terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Ajuste externo tranquiliza, mas é sinal de economia fraca – Editorial | Valor Econômico

O Brasil caminha para fechar o ano com um déficit em conta corrente de US$ 22 bilhões, ou 1,22% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com a mais recente revisão das projeções feita pelo Banco Central. Se prevalecer a expectativa do mercado financeiro apurada pela pesquisa Focus, o número será ainda menor, por volta de US$ 20 bilhões, ou 1% do PIB. No acumulado do ano até novembro o déficit acumula US$ 17,8 bilhões e marca um dos maiores ajustes das contas externas brasileiras, que registraram em 2015 um rombo que chegou a bater em 4,5% do PIB e fechou o ano em 3,3%, ou US$ 58,9 bilhões.

A crise econômica doméstica e a política de câmbio mais realista estão na raiz do ajuste. Os dois fatores combinados tiveram impacto poderoso na balança comercial. Até novembro, o saldo comercial acumulado é de US$ 40,8 bilhões, em comparação com US$ 17,7 bilhões em todo o ano de 2015. As exportações não superam a marca de 2015, mas as importações despencaram pela forte queda do consumo e dos investimentos em máquinas e equipamentos. O BC prevê que o saldo comercial feche 2016 em US$ 44 bilhões. Até a terceira semana deste mês, estava em US$ 45 bilhões e o mercado financeiro aposta que chegue ao redor de US$ 47 bilhões no fim do ano, com a tradicional queda das importações na última quinzena. Calcula-se que a balança comercial já garantiu três quartos do ajuste do balanço de pagamentos nos últimos 12 meses.

O déficit de serviços soma US$ 27,1 bilhões até novembro e mostra um recuo significativo em comparação com os US$ 36,9 bilhões de todo o ano de 2015. Apesar da apreciação cambial ter provocado a retomada dos gastos com viagens ao exterior, o saldo em onze meses está negativo em US$ 7,5 bilhões, inferior aos US$ 11,5 bilhões de 2015. O câmbio intensificou a remessa de lucros e dividendos, que soma US$ 15,7 bilhões até novembro, ainda assim distante dos US$ 20,8 bilhões de 2015, levando o saldo negativo da conta de rendas para US$ 34,3 bilhões em comparação com US$ 42,4 bilhões em todo o ano passado.

Na conta financeira, o investimento direto no país (IDP) surpreendeu mais uma vez e somou US$ 8,8 bilhões em novembro, acumulando US$ 63,7 bilhões no ano, inferior aos US$ 75,1 bilhões de todo o ano passado. Dados preliminares divulgados pelo Banco Central mostram que o IDP permanece em patamares elevados neste mês. Já o investimento estrangeiro no mercado de capitais ficou negativo nos últimos quatro meses, com resgates principalmente nas aplicações de renda fixa. No acumulado do ano, o saldo é negativo em US$ 18,5 bilhões - exatamente o oposto de 2015 quando ficou positivo nesse mesmo valor -, com as aplicações em bolsa neutralizando parcialmente o resgate de US$ 24,6 bilhões em renda fixa.

Para 2017, a expectativa do BC é de um pequeno aumento no déficit em conta corrente para US$ 28 bilhões, o equivalente a 1,47% do PIB. As projeções levam em consideração que a balança comercial deve fechar o ano que vem com superávit de US$ 44 bilhões, praticamente estável em relação a este ano, com aumento de 6% nas exportações, para US$ 195 bilhões. O balanço de serviços teria déficit de US$ 31,2 bilhões, um pouco mais alto dos que os US$ 29,3 bilhões projetados para este ano. As remessas de rendas, incluindo juros e lucros, passariam de US$ 40 bilhões para US$ 44 bilhões.

Novamente, o ingresso de Investimento Diretos no País, capitais mais estáveis geralmente direcionados para atividades produtivas, será mais do que suficiente para cobrir o déficit em conta corrente. Os ingressos de IDP são estimados em US$ 75 bilhões pelo BC, o equivalente a 3,84% do PIB, montante superior aos US$ 70 bilhões esperados para este ano, que correspondem a 3,88% do PIB.

Se os resultados forem confirmados, o balanço de pagamentos vai sair da zona de risco para mercados emergentes em que ficou nos últimos dois anos. O déficit em conta corrente é um dos importantes indicadores de solvência externa de um país. Há o consenso de que déficits acima de 3% do PIB representam um risco elevado, obrigando o país a tomar empréstimos ou atrair capitais estrangeiros para fechar as contas ou gastar suas reservas internacionais. Percentuais muito baixos, porém, indicam que o país está deixando de atrair poupança externa para financiar investimentos produtivos e, no caso brasileiro, são mais um sintoma do enfraquecimento econômico.

Nenhum comentário: