segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Opinião do dia – Luiz Werneck Vianna*

O programa do moderno, sem dúvida, não era de fácil realização - demandava tempo e não facilitava uma reeleição, mas deixaria, de qualquer modo, um lastro positivo. Nada, porém, poderia ser pior que o cavalo de pau que nos devolveu ao ciclo da modernização sem alma, que ora jaz moribundo sem que o moderno dê sinais de que ainda vive. E não será dos restos insepultos do sistema político que aí está que poderá renascer. Nessa desordem em que recaímos, não há juiz Sergio Moro que nos livre. E, pelo que se vê, nas praias também não há quem nos acuda.
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* Sociólogo, PUC-Rio. –‘As praias cariocas e a política’ – O Estado de S. Paulo, 4 de outubro de 2015.

Governo manobra para adiar julgamento de contas

• Ministros acusam relator de antecipar voto e pedem seu afastamento

Para oposição, Dilma age com truculência e autoritarismo para evitar processo de impeachment

A dois dias do julgamento das contas de 2014 da presidente Dilma no Tribunal de Contas da União, o governo pedirá hoje o afastamento do relator, ministro Augusto Nardes. A manobra, anunciada por três ministros de Dilma, pretende adiar a votação, pois o TCU deve rejeitar as contas, devido às “pedaladas fiscais”. Se o pedido for recusado no TCU, Dilma vai recorrer ao Supremo. Nardes rejeitou a alegação de que antecipou seu voto e, com isso, violou o regimento interno. A oposição acusou o governo de “truculência e autoritarismo”, por medo de que a rejeição das contas leve à abertura do processo de impeachment no Congresso.

Uma última cartada

• Governo manobra para afastar relator das contas de Dilma e adiar o julgamento no TCU; oposição reage

Vinicius Sassine - O Globo

- BRASÍLIA- Numa ofensiva avalizada por Dilma Rousseff, o governo tentará, a partir de hoje, destituir o ministro Augusto Nardes da relatoria do processo sobre as contas de 2014 da presidente. A iniciativa — a cargo dos ministros Luís Inácio Adams, da Advocacia Geral da União (AGU), e José Eduardo Cardozo, da Justiça — ocorre a apenas dois dias do julgamento no Tribunal de Contas da União (TCU), marcado para quarta-feira. Esta passou a ser a principal estratégia para tentar adiar o veredicto no tribunal, que deve votar pela rejeição das contas de Dilma. A oposição pretende usar o resultado do julgamento para embasar um pedido de impeachment da presidente.

Adams, Cardozo e o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, anunciaram ontem que o governo vai protocolar hoje no TCU uma arguição de suspeição de Nardes. O governo quer que a Corregedoria do tribunal abra um processo para apurar a conduta do relator, por ele já ter manifestado a intenção de votar pela rejeição das contas. A ideia é pedir a substituição do relator, o que precisa ser decidido pelo plenário do tribunal. À noite, Nardes repudiou as acusações do governo e negou que tenha antecipado seu voto.

Caso a análise no TCU não ocorra na própria quarta, o julgamento poderá ser adiado. Pouco antes do anúncio da nova estratégia, Adams se reuniu com Dilma no Palácio da Alvorada e a informou sobre os argumentos que seriam utilizados para pedir o afastamento de Nardes. A presidente concordou com a manobra dos ministros, que foi duramente criticada pela oposição.

Ação “truculenta e desrespeitosa”, diz Aécio
Em nota, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), disse que a ação do governo é “truculenta e desrespeitosa”, numa agressão à democracia. Para Aécio, o governo age como um time que, vendo que está perdendo de goleada a partida, pede para mudar o juiz:

“Chega a ser patética essa tentativa extrema de buscar desqualificar o Tribunal de Contas da União e os pareceres técnicos elaborados com rigor e isenção. Na verdade, essa ação truculenta e desrespeitosa do governo através do titular da AGU só consegue demonstrar de forma definitiva que faltam argumentos sérios para responder aos questionamentos feitos pelo TCU. E escancara o enorme receio de uma histórica derrota quando do julgamento das contas presidenciais”, disse Aécio. “É hora de mostrarmos definitivamente que no Brasil a lei deve ser cumprida por todos, em especial por quem deveria dar o exemplo: a presidente da República”.

Para o líder da Minoria na Câmara, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), o governo mostra “a pior face de seu autoritarismo e intolerância” ao exigir o afastamento de Nardes.

— A ação bolivariana ora em curso abre um precedente grave e representa um retrocesso nas relações entre as instituições da República. Estamos diante de uma sombria agressão à democracia — disse o parlamentar.

O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), disse que a intenção do governo é constranger o tribunal, atrasar o julgamento das “pedaladas fiscais” para, com isso, tentar enfraquecer o processo de impeachment. Para ele, essa atitude do governo é uma afronta ao Legislativo, ao qual o TCU está vinculado.

“As pedaladas fiscais já estão configuradas em acórdão do TCU e são provas de que a presidente cometeu crime de responsabilidade, passível de impeachment. Com o julgamento das contas marcado para esta quarta-feira, bateu o desespero no governo, que vê o afastamento da presidente do cargo cada vez mais próximo. Por isso, quer constranger o TCU e atrasar o julgamento. Ao agir dessa forma, o governo faz sua confissão de culpa”, afirmou.

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), também criticou a truculência:

— O governo viu que vai perder de sete a zero e tenta criar um fato para confundir o cenário. Isso é uma ingerência indevida do governo. Essa atitude passa a ser tão truculenta quanto a pedalada fiscal — afirmou.

Para governo, relator descumpriu regimento
O entendimento no governo é que existe uma tentativa clara de associar o processo das contas presidenciais ao pedido de impeachment no Congresso. Ao pedir a suspeição, os ministros acreditam que podem conseguir o adiamento da votação no TCU. Uma das apostas é que não haverá tempo suficiente para a instrução do pedido antes do julgamento agendado para quarta.

Adams citou por diversas vezes ontem um encontro de Nardes com grupos que defendem o impeachment de Dilma. Cardozo fez críticas ao “corpo a corpo” da oposição junto a Nardes. O entendimento dos dois é de que Nardes antecipou suas posições antes mesmo de o governo apresentar as defesas e de a área técnica concluir os relatórios que embasam o voto do relator. O ministro do TCU sinaliza a rejeição das contas desde o início. Adams citou, como exemplo, uma entrevista em que Nardes disse que “fará história” ao propor a rejeição das contas.

O ministro da AGU lembrou que a Constituição Federal e o regimento interno do TCU equiparam ministros do tribunal a ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Assim, eles estão submetidos à Lei da Magistratura, inclusive no que diz respeito aos impedimentos.

A arguição de suspeição será encaminhada ao presidente do TCU, Aroldo Cedraz. Adams disse que, caso o plenário do TCU não concorde com o afastamento e substituição do relator, levará a questão à Justiça. A instância mais provável é o Supremo Tribunal Federal (STF).

— O ambiente de debate político criou um constrangimento ruim. O tribunal pode corrigir isso e afirmar sua autoridade como tribunal. O reconhecimento da suspeição é um instrumento de força institucional. Devemos ser julgados por juízes independentes, imparciais. Ninguém quer ser julgado por um juiz parcial — disse Adams.

— Até as questões preliminares serem decididas (a arguição de suspeição), não pode ter julgamento de mérito — defendeu Cardozo.

O parecer prévio distribuído por Nardes recomenda a rejeição das contas. O documento foi encaminhado na noite de quinta-feira aos demais ministros que vão julgar o balanço de 2014. “As contas não estão em condições de serem aprovadas, recomendando-se a sua rejeição pelo Congresso Nacional”, diz o parecer.

A posição de Nardes segue o relatório técnico do TCU sobre as contas de 2014, documento que embasa o voto do relator. Os auditores concluem pela existência de “irregularidades graves na gestão fiscal”, o que comprometeu o equilíbrio das contas públicas, segundo o documento. O parecer rejeitou a defesa da presidente para 12 dos 15 indícios de irregularidades listados, entre elas as “pedaladas fiscais”, manobra que envolveu R$ 40 bilhões entre 2009 e 2014.

‘O trabalho feito no TCU é coletivo. Só verbalizo o que os técnicos apontam’

• Ministro nega ter antecipado seu voto sobre as contas de Dilma e lembra que já houve dois julgamentos sobre as ‘pedaladas’ no Tribunal de Contas

Vinicius Sassine - O Globo

-BRASÍLIA- Sob fogo cruzado do governo, o ministro Augusto Nardes disse ontem que não antecipou o voto e que o trabalho feito nos processos do Tribunal de Contas da União é coletivo. À noite, o ministro divulgou nota em que “repudia” as acusações feitas pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.

Na nota, Nardes disse não ter antecipado sua “opinião final”, e afirmou que seguiu o Regimento Interno do TCU ao distribuir o parecer prévio sobre as contas aos ministros. Conforme o regimento, isso deve ocorrer até cinco dias antes da sessão. Em entrevista ao GLOBO, ele falou sobre a acusação do governo:

O governo acusa o senhor de ter antecipado sua posição sobre as contas. Essa antecipação ocorreu?

Não antecipei o voto. Não liberei o voto. Essa matéria já está sendo discutida há muito tempo e já houve dois julgamentos, tanto o processo original das “pedaladas fiscais” (em abril, quando 17 autoridades e ex-autoridades do primeiro mandato da presidente Dilma foram chamadas a se explicar) quanto a primeira parte do processo das contas (em junho, o plenário aprovou um prazo de 30 dias para a presidente apresentar defesa sobre 13 indícios de irregularidades).

E a acusação dos ministros de que o senhor defendeu a rejeição das contas antes de analisar a defesa da presidente?

Lá atrás, já houve um voto preliminar, em que dizia que as contas não estavam em condições de serem apreciadas. Abrimos, então, para o contraditório. Não liberei o voto à imprensa. Liberei o voto para os ministros e para o Ministério Público junto ao TCU.

O governo vai pedir sua suspeição por conta de uma alegada parcialidade.

O trabalho feito no TCU é coletivo, é de toda a área técnica. Eu apenas verbalizo o que os técnicos apontam.

Outros artifícios usados pelo governo neste caso

Romaria aos gabinetes dos ministros.
A partir da informação de que as “pedaladas fiscais” constariam como irregularidade no relatório das contas de 2014 da presidente Dilma, publicada pelo GLOBO em 10 de junho, ministros do governo iniciaram uma romaria ao gabinete do relator Augusto Nardes e de outros ministros do TCU. O titular da AGU, Luís Inácio Adams, argumentou que as manobras não se repetiriam. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, sustentou que uma eventual rejeição das contas comprometeria o processo de retomada de credibilidade das contas públicas.

Eleger um culpado: Arno Augustin.
Defesas de autoridades e ex-autoridades do primeiro mandato de Dilma atribuíram a responsabilidade pela manobra ao ex-secretário do Tesouro Nacional Arno Augustin. O próprio ex-secretário assinou uma nota técnica na véspera da saída do cargo, em 30 de dezembro de 2014, que atribui às atividades dele a palavra final sobre a liberação de recursos públicos aos ministérios e demais órgãos da União.

O processo original das “pedaladas”.
Ministros do TCU cogitaram pautar o processo original das “pedaladas” antes do julgamento das contas da presidente. Esse processo está na fase de recursos, e acusações podem ser desidratadas. Relator dos recursos, o ministro Vital do Rêgo desobrigou o governo de cumprir medidas que restringiam as “pedaladas” e suspendeu os efeitos de uma decisão em abril até o julgamento definitivo. Depois de O GLOBO revelar a estratégia em agosto, o processo original acabou não sendo pautado.

Mais prazo para defesa.
Numa manobra surgida a partir da reaproximação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), com o Palácio do Planalto, Dilma ganhou mais 15 dias para novas explicações sobre outros dois indícios de irregularidades nas contas. Um senador aliado ao governo, Otto Alencar (PSD-BA), que foi vice-governador da Bahia na gestão de Jaques Wagner (PT), atual ministro da Casa Civil, pediu em requerimento a concessão do novo prazo. Depois, o governo pediu mais 15 dias de prazo, para se equiparar aos 30 dias iniciais dados à defesa, o que foi concedido.

Decretos anunciam intenção de evitar novas “pedaladas”.
Na última sexta-feira, o governo editou um decreto que objetiva impedir novas “pedaladas”. As dívidas com os bancos não podem durar mais de cinco dias. Por trás da medida está a tentativa de evitar a rejeição das contas.

Dilma tenta afastar relator para adiar decisão no TCU

• Planalto pedirá ao tribunal que ministro Augusto Nardes fique fora de votação

Governo ataca relator para tentar adiar decisão no TCU

• Ministro que tende a reprovar contas de Dilma é acusado de parcialidade

• Objetivo do Planalto é forçar adiamento do julgamento no tribunal e ganhar tempo para combater impeachment

Márcio Falcão – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA- Com a presidente Dilma Rousseff ameaçada pelo TCU (Tribunal de Contas da União), o governo deflagrou uma nova ofensiva para tentar adiar o julgamento das contas de 2014 da presidente, cuja reprovação pode dar fôlego à oposição para abrir um processo de impeachment no Congresso e afastá-la do cargo.

O alvo é o relator do processo no TCU, ministro Augusto Nardes, acusado de parcialidade na condução do caso. Para o governo, ele cometeu uma irregularidade ao opinar sobre o assunto e antecipar publicamente seu voto. O Palácio do Planalto vai pedir que o plenário do TCU, formado por nove ministros, decida se Nardes deve ser afastado.

Junto com a substituição do relator, o governo espera conseguir o adiamento do julgamento das contas, que está marcado para esta quarta-feira (7). O questionamento será feito na Corregedoria do tribunal nesta segunda (5). Se o TCU mantiver Nardes como relator, o governo deve recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) para discutir o caso.

A suspensão do julgamento daria ao Palácio do Planalto mais tempo para reorganizar sua base de apoio no Congresso, onde o principal aliado dos petistas, o PMDB, está dividido. O partido ganhou força no governo com a reforma ministerial concluída por Dilma na semana passada.

A interrupção do processo no TCU pode conter o avanço dos pedidos de impeachment. Cabe ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), decidir se algum será analisado pela Casa. O governo teme que Cunha faça uma das petições avançar para camuflar o desgaste que tem sofrido desde que se tornou alvo das investigações da Operação Lava Jato.

A ofensiva palaciana foi anunciada neste domingo (4) pelos ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Nelson Barbosa (Planejamento) e Luís Inácio Adams (Advocacia-Geral da União). Com discurso afinado, os três afirmaram que o julgamento das contas no TCU, que deveria ser técnico, ficou politizado.

Em seu parecer, Nardes apontou 12 irregularidades que o governo teria praticado em 2014, contrariando a Constituição, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Lei Orçamentária. A tendência do TCU é recomendar ao Congresso, pela primeira vez em 80 anos, a rejeição das contas de um presidente da República.

Os problemas são considerados tão graves pelos auditores do TCU que o mais provável é que a reprovação seja unânime, apesar de o governo ter pressionado ministros para que ao menos um aceite os argumentos da presidente.

Adams disse que o relator descumpriu o regimento interno do TCU e a Lei Orgânica da Magistratura, que proíbe juízes de manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processos pendentes de julgamento.

Para Adams, Nardes deixou claro em entrevistas que votaria contra o governo – há duas semanas, ele disse ao jornal "Valor Econômico" que pretende "fazer história" na análise do caso. Outro ponto questionado foi um encontro que o ministro teve com movimentos pró-impeachment.

Constrangimento
Para Adams, o processo está viciado e a atitude do relator criou constrangimento no tribunal. "Falar antes é impedimento e prejuízo ao processo", disse o advogado-geral da União. "Estamos falando de magistrados que têm a forma de garantir imparcialidade."

Cardozo reforçou o discurso, acusou a oposição de contribuir para politizar o caso e descartou a ideia de que o julgamento pode dar impulso a um pedido de impeachment.

"Consideramos lamentável a postura de setores oposicionistas que querem fazer um julgamento de contas num cenário de disputa política", disse. "Não vivemos numa arena romana, fazendo um julgamento que não seja o que a Constituição determina que é um Estado de Direito."

Nelson Barbosa reiterou que não houve irregularidades nas contas do governo, que tiveram que ser adequadas a mudanças no cenário econômico. "Os pontos apontados podem ser objeto de aperfeiçoamento. Como isso é feito? É feito para frente."

Ministro diz que não se sente impedido

• Relator do processo que analisa contas de Dilma no TCU, Nardes afirma que não vazou nem antecipou seu voto

• Segundo ele, ofensiva do governo para tirá-lo da condução do caso só serve para postergar discussão

Márcio Falcão – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro do Tribunal de Contas da União Augusto Nardes afirmou à Folhaque não se sente impedido para atuar no julgamento da prestação de contas de 2014 de Dilma Rousseff, já que não vazou nem antecipou seu voto.

Relator do caso, o ministro repudiou a ofensiva do governo para tirá-lo da condução do processo. Segundo Nardes, o Palácio do Planalto, ao defender seu impedimento argumentando que ele agiu de forma tendenciosa, quer adiar a discussão do caso.

O relatório dele pede a rejeição das contas do governo. O ministro sustenta que suas declarações sobre o tema, que deram munição para a artilharia do governo, são embasadas em discussões do próprio TCU sobre o caso.

O ministro disse que as chamadas pedaladas fiscais foram confirmadas pelo tribunal e que já houve uma discussão preliminar sobre as contas do governo.

"Essa matéria foi julgada duas vezes [no TCU]. A matéria já foi discutida e é de conhecimento público. Não vazei o voto. Não antecipei."

Em junho, o TCU tratou das contas, quando decidiu dar um prazo de 30 dias para Dilma se explicar sobre indícios de irregularidades no balanço, como o atraso no repasse de recursos para bancos públicos que fazem o pagamento de programas do governo.

O outro debate sobre a chamada contabilidade criativa do governo ocorreu quando o plenário do TCU considerou ilegais as manobras na ação que apura seus responsáveis. Dezessete ex-ministros e servidores podem ter que pagar multa e ressarcir o prejuízo. O processo não foi finalizado.

Em nota divulgada, Nardes afirmou que "não antecipou sua opinião final" sobre as contas. O texto explica que o ministro distribuiu, na quinta (1º), minuta do relatório e do parecer aos ministros, seguindo norma do tribunal.

"Eventuais declarações coletadas junto à imprensa estão relacionadas a acórdãos públicos [resultado de julgamento] prolatados pelo TCU."

Sobre a discussão do balanço de 2014, a nota afirma que "o tribunal comunicou ao Congresso que as referidas contas não estavam em condições de serem apreciadas no momento, em virtude dos indícios de irregularidades constatados que demandavam a apresentação de contrarrazões por parte da presidente".

Ação contra Nardes é ataque à democracia, afirmam opositores

• Para Aécio, ação mostra o 'desespero de uma gestão que já se vê derrotada antes do fim do processo'

• Ministros e deputados veem na manobra uma tentativa do governo de ganhar tempo para enfraquecer Cunha

Daniela Lima - Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Os líderes dos principais partidos de oposição ao governo Dilma Rousseff classificaram a ofensiva do Planalto contra o ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Augusto Nardes como uma ação "autoritária", "bolivariana" e "truculenta". Eles querem que o Congresso reaja para proteger o tribunal.

Presidente nacional do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) disse que a ação para afastar Nardes da relatoria do processo que analisa as contas do governo soa como "um atentado à democracia" e evidencia o "desespero de uma gestão que já se vê derrotada antes mesmo do resultado final do processo".

O tucano afirmou ainda que a ação contra o ministro do TCU é uma medida "procrastinatória". "Esse é um ato que só escancara a falta de argumentos técnicos para responder às graves denúncias de que houve manobra nas contas públicas", avaliou Aécio. "O governo age como um time que perdeu de goleada e tem como último recurso tentar trocar o juiz.
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'Bolivariana'
O discurso de que a ação contra Nardes é um atentado á democracia foi entoado em uníssono pela oposição. Líder da minoria na Câmara, o deputado Bruno Araújo (PSDB-PE) afirmou que o gesto configura a "primeira ação institucional bolivariana do PT dentro do Brasil".

"Isso é muito grave, estarrecedor. É a primeira atuação bolivariana institucional do PT dentro do Brasil. O governo mostra agora a pior face do seu autoritarismo e intolerância", concluiu.

Líder do DEM, o deputado Mendonça Filho (DEM-PE) afirmou que o Congresso tem o dever de reagir à ofensiva do governo contra Nardes. "O TCU é um órgão auxiliar do Congresso Nacional. Não podemos e não vamos aceitar esse tipo de intimidação. O Congresso terá que reagir."

A votação das contas do governo Dilma no ano de 2014 no TCU é a principal aposta da oposição para justificar a abertura de um pedido de impeachment contra a petista.

No processo, são analisadas manobras como as chamadas pedaladas fiscais –uso de dinheiro de bancos públicos para pagamento de benefícios de programas sociais e outras despesas federais.

Integrantes da oposição viram na ofensiva contra Nardes uma tentativa do governo de atrasar a conclusão do julgamento das contas de Dilma, já que nos bastidores a reprovação do balanço apresentado pelo governo é dada como certa.

Cunha
Deputados e ministros do TCU ouvidos pela Folha avaliam que o governo busca usar o tempo que o tribunal levará para decidir sobre a afastamento de Nardes para continuar manobrando no Congresso para diminuir o número de deputados que, hoje, estão insatisfeitos e poderiam votar pelo impeachment.

Eles também viram na ofensiva uma aposta do governo de que, nos próximos dias, haverá uma deterioração da situação política do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O peemedebista, que rompeu publicamente com o governo em julho, ganhou suporte da oposição por ter a prerrogativa de instaurar o processo de impeachment, mas teve o prestígio abalado após o Ministério Público da Suíça informar ao Brasil ter encontrado quatro contas controladas por Cunha e seus familiares naquele país.

O peemedebista nega ter recursos não declarados no exterior, mas sabe que a eventual comprovação do caso pode resultar em seu afastamento do comando da Câmara, o que, na atual conjuntura, seria celebrado pelo governo.

Governo pede afastamento de relator das ‘pedeladas’

Governo vai pedir para julgamento de contas de Dilma ser suspenso

• Argumento é de que o relator Augusto Nardes já antecipou várias vezes seu voto pela reprovação, o que é vedado por lei

André Borges e Lorenna Cardoso - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo vai pedir a suspensão do processo de julgamento de contas ao Tribunal de Contas da União (TCU). O argumento central do governo é de que o ministro relator do processo, Augusto Nardes, tem vazado reiteradamente seu voto, que é pela reprovação das contas. Essa postura, que é vedada por lei, teria constrangido os demais ministros da corte.

O pedido do governo será enviado à Corregedoria do TCU nesta segunda-feira, 5, com a defesa de que há "vício" no processo relatado por Nardes. Em termos práticos, a medida pede a substituição do relator, por conta de "suspeição".

Se a Corregedoria acatar o pleito, enviará sua demanda à presidência do tribunal, que terá de submeter o pedido do governo ao plenário da corte, ou seja, os próprios colegas de Nardes terão de julgar a sua conduta à frente do processo.

"É vedado ao ministro do tribunal que, por qualquer meio de comunicação, expresse opinião sobre processo pendente", declarou Luís Inácio Adams, ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU).

Segundo Adams, o governo colheu mais de 2 mil páginas de reportagens nas quais Nardes deixa clara a sua intenção de reprovar as contas do governo Dilma Rousseff (PT) de 2014. Perguntado por que, só agora, decidiu pedir a suspeição de Nardes, Adams disse que o posicionamento do ministro do TCU se tornou mais claro desde o dia 11 de setembro, quando o governo entregou uma última parte de suas defesas.

"Essa reiterada manifestação vem em claro conflito com uma regra que se dirige aos magistrados. Não estamos falando de agentes políticos, mas magistrados que têm regras de comportamento", disse Adams. "Essa lógica, essa manifestação reiterada gerou um movimento de constrangimento, como já noticiado pela imprensa."

Em coletiva de imprensa, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o governo tem "absoluta convicção que não existe motivos ou justa causa para reprovação das contas".

"Consideramos lamentável a postura de alguns setores oposicionistas que querem transformar as contas em cenário de disputa política", declarou. "Setores oposicionistas têm ido ao TCU para pressionar, na tentativa de constranger aqueles que vão julgar. Acho profundamente lamentável que isso ocorra. Como se lá fosse realizado um julgamento político."

O ministro do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), Nelson Barbosa, reafirmou que "todas as medidas foram feitas com amparo legal e seguiram o que foi aplicado em todos os anos anteriores".

"Os pontos apontados podem ser objeto de aperfeiçoamento. E como isso é feito? É feito para frente. Reafirmamos que as operações de repasse de recursos não são operação de crédito, mas de repasse", disse Barbosa, que também defendeu que não houve operação de crédito nas equalizações de taxas de juros.

"São discussões técnicas, que respeitaram a legislação em vigor, mas que podem ser aperfeiçoadas, e qualquer mudança deve ser aplicada daqui para frente", declarou.

Governo quer cercear liberdade do TCU, diz Augusto Nardes

• Ministro do Tribunal de Contas da União diz que não antecipou seu voto para ninguém, a não ser para os ministros da corte, conforme prevê regimento do órgão

André Borges - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes, relator do processo que julgará as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff, disse que a decisão do governo de pedir seu afastamento do caso tem, por objetivo, cercear o direito de liberdade da corte de contas em deliberar sobre o assunto.

Ao ‘Estado’, Nardes reiterou que não liberou seu voto para ninguém, a não ser para os ministros da corte, conforme prevê o regimento do tribunal. “Estou tranquilo, não divulguei nada. Se houve conhecimento prévio pela imprensa, não foi por mim. Além disso, essa matéria [sobre as pedaladas fiscais] já foi julgada pelo ministro José Múcio, e veio a público o seu voto” comentou Nardes. “Esse é um trabalho coletivo, não é um trabalho só do relator. Essa matéria está sendo discutida há 90 dias.”

Perguntado sobre como recebeu a notícia de ser alvo do processo movido pela Advocacia-Geral da União (AGU), Augusto Nardes disse que o governo, em vez de se explicar e responder aos questionamentos da corte, passa a atacá-lo. “Isso é tentar cercear a liberdade e cercear o tribunal. É tentar evitar de se discutir uma matéria que toda a sociedade tem que saber. É um cerceamento de liberdade”, disse o ministro.

O relator lembrou ainda que, quando era presidente do TCU, chegou a receber um pedido de suspeição contra o então ministro José Jorge, que relatava um processo sobre a polêmica refinaria de Pasadena, comprada pela Petrobrás. “Tentaram retirar José Jorge da relatoria e não conseguiram.”
Segundo Nardes, mesmo com a movimentação do governo, nada muda no calendário da votação das contas, que está marcada para a próxima quarta-feira. “Não vai ser adiada, vamos votar na próxima sessão, porque quem decide isso é o tribunal. Quem decide sobre a suspeição é o tribunal”, comentou.
Augusto Nardes divulgou nota oficial sobre o assunto. Leia a íntegra:

O ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União (TCU), repudia as declarações do Advogado-Geral da União divulgadas pela imprensa acerca de sua atuação na relatoria do processo de apreciação das Contas de Governo do exercício de 2014.

Esclarece, em relação à sessão prevista para 7 de outubro, que não antecipou sua opinião final acerca da apreciação dessas contas. Apenas disponibilizou, na quinta-feira passada, minuta de relatório e do parecer prévio aos demais ministros, uma vez que o Regimento Interno do TCU exige que a distribuição dessas peças aos seus pares se faça em até cinco dias antes da data da sessão.

Eventuais declarações coletadas junto à imprensa estão relacionadas a acórdãos públicos já prolatados pelo TCU, a exemplo do Acórdão 825/2015 - TCU-Plenário, que tratou de adiantamentos realizados pelos bancos oficiais para cobertura de despesas da União com programas sociais, e do Acórdão 1.464/2015 - TCU-Plenário, sobre a análise preliminar das contas de governo, no qual o tribunal comunicou ao Congresso Nacional que as referidas contas não estavam em condições de serem apreciadas naquele momento, em virtude dos indícios de irregularidades constatados que demandavam a apresentação de contrarrazões por parte da Presidente da República.

Para oposição, possível substituição de ministro do TCU não altera pedido de afastamento de Dilma

• Presidente da Câmara, DEM e PSDB dizem que requerimento para afastar a presidente não tem relação com análise de balanço

Carla Araújo e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A possibilidade de o Tribunal de Contas da União (TCU) atender ao pedido do governo de substituir o relator do julgamento das contas da presidente Dilma Rousseff e, com isso, adiar a apreciação das contas não altera a análise dos pedidos de impeachment pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). "A decisão dos pedidos não está atrelada à decisão do TCU", afirmou ontem Cunha ao Estado. "Independentemente do TCU, as decisões serão tomadas", disse. O presidente da Câmara já indeferiu cinco pedidos na semana passada e disse que queria apreciar o restante em "10 dias ou 15 dias".

Restam sobre a mesa de Cunha oito pedidos, entre eles o de autoria dos juristas Hélio Bicudo e Miguel Reale Júnior, ex-ministro da Justiça na gestão de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O pedido assinado por ambos, considerado pelos partidos de oposição o mais consistente entre os que foram protocolados na Casa, tem como elemento central as pedaladas fiscais. É sobre esse pedido que reside toda a estratégia da oposição.

Deputados oposicionistas dizem que a estratégia do impeachment não estava "subordinada" à avaliação das contas de Dilma. Segundo o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), o Congresso não vai esperar para tratar a questão do impeachment. "O pedido está baseado nas pedaladas que já foram rejeitadas pelo TCU, não precisa da aprovação das contas. A rejeição apenas reforçaria a tese", declarou.

PSDB. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), classificou no último domingo, 4, o pedido para afastamento do ministro Augusto Nardes como uma "agressão à democracia". "Na verdade, essa ação truculenta e desrespeitosa do governo através do titular da AGU (Advocacia-Geral da União) só consegue demonstrar de forma definitiva que faltam argumentos sérios para responder aos questionamentos feitos pelo TCU, e escancaram o enorme receio de uma histórica derrota das contas presidenciais", declarou em nota.

Para o líder do PSDB, deputado Carlos Sampaio (SP), a atitude do governo representa uma "afronta ao Legislativo". "As pedaladas fiscais já estão configuradas em acórdão do TCU e são provas de que a presidente cometeu crime de responsabilidade, passível de impeachment."

O deputado Bruno Araújo (PSDB-PE), líder da minoria, ressalta que a rejeição das contas da presidente, que poderia torná-la inelegível, seria "uma formalidade". "Os empréstimos irregulares são muito mais graves", calculou.

Governo joga o xadrez do impeachment

João Villaverde – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O governo Dilma Rousseff fez neste domingo o penúltimo movimento no tabuleiro do Tribunal de Contas da União (TCU). Como numa partida de xadrez, a jogada do governo pode ter sido uma "pregadura", nome dado à manobra do xadrez no qual um jogador ataca uma peça que o adversário não pode mover, pois caso mova colocará uma peça de maior valor sob ataque. Ao questionar ao próprio TCU a postura do relator do processo de análise das contas de 2014, o governo tenta "pregar" Augusto Nardes. Com base nas "pedaladas fiscais", Nardes recomendou a rejeição do balanço federal aos demais colegas, em parecer enviado na sexta-feira.

Se a jogada do governo fizer com que os demais ministros decidam pela troca de Nardes como relator ou, ainda, que fiquem convencidos a aprovar as contas de Dilma, deixando de seguir o relator, a pregadura terá sido bem sucedida, levando Dilma ao xeque-mate.

A próxima jogada, no entanto, será de Nardes. Ele terá que se pronunciar antes do julgamento, marcado para quarta-feira. Caso ele consiga sustentar a tendência de rejeição das contas que era predominante no TCU até sexta-feira, o governo terá, na realidade, feito uma "pregadura relativa" – a que derruba a Rainha do adversário, mas não a peça mais importante, o Rei.

O caso é dramático e Dilma guarda uma última jogada: o governo está preparado para entrar com um pedido no Supremo Tribunal Federal (STF) para afastar Nardes do julgamento, alegando que ele antecipou voto (o que é proibido pela Lei da Magistratura, a qual ele está submetido). Dilma, inclusive, já autorizou essa estratégia, que pode ser desencadeada até quarta-feira, dia do julgamento.

Nunca no TCU, desde 1937, sequer um ministro pediu a reprovação das contas presidenciais. Hoje, a Corte tem o relator e o Ministério Público de Contas defendendo a rejeição do Balanço de 2014 do governo, devido, principalmente, ao possível crime de responsabilidade fiscal cometido pela gestão Dilma com as "pedaladas".

Uma inédita rejeição das contas seria o início formal do processo de impeachment no Congresso, por parte da oposição e parte rebelada da base aliada de Dilma. O pedido de afastamento da presidente feito pelos juristas Helio Bicudo e Miguel Reale Jr. está sustentado justamente nas "pedaladas fiscais".

Na quarta-feira, o tabuleiro do TCU terá o xeque-mate: os reflexos do julgamento (ou de sua postergação, caso o governo seja bem sucedido na troca de Nardes) serão sentidos no mercado financeiro, nas contas públicas e, principalmente, na delicada luta política que envolve a presidente.

Governo questiona relator para tentar adiar julgamento de contas pelo TCU

Por Andrea Jubé - Valor Econômico

BRASÍLIA - Diante da ameaça de rejeição das contas da presidente Dilma Rousseff de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em julgamento programado para quarta-feira, o governo decidiu reagir para ganhar mais tempo. A Advocacia-Geral da União (AGU) vai alegar o impedimento do relator do processo, ministro Augusto Nardes, cujas declarações sinalizando para a rejeição das contas teriam contaminado o processo. O pedido de afastamento do relator tem potencial para adiar novamente a análise das contas.

O requerimento será apresentado hoje ao presidente do TCU, ministro Aroldo Cedraz, e encaminhado à Corregedoria-Geral. A palavra final é do plenário da Corte. Dilma está tão preocupada com o processo, que adiou a visita de Estado à Colômbia para comandar de perto a estratégia de defesa do governo. Ontem ela escalou três ministros - José Eduardo Cardozo, da Justiça, Luís Inácio Adams, da AGU, e Nelson Barbosa, do Planejamento -, para reforçarem, em entrevista coletiva, as justificativas do Executivo às "pedaladas fiscais". Pela manobra, o governo utilizava recursos dos bancos públicos para quitar obrigações do Tesouro Nacional.

Os ministros negam o esforço para postergar o julgamento, que deveria ter ocorrido em agosto. O novo adiamento, contudo, daria fôlego político a Dilma num momento em que ela tenta respirar com a reforma ministerial. "Não queremos o adiamento do julgamento, queremos que a lei seja respeitada", disse o ministro José Eduardo Cardozo. "Ninguém quer ser julgado por alguém que vai a público dizer que julgará contra, queremos a imparcialidade", reforçou Adams.

O advogado-geral da União alega que os ministros do TCU submetem-se às regras da Lei Orgânica da Magistratura (LOM), que veda ao magistrado "manifestar por meio de comunicação opinião sobre processo pendente de julgamento". Segundo Adams, o governo reuniu mais de 2 mil páginas de entrevistas em que, nos últimos dois meses, Nardes teria antecipado o seu veredito sobre o caso.

Cardozo rebateu declaração do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de que a rejeição das contas "turbina" o impeachment. "O presidente da Câmara tem o direito de falar o que acha, mas o uso da palavra 'turbinar' é uma tentativa de politização de um julgamento que é técnico, e não político", criticou.

Em nota divulgada à noite, Nardes rebate a AGU. Afirma que "não antecipou sua opinião final acerca da apreciação dessas contas. Apenas disponibilizou (...) minuta de relatório e do parecer prévio aos demais ministros, uma vez que o regimento interno do TCU exige que a distribuição dessas peças aos seus pares se faça em até cinco dias antes da data da sessão".

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG) criticou a tentativa de afastamento do relator. "O governo age como um time que, vendo que está perdendo de goleada a partida, pede para mudar o juiz. Chega a ser patética a tentativa de buscar desqualificar o Tribunal de Contas da União."

Impeachment perde fôlego com reforma

Por Raphael Di Cunto – Valor Econômico

BRASÍLIA - A reforma ministerial pode dar fôlego para a presidente Dilma Rousseff brecar o pedido de impeachment, mas ainda não garante maioria na Câmara dos Deputados. Cientistas políticos e parlamentares da base e da oposição ouvidos pelo Valoravaliam que o governo consolidou entre 200 e 240 votos, menos da metade do plenário e longe do quórum necessário para aprovar a proposta de emenda constitucional (PEC) da CPMF - de 308.

Só as primeiras votações - como o veto presidencial ao reajuste dos servidores do Judiciário amanhã - vão mostrar o real apoio na Câmara, mas a análise corrente após a reforma é de que faltou atender as demandas de PP e PTB, consolidar o apoio do PSD e PRB, só possível com as nomeações do segundo escalão, e agregar partidos como o PSB.

De acordo com o banco de dados legislativos do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), PTB e PP foram os dois partidos da base mais problemáticos este ano. A taxa de fidelidade dos pepistas ao governo foi de 46% nos cinco primeiros meses, quando foi votada a primeira parte do ajuste fiscal. Entre os petebistas foi de 54%.

Só foram mais fiéis do que o PDT - taxa de 41% -, mas que, na reforma, saltou do Ministério do Trabalho para o das Comunicações, que será ocupado pelo líder da sigla na Câmara, André Figueiredo (CE). A mudança teve reflexo já na quarta-feira e o partido, que ia sempre contra o governo em questões que envolviam os trabalhadores, deu 90% de seus votos contra as emendas da "desaposentação" e do seguro-desemprego rural.

Já o PP, em que pelo menos 15 dos 39 deputados votam contra o governo sistematicamente, permanece descontente na Integração Nacional. As razões são várias: a base conservadora, que os afasta do PT; irritação com a perda do Ministério das Cidades para o PSD, deslocamento para uma pasta que não tem atuação fora do Nordeste; e a pressão para ocupar todos os cargos com "porteira fechada", ou seja, livre indicação dos comissionados.

Entre os governistas há a impressão de que a nova fase de Dilma, ao ceder as indicações políticas, pode dar ao PP a porteira fechada desejada. Mas a presidente ainda não deu sinal nesse sentido.

O PTB, por sua vez, declarou independência em julho após o governo prometer cargos e não entregar. Os 25 deputados não se sentem representados por Armando Monteiro (PTB), que ocupa o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio pela boa relação com os empresários, e não por indicação do partido.

Na reforma, o líder do PTB, deputado Jovair Arantes (GO), cobrou a manutenção de Monteiro, mas com indicações do partido, e o controle da Superintendência de Seguros Privados (Susep), da Casa da Moeda e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, resiste sobre os dois primeiros - os petebistas saíram em meio à escândalos de corrupção-, mas Dilma prometeu os cargos, segundo aliados.

O PMDB nomeou os deputados Marcelo Castro (PI) para a Saúde e Celso Pansera (RJ) para Ciência e Tecnologia, mas o governo continua trabalhando com apenas 40 votos certos, dos 66. Aliados do líder da bancada, Leonardo Picciani (RJ), dizem que o número é maior, de 50 a 55, e que os 22 pemedebistas que assinaram nota contra as indicações serão cobrados.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que faz oposição, diz que reforma do governo só consolidou os votos que ele já tinha. "Não ganharam um voto e ainda perderam o do Edinho Araújo [demitido dos Portos] e conheço o suplente do Pansera, votará contra o governo."

Para Antônio Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o governo, que antes estava em posição desconfortável, com apenas 170 votos, consolidou uma base de 220 para barrar o impeachment. "Para além disso vai depender do conteúdo e das concessões feitas."

Cunha diz que 'despachar' o impeachment é 'obrigação'

• Deputado afirma em rede social que não vai manter pedidos na gaveta

• Auxiliares de Dilma estão se preparando para reagir a uma eventual ofensiva do presidente da Câmara

Cátia Seabra, Gustavo Uribe, Débora Álvares e Gabriel Mascarenha – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), usou as redes sociais neste domingo (4) para reiterar que, num eventual processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, caberá a ele apenas aceitar ou rejeitar o pedido de instauração do caso.

"Não tenho qualquer outro papel que não seja esse. Os que falam gostariam que eu mantivesse (a representação pela abertura do impeachment) na gaveta, e isso não ocorrerá. A minha obrigação é despachar", disse.

Cunha reafirmou sua posição ao comentar reportagem da Folha neste domingo que mostrou que auxiliares de Dilma estão se preparando para reagir, caso ele se movimente para viabilizar a análise do impeachment.

"Acho engraçado que ficam achando conspiração em tudo. Se eu aceitar (o pedido de instauração) é porque estou viabilizando (o impeachment) e, se rejeitar, também estou viabilizando", criticou.

O Planalto aposta que o peemedebista pode dar andamento ao processo nas próximas semanas para diminuir o desgaste que tem sofrido desde que virou alvo das investigações do esquema de corrupção na Petrobras.

Cunha foi denunciado ao Supremo Tribunal Federal sob suspeita de lavagem de dinheiro e corrupção. Ele é acusado de ter recebido US$ 5 milhões em propina.
A situação do peemedebista ficou ainda mais complicada na semana passada, depois que o Ministério Público da Suíça informou ter encontrado quatro contas bancárias no país controladas por ele e familiares.

Apesar de o PMDB ter ampliado seu espaço no governo na última reforma ministerial, os impasses entre o Planalto e a bancada do partido na Câmara ainda não estão resolvidos. Por isso, Dilma pediu aos novos ministros peemedebistas que atuem para liquidar os problemas.
Na semana passada, um terço da bancada assinou manifesto no qual se posicionou contra as negociações por cargos na Esplanada.

A expectativa dos ministros peemedebistas é reverter a posição de pelo menos 14 dos 22 deputados que assinaram o manifesto.

Divergências
O ministro Celso Pansera (RJ), que assume a Ciência e Tecnologia pela cota do PMDB na Câmara, disse estar seguro que deputados da ala contrária ao governo vão reverter suas posições.

"Na quinta (1º), diversos deputados ligaram dizendo que não tinham entendido o manifesto naquele sentido e que anunciarão a retirada das assinaturas", disse Pansera.

Na Câmara, porém, há demonstrações de resistência.

No mesmo dia em que Pansera disse haver fragilidade na posição dos "rebeldes peemedebistas", dissidentes negaram a intenção de retornar à base aliada. "Apoio não se diz, se confirma no voto", afirmou um deles.

Reconhecendo as divergências, o ministro Eliseu Padilha (Aviação Civil) ressaltou a necessidade de "trabalhar pela unidade do partido".

"O presidente Michel Temer vai trabalhar no sentido de unificar o partido para que o PMDB tenha um comando só, com uma voz só", disse.

Para Padilha, o governo "fez a sua parte" ao ampliar o espaço do partido e atender as demandas da bancada da Câmara que, além de Pansera, também emplacou Marcelo Castro na Saúde.

"A presidente Dilma Rousseff foi a limites extremos. O governo federal fez o gesto. Agora, há que se esperar a correspondente reação por parte de quem foi tão beneficiado", afirmou.

Votação de MP ‘comprada’ não registrou nomes

• Medida foi aprovada pelo Congresso sem o registro nominal de votos de deputados e senadores

Ricardo Brito, Andreza Matais, Fabio Fabrini - O Estado de S. Paulo

A medida provisória que teria sido “comprada” no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi aprovada pelo Congresso sem o registro nominal de votos de deputados e senadores. No jargão legislativo, o texto passou em votações simbólicas, quando há uma manifestação coletiva dos parlamentares. A MP também foi transformada em lei sem sofrer qualquer alteração desde sua edição pelo governo, o que é raro de ocorrer.

Documentos obtidos pelo Estadoindicam que a Medida Provisória 471, editada em 2009, que prorrogava incentivos fiscais de 2011 até 2015 em três regiões (Norte, Nordeste e Centro-Oeste) teria sido “comprada” por meio de lobby e de corrupção para favorecer montadoras de veículos. A Polícia Federal e o Ministério Público vão tentar rastrear os pagamentos.

Na tramitação da medida no Congresso, o deputado de oposição José Carlos Aleluia (DEM-BA) foi designado relator e propôs a rejeição de todas as emendas. Ele disse ter procurado o então presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB), para relatar a matéria por acompanhar desde o governo Fernando Henrique Cardoso a implementação da fábrica da Ford na Bahia. Segundo ele, houve um acerto com o governo para não se alterar qualquer ponto da MP. “Não percebi que havia sacanagem nenhuma. Fiz o que interessava a Bahia, mas fico com a sensação de que o Brasil estava sendo governado por uma quadrilha”, criticou.

Aprovação. Na Câmara, a medida foi aprovada rapidamente e sem grande debate. Ninguém da base aliada falou. O deputado Duarte Nogueira (PSDB-SP) foi o único a discutir a matéria. Ele chegou a questionar o fato de o governo, em vez de ter um projeto de lei, instrumento mais adequado para discutir a matéria, usar medidas provisórias. Mas, no mérito, se posicionou a favor.

A medida chegou ao Senado formalmente no dia 22 de dezembro de 2009, mas só foi votada pelo plenário da Casa no ano seguinte, em 24 de março de 2010. Ex-governador da Bahia que ocupou dois ministérios no governo Dilma, Transportes e Portos, o senador César Borges (PR) relatou a matéria na Casa. Ele destacou que a medida era “muito importante”. A reportagem não conseguiu localizá-lo.

Durante os debates em plenário, o então senador ACM Júnior (DEM-BA) criticou o posicionamento do PT que, na época do governo FHC, foi contra a medida provisória que concedeu originalmente os incentivos.

Corrida à prefeitura do Rio já tem sete pré-candidatos

• Eleição promete ser pulverizada; PT não vai ter candidatura própria

Cássio Bruno - O Globo

A saída do deputado federal Alessandro Molon do PT para a Rede em setembro acirrou a disputa pela prefeitura do Rio, em 2016. Já são sete os pré-candidatos. Se confirmados, a briga pelo comando da cidade sede do Jogos Olímpicos será pulverizada e sem a participação do partido da presidente Dilma na cabeça de chapa. O PT apoiará o PMDB.

O cenário conta com pré-candidaturas de Pedro Paulo (PMDB), secretário municipal de Coordenação; dos senadores Marcelo Crivella (PRB) e Romário Faria (PSB); da deputada federal Clarissa Garotinho (PR); do deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL); e do ex-deputado federal Indio da Costa (PSD), além de Molon.

No PMDB, o prefeito Eduardo Paes ganhou a guerra contra Jorge Picciani, presidente estadual do partido e presidente da Assembleia Legislativa. Em articulação com o Planalto, Paes e o governador Luiz Fernando Pezão emplacaram o filho de Picciani, o deputado federal Leonardo Picciani — então pré-candidato à prefeitura —, como líder da legenda, deixando, assim, livre o caminho de Pedro Paulo.

Peemedebistas temem crise do PT
Para tornar Pedro Paulo conhecido, Paes tem usado eventos relacionados aos Jogos e inaugurações de obras como vitrine. A estratégia será intensificada no ano que vem. Além disso, o prefeito, Pezão e o exgovernador Sérgio Cabral têm se empenhado em conseguir alianças importantes. O objetivo é implodir pré-candidaturas de possíveis adversários. Crivella e Romário são os alvos preferenciais.

— Respeito todas as candidaturas. Mas estou focado na confirmação do partido pelo meu nome. É uma responsabilidade tentar dar continuidade ao trabalho — disse Pedro Paulo.

Nos bastidores, peemedebistas temem que a crise do PT e do governo e o andamento da Operação Lava-Jato possam respingar na campanha. Na semana passada, o PMDB do Rio defendeu Dilma publicamente. Em 2014, parte da legenda pediu votos para Aécio Neves (PSDB-MG).

Segundo o presidente regional do PT, Washington Quaquá, a decisão de manter a aliança no estado em 2016 é estratégica para a eleição presidencial em 2018:

— Ajudamos na aproximação da família Picciani e do PMDB com Dilma. Nossa prioridade é criar condições para o retorno de Lula. O PMDB do Rio é nosso aliado.

Com votação recorde, Romário foi eleito senador, anunciou ser pré-candidato a prefeito e assumiu o comando do partido com esse objetivo. No entanto, a candidatura vem se tornando incerta porque ele se aproximou do PMDB. Evita atacar Paes, Pezão e Cabral. Recentemente, foi visto almoçando com o prefeito e o governador.

— Alguns dizem que Romário não tem equipe preparada e não sobreviveria aos debates. Temem perder o espaço que têm — afirmou um aliado do senador.

Já em ritmo de pré-campanha, Freixo tem no horizonte Molon e Romário, com quem pode dividir os votos dos eleitores do campo da esquerda, como obstáculos.

— A diversidade contribui para a democracia. Vai ser a eleição mais disputada dos últimos anos — disse Freixo.

Indio da Costa vem consolidando a précandidatura. A executiva municipal do PSD divulgou nota dizendo aprovar o nome. Mesmo reconhecendo “qualidades” da prefeitura atual, o partido colocou à disposição de Paes os espaços administrativos ocupados pela legenda.

Segunda mais votada do Rio, Clarissa Garotinho flertou com o PSDB, mas não pôde trocar de legenda.

— Sempre quis disputar uma eleição majoritária, mas preciso avaliar o cenário mais à frente e definir uma estratégia — disse Clarissa, filha dos ex-governadores Anthony Garotinho e Rosinha Matheus.

Em relação a Crivella, o cientista político Ricardo Ismael diz que o senador pode surpreender:

— O Molon vai atrapalhar o Freixo. E o Romário poderá embaralhar tudo. Por fora, corre o Crivella, que sempre surpreende na reta final. A briga vai ser para saber quem será o candidato contra o PMDB.

Paes não descarta concorrer ao Planalto

• Prefeito do Rio condena rivalidade entre PT e PSDB e ‘oposição para matar’

-O Globo

O prefeito do Rio, Eduardo Paes, condenou ontem a rivalidade entre PT e PSDB, em entrevista ao jornalista Jorge Bastos Moreno, no programa “Preto no branco”, do Canal Brasil. Paes disse que “ninguém aguenta mais essa dualidade, esse jogo de se ele está lá, eu aqui serei oposição para matar”. O prefeito não descartou a possibilidade de ser candidato à Presidência da República pelo PMDB, depois de afirmar preferir que o candidato do partido à sucessão de Dilma seja o vice-presidente Michel Temer:

— Eu prefiro o Temer, mas deixa eu falar disso, porque os políticos sempre fogem dessas perguntas. Eu estou prefeito do Rio com muito prazer. Os desafios da cidade são imensos. Acho que tem muita coisa mudando para melhor. Não estou dizendo que não tem ainda muito problema. Então, eu curto cada momento de ser prefeito do Rio. Nunca fico pensando muito no dia seguinte.

Natural no governo do estado
Moreno comparou a resposta de Paes a declarações semelhantes do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em entrevista à revista “Playboy”, feita pela colunista do GLOBO Miriam Leitão, em 1985, quando FH concorreu à prefeitura de São Paulo. Questionado se seria candidato à Presidência, Fernando Henrique respondeu: “Não penso em candidatura, penso no momento.” Moreno aproveitou para insistir:

— Geralmente, as pessoas que pensam assim são aquelas que acabam chegando lá, prefeito.

— Enfim, se for para ser... — respondeu Paes. — Mas, de verdade, eu penso no momento, porque isso não pode ser um negócio sofrido.

O prefeito do Rio argumentou que acha mais natural uma candidatura ao governo do Estado do Rio, mas garantiu que isso não vem pautando suas ações. E defendeu a candidatura própria do PMDB à Presidência da República:

— Primeiro porque partido tem que ter candidato a presidente, e o PMDB é grande. Ele precisa colocar suas propostas e o que pensa sobre o Brasil. Segundo que, com todo carinho e respeito ao PT e ao PSDB, ninguém aguenta mais essa dualidade, esse jogo de “se ele está lá, eu aqui serei oposição para matar”. Hoje, essa dualidade entre o PT e o PSDB, esse ódio, sangue na boca e veneno permanente fazem com que eles estejam incapazes, os dois partidos, de construir uma coalizão para permitir o avanço do país.

Paes disse achar que a proximidade com a presidente Dilma não desgastaria uma eventual candidatura de Temer:

— As pessoas estão vendo o esforço de um democrata. A grandeza do Michel Temer permitiu, em um momento de crise institucional, dar uma desanuviada. Ele dialoga com Fernando Henrique, com Aécio, Serra, Lula, PT, PSB, com todo mundo. Esse é um papel importante. Já estou preparando a campanha Michel Presidente.

Aécio Neves - A "não presidente"

- Folha de S. Paulo

O arremedo de reforma ministerial que acaba de ser anunciado expõe ao limite máximo a constrangedora fragilidade da presidente da República e tem como principal efeito o adensamento da desqualificação da sua gestão à frente do país.

No momento em que o Brasil precisava de um gesto de desprendimento e coragem para fazer mais do que uma reforma, uma revolução gerencial, com intervenções profundas na estrutura governamental e a introdução de mecanismos inovadores em busca de eficiência e resultados, além de uma imperativa limpeza ética, o que se viu foi uma reforma marcada pela covardia e pela farta distribuição de nacos de poder, como se fossem mercadorias entregues àqueles que, de alguma forma, ameaçavam a permanência da presidente no cargo.

Ou alguém em sã consciência pode acreditar que a escolha dos novos ministros – para ficar apenas nas duas pastas mais relevantes – teve como objetivo melhorar a qualidade da saúde pública oferecida aos brasileiros ou colocar de pé a falaciosa "pátria educadora"?

A lógica da reforma não foi servir ao Brasil, mas, uma vez mais, atender às conveniências e aos interesses nada republicanos do governo e do PT. A verdade é que a presidente capitulou e jogou pela janela o pouco de autoridade que lhe restava.

Com o país mergulhado em crises cada vez mais graves, meses de discussões foram consumidos nos gabinetes de Brasília com o único propósito de evitar o encontro de contas com a Justiça de uma presidente eleita através de manobras sob drástica suspeição e pressionada por sucessivas denúncias de que o dinheiro da corrupção alimentou o caixa de sua campanha eleitoral.

Está chegando a hora de esclarecer com rigor tudo o que aconteceu. Os órgãos de controle do país saberão cumprir com independência, e sob o olhar atento da sociedade brasileira, o papel que deles se espera. Porque ninguém pode estar acima da lei, em especial quem deveria dar o exemplo – a presidente da República.

Se antes tínhamos uma presidente frágil, acossada pela crise econômica que seu próprio governo criou; pelos seus efeitos sociais que atingem de forma avassaladora principalmente os mais pobres, com o desemprego alarmante, juros escorchantes e inflação crescente; e por uma crise moral sem precedentes, com denúncias que chegam cada vez mais próximas do seu governo e do seu antecessor, resta agora uma "não presidente" que, para continuar no Palácio da Alvorada e frequentando o escritório do Planalto, parece ter abdicado das suas responsabilidades constitucionais.

A sensação que nos resta está expressa na frase proferida pelo ex-presidente Fernando Henrique: "A presidente já não governa mais. Ela é governada".

Até quando?

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Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat - A meia sola de Lula

- O Globo

“O governo distribuiu camarotes no ‘Titanic’ em vez de mudar o rumo do navio” Romero Jucá, senador do PMDB de Roraima

A presidente recordista em desaprovação popular delegou a Lula a tarefa de escolher seus novos ministros com o objetivo de montar o Governo 171. Nada a ver com o artigo do Código Penal que fala do crime de estelionato. Governo 171 é aquele capaz de garantir na Câmara dos Deputados pelo menos 171 votos, o mínimo necessário, segundo a lei, para enterrar qualquer pedido de impeachment.

LULA CELEBRA o desfecho da primeira etapa da tarefa. Sim, porque a depender dele, haverá uma segunda – e nessa rolarão as cabeças de Joaquim Levy, Ministro da Fazenda, e José Eduardo Cardoso, Ministro da Justiça. Levy porque é negativo seu discurso sobre o ajuste fiscal. Falta-lhe habilidade para vender esperança. Cardoso porque Lula está com raiva dele, e acha que tem lá suas razões.

ESTREITA-SE o cerco da Polícia Federal e do Ministério Público a Lula. Em breve, ele irá depor sobre a roubalheira na Petrobras que começou no seu segundo governo. Por mais que o Supremo Tribunal Federal o proteja concedendo-lhe a condição de “informante”, o que em tese não o obrigaria a dizer a verdade, não será tão simples assim.

ARRISCA-SE LULA, se flagrado mentindo, a passar à condição de indiciado. E como não tem direito a fórum especial, poderá cair nas mãos ásperas do juiz Sérgio Moro, o mentor da Operação Lava Jato. Lula debita na conta de Cardoso o suplício que o aguarda. Chefe da Polícia Federal, Cardoso nada fez até aqui para tirá-la do caminho de Lula.

HÁ OUTRO FRONT nas investigações conduzidas por Moro que preocupa cada vez mais o ex-presidente: o que tenta entender sua parceria com a Odebrecht, mas não só com ela. Lula tem dito que usou o cargo de presidente para facilitar a entrada de empresas brasileiras em outros países. Teria procedido, apenas, como um verdadeiro patriota, sem ganhar um tostão com isso.

O DIFÍCIL DE ACREDITAR é que agora, podendo legitimamente ganhar milhões de tostões como lobista de empreiteiras, Lula prefira seguir trabalhando de graça para elas. Teria sido de graça que ele voou a diversos países da América do Sul e da África onde a Odebrecht e outras construtoras disputam negócios. Delas, só ganharia para fazer palestras. E a preços de mercado. Bom menino!

SAIU BARATA a meia sola aplicada por Lula ao governo Dilma na semana passada. Reforma ministerial é algo mais abrangente e ambicioso. A meia sola limitou-se a uma troca de cadeiras entre ministros, com a extinção de algumas delas. Foi admitida a entrada de três caras novas: duas de deputados fiéis a Dilma, e uma de deputado que lhe promete doravante ser fiel.

QUANTO AOS sonhados 171 votos para barrar o impeachment, que é o que importa... Numa conta grosseira, Dilma, hoje, contaria com cerca de 220 para governar até o fim do seu mandato. Só tem um problema: impeachment não é uma questão matemática. É uma questão política. Os 220 votos estão sujeitos à força e à direção dos ventos soprados pela opinião pública.

DE FATO, o destino de Dilma depende do destino da economia. O governo carece de maioria no Congresso para aprovar as medidas mais duras do ajuste fiscal – entre elas, a recriação da CPMF. Dilma não tem autoridade política para pedir sacrifícios à população. O país está longe de ter atingido o fundo do poço. E a crise só agora começa a bater forte na porta das classes C e D, que ainda não foram para as ruas.

Valdo Cruz - A vez da moça do cafezinho

- Folha de S. Paulo

Nove meses depois de tomar posse, Dilma recomeça nesta semana seu governo. Não diria que do zero, porque ela entrou foi no vermelho neste período, de muitas perdas e pouquíssimos ganhos.

Criticada pelo oposição por ceder os anéis para não perder os dedos, Dilma não fez nada de novo. Repetiu o que tucanos já fizeram. Abriu mão de parte do poder para não perder poder. No caso dela, todo.

A diferença é que, como de costume, ela demorou muito a mudar. O que encareceu o preço do apoio, tornando-a tudo que não queria: mais dependente de Lula e do PMDB.

A novidade deste recomeço está na própria Dilma. Ela assumiu pessoalmente as negociações para recompor sua equipe ministerial. Fez os contatos diretos, olho no olho.

Em tese, porque nunca se sabe quando se lida com pretensos aliados, isto torna mais fácil a vida da petista na hora de cobrar lealdade dos governistas, virtude que anda meio fora de moda na base dilmista.

Enfim, parece, repito, parece que o novo arranjo ministerial deu certo. Se, na prática, vai funcionar dependerá da disposição da presidente de seguir atuante na política e entregar, de fato, os anéis prometidos.

O primeiro teste virá depois da posse da nova equipe. Na Saúde, dizem que o aparelhamento da máquina pelo PT chegou a tal ponto que até a moça que serve o cafezinho seria filiada ao partido de Lula.

O novo ministro Marcelo Castro (PMDB-PI), com certeza, vai querer trocá-la por gente sua logo que assumir a cadeira. Até para evitar, como diz um peemedebista em tom de galhofa, riscos de envenenamento.

Brincadeiras à parte, a piada revela a disposição dos ministros que chegam de mandarem, de fato, em suas áreas. Algo que, até aqui, a presidente e o PT não deixavam.

Só que o momento já não permite mais este luxo. Dilma ganhou fôlego, mas ainda corre riscos e seus aliados sabem que esta é a hora de sugar do governo tudo o que podem.

José Roberto de Toledo - Divórcio inevitável

- O Estado de S. Paulo

Quem reclama de o PMDB ter arrancado sete ministérios de Dilma Rousseff deve lembrar que a alternativa é o partido conquistar todos os 31 – ou, no mínimo, o direito de distribui-los entre aliados. A reforma ministerial foi uma prévia do futuro. Com ou sem impeachment, governo e País estão cada vez mais nas mãos de Eduardo Cunha, Renan Calheiros e companhia. Quanto mais dizem desdenhá-lo, mais cresce o seu poder.

Cunha não está a um extrato suíço da cassação? Talvez, mas está também a uma palavra de deflagrar o processo de apreciação do impeachment de Dilma. Basta ele responder ao pedido de Bicudo para os tucanos amestrados de Aécio Neves recorrerem ao plenário da Câmara e testarem a capacidade do governo de ter maioria simples. Sem o PMDB, a chance de fracasso governista é de 60%.

Não deixa de ser irônico e instrutivo que o processo que culminou com os peemedebistas aumentando sua fatia no Orçamento da União tenha começado em 2013, com um movimento de protesto contra os vícios de representação da democracia brasileira. O PMDB desviou de balas miradas e perdidas e ganhou cacife.

O poder do PMDB emana dos municípios. São prefeitos, vereadores e funcionários municipais que elegem deputados. É o voto destes, e o tempo de propaganda na TV proporcionado por eles, que o PMDB usa para negociar sua influência junto a qualquer presidente.

Nos últimos 25 anos, esse poder diminui a cada eleição. O PMDB elegeu 38% dos prefeitos do País em 1988. Daquela eleição até 2004, essa porcentagem caiu quatro vezes seguidas, para 34%, 24%, 23% e 19%. A perda se deu, primeiro, em favor do PSDB e, depois, do PT. Ambos os rivais usaram a Presidência para aumentar sua penetração municipal: tucanos duplicaram seu peso nas prefeituras entre 1992 e 2000, e os petistas multiplicaram por três seu número de prefeitos desde que Lula se elegeu.

A trajetória era desastrosa, e o PMDB se mexeu.

Depois de ser derrotado nas eleições presidenciais de 2002 coligando-se ao PSDB, o PMDB aderiu ao governo do PT em 2004. No 2.º turno de 2006, ajudou Lula a reeleger-se. O partido ganhou mais ministérios e, em 2008, conseguiu reverter a tendência de queda. Voltou a ter 22% das prefeituras.

A nova estratégia não era sustentável, porém. Os peemedebistas tinham se casado com o inimigo. Nas eleições municipais seguintes, o PMDB seguia aliado ao PT em Brasília – agora, com o vice-presidente da República –, mas, nos municípios, a ascensão petista criava muitos focos de conflito entre ambos.

No pleito de 2012, PT e PMDB foram, ao mesmo tempo, os maiores aliados e os maiores adversários um do outro: tinham o maior número de coligações e o maior número de confrontos diretos entre si.

O PT ganhou mais com o jogo duplo: cresceu sua fatia de 10% para 11,4% das prefeituras enquanto os peemedebistas voltaram a perder espaço, de 22% para 18% dos prefeitos eleitos.

Além de se ver reduzido à menor participação em prefeituras desde sua fundação, pela primeira vez o PMDB elegeu menos vereadores do que havia eleito no pleito anterior. Pior, perdeu o comando sobre 180 mil funcionários municipais e o poder de nomear 20 mil cargos sem concurso. 2012 fez soar um alerta.

E 2014 fez disparar o alarme: o partido continuou a encolher e perder deputados. Só não perdeu a presidência da Câmara porque Eduardo Cunha foi mais hábil que o governo e o PT, articulou um bloco e, mesmo sem ter a maior bancada, elegeu-se presidente. Vestiu a insatisfação do PMDB e passou a articular a separação litigiosa do casamento inconveniente com os petistas.

Mesmo que ele caia, mesmo que parte dos peemedebistas esteja acomodada em ministérios, a incompatibilidade municipal entre os dois partidos permanece. E só tende a crescer em 2016.

Marcos Nobre - Depois da abdicação

• Arranjo atual é a última chance de Dilma preservar o mandato

- Valor Econômico

Há cerca de 15 dias, Lula colocou Dilma diante do fato de que estava para ficar sem base suficiente para enfrentar o impeachment e que se veria obrigada a renunciar. Como fez reiteradas vezes desde 2014, deu-lhe o ultimato de entregar a ele a articulação do governo ou ficar sem condições de governar. Com muito choro e ranger de dentes, Dilma entregou a Lula a articulação. Quer dizer, entregou em dois tempos. Na primeira etapa, há duas semanas, a presidente cedeu ao antecessor algo como metade de seu governo, o mínimo necessário para a formação de um ministério anti-impeachment.

Semana passada Dilma foi obrigada a aceitar que esse movimento seria insuficiente. Travar a guerra do impeachment já seria a derrota, significaria assinar a carta de renúncia, deixando em branco apenas a data. A guerra do impeachment exigiria virar as costas para a economia e para o mercado por pelo menos dois meses. Em um contexto de crise aguda, seria o mesmo que pedir para que o mercado produzisse o ajuste na marra e jogasse o governo no precipício do caos econômico que levaria ao impeachment.

Ficou claro que não era possível separar o movimento de desarme do impeachment da formação de uma base parlamentar ampla o suficiente para permitir ao governo sair de uma posição meramente defensiva. Mas esse segundo movimento Dilma já não tinha mais condições de realizar sem abdicar em favor de Lula. O gesto foi selado pela entrega do último bastião de sua independência, a Casa Civil. A troca de Mercadante por Jaques Wagner não apenas põe Lula na Presidência: significa que Dilma já não tem mais controle sobre seu próprio governo. O que a Casa Civil não processa, não existe. Nem que seja o mais vivo desejo expresso da presidente.

Lula entregou com isso parte do que exigia o mercado: neutralizar Dilma sem o imponderável de uma ruptura como o impeachment. Veio junto uma demonstração importante de comando e controle sobre uma base congressual suficiente para levar o mandato de Dilma até o final. A primeira questão que vem depois da abdicação é saber se o mercado vai se dar por satisfeito, se o afastamento pelo menos temporário do colapso será avaliado como o máximo a que se pode almejar no momento, dando o resto por perdido pelo tempo que for possível. Porque, mesmo deixando de lado o incontrolável das graves incertezas do mercado internacional, o desequilíbrio estrutural das contas públicas persiste.

Os horrores da recessão darão sua contribuição, mas estão longe de resolver. Também vão contribuir, mas não vão bastar, a inflação mais para o lado do teto da meta em 2016 (o que já parece contratado) e o aumento de impostos (em se encontrando substitutos para o bode da CPMF). Mas o mercado pode perfeitamente não se contentar com o simples adiamento do colapso. Passado o susto de uma crise política em estado terminal, o mercado pode agora achar que já existe estabilidade política suficiente para ter o seu "momento PMDB", para começar a exigir ações de ajuste politicamente dolorosas.

Nesse cenário, Lula poderia se ver obrigado a recorrer a uma manobra nos moldes do duplo mortal carpado de 2003. Naquele seu primeiro ano de mandato, Lula saiu-se com uma reforma da Previdência cujo intuito foi produzir um "choque de credibilidade". Na circunstância atual de crise aguda, mesmo uma manobra como essa continuaria sendo insuficiente do ponto de vista do mercado, continuaria não resolvendo o problema das contas públicas esburacadas. Mas mostraria comprometimento com uma das principais "reformas estruturantes" e, sobretudo, demonstraria uma vez mais controle e comando sobre o sistema político. Nesse quadro, Lula acabaria impondo Henrique Meirelles no lugar de Joaquim Levy, acrescentando um requinte de crueldade à abdicação, já que Dilma simplesmente não tolera o ex-presidente do BC de Lula.

Não que o impeachment tenha inteiramente desaparecido do horizonte. Ali por março, abril de 2016, a inflação, o desemprego e a queda da renda estarão no pico do desespero. A Lava-Jato estará no auge do quadro de denunciados. Também não será surpresa se o Congresso do PMDB, previsto para 15 de novembro próximo, acabar adiado em quatro ou cinco meses, para coincidir com esse novo encontro de contas do novo governo. Sendo muito improvável que um processo de impeachment possa prosperar junto com as eleições municipais, o primeiro semestre é a última chance para as forças anti-Dilma. A desgraça ainda maior em que estará o país certamente vai ajudar. Mas, conforme passa o tempo, também o andor do impeachment vai ficando cada vez mais pesado de carregar.

Paradoxalmente, as melhores chances das forças pró-impeachment dependem de Dilma. Se a presidente usar os seis meses de crédito que ganhou com a abdicação para tentar reassumir a Presidência, provocará um movimento de instabilidade terminal de seu mandato. O presente arranjo é sua última chance. Não há volta nem alternativa a ele. Se sobreviver a 2016, Dilma pode até tentar negociar a retomada de algum espaço em seu próprio governo. Mas não mais do que isso.

Do ponto de vista do governo, tudo isso pode ser hoje condição necessária para tentar retomar alguma estabilidade menos instável do que se teve ao longo de 2015. Mas não é condição suficiente para resolver os problemas colocados. E não apenas do ponto de vista do equilíbrio das contas públicas. Mais grave, persiste a quadratura do círculo de conciliar as manobras de ajuste com a resistência social às medidas até agora apresentadas.

Lula jogou até agora de costas para o seu partido e para as bases sociais de sustentação do PT. A articulação aplacou, temporariamente ao menos, o sistema político. Deu um passo decisivo para alcançar o próximo objetivo, estabelecer uma trégua duradoura com o mercado. Falta o essencial, entretanto. Em uma democracia, é preciso produzir discurso e prática capazes de conquistar uma boa e sólida parcela de adesões entre quem trabalha, protesta e vota. Das três etapas, é a mais difícil de alcançar. Esse é o verdadeiro nó da abdicação.
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Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap.