segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Opinião do dia – Fernando Gabeira

A situação de Dilma e a do chavismo convergem para um mesmo ponto: tanto lá quanto aqui a aspiração majoritária é derrubá-los do poder. João Santana, num país onde se valoriza a esperteza, foi considerado um gênio. Gênio da propaganda enganosa, dos melodramas, dos ataques sórdidos contra adversários. O único critério usado é a eficácia eleitoral avaliada em milhões de dólares, certamente com taxa extra para os postes, Dilma e Haddad.

Sua obra continental se espelha também no resultado dos governos que ajudou a eleger: Dilma e Maduro são rejeitados pela maioria em seus países. O que aconteceu na semana passada é simplesmente o fim do caminho. Com abundantes documentos, cooperação dos Estados Unidos e da Suíça, não há espaço para truque de marqueteiros.

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Fernando Gabeira é jornalista, ‘É o fim do caminho’, O Globo, 28.2.2016

Pressionado pelo PT, ministro da Justiça decide deixar o governo

• Ministro da Justiça já confidenciou a interlocutores a intenção dedeixar o cargo; deputados do partido reclamaram de cerco a Lula

Vera Rosa e Luciana Nunes Leal - O Estado de S. Paulo

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, decidiu deixar o governo. Pressionado pelo PT após rumores de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria alvo de quebras de sigilos bancário, telefônico e fiscal no âmbito da Operação Lava Jato, Cardozo se sente injustiçado e revelou a interlocutores a decisão de entregar o cargo.

No sábado, 27, Lula se queixou de estar sendo perseguido pela Polícia Federal e pelo Ministério Público ao participar da festa de 36 anos do PT.

"Eu já fui prestar vários depoimentos. Recebi uma intimação de que, a partir de segunda-feira, vão quebrar meu sigilo bancário, telefônico, fiscal. O meu, da Marisa, do meu neto, se precisar até da minha netinha de um mês", disse o ex-presidente, sob aplausos. "Se esse for o preço que a gente tem que pagar para provar nossa inocência, que façam. A única coisa que quero é que, depois (…), me deem um atestado de idoneidade porque duvido que tenha alguém mais honesto que eu neste País."

A amigos com quem conversou neste domingo, Cardozo não escondeu o seu aborrecimento com os ataques e afirmou que o PT não entende o seu papel quando critica a falta de controle sobre a Polícia Federal. O ministro argumenta que a corporação tem autonomia para fazer investigações e ele só pode atuar em caso de violação de direitos.

No último dia 22, uma comissão de dez deputados federais do PT esteve no gabinete de Cardozo para fazer nova reclamação. Os parlamentares cobraram dele providências sobre as investigações relativas a Lula e pediram que a Polícia Federal centrasse fogo na apuração de denúncias contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Os petistas também disseram ao ministro ter certeza de que o objetivo da força-tarefa da Lava Jato era prender Lula e o criticaram até mesmo por tirar "selfies" com o "japonês da Federal", numa referência ao agente da PF Newton Ishii , que chegou a ser expulso da corporação em 2003 e foi reintegrado depois.

A prisão do marqueteiro João Santana, que fez campanhas de Dilma e Lula, também reforçou a pressão feita por setores do PT, com apoio do ex-presidente, para que Cardozo seja substituído.

No ano passado, Cardozo chegou a comunicar a Dilma a intenção de deixar o cargo, mas atendeu a um apelo da presidente e permaneceu no ministério. Já na época ele era alvo de críticas do PT por causa da Operação Lava Jato.

Senado vai protelar decisão sobre Delcídio

• Integrantes do Conselho de Ética afirmam não ter como fazer julgamento político antes do fim de processo judicial

Isabela Bonfim - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O Senado pretende esperar o avanço dos inquéritos sobre Delcídio Amaral (PT-MS) no Supremo Tribunal Federal (STF) para dar continuidade ao processo contra o senador no Conselho de Ética da Casa. A estratégia para protelar o julgamento do petista no Legislativo, que poderia resultar em sua cassação, é alegar falta de informação sobre os casos em tramitação na corte suprema.

Delcídio foi preso preventivamente em novembro, acusado de tentar dificultar as investigações da Operação Lava Jato. Ele foi solto em 19 de fevereiro, mas responde a três inquéritos no STF por suposto envolvimento no esquema de corrupção na Petrobrás. As peças das investigações são mantidas em segredo de Justiça. Embora alegue falta de dados sobre os casos, o Senado não fez nenhum requerimento de informação desde que foi protocolada a representação contra o senador no Conselho de Ética, há três meses.

A estratégia para atrasar o andamento do processo foi dada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), logo após a primeira reunião do conselho, na última quarta-feira. “O Conselho de Ética não tem como inverter o processo e fazer um julgamento político sem saber o que acontece no processo judicial. É preciso conectar as coisas”, defendeu. Segundo ele, a lógica do colegiado é avaliar como o processo político leva em conta o que está acontecendo no processo judicial. Por isso, alega, o acesso aos inquéritos seria essencial.

A interpretação de Renan segue um dos principais argumentos enviados ao Senado pelo advogado de defesa de Delcídio, Gilson Dipp, ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Dipp defende o direito à presunção de inocência, que admite que Delcídio não tem culpa até que seja condenado pela Justiça. A defesa caracteriza como “dano irreparável” qualquer punição no Senado, caso Delcídio seja inocentado posteriormente pelo Supremo.

Espera. Após a declaração de Renan, o posicionamento rapidamente se difundiu entre os demais senadores. Entre integrantes do conselho, predomina a avaliação de que o Senado não deve deliberar sobre a cassação de Delcídio antes de uma decisão do STF.

A ideia de alongar o processo contra Delcídio é pluripartidária. Tanto os senadores do PT quanto da oposição estão desconfortáveis com a situação de julgar um colega de trabalho. Delcídio teria ameaçado entregar outros senadores envolvidos em esquemas de corrupção em delação premiada – o que o senador desmentiu, em carta enviada aos pares. A cúpula do PMDB, que possui três senadores investigados pela Lava Jato, é a mais engajada em atrasar a tramitação do processo.

Não há consenso entre os senadores se é preciso aguardar eventual julgamento de Delcídio ou se somente uma possível denúncia do Ministério Público Federal à Justiça seria suficiente para fazer o processo no conselho andar com celeridade. O colegiado é uma instância diferente da Justiça e, ao avaliar outros casos, não atrelou suas atividades ao Judiciário.

Prazos. O presidente do conselho, João Alberto Souza (PMDB-MA), aliado de Renan, avalia que se trata de uma questão delicada. Ele não soube responder se será necessário esperar pela decisão do STF. “Vamos supor que se faça uma opção pela condenação de Delcídio agora e, mais tarde, o tribunal decida por inocentá-lo. Como fica?”, questionou.

Não há previsão para que o STF dê encaminhamento às investigações sobre Delcídio. João Alberto, que previa que o processo fosse finalizado em até 60 dias, já avalia que a tramitação possa ser mais longa caso o relator julgue necessário receber mais informações do tribunal. “Até agora, o único documento que temos contra o senador Delcídio é a degravação de uma conversa. Os senadores e o relator vão decidir se precisam solicitar mais documentos”, explicou.

Gestão Dilma é reprovada por 64%, diz Datafolha

• Pesquisa revela que 60% dos entrevistados defendem aprovação do impeachment pela Câmara

- O Globo

Pesquisa Datafolha, divulgada pelo jornal ‘ Folha de S. Paulo” mostrou que 64% dos entrevistados avaliam o governo da presidente Dilma Rousseff como ruim e péssimo. Os que consideram o governo regular somaram 25% do total, enquanto 11% o avaliam como ótimo ou bom. Segundo o instituto, Dilma atingiu o pico de desaprovação em agosto, quando chegou a 71% . A avaliação negativa recuou nas últimas pesquisas — em dezembro, a reprovação era de 65%.

A aprovação, por outro lado, caiu um ponto percentual. Na última pesquisa, realizada em dezembro, 12% dos entrevistados consideravam a gestão de Dilma ótima ou boa. O Datafolha realizou o levantamento nos dias 24 e 25 de fevereiro. As somas podem passar ou ficar abaixo dos 100% por conta de arredondamentos, informou o instituto.

Os entrevistados também foram questionados sobre o impeachment. Indagados se, com o pedido de impeachment da presidente aceito pela Câmara, os deputados deveriam votar pelo seu afastamento, 60% responderam que sim. Para que o processo siga para o Senado, onde o caso será julgado, é preciso que dois terços dos 513 deputados votem pela abertura do impeachment.

Do total, 33% responderam que não; 4% se disseram indiferentes e 3% responderam que não sabem.

A pesquisa, ao sondar se os entrevistados entendem que Dilma deveria renunciar, constatou que 58% responderam sim. As respostas negativas ficaram em 37%, enquanto responderam que não sabem.

O instituto também questionou os entrevistados sobre se, na opinião deles, a situação econômica do país melhorou, piorou ou ficou como estava nos últimos meses. Para 80% dos entrevistados, a economia piorou e apenas 5% consideram que houve melhoria na situação econômica do país e 14% acham que ficou como estava. (Com G1)

Rejeição a Lula cresce, mas oposição patina, diz pesquisa

Graciliano Rocha – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - A 32 meses da eleição de 2018, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ostenta rejeição de metade do eleitorado, mas o petista não é carta fora do baralho da sucessão de Dilma Rousseff.

Nomes conhecidos da oposição –os tucanos Aécio Neves e Geraldo Alckmin e Marina Silva (Rede)– estão estagnados ou encolheram, segundo o Datafolha.

Hoje, 49% dos eleitores afirmam não votar de jeito nenhum em Lula. É uma tendência crescente: em novembro, eram 47%, em dezembro, 48%. Aécio é o segundo em rejeição, com 23%.

"Pode ser um copo meio cheio ou meio vazio, dependendo do ponto de vista do observador", diz Alessandro Janoni, diretor de pesquisas do Datafolha.

A má notícia para o ex-presidente é que a rejeição é superior à dos meses seguintes à revelação do mensalão, em 2005, quando seu governo mais correu risco.

O copo meio cheio é a rejeição ter subido dentro da margem de erro (dois pontos), mesmo após pessoas próximas do ex-presidente –o pecuarista José Carlos Bumlai e o marqueteiro João Santana–terem sido presas por ordem do juiz Sergio Moro.

A relação de Lula com empreiteiras alvos da Lava Jato, que bancaram reformas em imóveis ligados a ele, é apurada em São Paulo e no Paraná.

Segundo Janoni, três variáveis determinarão a viabilidade de Lula como candidato: o tempo que falta até 2018, o estado da economia sob o governo Dilma Rousseff e a Operação Lava Jato.

"O mensalão foi um exemplo da capacidade de recuperação. A taxa de rejeição dele é alta hoje, mas ainda há um contingente grande (37%) que o considera o melhor presidente que o país já teve e uma percepção do eleitor de que haverá melhoras na economia", afirma Janoni.

Oposição
A crescente rejeição de Lula ainda não rendeu dividendos para a oposição, segundo quatro cenários eleitorais pesquisados pelo Datafolha.

Em um deles, Aécio Neves ainda lidera, mas escorregou três pontos percentuais (de 27% para 24%) desde dezembro. Lula e Marina seguem-no, estáveis, em situação de empate técnico –20% e 19%, respectivamente.

Num cenário com Geraldo Alckmin como o postulante do PSDB, Marina está na dianteira com 23%, Lula aparece com 20% enquanto o governador de São Paulo fica na terceira posição (12%).

Nos dois cenários, o quarto colocado é o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ).

O Datafolha indica que a "crise de representação", nas palavras de Janoni– é um fenômeno em crescimento.

De dezembro para cá, os únicos a avançar no limite da margem de erro foram o ainda nanico Bolsonaro (chegou a 7%) e a vontade de não votar em ninguém. A opção do voto nulo ou branco chega a 19%.

Lula prioriza sua defesa e a do PT e vê Dilma em 2º plano

Marina Dias – Folha de S. Paulo

No momento de maior afastamento da presidente Dilma Rousseff, Luiz Inácio Lula da Silva fez chegar à sucessora o recado de que pretende se concentrar em sua defesa pessoal e na reconstrução da imagem do PT, deixando em segundo plano a advocacia do governo.

Um dos principais interlocutores de Lula dentro do Planalto, o ministro Jaques Wagner (Casa Civil) viajou a São Paulo na terça (23) para ouvir os recados do ex-presidente.

O movimento de Lula foi acompanhado já na semana passada pelo seu partido, que fez duras críticas à aprovação, com apoio do Planalto, de um projeto no Senado que diminui o peso da Petrobras na exploração do pré-sal.

Além disso, o Diretório Nacional do PT aprovou texto rejeitando o ajuste fiscal e pedindo a volta de políticas dos anos Lula no poder, como estímulo ao crédito, para tentar reanimar a economia.

Dilma, por sinal, não compareceu ao encontro partidário neste sábado (27). Para tentar amainar o clima, o entorno dilmista quer viabilizar um encontro entre os dois nesta semana, mas até o domingo (28) a posição oficial do Instituto Lula era de que isso não deveria acontecer.

Não é a primeira vez que Lula envia esse tipo de sinal, mas o momento é considerado o de maior fissura entre os dois. Contra a ideia de um rompimento formal há a avaliação de que um naufrágio do governo da sucessora invariavelmente afetaria Lula.

No cálculo de Lula, apurado com aliados, ele havia estipulado junho como prazo final para avaliar sua situação política, a do governo e a do partido. A partir daí, decidiria sobre a a candidatura à Presidência em 2018.

Além da má avaliação do governo Dilma, pesa contra Lula o fato de sua imagem pessoal estar comprometida. Ele é investigado por suposto tráfico de influência para empreiteiras no exterior e por causa do tríplex no Guarujá (SP) e do sítio em Atibaia (SP).

Lula nega as acusações e diz que há setores da mídia e do Judiciário buscando "criminalizá-lo". Por isso, diz, é preciso se concentrar em uma linha de defesa mais precisa.

O plano original de Lula, porém, foi suspenso com as novas medidas de ajuste fiscal e com a prisão do marqueteiro João Santana, que trabalhou na sua reeleição, em 2006, e nas duas campanhas de Dilma, em 2010 e 2014.

Segundo a Folha apurou, Lula classificou como "pífias" as primeiras propostas do novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, outrora aliado.

Segundo Lula diz a aliados, Dilma, que chegou ao PT em 2001, não está comprometida com o projeto partidário.

Os dois têm conversado cada vez menos e, segundo relatos, as últimas reuniões foram "protocolares". Lula reclama que Dilma ouve suas sugestões, mas não faz nada.

Como oferta de trégua, o ex-presidente insiste em ter a cabeça de José Eduardo Cardozo (Justiça). Para Lula, ele é o responsável pelo avanço das investigações ao coração do PT e do Planalto por não controlar a Polícia Federal.

No sábado, o ex-presidente disse em discurso em festa do PT ter recebido a informação de que terá seus sigilos bancário, telefônico e fiscal quebrados.

Lula é alvo de investigações em Brasília, São Paulo e em Curitiba. Procuradores negam já ter formulado pedidos de quebra de sigilos dele. Sob anonimato, um investigador diz que, ao dar a declaração, o petista busca se vitimizar aos olhos da opinião pública.

Colaborou Graciliano Rocha, de São Paulo

Acusados da Lava Jato tentam criar 'teoria da conspiração', diz procurador

Felipe de Oliveira – Folha de S. Paulo

RIO - O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, rebateu as críticas do ex-presidente Lula, que, durante festa de aniversário de 36 anos do PT no sábado (27), acusou o Ministério Público e a imprensa de trabalhar para "destruir o PT". Dallagnol afirmou que alguns acusados, "diante da robustez das provas", têm buscado agredir o acusador para tentar tirar a credibilidade da acusação

"Existem basicamente dois modos de você responder uma acusação. O primeiro modo é mostrar que aquilo que a pessoa disse é mentira e que está errado. O segundo é desacreditar e tirar a credibilidade das pessoas que te acusam. O que vários acusados têm feito diante da robustez das provas é buscar agredir o acusador, tentando tirar desse modo a credibilidade. Mas isso é criar uma espécie de teoria da conspiração." afirmou o procurador

Dallagnol esteve na noite deste sábado (28) na Primeira Igreja Batista de Campo Grande, zona oeste do Rio, para dar uma palestra sobre a campanha "10 medidas contra a corrupção" para cerca de 2.000 jovens

As "10 medidas contra a corrupção" são um pacote de ações que tem como objetivo a apresentação de um projeto de lei de iniciativa popular ao Congresso Nacional, com medidas que buscam o aperfeiçoamento do sistema jurídico, de modo a reprimir a corrupção no Brasil. Entre as medidas estão: penas maiores para casos de corrupção (atualmente a pena máxima de prisão é de apenas dois anos), novas punições para partidos que cometerem "caixa dois" e a criminalização de enriquecimento ilícito, mesmo sem a comprovação do crime de corrupção

Após o evento, Dallagnol disse à Folha que o Ministério Público Federal está aguardando mais informações vindas da Suíça, que podem revelar novos fatos sobre o caso. "Existem muitas perspectivas novas. Investigações sendo desenvolvidas em relação a outros setores da Petrobras, perspectivas de novas colaborações que estão sendo tratadas, e existe também a expectativa de que venha um grande material da Suíça trazendo contas de pessoas usadas para pagar e receber propina."

Segundo ele, das 300 contas reveladas pelo procurador-geral suíço, que são suspeitas de terem sido usadas para pagamento de propinas, apenas cerca de 10% foram analisadas pela força-tarefa brasileira.

"O procurador-geral suíço quando veio ao Brasil, há cerca de um ano, falou que havia investigação sobre mais de 300 contas lá. Não vieram para cá 10% dessas 300 contas. Durante esse tempo certamente as investigações lá se expandiram. Existe um grande copo aprobatório de fatos que a gente ainda não tem conhecimento, que está lá e que em algum momento virá para o Brasil e repercutirá em novas investigações e novas delações aqui."

Sobre as "10 medidas contra a corrupção", o procurador disse que o próximo passo é levar as assinaturas até o Congresso para formalizar a entrega e "simbolicamente demonstrar o apoio popular", para que os projetos não sejam só aprovados, mas de modo rápido.

Ao lado do juiz Sergio Moro, Dallagnol é uma das caras mais visíveis da operação Lava Jato. Ele diz que não pensa em qualquer cargo eletivo.

"Nunca tive qualquer intenção em concorrer ou participar de atividade político-partidária ao longo da minha história. O nosso objetivo é servir a sociedade. Muitas pessoas colocaram suas esperanças em nós, acreditando que nós seríamos capazes de conduzir um processo de transformação, mas o que fazemos quando oferecemos a sociedade 10 medidas contra a corrupção é devolver o protagonismo."

Ele afirmou ainda que crê em uma redução dos casos de corrupção no Brasil, se o país passar por uma transformação social.

"Isso passa por uma transformação social eu nós não podemos implementar da noite para o dia, mas nós podemos atuar sobre condições que favoreçam esse processo. É necessária existência de campanhas para curar a corrupção com educação. Para que todos nós desenvolvamos uma intolerância real a corrupção, não só a grande corrupção, mas aquela pequena corrupção que acaba gerando um ambiente propício para o surgimento da grande."

Gilmar questiona pagamentos da campanha de Dilma

Por Carolina Oms – Valor Econômico

BRASÍLIA - O vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, pediu apuração de pagamentos da campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff feitos a sete empresas que prestaram serviços nas eleições de 2014.

O ministro atendeu pedido do PSDB, que apontou indícios de "irregularidade e ilegalidade na contração e pagamento efetuado a empresas que não possuem capacidade operacional para prestar os serviços avançados pela campanha do PT, bem como evidências de que as empresas aparentemente de fachada foram contratadas por valores exorbitantes e desproporcionais".

As notas fiscais de prestação de serviço devem ser enviadas ao Ministério Público estadual e federal, Receitas federal e estadual, Polícia Federal e Conselho de Administração de Operações Financeiras (Coaf) "para providências cabíveis". Se estes órgãos avaliarem que as irregularidades são graves, podem abrir novas investigações.

A coordenação jurídica do comitê de Dilma informou que recorrerá da decisão por considerá-la "inconstitucional, com ofensa aos princípios do respeito à coisa julgada, do contraditório e a ampla defesa, e da imparcialidade". "Oportuno frisar, mais uma vez, que as contas da campanha presidencial foram aprovadas por unanimidade pelo TSE", concluiu em nota.

As empresas apontadas pelo partido de oposição são: Mariana Produtos Promocionais Ltda; Rede Seg Gráfica e Editora; Vitor H G de Souza Design Gráfico; Marte Ind. e Com. de Artefatos de Papéis Ltda; Francisco Carlos de Souza Eirelli; Door2Door Serviços Ltda; e DCO Informática.

As empresas receberam um total de R$ 23,3 milhões dos cofres da campanha petista por atividades principalmente na área de publicidade. O valor representa 6,6% do custo total da campanha da petista.

O pedido foi feito dentro da prestação de contas da campanha presidencial, que foi aprovada com ressalvas no fim de 2014.

Segundo a decisão do ministro que pediu apurações a diversos órgãos, o PSDB quer saber se houve "indícios de participação de empresas incapazes de cumprir com o objetivo contratado na campanha de Dilma Rousseff, o que poderá ensejar práticas criminosas, inclusive, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha".

O PSDB também solicitou apuração suposta inserção de declaração falsa de valores em notas fiscais das empresas.

Em outubro do ano passado, a PF abriu inquérito para apurar eventuais ilegalidades encontradas também na prestação de serviço de empresas contratados pela campanha, entre elas a Focal Confecção e Comunicação, que recebeu R$ 23,9 milhões pelos serviços prestados à campanha.

Sem utopia, o jogo de simulações entre a presidente e o PT

Por Cristian Klein – Valor Econômico

RIO - "Dilma, chega de ajuste fiscal, e superávit". A faixa estendida numa mesa lateral do seminário que comemorou os 36 anos do PT, no Rio - festejados em show esvaziado com a presença de Lula - era só um pequeno sinal do clima que aparentemente distancia o partido e a presidente. A orelha de Dilma queimou nas conversas dos petistas presentes ao simpósio da Fundação Perseu Abramo (sexta e sábado) e na reunião do diretório nacional (sexta), quando o PT lançou um Programa Nacional de Emergência, com 22 pontos para tirar o país da recessão e retomar o crescimento. É uma espécie de documento "Uma Ponte para o Futuro", só que à esquerda, para o desenvolvimentismo, diziam petistas, numa referência às propostas lançadas pelo PMDB, no ano passado.

Dilma, porém, não quer se comprometer com o PT. O distanciamento ficou tão evidente que preferiu alongar sua visita ao Chile. Evitou a saia-justa e a festa de um aniversário sem muitos motivos para comemorar. Atrair a massa de militantes foi uma utopia, nome digno para o armazém do porto que abrigou cerca de 1.500 pessoas, quando o esperado eram 4 mil. Mesmo com o chamariz de um cantor de samba popular e de Lula. Entre a base de militantes - em regra mais radicais que líderes partidários - e Dilma, o ex-presidente fez o papel que sempre cumpriu, o de amálgama, ou de cimento ideológico do PT.

Será que vai colar? Nos bastidores, houve quem traçasse um cenário ameaçador, quase de rompimento com Dilma, caso a presidente insista em se apoiar no aperto fiscal para superar a crise. "Não há governo, na história, que se sustente adotando um programa contrário ao que defendeu para se eleger", apontava um petista de São Paulo.

Menos catastrófico, o ministro Edinho Silva dizia ser possível o PT ceder nas negociações - mas não agora. Outros, como ele, lembravam que "é governo de coalizão".

Ou um jogo de simulação. O PT faz discurso para agradar seu eleitorado, e Dilma para acalmar o mercado.

Obras no sítio em Atibaia custaram mais de R$ 1 milhão

Bela Megale, Flávio Ferreira – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - As obras no sítio em Atibaia (SP) frequentado pela família do ex-presidente Lula custaram mais de R$ 1 milhão, em valores atualizados, segundo fornecedores de materiais e serviços ouvidos pela Folha, pelo Ministério Público de São Paulo e interlocutores de uma construtora que trabalharam no local a partir do fim de 2010, quando Lula ainda era presidente.

Quase a totalidade dos produtos e serviços foi paga em espécie, conduta incomum que levanta a suspeita de que os recursos possam ter origem ilícita. Até agora nenhum dos envolvidos assumiu ter arcado com os valores relativos à construção da edificação que se tornou a principal área do sítio.

Em depoimento na operação Lava Jato, o engenheiro da Odebrecht Frederico Barbosa apontou como uma das executoras das obras uma pequena empreiteira que tem como principal cliente e "parceira" a própria Odebrecht.

A Rodrigues do Prado, construtora de Igaratá, no Vale do Paraíba (SP), que tem como dono Carlos Rodrigues do Prado, atuou na propriedade entre dezembro de 2010 e janeiro de 2011, segundo Prado relatou a interlocutores.

A lista dos seis principais clientes indicados no site da construtora traz cinco empresas ligadas à Odebrecht: a Construtora Norberto Odebrecht Brasil, a Concessionária Rota das Bandeiras, a CBPO Engenharia, a Odebrecht Serviços de Engenharia e Construção e a Construtora Norberto Odebrecht. A empresa também diz ter "parcerias firmadas" com as empresas do Grupo Odebrecht.

Em petição protocolada no STF (Superior Tribunal Federal) na sexta (26), a defesa de Lula afirma que ele tinha conhecimento que o pecuarista José Carlos Bumlai, preso na Lava Jato, ofereceu a reforma ao petista, de quem é amigo, e "depois, diante de algumas dificuldades técnicas, a obra foi concluída por uma empresa situada a cerca de 50 km do 'Sítio Santa Bárbara'".

Os relatos de Prado e Barbosa indicam que a empreiteira mencionada pelos advogados de Lula é a Rodrigues do Prado. Seu dono disse a interlocutores que entrou na obra por indicação de Barbosa quando ela já estava em andamento, e que à época recebeu R$ 200 mil (R$ 280 mil, atualizados) em espécie.

À Folha, a ex-dona de uma loja de materiais de construção de Atibaia que forneceu produtos disse que a Odebrecht bancou parte das obras, que consumiram R$ 500 mil (R$ 700 mil corrigidos) só em materiais, pagos em espécie. A construtora nega ter assumido esses custos.

Segundo relato do dono da empresa Fernandes dos Anjos e Porto Montagem de Estruturas, Adriano dos Anjos, ao Ministério Público, a empresa recebeu R$ 40 mil (R$ 55 mil atualizados) da Usina São Fernando, pertencente aos filhos de Bumlai, para montar a estrutura de metal do anexo com quatro suítes. Segundo Santos, o serviço foi pago com depósito bancário.

Em janeiro, o marceneiro Antônio Carlos Oliveira Santos, 45, disse ter recebido R$ 5.400 (R$ 7.500 corrigidos) em espécie das mãos de Barbosa por serviços no sítio.

Outro lado
Procurada pela reportagem, a Odebrecht disse por meio de nota que a empresa e seus integrantes estão colaborando com as autoridades e que "todos os esclarecimentos estão sendo prestados no âmbito do inquérito em curso, que corre em sigilo".

A Folha pediu à assessoria de Lula uma manifestação sobre o fato de a Odebrecht estar ligada às obras no sítio frequentado por ele. A assessoria, porém, não respondeu especificamente sobre esse tema e pediu a reprodução de nota na qual aponta que Lula e sua família usam o sítio de seus amigos em fins de semana e que tal fato não tem relação com ato ilícito.

Deputados falam em 'feirão' para troca de partido

• Parlamentares citam ofertas de cargos, de controle de diretórios e de dinheiro; mudanças de legendas poderão ser feitas até 18 de março

Adriano Ceolin - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A janela para trocas partidárias – aberta no dia de 18 deste mês e que vai até 18 de março – transformou o Congresso num “feirão” para a filiação de deputados e senadores. As ofertas são das mais diversas: cargos, controle de diretórios regionais e até dinheiro.

“Tem dirigente de partido com promessa de pagar até R$ 2 milhões para ter um deputado”, afirmou Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SP), presidente do Solidariedade (SD). “Se eu meu partido perder deputado, vou dizer quem é”, completou Paulinho.

Conforme apurou o Estado, as legendas que têm apresentado ofertas mais agressivas são o PP, o PSD e o PR. Condenado no mensalão e cumprindo pena em regime semiaberto, o ex-deputado Valdemar Costa Neto (PR) tem recebido parlamentares no seu escritório em Brasília. “Eu estive com o Valdemar, mas ainda não decidi o que farei. Tenho ofertas da Rede e do PP também”, disse o deputado Ricardo Izar (PSD-SP).

O principal objetivo de Izar é controlar diretórios em cidades em que pretende pedir votos para se reeleger em 2018.

O presidente nacional do PP, senador Ciro Nogueira (PI), tem se envolvido diretamente nas discussões. Na semana passada, ofereceu cargos na estrutura da liderança da Câmara para deputados de outras siglas migrarem para o PP.

Um dos assediados foi o deputado José Mainha (PI), que ainda não decidiu se troca o Solidariedade pelo PP. Em entrevista ao Estado, Ciro Nogueira admitiu que a oferta de cargos em liderança ocorre, mas não é o principal atrativo.

“Não vou negar que todo deputado que entra no partido acaba tendo cargos em liderança. Isso ocorre em todos os partidos”, afirmou Ciro. “Mas isso não é decisivo. O que tem sido determinante é o controle do partido no seu Estado de origem.”

Por meio de sua assessoria de imprensa, o ex-deputado Valdemar Costa Neto disse que nunca deixou de se encontrar com políticos. Ele negou, porém, agir para atrair deputados para a legenda durante o período de janela partidária.

Emenda. No último dia 18, o Congresso promulgou uma emenda constitucional autorizando, por um mês, a troca de partido por políticos eleitos para cargos proporcionais durante o exercício dos mandatos (vereadores, deputados estaduais e federais).
Em 2007, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) havia decidido proibir a troca de sigla durante o mandato, a fim de garantir a legislação que impõe a fidelidade partidária. Há a expectativa de que até 10% dos 513 deputados troquem de partido.

Outra alternativa para a troca de partido é o ingresso numa sigla recém-fundada. Recentemente, um grupo de 19 deputados ingressou no PMB (Partido da Mulher Brasileira). Agora, com a janela partidária, grande parte deles deve deixar a sigla.

Até mesmo o primeiro líder do PMB vai deixar o partido. Domingos Neto (CE), que já havia sido líder do PROS, pretende se transferir para o PSD, presidido pelo ministro Gilberto Kassab (Cidades).

‘Penso que na Lava Jato tudo ocorre dentro da normalidade’, diz Toffoli

Entrevista - Dias Toffoli Ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral

Luiza Muzzi - O Tempo (MG)

Em Belo Horizonte, na última sexta-feira, para palestrar em evento do TRE de Minas, o ministro José Antônio Dias Toffoli falou com exclusividade a O TEMPO sobre seu trabalho à frente do TSE, desafios das eleições municipais, corrupção, cassação presidencial e condução da operação Lava Jato.
No momento em que o país acompanha com expectativa os desdobramentos políticos e o curso do processo que pode até tirar o mandato da presidente da República no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Dias Toffoli, presidente da Corte, afirma que as pressões populares não irão interferir nas decisões da Justiça. “Todo juiz tem que estar acostumado a ouvir pedidos e reclamações. Ele não se submete à pressão popular”, diz em entrevista, cujos principais trechos você confere abaixo.

Veja entrevista

Qual avaliação o senhor faz de sua gestão na presidência do TSE?

Foi de muito trabalho. Tivemos a eleição presidencial mais disputada da história, um trabalho de auditoria das urnas, pedido pelo candidato Aécio Neves, uma ampliação e retomada do sistema de identificação biométrica, com o recadastramento, e estamos com meta de chegar até o dia 4 de maio com 50 milhões de brasileiros recadastrados. Também tivemos grande atuação na área internacional e junto ao Parlamento. Encaminhamos ao Congresso um projeto para transformar a identificação biométrica na identificação nacional do cidadão.

Quais são as expectativas para as próximas eleições, considerando o atual cenário político? Como o TSE pode evitar a possibilidade de caixa dois no pleito?

Nesta eleição não haverá dinheiro de empresas. Isso é bastante positivo e salutar. Temos assistido a investigações e escândalos que demonstram que essa proximidade entre o dinheiro das empresas e a política tem se mostrado nefasta e acaba por criar situações que geram crimes. Outra mudança foi estabelecer limites de gasto eleitoral. Até 2014, era o próprio candidato que se autolimitava e dizia quanto ia gastar, o céu era o limite. Como identificar um abuso do uso de recursos em campanha se você não tem um parâmetro equânime para todos os candidatos? As eleições de 2016 terão essas novidades.

Quais são os desafios do TSE na mediação de conflitos eleitorais nesse ambiente político de guerra que o Brasil vive?

O papel é ser ao mesmo tempo aquele que organiza e que julga as eleições. Temos que ter diálogo constante com os partidos políticos e candidatos, que são a clientela da Justiça Eleitoral, e por outro lado temos que garantir que o eleitor possa se dirigir à urna com a consciência tranquila e fazer uma escolha absolutamente livre. E para isso a Justiça Eleitoral está preparada historicamente. O Judiciário, por ser um poder que não interfere, tem tranquilidade de arbitrar as disputas políticas. O grande desafio dessa eleição são os números. Talvez seja a eleição organizada em um único dia maior que exista no mundo. São 550 mil candidatos que teremos disputando vagas de prefeito e vereador. Só entre registro de candidatura e prestação de contas, se gera em poucos meses mais de um milhão de processos.

Como o senhor avalia o atual momento de combate à corrupção no Brasil?

O combate à corrupção é uma constante, e cada vez mais foram criados instrumentos que permitem maior fiscalização. O que podemos dizer e nos orgulhar, embora muitas vezes os fatos nos deixem tristes de verificar situações de corrução, é que há um outro lado da moeda. O Brasil hoje está com instituições funcionando, com regras de alto nível internacional para que se possa combater o crime organizado, a corrupção e então evitar que nós continuemos a viver em uma sociedade do jeitinho, em que os amigos são privilegiados. Estamos cada vez mais indo para uma atuação mais impessoal, independente, e é isso que se deseja do Estado. Não que (a corrupção) não existiu no passado, é que não havia instituições capazes de fazer tais fiscalizações e de levar isso ao Poder Judiciário.

Qual é o peso da pressão das ruas nas decisões da Justiça Eleitoral?

Todo juiz tem que estar acostumado a ouvir pedidos e reclamações. Ele não se submete à pressão popular. Se submete ao ordenamento jurídico, à Constituição e às leis. O ofício judicante tem essa grandeza: ao ser juiz, você tem a frieza de ouvir todos os lados e chegar, de acordo com o ordenamento jurídico, à melhor solução. Então, não há que se falar em pressão sobre a Justiça. É uma responsabilidade grande e a Justiça Eleitoral tem agido sempre com presteza e eficácia. A Justiça Eleitoral é reconhecidamente uma Justiça célere, e nunca deixou de aplicar sanções. Inclusive já tivemos até senador cassado por compra de voto, governadores afastados por abusos da máquina administrativa. São inúmeros os casos que a Justiça decide, porque ela tem por finalidade garantir que aquele que foi eleito foi eleito de maneira limpa, dentro das regras do jogo.

Mas nesse momento estamos diante de um limite, que atinge a disputa presidencial.

É a primeira vez que há uma ação de tal envergadura envolvendo a campanha presidencial. Se houver provas que levem a demonstrar que houve algum tipo de desvio ou influência nefasta de recursos não declarados na campanha, a Justiça Eleitoral decidirá como decide sempre, afastando aqueles que foram eleitos de maneira ilegal. Se não houver prova nesse sentido, vai se decidir no sentido da manutenção do mandato.

Trata-se de decisão que impacta o país. Existe tranquilidade então para lidar com essas ações?

Assim como (a Justiça) atua no âmbito de prefeitos, governadores e parlamentares, não há porque não atuar também no âmbito da Presidência da República, desde que provocada. Este processo (que pede a cassação de Dilma) não foi criado pela Justiça Eleitoral. Foi uma proposição feita pela candidatura que chegou em segundo lugar. E cabe a nós julgarmos.

Como é o desafio de mediar conflitos no âmbito do Congresso, mas, ao mesmo tempo, sem invadir as atribuições do Legislativo?

Isso aflige as cortes constitucionais no mundo inteiro. Cada vez mais o Parlamento tem encontrado dificuldades de resolver temas que são muito quentes e que dividem a sociedade de maneira igual, como aborto, casamento homossexual. O que nós assistimos nos últimos tempos é que as demandas às cortes constitucionais têm aumentado na mesma medida em que o Parlamento não consegue responder à rapidez da sociedade atual. E por curioso que possa parecer, o Judiciário, que é, muitas vezes, mais lento, acaba sendo provocado à resolução desses grandes problemas que no Congresso ficam sem resposta. E aí surge a pergunta: o Judiciário está invadindo a competência do Legislativo? Mas sempre tem aquela resposta: é que o Judiciário não tem o poder de ação, é provocado. Se aquilo está dentro do que diz a Constituição, temos que dar uma resposta.

Como o senhor avalia a condução dos processos da operação Lava Jato?

Esse processo no Supremo tem por relator o ministro Teori Zavascki. E até agora suas decisões vêm sendo mantidas pelo colegiado. Este processo já desdobrou em outras investigações. Eu penso que tudo ocorre dentro da normalidade, com direito a ampla defesa, com acesso ao Judiciário, acesso aos órgãos. Isso faz parte do Estado democrático de direito.

A favor do Brasil - Aécio Neves

- Folha de S. Paulo

Temos um embate muito claro no Brasil de hoje. De um lado, ideias ultrapassadas que insistem em um modelo que privilegia o Estado centralizador, demoniza o capital privado, subestima os fundamentos econômicos e dispõe da máquina pública para servir a um projeto de poder. O resultado é o país imerso em escândalos e com a economia em frangalhos.

De outro lado – e estamos falando da grande maioria dos brasileiros – estão os que acreditam na urgência de se promover mudanças capazes de resgatar o país e recolocá-lo em uma rota de crescimento e credibilidade.

Ciente de suas responsabilidades neste momento delicado, a oposição tem dado provas concretas de que fará o que for possível em favor do Brasil.

Duas vertentes têm nos mobilizado: a primeira passa por manter o apoio claro e decidido à operação Lava Jato, assim como às investigações que se dão no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral e por fortalecer a crítica aos descaminhos desse governo.

A segunda é o esforço para, mesmo sendo minoritários nas duas Casas do Congresso Nacional, garantir a aprovação de iniciativas que possam sinalizar o início de um novo momento no país. 

Alguns projetos em tramitação ilustram bem este movimento. A mudança na lei do petróleo, proposta pelo senador José Serra, é um bom exemplo. A iniciativa é tão significativa que a Firjan já calcula que a nova regra, ao destravar os processos licitatórios e estimular a cadeia de fornecedores da indústria, pode trazer US$ 420 bilhões em investimentos até 2030.

Também é urgente enfrentar o loteamento político no Estado e a ineficiência dos serviços públicos, que tanto prejudicam os brasileiros

O projeto de lei 555, de autoria do senador Tasso Jereissati, estabelece normas de governança corporativa para as empresas públicas e torna a gestão mais transparente. Já o projeto do senador Paulo Bauer combate o aparelhamento político dos fundos de pensão das estatais, que, sob o comando de sindicalistas ligados ao PT, estão hoje com um rombo bilionário, ameaçando o futuro dos beneficiários. Outra proposta pronta para ser votada é a que apresentei e que limita o número e garante critérios de meritocracia para o preenchimento dos cargos comissionados, hoje em grande parte ocupados pelos "companheiros".

Essas iniciativas, dentre outras, não vão por si só nos tirar do abismo econômico em que as administrações petistas nos lançaram, mas servem de alento em um país que se especializou em medidas equivocadas.

A verdade é que o Brasil não aceita mais este padrão de governo, incompetente na administração, conivente com a corrupção, incapaz de prover os cidadãos de serviços mínimos de qualidade em qualquer área.
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Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Basta! - Ricardo Noblat

- O Globo

Se vocês entenderem que a manutenção do projeto corre risco, estarei com 72 anos e tesão de 30 para ser presidente. Lula

Em que momento de sua história o PT se perdeu? Em que momento de sua história o PT se perdeu? Foi quando Lula, depois de três derrotas consecutivas, achou que para vencer em 2002 deveria “jogar o jogo”? Foi quando, a governar com partidos, ele preferiu aliciar o apoio individual de deputados e senadores? Ou foi quando ele, uma vez superada a fogueira do mensalão, convidou o PMDB para ser o principal parceiro do PT no seu segundo governo?

ESCOLHA O momento que lhe pareça o mais significativo. Existem outros. O meu preferido é o primeiro — aquele de “jogar o jogo”. Dirão os pragmáticos inescrupulosos: sem jogar conforme as regras usuais, Lula e o PT jamais teriam chegado ao poder. Pergunto: valeu a pena ter chegado desprezando os valores e princípios que pareciam distingui- los de outros políticos e partidos?

APENAS PARECIAM, como ficou demonstrado nos últimos 13 anos. Lula e o PT governaram sem dispor de ideias para o país. Favorecidos por uma conjuntura econômica mundial positiva, improvisaram o quanto deu. Quando não deu mais, viram no aparelhamento do Estado e na corrupção os únicos meios de se sustentar no poder. Deu no que vemos.

O PT FOI inventado pela ala progressista da Igreja Católica. Para combater a influência dos partidos comunistas no meio operário, a Igreja imaginou reunir em um novo partido as demais correntes de esquerda. Conseguiu. E por muito tempo, as comunidades eclesiais de base, alimentadas pela teologia da libertação, funcionaram como células do PT.

POR MAIS que tenha radicalizado seu discurso na tentativa de eleger Lula presidente em 1989, 1994 e 1998, o PT jamais foi criado para pregar a revolução social. É verdade: abriga tendências de esquerda sem compromissos com a democracia tal qual a conhecemos. Mas foi sempre o partido da ordem. “Nunca fui de esquerda”, uma vez comentou Lula. “Quando cedi às pressões dela, me dei mal”.

LULA NÃO PASSA, nunca passou de um malandro esperto e carismático que concordou em ser cavalgado por parte da esquerda — e que acabou por cavalga-la. Não foi muito difícil para ele e seus adeptos trocarem o discurso radical pelo discurso conciliador de 2002. Quem imaginou que Lula, para se eleger afinal, assinaria um documento como a “Carta aos Brasileiros”?

MAIS ADEQUADO seria chamá- lo de “Carta aos Banqueiros e Empresários”. Ou “Carta ao Capitalismo Internacional”. Foi a garantia dada por Lula de que seu governo manteria a política econômica do governo do então presidente Fernando Henrique. Assinou e cumpriu. A Bolsa Família, mais tarde, em nada desautorizou a carta do pai dos pobres e mãe dos ricos.

NAQUELE MOMENTO, deu- se a assimilação de Lula e do PT pelas elites, acusadas por eles, hoje, de aliadas do PSDB. De fato, aliaram- se a Lula e ao PT. E lucraram os tubos com isso. Se dependesse delas, e se não existisse a Lava- Jato, seguiriam apoiando o PT e torcendo pela volta de Lula em 2018. Como torceram há dois anos. Lula e o PT as espancam por puro marketing.

A OPÇÃO POR “jogar o jogo”, que empurrou Lula e o PT rampa acima do Palácio do Planalto, empurrará Dilma, Lula e o PT ladeira abaixo em 2018 — ou mesmo antes. Simplesmente, a maioria esmagadora dos brasileiros quer vê-los pelas costas. A incompetência e a corrupção exauriram o país. Ele não pode continuar mais se arrastando sem direção. Chega! Basta!

PT, 36 = PMDB, 50 - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Não é o presente de aniversário com que o balzaquiano partido sonhava. Ao completar 36 anos, o PT regrediu a quando tinha 8. Não em quantidade de cargos eletivos e processos judiciais – já corriqueiros entre seus filiados –, mas em apelo popular. Segundo pesquisa inédita do Ibope, a taxa dos que se declaram petistas bateu 12% em fevereiro. É igual à de junho de 1988.

A regressão de 28 anos no alcance do petismo foi acompanhada de uma reação do aliado com o qual o PT mais gosta de brigar. Pela primeira vez em quase 16 anos, o PMDB empatou em proporção de simpatizantes com o PT: 11% dos brasileiros declararam preferência peemedebista. Como a margem de erro é de dois pontos, há um empate estatístico entre PT e PMDB que não ocorria desde julho de 2000 na série histórica do Ibope.

Para os peemedebistas que articulam o fim da aliança com o petismo, é razão para comemorar os 50 anos que o partido completará em março (somando-se o período em que era só MDB). É também quando Michel Temer tentará se reeleger presidente da legenda e retomar articulações de outra campanha presidencial.

Na última década e meia, o PMDB viu o PT crescer, tomar-lhe prefeituras, cadeiras no Congresso e governos nos Estados. Mesmo assim, ambos seguem aliados no plano federal desde 2004.

Os peemedebistas tentam recuperar com ministérios e diretorias de estatais o que perderam de poder e orçamento em cargos eletivos. Mas o casamento de conveniência é permeado de infidelidades. Corriqueiramente, são traições à orientação do líder do governo nas votações do Congresso. Nos momentos mais graves, viram maquinações pelo impeachment de Dilma Rousseff.

À decadência de um, correspondeu a ascensão do outro. Enquanto o PMDB acumulou 600 prefeituras perdidas nas últimas seis eleições municipais, o PT ganhou exatamente o mesmo número de prefeitos.

No pleito de 2012, com a máquina petista nas cidades buscando se equiparar à mais tradicional e ampla rede municipal do PMDB, o paradoxo da relação chegou ao seu apogeu. PT e PMDB foram, ao mesmo tempo, os maiores aliados e os maiores adversários da política brasileira. Não houve naquela eleição nenhuma outra dupla de partidos que tivesse tantos confrontos diretos nem tantas coligações entre si. Faces opostas de uma mesma moeda.

A derrocada do petismo começou logo depois disso. No conturbado período entre abril e julho de 2013, quando centenas de manifestações de rua paralisaram o País, a simpatia pelo PT experimentou a queda mais abrupta de sua história. Foi de recordes 36% para 22% em apenas três meses.

Desde então, a velocidade da queda do petismo desacelerou, mas o partido continuou rolando ladeira abaixo: 19% de simpatizantes em agosto de 2014, 18% em setembro, 16% em outubro, 14% em abril de 2015, 12% em outubro e, novamente, 12% em fevereiro de 2016.

Apesar da repetição da taxa, é cedo para saber se o partido chegou ao fundo do vale.

Seja como for, a preferência pelo PT foi reduzida ao mesmo patamar da pelo PMDB – que cresceu de 5% em abril de 2015 para 10% em outubro e chegou agora a 11%. É um sinal de que os órfãos do petismo, que, num primeiro momento, engordaram as cortes dos sem-partido, começam a buscar abrigo em outras agremiações – como fez a senadora Marta Suplicy.

De polo aglutinador que recebeu incontáveis adesões de simpatizantes de outros partidos – como a pedetista Dilma –, o PT se tornou desde 2013 um difusor de militantes. Seu poder centrípeto virou centrífugo. O teste definitivo será a eleição municipal deste ano. Se a um encolhimento do PT corresponder uma dispersão de prefeitos eleitos por dezenas de siglas diferentes, terá chegado ao fim o modelo PT x anti-PT que tem organizado a política brasileira pelo menos desde 2000. É uma revolução.

Demorou por quê? – Valdo Cruz

- Folha de S. Paulo

O Datafolha revela: a maioria dos brasileiros acredita que Lula foi favorecido por empreiteiras em obras feitas em dois imóveis ligados ao ex-presidente e familiares.

A cúpula petista reage: os brasileiros foram levados a acreditar nesta história por causa de uma campanha da mídia e do Ministério Público contra seu líder supremo.

Bem, primeiro, de fato nem o tríplex do Guarujá nem o sítio em Atibaia estão no nome do petista. Agora, uma perguntinha: por que Lula demorou tanto em dar explicações?

Elas passaram a ser concedidas apenas depois que vieram a público fatos ligando o ex-presidente e empreiteiras a obras e serviços executados tanto no sítio como no tríplex.

A sensação é de que, não fossem as investigações, tudo ficaria escondido. No mínimo, são presentinhos e agrados dados ou que seriam dados a um ex-presidente por empresas que lucraram em seu governo.

Algo que o velho PT jamais aceitaria, mas o novo faz que não vê. E que sonha, para afastar este pesadelo do caminho, com o mundo mágico criado pelo marqueteiro João Santana na campanha de 2014.

Os petistas parecem não lembrar que, passada a eleição, a ilusão inventada pelo marqueteiro desmanchou-se no ar porque seu próprio governo havia quebrado o Tesouro e destruído a política econômica.

Mesmo assim o PT faz festa de aniversário num momento que demanda penitência e pressiona por mais uma aventura populista na economia para salvar sua própria pele.

Por falar no marqueteiro, preso em Curitiba, ele levou R$ 88,9 milhões para satanizar adversários e criar um Brasil ilusório. A PF suspeita que foi mais, e no caixa dois. O governo nega e diz que a conta salgada é prova de que tudo foi legal.

Seja como for, nunca uma ilusão custou tão caro ao país. Custou milhares de empregos e anos de forte retração da economia. Até o PT deveria estar arrependido do que pagou. Se não pagou bem mais.

O novo centrão - Marcos Nobre

• Surgiu um polo de reorganização do sistema

- Valor Econômico

O fato mais notável do período de recesso parlamentar foi a consolidação de um princípio de reorganização do sistema político a partir do Senado Federal. Celebrou-se ali um acordo suprapartidário que pretende dar rumo ao país, nada menos do que isso. Não se trata de uma base de governo nem o acordo se deu entre governo e oposição, mas entre membros desse clube político exclusivo que é o Senado.

A pretensão é tão simples quanto difícil de realizar: estabelecer um ponto de referência denso o suficiente para frear a deterioração generalizada que se vê. E, claro, uma tentativa muito mais eficaz de autodefesa contra a Lava-Jato do que o enfrentamento beligerante de Eduardo Cunha. Diante de um sistema político em frangalhos, de um governo que não consegue governar e de uma oposição que não sabe se opor, a pretensão dessa coalizão parlamentar é garantir o monopólio do equilíbrio e da razoabilidade. E, com isso, atrair por gravidade o apoio de quem quer evitar o desastre da continuidade da situação atual.

O primeiro grande teste desse novo centrão foi a votação de projeto de autoria do senador José Serra que determinou o fim da participação obrigatória da Petrobras na exploração de novos campos. A nova determinação fez nada menos do que alterar lei promulgada nos últimos dias do segundo mandato de Lula e considerada um dos principais legados de seu governo. Apesar da carga simbólica, foi aprovada em menos de um ano de tramitação e coincidiu com a montanha-russa de 2015. Ainda que com dissidências expressas da tribuna, pode-se dizer que o novo centrão tem uma maioria de algo como 44 votos, a somatória das bancadas de DEM, PMDB, PP, PR, PSD e PSDB. É claro também que fraturas vão aparecer em votações futuras. Mas o novo centrão teve seu batismo de fogo.

A tramitação do projeto de lei aprovado no último dia 24 de fevereiro foi um período de experimentação da nova coalizão política. O governo, representado em especial por Jaques Wagner, foi apenas um dos celebrantes do pacto e não aquele que deu a pauta ou o tom. Pelo contrário, o governo interpretou a situação como um xeque-mate e tentou não ficar inteiramente a reboque de uma negociação que se daria com ele ou sem ele. Ou negociava com o novo centrão, ou ficaria inteiramente isolado, à mercê de sua própria impotência.

Um dos resultados dessa nova configuração foi o afastamento entre o governo e o PT. Mas também aqui a situação joga a favor da hegemonia política do novo centrão do Senado. Afinal, o PT vai fazer o quê, romper com o governo? Já faz muito tempo que o PT não lidera o governo Dilma. Mas também não tem como desembarcar. O que pode fazer é o que está fazendo: defender o legado de Lula contra a realidade do governo de Dilma. Mas esse é um movimento meramente simbólico. Serve à defesa pública de Lula e do partido, mas não muda em nada o fato de que esse governo é refém de uma situação econômica e de uma nova coalizão política sobre as quais tem escasso controle. Mais ainda do que o próprio governo, o PT ainda não encontrou uma maneira de desamarrar os nós do estado de completa impotência em que se encontra, ainda não conseguiu encontrar nenhuma outra linha de ação que não espernear.

Além da caixinha de surpresas da Lava-Jato, os três principais obstáculos ao projeto do novo centrão são Aécio Neves, a Câmara dos Deputados e o impeachment. Aécio não dá mostras de recuar da pretensão de conseguir nova eleição presidencial ainda este ano. Mas a base parlamentar para esse projeto está na Câmara, justamente. De sua parte, Eduardo Cunha já disse que o projeto aprovado pelo Senado terá como destino uma gaveta bem acolchoada. Ou seja, não adianta querer fazer um novo centrão apenas no Senado, sem incluí-lo na negociação. O que mostra também que combinar com os russos da Câmara significa tentar superar a divisão histórica entre o PMDB de cada uma das casas legislativas, tarefa jamais tentada com sucesso no passado.

Aliás, o governo conta com o brutalismo de Cunha e com a balbúrdia da Câmara para impedir que o novo centrão do Senado o imobilize de maneira duradoura. Com Cunha na presidência, não há o que possa frear o estado de anomia e total fragmentação que domina a casa. E se há alguma coisa que 2015 ensinou foi que até mesmo um governo Dilma é capaz de adquirir um lote mínimo de parlamentares disposto a defender a cidadela mediante compensações em cargos.

O primeiro centrão com esse nome se estabeleceu durante o período Constituinte, entre 1987 e 1988. Foi uma estratégia defensiva da maioria conservadora do Congresso de então, já que os progressistas tinham encontrado apoio e força para lhe impor derrotas relevantes. Depois disso, o modelo do centrão voltou sob diferentes formas nos governos seguintes. Agora, ao contrário do original, o projeto do novo centrão não é apenas defensivo (contra a Lava-Jato), mas predominantemente ofensivo. Pretende nada menos do que romper um impasse que não dá sinais de se dissipar. Pode ser que acabe mesmo servindo de ponto de partida para reorganizar o sistema. Porque pode servir de referência tanto para quem quiser aderir como para quem quiser se opor a ele.

Cada um a seu tempo, os governos Sarney e Itamar souberam reconhecer a própria irrelevância e se abstiveram de atrapalhar a sério a dinâmica própria que o sistema político adquiriu em seus mandatos. Mas nenhum dos dois esteve sob a ameaça do impeachment. Juntamente com a Lava-Jato, essa é a ameaça que impede hoje que o governo Dilma dê mostras progressivas dessa estranha grandeza histórica que caracteriza o país, assumindo de vez sua posição de coadjuvante.

A reorganização do sistema político que se esboça a partir do novo centrão do Senado é frágil. Não bastasse a fragilidade, para que prospere é preciso ainda que o impeachment seja afastado e que Dilma aceite o destino de Sarney e de Itamar. Parece pedir demais. Mas não apareceu até agora outra perspectiva de estabilização que possa tentar evitar o total colapso do país, que é o único horizonte certo até o momento.
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Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap.

A guerra de mentira - Murillo de Aragão

- O Estado de S. Paulo

Dizem que Winston Churchill teria dito (o que foi desmentido por uns e confirmado por outros): “Lá vem um táxi vazio e dele desce Neville Chamberlain”. A irônica frase caracterizava o perfil desse primeiro-ministro inglês que, sem muita convicção, declarou guerra aos nazistas e passou oito meses em lentos preparativos para o conflito. Historicamente, o período que vai de setembro de 1939 a maio de 1940 é conhecido como a “guerra de mentira”. Com a ascensão de Churchill, em 13 de maio de 1940, a guerra de verdade começou.

Busco o exemplo na História para ilustrar o fato de que o Brasil vive, desde a reeleição da presidente Dilma Rousseff, em outubro de 2015, uma longa “guerra de mentira” contra a inflação, a recessão e o desequilíbrio fiscal. Houve alguns avanços. Em especial, no que se refere ao ajuste de certos preços públicos e das contas externas, com um câmbio mais de acordo com nossas condições. E dizem que as “pedaladas fiscais” foram contidas, entre outros aspectos pontuais. Tenho sérias dúvidas. Afinal, outro dia o TCU informou que usaram os recursos do Fundo de Universalização das Telecomunicações para pagar vale-transporte e plano odontológico de servidores públicos. Tudo nas barbas complacentes da oposição.

Mesmo com a crise estapeando a face do governo e do povo, nada de muito relevante foi feito. É certo reconhecer que no campo fiscal e no ambiente de negócios o governo não fez o dever de casa. Pior: em meio à crise de confiança, adiou o anúncio de medidas de austeridade fiscal. O mundo político tampouco se mobiliza. Aceita a paralisia do governo. Trafegam todos na contramão da conjuntura e, sobretudo, do interesse nacional. Por isso estamos perdendo a guerra de verdade pelos investimentos e travando uma guerra de mentira contra a estagflação. Além de nada acontecer, mantemos incólume nossa imensa incompetência na gestão das políticas públicas.

Por exemplo, das dez maiores obras do PAC apenas duas foram concluídas. A causa não foi apenas falta de dinheiro, mas também planejamento inadequado, entre outros problemas de gestão. A prometida racionalização da máquina pública – com enxugamento de cargos e ministérios – não foi posta em prática. Basicamente, o governo jogou na defensiva para proteger sua autonomia e não enfrentou os problemas.

Chamberlain, querendo evitar a guerra contra os nazistas, fez concessões absurdas a Hitler em 1938. Retornando de Munique, onde negociara com o Führer, disse na Inglaterra que o acordo e as concessões aos nazistas significaria “peace in our time”. Não foi o que aconteceu. O governo brasileiro, buscando alguma “peace in our time” entre seus aliados ideológicos, reluta em fazer o dever de casa fiscal e em modernizar, de forma aguda, o ambiente de negócios no País.

Somos todos punidos pela demora do governo em enfrentar os problemas criados por ele mesmo. Ainda agora, por causa da paralisa do governo, fomos mais uma vez rebaixados pelas agências de avaliação de risco, postos no mesmo patamar da Bolívia de Evo Morales. Nelson Barbosa nunca se importou muito com os ratings. Meses atrás, quando o Brasil foi rebaixado a primeira vez, encarregou-se de espalhar ser apenas um índice entre outros indicadores. E que estávamos melhor do que antes. Foi um grave erro, que comprometeu sua imagem.

Paradoxalmente, nunca estivemos tão próximos de resolver os nossos problemas. Só que a grossa parede de preconceitos ideológicos e a incompetência nos impedem de vencer o último quilômetro. Todos sabem que reduzir o tamanho do Estado e o tamanho de sua indevida intervenção na economia é o caminho para a retomada do tão necessário crescimento. Sobretudo empreender a caminhada pela reconstrução da credibilidade perdida com medidas que apontem para a austeridade fiscal.

As mudanças terão de ocorrer, agora ou mais tarde. É uma questão de tempo. E tempo parece ser um tema que não preocupa o governo. O adiamento das medidas adicionais de ajuste fiscal comprovam o ritmo quase parando de propor mudanças. As discussões esvaziadas da reforma previdenciária também revelam a falta de convicção. Portanto, quem deseja um Brasil progressista, voltado para o emprego e o desenvolvimento econômico e social sustentável, deve esperar sentado, ou mesmo deitado, já que nosso governo busca o “peace in our time” enquanto os monstros da inflação e da recessão devoram a renda e o emprego.

Como o Brasil é um país de paradoxos, Dilma ainda poderia fazer história e se transformar na líder que não foi. Ser a presidente que ainda não temos, como disse Delfim Netto ao se referir à atualidade do presidencialismo no Brasil. Basta reconhecer que o modelo não deu certo e é hora de mudar radicalmente. É hora de acabar com a “guerra de mentira” e enfrentar o desafio de reequilibrar o Brasil a partir de medidas ousadas, com ataque a questões críticas que envolvem Previdência, gasto público, desburocratização, privatização e reforma tributária, entre outras. Só com um choque de credibilidade fiscal e uma agenda modernizadora poderá evitar que o Brasil prossiga em letargia rumo ao já anunciado coma profundo.

Para tal, já passou da hora de ampla negociação e entendimento, tendo o futuro do País no centro dos interesses. É dever de todas as forças políticas abrir mão dos interesses próprios para buscar uma agenda nacional com apoio imediato do Congresso, atitude que demanda empenho e desprendimento tanto da presidente quanto da oposição e suas lideranças. Não é fácil. Mas o momento exige. É hora de o governo e o mundo político preencherem o táxi vazio em que transitam sem ir a lugar nenhum. E buscar um novo rumo para o País. Infelizmente, os sinais não são animadores. Estamos perdendo a guerra da mentira e fugindo da guerra de verdade. A situação econômica terá de piorar muito antes de governo e políticos acordarem.

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Mestre em ciência política e doutor em sociologia pela Unb, é advogado e consultor

O cinismo vai vencer – Vinicius Mota

- Folha de S. Paulo

Não perdeu dinheiro quem apostou na piora econômica e política do Brasil de dois anos para cá. Breves e relativas calmarias iludiram alguns, mas foram só interregnos na espiral descendente.

Essa perspectiva não se alterou para os dez meses restantes de 2016. Acaba de ser reiterada por desdobramentos das investigações judiciais, que mantiveram improvável a restituição da liderança presidencial e de sólida maioria parlamentar, sem os quais a sangria não será contida.

O processo político arrasta-se para acomodar-se à desgraça. Mais alguns meses e o apetite da oposição e de parte do PMDB para assumir logo o transatlântico desgovernado estará extinto. Todos, inclusive o PT, vão preparar-se para 2018, tomar distância de Dilma e recusar-se a colaborar até com os planos mais modestos do governo. A eleição lembrará a de 1989, com o conjunto dos candidatos a antepor-se a um presidente decorativo.

O país aguenta mais dois anos e dez meses nessa toada? A resposta cínica, embora verdadeira, é sim. Com mais inflação, mais desemprego e mais desorganização no ambiente de negócios.

A Venezuela é caso de laboratório a mostrar quanta degradação uma nação pode suportar antes de ser levada a alterar a elite governante e a maioria política. O Brasil, longe daquele estágio, tem dez anos de lenha para queimar, no mínimo.

O frustrante neste ciclo de esmagamento do poder presidencial é não ter-se formado no Congresso uma maioria reformista a tocar as mudanças que o Planalto e o PT são incapazes de liderar. Isso embaça o futuro, muito além de 2016 ou 2018.

A esperança venceu o medo, dizia o bordão de Lula em 2002. O cinismo, 14 anos depois, está prestes a derrotar o medo e a vergonha de lançar o país de volta ao labirinto do baixo desenvolvimento, onde os seres reprimem suas expectativas e se acostumam às mais tortuosas rotinas.

As cores das Farmácias de Minas são as cores do SUS - Marcus Pestana

- O Tempo (MG)

As políticas públicas de saúde ocupam espaço central na ação governamental e na vida das pessoas. Ao lado da atenção primária, da prevenção e da promoção nas ações de vigilância, da assistência ambulatorial e hospitalar, entre outros, o acesso aos medicamentos é essencial para assegurar os direitos de cidadania previstos em nossa Constituição.

Quando assumimos a Secretaria de Estado de Saúde, em 2003, o primeiro passo foi erguer um sólido planejamento estratégico, ancorado em conceitos consistentes e em diagnóstico profundo da realidade.

Na assistência farmacêutica, colocamos de pé o Farmácia de Minas. A situação era grave. Atraso na entrega, a Fundação Ezequiel Dias (Funed) no fundo do poço, investimento financeiro estadual baixo, organização institucional no setor precária, deficiência em pessoal e em processos gerenciais. O censo encomendado à UFMG demonstrou que mais da metade dos municípios mineiros não dispunha de profissional farmacêutico no SUS.

O Farmácia de Minas procurou ter uma abordagem ampla da assistência farmacêutica básica, do acesso aos medicamentos de alto custo, do cuidado com as doenças eleitas como estratégicas, do avanço científico-tecnológico-produtivo no setor e na modernização dos processos de gestão.

Multiplicamos por dez os investimentos estaduais na área e introduzimos avanços gerenciais, como a criação da Subsecretaria de Assistência Farmacêutica e do Comitê de Gestão da Assistência Farmacêutica. Introduzimos os pregões presenciais e eletrônicos. Estabelecemos ritos e protocolos. Impulsionamos a Funed na direção da era da biotecnologia.

Na parceria com os municípios, construímos mais de 700 Farmácias de Minas.

Outras 200 estão a caminho. Participei da inauguração da de Leopoldina na última sexta-feira. Introduzimos o incentivo mensal em 13 parcelas para ajudar na contratação obrigatória de farmacêutico. Eram 41 itens, e a farmácia básica passou a distribuir mais de 160 tipos de remédios. O Sistema de Gestão da Assistência Farmacêutica (Sigaf) criou uma rede online, integrando todos os profissionais e possibilitando não só modernizar o planejamento das encomendas, como também a homogeneização do acesso ao conhecimento científico e aos protocolos clínicos. O Congresso Estadual Anual foi implantado para alimentar a integração e a solidariedade entre os profissionais do programa espalhados pelo Estado. Por tudo isso, o Farmácia de Minas foi homenageado pelo Conselho Federal de Farmácia e Bioquímica como a melhor estratégia no Brasil para a assistência farmacêutica básica.

Desejamos que a atual gestão continue introduzindo avanços substantivos para melhorar a vida da população em área tão essencial. Não me pareceu uma boa e relevante ideia determinar que as farmácias fossem pintadas de vermelho. Felizmente, o Poder Judiciário evitou o desperdício. O SUS é uma bandeira de todos. Não é do PSDB, do PT, do PMDB, nem de ninguém. É uma conquista da sociedade. A cor das farmácias e do SUS são as cores do Brasil.

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Marcus Pestana é deputado federal (PSDB-MG)

De que foge Lula? – Editorial / O Estado de S. Paulo

Diante da montanha de evidências de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ter se beneficiado pessoalmente de suas relações com as maiores empreiteiras do País, é justo esperar que o capo petista venha a público prestar os devidos esclarecimentos. Afinal, a “viva alma mais honesta deste País” decerto não teria nenhuma dificuldade para dissipar as suspeitas a respeito de sua conduta.

Mas Lula decidiu refugiar-se no silêncio. As únicas manifestações em seu nome partem quase sempre do Instituto Lula, que instituto não é, pois funciona como assessoria de imprensa e escritório político do ex-presidente. E essas manifestações, geralmente furibundas, limitam-se a negar as acusações e a disparar impropérios contra aqueles que, segundo a tigrada, invejam as conquistas desse grande homem e o bem que ele fez ao País.

Lula mesmo não fala, e até seus apoiadores, quando ousam tocar no assunto, na esperança de ouvir dele sua versão dos fatos e assim orientar-se sobre o que dizer quando questionados, recebem como resposta resmungos indignados. Em recente reunião do PT, ele se queixou: “Não aguento mais falar disso”.

Os atos de Lula, porém, valem mais do que mil palavras. Sem ter como justificar os imensos favores que recebeu das empreiteiras camaradas, pois qualquer explicação que ele der terá de vir acompanhada de documentos, ao ex-presidente restaram as chicanas mais ordinárias. A mais recente foi o ataque ao promotor Cássio Roberto Conserino, do Ministério Público Estadual, que chamou Lula e sua mulher, Marisa Letícia, para depor sobre o misterioso tríplex do Guarujá totalmente reformado pela construtora OAS e cuja propriedade se atribui ao petista. A coisa toda respeitou o bem conhecido padrão de comportamento do ex-presidente. O nome de Lula, como sempre, não aparece em nenhum lugar – há sempre uma interposta pessoa a fazer o serviço que lhe convém. No caso do promotor Conserino, quem fez esse serviço foi o deputado petista Paulo Teixeira (SP).

Às vésperas do depoimento de Lula e Marisa Letícia, marcado para o dia 17/2, Teixeira entrou com uma representação no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) alegando que o promotor Conserino havia transgredido a Lei Orgânica do Ministério Público ao supostamente antecipar juízo de valor sobre o caso em entrevistas à imprensa. Além disso, o deputado argumentou que o processo deveria ter sido distribuído a um outro promotor, que já cuida de uma investigação semelhante.

Em caráter liminar, o CNMP aceitou os argumentos de Teixeira e adiou o depoimento. Foi uma decisão excêntrica, antes de mais nada porque o deputado Teixeira nem é parte no processo e, por razões óbvias, não poderia ter ingressado com a representação.

Dias depois, os advogados de Lula protocolaram requerimento no CNMP em que apoiavam a representação de Teixeira, mas a liminar acabou derrubada por unanimidade pelo plenário desse órgão, por sua evidente fragilidade. O imbróglio, no entanto, dá pistas de qual será a estratégia lulopetista para criar embaraços técnicos ao processo e, assim, livrar Lula da obrigação de falar. A ideia é questionar a conduta dos que acusam o ex-presidente, sem enfrentar o mérito das acusações.

Os advogados do petista, por exemplo, já avisaram que também vão reclamar ao CNMP e ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a respeito do comportamento dos procuradores do Distrito Federal em inquérito que apura se Lula cometeu tráfico de influência. É, portanto, um método.

Enquanto isso, nem a defesa de Lula nem os petistas que lhe servem de títeres fornecem qualquer explicação concreta a respeito das caríssimas benfeitorias bancadas pelas empreiteiras companheiras no apartamento do Guarujá e também no sítio de Atibaia, aquele para o qual o chefão petista enviou sua mudança quando deixou a Presidência, mas que ele jura que não lhe pertence.

Não será surpresa se, para justificar tanto mimo da parte de empresas enroladas no petrolão e o usufruto de imóveis que não constam de sua declaração de renda, Lula acabe dizendo apenas que tem bons amigos – e amizades puras como essas, afinal, dispensam a apresentação de provas à Justiça.

domingo, 28 de fevereiro de 2016

Opinião do dia – José de Souza Martins

O PT adotou uma fatal e antipatriótica pedagogia política maniqueísta que, ideologicamente, dividiu o Brasil em dois grandes países antagônicos e inconciliáveis. Convenceu seus eleitores de que o povo brasileiro é um povo separado em duas populações: de um lado, a dos ricos e poderosos que há 500 anos oprimem e exploram o povo, massa de privilegiados que abrange todos aqueles que não são petistas; de outro lado, a massa dos pobres e oprimidos, supostamente há cinco séculos explorados e dominados, que são os que presumivelmente se identificam com o PT e nele votam. Mesmo os abonados e amplos setores da classe média, como é o caso dos muitos funcionários públicos que a ele se ligaram. Adotaram o partido, na pedagogia de sua crença política, e adotaram seus seguidores, uma simplificadora concepção de Brasil, na qual eles próprios não se enquadram.

Na verdade, há nessa concepção estereotipada de país grande e deplorável desconhecimento da história brasileira e um didatismo enganador que foram fatores de bloqueio da consciência crítica dos petistas. Consciência que lhes teria permitido verem-se e entenderem-se como sujeitos de contradições e expressões da tensão dialética que dá rumo ao processo histórico. Os petistas não compreenderam que não estão sozinhos na trama de decisões e ações que definem o destino de todos.
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José de Souza Martins, ‘Do PT das lutas sociais ao PT do poder’, pp. 16-17 Editora Contexto, São Paulo, 2016