sábado, 17 de dezembro de 2016

Governo não pode mesmo esquecer da microeconomia – Editorial/O Globo

• As reformas estruturais, como da PEC do teto e da Previdência, não excluem, ao contrário, mudanças destinadas a melhorar a vida das empresas e das pessoas

Pode-se enxergar no pacote de medidas microeconômicas, anunciadas quinta-feira, o dedo da política. Um sinal foi a presença no evento do próprio presidente Michel Temer, ao lado do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. A pompa do evento ficou evidente também por estarem à mesa os presidentes do Senado e da Câmara, Renan Calheiros e Rodrigo Maia. Numa situação normal, Meirelles e o colega do Planejamento, Dyogo Oliveira, seriam suficientes. Mas é melhor que o governo dê mesmo importância às ações para melhorar a vida das empresas e da população.

Há algum tempo ficara evidente que a defenestração constitucional de Dilma e do lulopetismo do poder, se gerou uma lufada de otimismo refletida em melhorias tópicas nos mercados, não seria capaz de retirar a economia do mais grave ciclo recessivo da história. Ficou claro que, sem as reformas estruturais, o PIB, na melhor hipótese, ensaiará “voos de galinha” e/ou ficará no atoleiro da estagnação. A constatação deflagrou pressões políticas sobre Temer, com velhas sugestões salvacionistas, como troca de ministros.

Mas as reformas do teto para os gastos, a da Previdência e das leis trabalhistas, por exemplo, não excluem melhorar o ambiente de negócios no país — um dos piores do mundo —, por meio de mudanças de normas administrativas e projetos de lei simples. A receita da retomada está na combinação de mudanças nos níveis micro e macro.

A aprovação final do teto para o total dos gastos, no Senado, significou a primeira grande vitória do projeto de ajuste fiscal, motivo de otimismo. A próxima etapa deve ser mais difícil, por tratar da Previdência, mas o tema tem de ser enfrentado para que o limite dos gastos, agora constitucional, possa ser cumprido.

As medidas de quinta-feira são o exemplo prático da possibilidade de o governo atuar nas duas frentes. Não falta o que fazer para atenuar a espessa burocracia que dificulta a operação das empresas, como também a vida das pessoas. Neste conjunto de medidas, tratouse, entre outras questões, da redução do tempo nas operações de comércio exterior, da simplificação do pagamento de tributos e contribuições previdenciárias. Este é um dos itens bastante mal avaliados na pesquisa periódica feita pelo Banco Mundial junto a um conjunto de países, sobre facilidades e dificuldades no cotidiano dos negócios.

Com razão, foi dado destaque à criação de facilidades para as empresas e contribuintes pessoas físicas saldarem dívidas tributárias vencidas até 30 de novembro. Há muita gente e companhias endividadas, e ajudá-las a limpar passivos é caminho indicado para desobstruir os caminhos da retomada do crescimento.

Deve o governo entender que as ações no plano da vida real de empresas e pessoas não se esgotam. Há sempre o que fazer, principalmente num país com arraigada cultura burocrática.

Para provar, existe a experiência ainda no governo militar de João Baptista Figueiredo, durante o qual foi criado o Ministério da Desburocratização. Ele existiu de 1979 a 1986, tendo sido tocado, no início, por Hélio Beltrão, responsável por medidas de impacto e necessárias — fim da firma reconhecida, do atestado de vida etc. O ministério foi extinto na redemocratização e, na inércia, a burocracia voltou.

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