial, e isto é justamente o que ocorre no caso em tela”, assinala o delegado da Zelotes.

Marlon Cajado se reporta a trecho do inquérito 1424/2015, já concluído e levado à Justiça, que revela a ação de acusados que “teriam atuado em diversos órgãos do Poder Executivo e do Legislativo para obter êxito na prorrogação dos incentivos fiscais”.

Na semana passada, quando foi tornado público o ofício da PF à Justiça Federal, o advogado Cristiano Zanin Martins, que representa Lula, disse que o documento não muda formalmente a situação do ex-presidente no inquérito. “O delegado está investigando a possível ‘vitimização’ de outras pessoas, entre elas Lula. Estão investigando se estavam ‘vendendo fumaça’, usando o nome do ex-presidente”, disse o advogado, na ocasião.

Criador da sigla espanhola Podemos teme retrocesso na América Latina

• À Folha Juan Carlos Monedero diz que esquerda da região falharam ao transformar ex-pobres em consumidores e não em cidadãos

Eleonora de Lucena – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Colapso econômico, mudanças radicais no sistema político, escalada bélica, grande desemprego: tudo isso aconteceu nos anos que precederam a Primeira Guerra Mundial, no início do século passado. Tudo isso ocorre hoje, e as semelhanças das situações são inquietantes.

O alerta é do cientista político Juan Carlos Monedero, 53, um dos criadores do Podemos, o novo partido espanhol surgido em 2014, na esteira dos protestos contra a austeridade, e que se tornou a terceira força política no país nas eleições de dezembro passado.

Para ele, a "única varinha mágica" para sair da crise é gerar emprego –o contrário do que governos estão fazendo. E ataca: "O terrorismo financeiro, apesar de vestir terno e gravata, é tão perigoso quanto foi o nazismo nos anos 30 do século passado", declara em entrevista à Folha.

Professor da Universidade Complutense de Madri, Monedero teme uma regressão política na América Latina. "Na Argentina, a metade do país não vai permitir que [Mauricio] Macri acabe com os avanços sociais dos últimos anos. Alguns, especialmente os EUA, não teriam problema em converter a América Latina em uma guerra civil permanente, como na Líbia, na Síria ou no Iraque. Confio que os governantes da esquerda estejam conscientes desse risco", diz.

Ex-assessor de Hugo Chávez, ele afirma esperar que "a politização evite essa regressão". Na sua análise, as esquerdas latino-americanas cometeram os mesmos erros que as europeias: atacaram a pobreza, mas não conseguiram engajar os cidadãos, que se tornaram apenas proprietários e consumidores.

Autor de "La Rebelión de los Indignados" (2011) e de "Que no nos Representan!" (2011, com Pablo Iglesias, o líder do Podemos), Monedero foi integrante da executiva do partido. Avalia que as últimas eleições espanholas enterraram o bipartidarismo no país.

Nesta entrevista, ele fala dos pontos em discussão em curso para a formação de um governo de coalizão com o tradicional PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol): freios a privatizações, a demissões e ao TTIP, tratado que liberaliza negócios.

Folha - Como o sr. explica o avanço eleitoral do Podemos?

Juan Carlos Monedero - Numa campanha eleitoral, é mais difícil esconder a mensagem; as estratégias de ocultamento funcionam pior. Podemos, como um partido emergente, tem recebido muitas críticas de praticamente todo o espectro político, o que o havia enfraquecido. Nas eleições, ele pode contar quem é.

A eleição de dezembro significou o fim do bipartidarismo na Espanha?

Sem dúvida. Em comparação com outros momentos, quando [PP e PSOE] chegaram a ocupar mais de 80% dos assentos, hoje os dois principais partidos não podem formar um governo juntos. Além disso, as decomposições do PP, pela corrupção, e do PSOE, por sua falta de rumo, atestam que o problema do bipartidarismo é estrutural.

Só erros profundos do Podemos poderiam dar alento ao bipartidarismo. Mas não parece que essa possibilidade esteja no horizonte. As coisas têm sido bem-feitas até agora e não há razão para enganos no futuro próximo.

Quais são as prioridades do partido se chegar ao poder em coalizão com o PSOE?

Foi apresentada a Lei 25, em referência ao artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Trata-se de garantir soluções a pessoas em situação de urgência econômica.
Ela propõe medidas contra a pobreza energética –luz, gás–, estabelece alternativa habitacional a vítimas de abusos, evita despejos para quem não tem onde morar e acaba com o co-pagamento farmacêutico.

Na proposta de governo em coalizão com o PSOE, o Podemos reivindica a defesa da justiça social, freio a cortes de pessoal e a privatizações, além da revogação das reformas trabalhistas do PP e do PSOE. Em relação aos meios de comunicação, se deveria trabalhar por uma RTVE [mídia estatal] independente, com profissionais independentes. Na educação, saúde e serviços sociais, trata-se de garantir os direitos sociais e reverter as privatizações.

É relevante resolver o problema territorial, assumindo a plurinacionalidade da Espanha. Com a vitória da coalizão Em Comú Podem, na Catalunha, se reivindica que um membro dessa coalizão (Xavi Domenech) seja ministro da Plurinacionalidade. Na defesa, se trata de obter um sistema integral de defesa comum, à margem dos lobbies de armas, e que trabalhe para uma defesa europeia que irá substituir a Otan.

Na Europa, temos que travar o TTIP [sigla em inglês para Transatlantic Trade and Investiment Partnership, tratado comercial e de investimentos, em debate, que reduz barreiras e regulações para os negócios] e fomentar a cooperação para o desenvolvimento, ajudando a reverter a ideia de uma "Europa fortaleza", não solidária e distante dos direitos humanos.

Na Espanha, o pior da crise já passou?

As perspectivas são melhores do que na França ou na Itália, mas muitos indicadores apontam que virá um ano problemático em todo o mundo.

O que deve ser feito para a retomada do crescimento?

A única varinha mágica é o emprego. É a única forma de aumentar o consumo, a produção, a atividade econômica, os rendimentos, além de provocar redução no resultado da equação entre gasto público menos gasto em desemprego. É o contrário do que se está fazendo agora.

Quais são os impactos da crise migratória, econômica e dos ataques terroristas para a Europa?

São desafios que exigem política europeias que busquem a raiz dos problemas. As migrações podem ser muito benéficas. A crise deve ser resolvida com o aumento da integração europeia. Ataques terroristas se enfrentam com inteligência e ajudas econômicas –não lançando bombas ou demonizando, ações que só ajudam a aumentar o ódio e as fileiras dos extremistas.

É possível comparar a situação atual com os primeiros anos do século 20 que antecederam a Primeira Guerra Mundial?

Há contornos parecidos inquietantes: colapso econômico, mudanças radicais no sistema político, escalada bélica, grande desemprego. Como disse Antonio Gramsci (1891-1937) naqueles anos, ao pessimismo do intelecto se deve opor o otimismo da vontade. Insisto: devemos ver essas condições como desafios para evitar a paralisia.

Na América Latina, que o sr. conhece bem, a esquerda sofreu derrotas na Argentina e na Venezuela. Como o sr. explica esses reveses? Onde a esquerda errou? Há avanço da direita no continente? O que deve ser feito?

Como resumiu Boaventura de Sousa Santos: reformas constitucionais reais e mudança na hegemonia. Esclareço com dois pontos. Primeiro: a América Latina tem cometido o mesmo erro que a esquerda europeia –tirou a maioria da pobreza, mas não a converteu em cidadãos comprometidos, senão em proprietários e consumidores que acabaram voltando a votar em seus carrascos.

Segundo: a conivência com as velhas formas invariavelmente tem levado ao problema da corrupção às novas formações políticas. A vacina da participação popular não foi implementada. E isso dá à direita revanchista chance de tentar legitimar a sua ideia de que o poder lhe pertence por nascimento.

O Brasil vive uma crise política e uma recessão econômica. Qual sua avaliação do país e o que deveria ser feito?

Não sou eu quem vai dizer o que o governo de Dilma Rousseff deve fazer. Mas é terrível pensar que depois de uma década seja possível regressar ao passado sem nenhum conflito. Confio que a politização evite essa regressão.

Estamos vendo que na Argentina a metade do país não vai permitir que [Mauricio] Macri acabe com os avanços sociais dos últimos anos. Alguns, especialmente os EUA, não teriam problema em converter a América Latina em uma guerra civil permanente, como na Líbia, na Síria ou no Iraque. Confio que os governantes da esquerda estejam conscientes desse risco.

Petróleo e China estão no centro das atenções mundiais. Como o sr. analisa essas situações?

A geopolítica está golpeando a economia. A morte de [Hugo] Chávez e o assassinato de [Muammar] Gadaffi foram também a morte da Opep. A Arábia Saudita se aproveita disso para debilitar o Irã e arruinar as empresas de fracking [de exploração de xisto]. Mas isso está afetando a economia mundial.

A demanda menor da China termina por fazer o resto. Enquanto isso, recente informe da Oxfam afirma que 62 pessoas têm tanto dinheiro como 3,6 bilhões de seres humanos. As desigualdades são um fator terrível de desestabilização econômica.

E enquanto meia centena de pessoas tiver tanto dinheiro quanto metade da humanidade não haverá solução para os problemas do mundo.

O terrorismo financeiro, apesar de vestir terno e gravata, é tão perigoso quanto foi o nazismo nos anos 30 do século passado.

Lei de Responsabilidade Fiscal já ameaça 20 Estados

Felipe Bächtold, João Pedro Pitombo – Folha de S. Paulo

PORTO ALEGRE, SALVADOR - A crise econômica e os desajustes nos Orçamentos fizeram os Estados arrecadarem no ano passado quase R$ 30 bilhões a menos do que o esperado e avançar sobre limites de gastos impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Pelo país, as perspectivas para o ano são de mais atrasos em pagamentos e nos salários de servidores.

Levantamento feito pela Folha mostra que a maioria dos governos obteve menos receitas com tributos e com transferências federais do que o previsto um ano atrás.

Os problemas financeiros também levaram a maioria dos governadores a piorar o comprometimento das finanças com pessoal em 2015. Vinte deles ultrapassaram limites estabelecidos pela norma ao longo do ano. O nível de endividamento dos governos teve elevação generalizada.

A virada do ano escancarou os problemas de caixa que vinham se agravando ao longo de 2015. Em dezembro, o governo do Rio, administrado por Luiz Fernando Pezão (PMDB), atrasou pagamentos no setor de saúde, o que fez funcionários fecharem emergências de hospitais, gerando caos no atendimento.

Outros Estados, como Sergipe e Tocantins, retardaram o pagamento do décimo terceiro. No Rio Grande do Sul, o atraso no pagamento mensal da dívida com a União virou rotina. Há o risco de o mesmo ocorrer em Minas.

Em São Paulo, o grau de endividamento pulou de 148% de sua receita corrente líquida em 2014 para 168%.

Em relação a 2014, apenas três Estados conseguiram ampliar a arrecadação de tributos, em valores corrigidos pela inflação. Um deles foi o Paraná, primeiro a articular um pacote de aumentos de impostos neste mandato.

Os demais são o Pará e o Maranhão. Este último diz ter revisto benefícios fiscais concedidos em mandatos anteriores. A Paraíba não disponibilizou os dados.

O maior desfalque ocorreu no Rio, que esperava arrecadar com impostos e taxas R$ 43,4 bi, mas, com as dificuldades do setor do petróleo, só conseguiu R$ 29,1 bi.

Os quase R$ 30 bi a menos arrecadados representam uma queda de 7% em relação ao esperado. Nem o tarifaço, que elevou há um ano os preços da energia elétrica e dos combustíveis, evitou a queda.

O secretário da Fazenda de Santa Catarina, Antônio Gavazzoni, diz que o fenômeno é culpa "exclusivamente" da situação da economia nacional. No Estado, a arrecadação ficou quase R$ 800 milhões abaixo da esperada em 2015 –obteve 94% do previsto.

"A arrecadação é toda vinculada: 12% para saúde, 25% para a educação. Repassando menos recursos para áreas fundamentais e com a inflação elevando o custeio, vai tornando mais difícil a boa prestação do serviço público", afirma Gavazzoni. A previsão para 2016 no Estado é de queda na arrecadação.

Sanções
A Lei de Responsabilidade Fiscal prevê uma série de restrições a quem ultrapassa os limites de comprometimento de receita. No caso dos gastos com pessoal, o Estado fica impedido de fazer contratações. Se não houver uma melhora nas contas em oito meses, as transferências federais podem ser cortadas. Novos empréstimos também são barrados e as contas de governo podem ser rejeitadas, o que provoca a inelegibilidade do governador.

O presidente da Associação Nacional do Ministério Público de Contas, Diogo Ringenberg, diz que a piora nos índices reflete o fim de um período de "exuberância econômica", em que os Estados se comprometeram descontroladamente com gastos.

"A mudança do viés 'mão aberta' para o 'mão fechada' é muito lenta e há resistências gigantescas a ela", disse.

Um dos Estados que superaram o limite máximo com pessoal foi o Rio Grande do Sul, que acumula outras marcas negativas. O Estado, governado por José Ivo Sartori (PMDB), está com uma dívida 227% superior à receita corrente líquida, pior índice em oito anos.

Apesar de ter um dos maiores PIBs do país, o Rio Grande do Sul foi um dos que menos destinaram recursos para investimentos –só superou pequenos Estados do Norte.

Culpa da crise
Governos ouvidos pela reportagem afirmam que a previsão de arrecadação para 2015 foi feita quando a situação da economia não estava tão deteriorada.

Em São Paulo, o governo administrado por Geraldo Alckmin (PSDB), por exemplo, afirmou que, na época da elaboração do Orçamento de 2015, a perspectiva era de crescimento de 1,5% do país no ano, enquanto o resultado final acabou sendo um encolhimento de 3%.

A piora na relação entre a dívida e a receita corrente líquida, afirma o governo paulista, ocorreu por causa da inflação e da desvalorização cambial, que afeta dívidas contraídas em dólar ou euro.

O governo do Rio diz que o aumento nesse indicador é "inevitável" quando há queda da receita. O Estado agora tem uma dívida de quase o dobro de sua receita corrente líquida e ficou próximo de atingir o limite máximo imposto pela legislação.

O governo mineiro também afirmou que parte do endividamento é afetado pelo câmbio. A Secretaria da Fazendo do Rio Grande do Sul não quis se manifestar sobre as razões da escalada da crise.

Apesar de acumular dívida de R$ 1,5 bilhão, saúde ainda terá corte de 7%

• Medidas de economia incluem fim de internações nas UPAs

- O Globo

Com um rombo de R$ 20 bilhões no orçamento deste ano, o governador Luiz Fernando Pezão não poupou nem a saúde nos cortes anunciados na última sexta-feira. A pasta perderá 7%, mas a Secretaria estadual de Saúde só deve anunciar as áreas que serão alvo do ajuste fiscal depois do carnaval. Ao todo, o contingenciamento feito por Pezão será de R$ 18,4 bilhões, de um total de R$ 79,9 bilhões.

Após acumular uma dívida na saúde de R$ 1,5 bilhão com fornecedores no ano passado, o governador tenta reduzir as despesas da pasta em 2016. Uma das medidas de austeridade provocou polêmica: o fim de internações nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). A decisão foi criticada, porém mantida, pois vai gerar uma economia de R$ 700 milhões. E não é só. O governo também municipalizou os hospitais Rocha Faria, em Campo Grande, e Albert Schweitzer, em Realengo, o que deve representar uma redução de custo de mais R$ 500 milhões.

Atendimentos suspensos
A falta de receitas na saúde levou a uma situação de caos no setor em dezembro, quando houve a suspensão do atendimento nos principais hospitais do Rio, como o Getulio Vargas, na Penha, o Hospital da Mulher, em São João de Meriti, e o Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias. Até os transplantes chegaram a ser suspensos no Hospital São Francisco da Providência de Deus, na Tijuca.

Em meio a sucessivos episódios de colapso, o então secretário, Felipe Peixoto, deixou o cargo para disputar a prefeitura de Niterói. Ele foi substituído por Luiz Antonio Teixeira Junior, que assumiu a pasta com recursos liberados pelo governo federal e um empréstimo de R$ 100 milhões da prefeitura.

Apesar de as autoridades terem dito que a situação estava controlada, houve novos problemas no fim de janeiro, e o centro de diagnóstico Rio Imagem, no Centro, fechou.

O Hospital Universitário Pedro Ernesto, em Vila Isabel, passou a viver dias de penúria. O centro cirúrgico ficou 17 dias sem procedimentos eletivos, como resultado de uma soma de dificuldades: a ala ficou alagada após um temporal e faltou material. Além disso, funcionários terceirizados das áreas de segurança, limpeza e administração estavam com os salários atrasados. No auge da crise, a unidade começou a mandar para casa pacientes em estado menos grave, por não ter condições de mantê-los.

Pezão quer usar fundo ambiental na previdência

• Em projeto enviado à Alerj, governador pede autorização para pôr dinheiro em aposentadorias

Luiz Gustavo Schmitt - O Globo

O governador Luiz Fernando Pezão quer usar os recursos do Fundo Estadual de Conservação Ambiental (Fecam) para socorrer as aposentadorias da previdência fluminense, que tem um déficit de R$ 12 bilhões previsto para este ano. Ele garante que o dinheiro será reposto pelo Tesouro estadual, contudo, a proposta, já enviada à Assembleia Legislativa ( Alerj) é alvo de críticas de deputados. Eles afirmam que a destinação dos recursos será desvirtuada e que o Palácio Guanabara não terá caixa para garantir os investimentos em meio ambiente.

Pela lei atual, o fundo recebe 5% dos royalties do pós- sal e 10% das receitas do pré- sal. Com esses recursos foram bancados, nos últimos oito anos, programas para a limpeza das praias, além de várias ações de saneamento, como a reforma das estações de tratamento de esgoto da Pavuna, de Sarapuí e de São Gonçalo.

O dinheiro do Fecam também foi usado em ações de despoluição da Baía de Guanabara e na melhoria da captação de esgoto na Barra, no Recreio e em Jacarepaguá. Nesses bairros da Zona Oeste, a capacidade de tratamento foi ampliada de 5% para 55%.

Ex-secretário de Meio Ambiente e criador da lei que deu origem ao Fecam, o deputado estadual Carlo Minc (PT) lembra que a aplicação dos recursos do fundo fez o tratamento de esgoto subir de 16% para 48% na Baía de Guanabara desde 2007. Mesmo assim, ele diz que hoje as águas da baía ainda recebem esgoto in natura de 4,5 milhões de pessoas, quase metade da população que vive na Região Metropolitana do Rio.

— O Fecam vai para projetos de saneamento, permite a recuperação de rios e lagoas. A nova proposta do governador levará o estado a um retrocesso na área ambiental — afirma Minc. — Na prática, significa que vai zerar o saldo do fundo. E o dinheiro não será substituído por fontes alternativas, como diz o texto do projeto, porque elas simplesmente não existem. Está claro que, se a proposta for aprovada, o dinheiro não será mais aplicado no meio ambiente.

Na proposta, Pezão pede autorização à Alerj para que o dinheiro do Fecam possa ser utilizado no pagamento de operações financeiras de antecipação de royalties feitas pelo Rioprevidência. O governo estadual vendia títulos no mercado internacional e dava como garantia a previsão de receitas de royalties a serem arrecadadas. O dinheiro que recebia era utilizada para pagar a folha de inativos e pensionistas.

Crítico à proposta, o presidente da Comissão de Finanças e Tributação da Alerj, Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), afirma que o projeto é uma tentativa desesperada do governo de honrar seus compromissos com credores internacionais. Ele alerta para o agravamento da situação das contas públicas:

— Somente em 2015, o Rioprevidência pagou aos credores das operações financeiras o montante de R$ 1,735 bilhão. Essas manobras financeiras estão consumindo os royalties.

Não é a primeira vez que um governo tenta usar recursos do Fecam, criado em 1986, para outros fins. Até 2007, o dinheiro abastecia diversas pastas. Questionado pelo GLOBO na semana passada, Pezão afirmou que o meio ambiente não perderia recursos. Já o secretário do Ambiente, André Correa, não retornou contatos do GLOBO