segunda-feira, 25 de abril de 2016

A hora e a vez de Lula - Ricardo Noblat

- O Globo

No passado, os golpes foram feitos com tanques e armas. Hoje, bastam mãos propensas a rasgar a Constituição Dilma Rousseff

Na tarde quente do domingo, 5 de junho de 2005, um homem de meia- idade e uma vidente famosa em São Paulo foram admitidos no apartamento do então presidente Lula, em São Bernardo do Campo. Lula e a mulher conversaram a sós por 20 minutos. Depois que ela foi embora, Lula contou ao homem sobre o terremoto que ameaçava desestabilizar o seu governo e sobre o que faria para tentar sobreviver.

NAS TRÊS SEMANAS anteriores, o noticiário girava em torno de um único assunto: a compra pelo governo de votos de deputados para aprovar projetos do seu interesse. Feita pelo deputado Roberto Jefferson ( RJ), presidente do PTB, a denúncia ganhara status de escândalo e estava prestes a ser alçada à condição de maior escândalo de corrupção desde a chegada do PT ao poder.

PARA ISSO, só faltava Jefferson conceder uma entrevista explicando em detalhes tudo o que dissera até ali e acrescentando novas revelações. Pouco antes da chegada do homem e da vidente ao seu apartamento, Lula ficara sabendo que já não faltava mais nada. Jefferson falara à jornalista Renata Lo Prete, da “Folha de S. Paulo”. E a entrevista seria publicada no dia seguinte.

ENTRE OUTRAS COISAS, Jefferson diria que deputados de partidos aliados do governo recebiam o que chamou de um “mensalão” de R$ 30 mil pago pelo tesoureiro do PT Delúbio Soares. Segundo Jefferson, ele alertara a respeito vários ministros do governo — entre eles, José Dirceu, da Casa Civil; e Antonio Palocci, da Fazenda. No janeiro anterior, alertara também o próprio Lula, que chorou.

“A ENTREVISTA DO Roberto vai virar o país de cabeça para baixo”, comentou Lula com o amigo que o ouvia em silêncio. “Todo mundo vai achar que o governo não se sustentará mais de pé e que talvez nem consiga chegar ao fim. Mas acredite: a montanha vai parir um rato. Pensam que vão me destruir. Pois vou me reeleger e fazer meu sucessor”.

LULA NÃO CONTOU como imaginava sobreviver. Mas como se falasse sozinho, aduziu em voz baixa: “Vou aproveitar para me livrar de Zé Dirceu e até de Palocci”. De Dirceu, Lula se livraria dali a um mês, ao forçá-lo a pedir demissão. Dirceu assumiu seu mandato de deputado federal, mas foi cassado. Acabou condenado a sete anos e 11 meses de prisão. Ficou 11 meses preso.

FOI PRESO novamente pela Lava- Jato no ano passado e virou réu. Quanto a Palocci, Lula se livrou dele em março de 2006, quando o caseiro Francenildo Costa teve seu sigilo bancário quebrado ilegalmente pelo governo. Francenildo havia flagrado Palocci uma dezena de vezes numa mansão de Brasília frequentada por prostitutas e lobistas.

O MENSALÃO NÃO foi um escândalo, e o petrolão, outro. Rodrigo Janot, procurador- geral da República, admitiu semana passada que os dois não passam de uma coisa só — um bilionário esquema de corrupção para sustentar no poder o PT e seus aliados. Lula reelegeu- se, elegeu Dilma e a reelegeu. Mas Dilma está a poucos dias de cair. E ele, Lula...

A LAVA- JATO DISPÕE de indícios e provas suficientes para prendê-lo por obstrução da Justiça, ocultação de bens em nomes de terceiros e recebimento de dinheiro por palestras que não fez. Lula só não foi preso ainda porque o Supremo Tribunal Federal avocou a responsabilidade de decidir o futuro dele, uma vez que Dilma o havia nomeado ministro. Em breve, pode mandar prendê-lo. Ou deixar que o juiz Sérgio Moro o faça.

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