terça-feira, 11 de agosto de 2015

Opinião do dia – Aécio Neves

Não cabe ao PSDB escolher qual o melhor desfecho para essa crise, até porque as alternativas que estão colocadas não dependem do PSDB. Seja a continuidade da presidente, seja a discussão na Câmara dos Deputados da questão do impeachment, seja a questão do TSE, o papel do PSDB é garantir que as instituições funcionem na sua plenitude.

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Aécio Neves é senador (MG) e presidente nacional do PSDB, na homenagem a Eduardo Campos. Recife, 10 de agosto de 2015.

Governo aceita agenda proposta por Renan para conter avanço da crise

Erich Decat, Vera Rosa, Ricardo Brito, Isadora Peron e Lorenna Rodrigues - O Estado de S. Paulo

• Após reunião com 4 ministros, presidente do Senado apresenta lista de 27 propostas legislativas para retomar crescimento do PIB; Planalto avalia que pauta do peemedebista é a chance para o Executivo tentar desviar o foco das ameaças de impeachment

BRASÍLIA - Para tentar superar a crise política, a presidente Dilma Rousseff vai encampar o pacote de propostas apresentado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para reeguer a economica. Para o Palácio do Planalto, a pauta é a chance que o Executivo tem para montar uma “agenda positiva” e tentar desviar o foco das ameaças de impeachment.

O pacote foi repassado ontem à tarde por Renan e aliados aos ministros Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento), Edinho Silva (Comunicação Social) e Eduardo Braga (Minas e Energia). Ao todo, são 27 propostas legislativas divididas em três grandes eixos: a melhoria da proteção social, do equilíbrio fiscal e do ambiente de negócios.

De acordo com senadores da base, a sinalização de apoio às iniciativas ocorreu por parte de Dilma em reunião com líderes partidários do Senado, antes de receber líderes e parlamentares da base aliada para um jantar no Palácio do Alvorada, residência oficial da Presidência.

“Aproveitamos o encontro e a comunicamos das propostas. Ela disse que já havia recebido o material de Michel Temer (vice-presidente e articulador político do governo) e que gostou. Ela até marcou um encontro na quinta-feira para dar continuidade nas conversas”, afirmou ao Estado o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE).

O fato de a agenda ter sido sugerida por Renan dá protagonismo ao presidente do Senado num momento em que o governo precisa dele para rejeitar a chamada “pauta-bomba” de projetos com aumento de gastos, isolando o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Renan também é hoje considerado no Planalto como “fiel da balança” para segurar eventual processo de impeachment de Dilma no Senado.

O presidente do Senado estava afastado do Planalto desde março, na esteira do seu envolvimento na Operação Lava Jato. Um ministro disse ao Estado que a agenda apresentada por Renan ajuda o governo a preparar o pós-ajuste. Em mais de uma ocasião, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dirigentes do PT pediram a Dilma que virasse a página do ajuste fiscal e começasse a falar do que virá depois.

No jantar, promovido para reaproximar o Planalto do Senado, Dilma recebeu ontem à noite no Alvorada 43 senadores e líderes da base do Senado e 21 ministros. No encontro, que durou cerca de quatro horas, a presidente apelou aos senadores para ajudá-la na votação de propostas de interesse do País.

Dilma não falou diretamente da atuação de Cunha, que rompeu com o governo há três semanas após ser citado em delação premiada na Lava Jato e impôs na semana passada duras derrotas ao Planalto. Renan não foi ao encontro – ele esteve com Dilma na quinta-feira passada.

“Ela pediu que os senadores ajudassem a Nação brasileira a superar este momento difícil, que prejudica a todos, não apenas ao governo”, contou o senador José Pimentel (PT-CE) após o jantar.

Agenda. Entre as medidas apresentadas no pacote de Renan está a aprovação de uma proposta que vincula a política de desonerações da folha de pagamento de empresas ao cumprimento de metas ou de preservação de emprego. Essa foi uma das medidas que mais agradaram ao Planalto. Auxiliares da presidente dizem temer que o projeto feito para rever as desonerações da folha das empresas, última etapa do ajuste fiscal, aumente as demissões.

Os projetos sugeridos também preveem um novo modelo de financiamento do Sistema Público de Saúde (SUS), além da realização de duas reformas tributárias: uma envolvendo o ICMS e outra do PIS/Cofins.

“Vamos apreciar todos os pontos do ajuste dentro dessa lógica da agenda”, afirmou Renan.

Para Dilma, opositores têm de ‘pensar primeiro no Brasil’; tucanos reagem

Daniel Carvalho e Anderson Bandeira - O Estado de S. Paulo

• Em palanque no Nordeste, presidente fala em ‘vale-tudo’ contra sua gestão e ataca quem torce e trabalha para o ‘quanto pior, melhor’; tucanos Aécio Neves e Geraldo Alckmin afirmam que a responsabilidade pela crise é do atual governo e rechaçam ajuda

SÃO LUÍS - A presidente Dilma Rousseff fez um apelo nesta segunda-feira, 10, em evento em São Luís (MA), para que os líderes oposicionistas e seus partidos “pensem no Brasil”. Ela criticou o que chamou de “vale-tudo” para desestabilizar sua gestão e a “torcida do quanto pior, melhor”.

As afirmações foram feitas durante entrega de unidades do programa Minha Casa Minha Vida. A presidente se posicionou também contra a chamada “pauta-bomba” do Congresso, em recado cifrado aos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). O senador e ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão (PMDB-MA), investigado na Operação Lava Jato, estava no palanque.

Segundo Dilma, os políticos de oposição devem pensar primeiro no País e, depois, em projetos pessoais. “O Brasil precisa muito, mais do que nunca, que as pessoas pensem primeiro nele, Brasil, pensem no que serve à nação, à população brasileira e, só depois, pensem em seus partidos e em seus projetos pessoais”, disse a presidente a uma plateia formada majoritariamente por integrantes de movimentos sociais, que responderam gritando “Não vai ter golpe”.

No Recife, onde participavam de homenagens ao ex-governador Eduardo Campos, morto em 13 de agosto do ano passado e que completaria 50 anos nesta segunda, líderes da oposição reagiram imediatamente às declarações de Dilma.

O senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB, considerou que não cabe ao seu partido escolher o melhor desfecho para a crise. “Até porque as alternativas que estão colocadas não dependem do PSDB. Seja a continuidade da presidente, seja a discussão na Câmara dos Deputados sobre o impeachment, seja a questão do TSE.”

Mais cedo, em entrevista a uma rádio local, Aécio afirmou que o problema do Brasil é a falta de confiança no governo. “As pessoas estão percebendo que a crise, além de política e econômica, é uma crise de confiança”, disse. Segundo o tucano, “errar faz parte da vida, mas o Partido dos Trabalhadores é incapaz de assumir seus erros”.

Endossando as críticas do correligionário, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, disse que a oposição não governa. “(O governo federal) Não pode responsabilizar os outros pelos seus problemas. A primeira questão para você resolver um problema é você reconhecer o problema”, afirmou.

Congresso. Sem citar nomes, Dilma, em São Luís, deu uma resposta indireta a Cunha e Renan, que voltaram do recesso com uma pauta que prevê projetos que aumentam os gastos do governo, como o reajuste de servidores federais, com efeito cascata para governadores e prefeitos. “Não concordamos com nenhuma medida aprovada que leve à instabilidade, tanto econômica quanto política do País. Não concordamos com medidas que levem o caos às finanças do governo federal, dos Estados e dos municípios”, disse Dilma.

A presidente citou o que chamou de “torcida do quanto pior, melhor” e fez outro apelo. “Vamos repudiar, sistematicamente, o vale-tudo para atingir qualquer governo. No vale-tudo, quem acaba sendo atingido pela torcida do quanto pior, melhor é a população do País, do Estado e do município.” Em seguida, Dilma questionou: “Quanto pior, melhor? Melhor para quem? É essa a pergunta. É pior para a população, é pior para o povo. É pior para todos nós”.

Alckmin e Aécio dizem que não cabe à oposição buscar solução para a crise do governo

Anderson Bandeira - O Estado de S. Paulo

• Presidente do principal partido de oposição e governador de São Paulo tentam afastar responsabilidade da sigla para ajudar na resolução do momento atual pelo qual passa o governo federal

RECIFE - Ao participar no Recife de homenagem pelos 50 anos que o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) completaria se estivesse vivo, o senador e presidente do PSDB, Aécio Neves (MG), afirmou nesta segunda-feira,10, que cabe ao governo, e não à oposição, buscar soluções para as crises política e econômica enfrentadas pelo País. Ao lado do parlamentar mineiro, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), também disse que a presidente Dilma Rousseff não pode "responsabilizar os outros" por problemas que ela própria criou.

"As alternativas que estão colocadas não dependem do PSDB. Seja a continuidade da presidente, seja a discussão na Câmara dos Deputados sobre o impeachment, seja a questão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral)", afirmou Aécio. Para o senador, a população brasileira percebe que há uma "crise de confiança", além da política e da econômica. "Errar faz parte da vida, mas o Partido dos Trabalhadores é incapaz de assumir seus erros".

Alckmin, por sua vez, criticou a atitude do governo em "não reconhecer erros" e de tentar "terceirizar responsabilidades políticas para solucionar a crise". "Não pode responsabilizar os outros pelos seus problemas. A primeira questão para você resolver um problema é você reconhecer o problema" disse o governador paulista.

Pela manhã, em São Luís (MA), Dilma havia reclamado do "vale-tudo" na política e afirmado que é preciso "pensar primeiro no Brasil". A presidente criticou os que apostam no "quanto pior, melhor", sem citar diretamente nomes da oposição. Na quinta-feira, em propaganda partidária exibida em rede nacional, o PT apontou Aécio como um dos líderes da oposição que atuam para "desestabilizar o governo" e, com isso, prejudicariam o País como um todo.

Presente no evento, o ministro da Defesa Jaques Wagner não comentou as falas dos líderes tucanos e usou o bordão criado por Campos para defender que o governo continuará "trabalhando", sem desistir do País. "Eduardo também enfrentou derrotas e vitórias, mas nunca desistiu por quem trabalha por um ideal não desiste nunca. E por isso a frase dele de que não vamos desistir do Brasil, porque nós temos um trabalho", disse o ministro.

"Vamos construir com altos e baixos , com divergências que são super bem vindas na democracia, mas sempre colocando aquilo que é fundamental, o interesse do País na frente", afirmou o ministro. Ele também usou o seu discurso para pedir conciliação e união para que a crise seja superada "a verdade nunca está na cabeça de um só. A verdade está na construção coletiva".

"Quem pensa diferente da gente não é inimigo. Ouvir para construir o consenso é que nos vai levar adiante".

Governo não é a solução para a crise, diz Alckmin

Ricardo Chapola - O Estado de S. Paulo

• Governador paulista voltou a fazer críticas à gestão Dilma Rousseff em jantar com 400 empresários realizado em São Paulo

O governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) afirmou nesta segunda-feira, 10, que o País vive uma “policrise” e disse que o governo federal não é a solução, mas sim o gerador dela.

“Nós vivemos hoje uma policrise: uma crise política, uma crise de natureza ética, uma crise econômica, e uma crise social. A crise é o governo. O governo não é a solução, é o gerador da crise”, afirmou Alckmin durante um jantar com cerca de 400 empresários em um hotel, na zona sul de São Paulo.

O tucano disse ainda que há uma “fragilização total do quadro partidário” pelo excesso de legendas e, ao se referir à crise ética, afirmou que o aparelhamento do Estado na esfera federal acaba “aumentando os desmandos”. “É inacreditável a situação”, disse o governador no evento promovido pelo Lide, grupo presidido pelo empresário João Dória, que recentemente manifestou sua disposição em disputar a Prefeitura de São Paulo pelo PSDB.

Mais cedo, em Recife, Alckmin também criticou a atitude do governo federal em "não reconhecer erros" e de tentar "terceirizar responsabilidades políticas para solucionar a crise".

"Não pode responsabilizar os outros pelos seus problemas. A primeira questão para você resolver um problema é você reconhecer o problema", disse o governador, que foi à capital pernambucana participar de uma homenagem ao governador Eduardo Campos, morto há um ano, vítima de um acidente de avião.

PMDB do Senado propõe pacote para superar crise

• Pauta, que inclui cobrança no SUS, é 'indispensável', diz ministro Levy

Senadores sugerem a Dilma pacote para combater crise

• Com governo frágil, líderes do PMDB tentam promover agenda ambiciosa

• Eles pedem fixação de idade mínima para as aposentadorias, leis ambientais mais flexíveis e terceirização

Natuza Nery, Fábio Monteiro e Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Chamados pelo Palácio do Planalto a ajudar na superação da crise política, líderes do Senado apresentaram um pacote de reformas –muitas delas polêmicas– como condição para votar as medidas de ajuste fiscal propostas pela presidente Dilma Rousseff.

Liderados pelo presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL), eles entregaram sua agenda nesta segunda (10) aos ministros Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Edinho Silva (Comunicação Social).

Intitulado "Agenda Brasil", o pacote lista 28 itens com medidas e ações como "contribuição do Congresso" para a retomada do crescimento. A proposta é dividida em três áreas: nove medidas para "melhoria do ambiente de negócios e infraestrutura"; 14 no campo do "equilíbrio fiscal"; cinco de "proteção social".

Entre as medidas polêmicas –sem consenso na própria base do governo– estão a possibilidade de cobrança do SUS por faixa de renda, a adoção de uma idade mínima na aposentadoria, a criação de um "fast track" (via rápida) para licenciamento ambiental de grandes obras e uma revisão de normas que regulam áreas indígenas.

Outras já estão mais ao gosto do PT, como a que regula imposto sobre heranças e a de reajuste planejado para servidores dos três poderes.

Senadores propõem ainda que o governo assine um termo de ajustamento de conduta em que se comprometeria a não empregar mais expedientes como as chamadas pedaladas fiscais, consideradas irregulares pelo TCU (Tribunal de Contas da União).

O pacote foi apresentado como um conjunto de iniciativas necessárias para o país voltar a crescer após o ajuste.

Na semana passada, Renan se encontrou com Dilma e falou, em linhas gerais, da disposição de apresentar as propostas. Ela deu o aval.

Levy e Barbosa também já vinham conversando com Renan e outros senadores sobre itens da lista, como a reforma do PIS/Cofins e do ICMS.

Mas os senadores aproveitaram o momento de fragilidade do Planalto para antecipar suas propostas. Os ministros avaliaram, então, que o melhor, neste momento, era deixar o Senado como protagonista das propostas.

Levy disse que o governo busca "convergência" com o Senado para "encontrar uma pauta de longo prazo, que a gente sabe que é necessária para a economia, para olhar não só para este momento, mas para onde a gente quer ir".

"Esta pauta sugerida pelo senador Renan Calheiros é a pauta do Brasil, indispensável para enfrentarmos a nova realidade econômica e superarmos a atual crise", disse.

O governo vê o Senado como possível contraponto à atuação da Câmara, cujo presidente, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), decidiu romper com o governo em julho, depois de ser acusado por um lobista de ter sido beneficiado pelo esquema de corrupção descoberto pela Operação Lava Jato na Petrobras.

A atuação de Cunha tem contribuído para a turbulência política, aumentando as pressões pelo impeachment. Na semana passada, ele pôs em votação contas de ex-presidentes que estavam pendentes, abrindo caminho para a análise das contas de Dilma, que o TCU tende a reprovar.

Prioridade
Renan, também alvo de inquérito da Lava Jato, disse que impeachment e análise das contas de governos anteriores não são prioridade agora.

"As pessoas perguntam sobre impedimento, perguntam sobre apreciação de contas dos governos anteriores e deste governo. E tenho dito que isso não é prioridade. Na medida em que o Congresso tornar isso prioritário, nós estaremos pondo fogo no Brasil. Não é isso que a sociedade quer de nós", disse ele.

Na noite desta segunda, num jantar com senadores de partidos aliados, Dilma foi questionada sobre o pacote. Ela afirmou ter recebido só "um rascunho inicial", segundo relatos, e não se estendeu nos comentários.

Não cabe à oposição apontar saídas para crise, dizem tucanos

• Em homenagem a Eduardo Campos, Aécio e Alckmin criticam PT por não admitir erros

Patrícia Britto – Folha de S. Paulo

RECIFE - Dois dos principais nomes do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) e o governador Geraldo Alckmin (SP) afirmaram nesta segunda (10) que não é dever da oposição apontar a saída para as crises política e econômica enfrentadas pelo governo federal.

"Não cabe ao PSDB escolher qual o melhor desfecho para essa crise, até porque as alternativas que estão colocadas não dependem do PSDB. Seja a continuidade da presidente, seja a discussão na Câmara dos Deputados sobre o impeachment, seja a questão do TSE", disse Aécio.

A declaração foi feita após homenagem ao ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto há um ano.

"A oposição não governa. Os erros que hoje estão ocorrendo são por conta do governo. Não pode responsabilizar os outros pelos seus problemas", afirmou Alckmin a jornalistas, rebatendo a declaração de Dilma de que haveria um "vale-tudo" para tentar atingir o governo.

Os tucanos criticaram as atitudes do governo de "não reconhecer os próprios erros" e de "terceirizar as responsabilidades", citando o último programa partidário do PT.

Eles evitaram, contudo, passar a imagem de que estariam atuando nos bastidores para desestabilizar o governo. "Essa questão de impeachment não está colocada neste momento", afirmou Alckmin.

Como a Folha mostrou no domingo (9), o PSDB está dividido. Grupo ligado a Aécio defende a convocação de novas eleições, mas ala próxima a Alckmin não quer mudanças, para que ele possa se candidatar à Presidência em 2018.

Homenagem
Políticos, amigos e familiares lotaram auditório no Recife para acompanhar as homenagens ao ex-governador.

O ministro Jaques Wagner (Defesa) citou bordão criado por Campos para dizer que o governo não irá desistir do Brasil. "Quem trabalha por um ideal não desiste nunca."

A ex-senadora Marina Silva (PSB) discursou emocionada. Ela clamou por justiça e pediu respeito à democracia. "Acima de nós está o Brasil."

Grupo faz lobby pelo afastamento de Dilma

- Folha de S. Paulo

• MBL quer convencer deputados indecisos

SÃO PAULO - Líderes do MBL (Movimento Brasil Livre), um dos principais movimentos de rua contra a presidente Dilma Rousseff, estão investindo no corpo a corpo com parlamentares para convencê-los a declarar posição favorável ao afastamento da petista.

O movimento atua em duas frentes. Há um grupo que investe em ações midiáticas, perseguindo parlamentares pelo Congresso com uma câmera em punho e divulgando as reações nas redes sociais.

A segunda frente mede a temperatura pró-impeachment, tendo contato discreto com líderes de diversas bancadas. Esse trabalho é capitaneado por dois dos "cabeças" do MBL: Renan Santos, 31, e Rubens Nunes, 26.

Os políticos os atualizam dos bastidores do Congresso –especialmente da Câmara, Casa que autoriza ou não um pedido de impeachment.

Nas últimas semanas, concentraram-se em parlamentares do PP e do PR, ainda reticentes ao impeachment. Eles avaliam ainda que o PSB está dividido sobre o tema.

Renan se opõe a Cunha e acerta pauta com governo

• Presidente do Senado diz que dar prioridade a impeachment é pôr fogo no país

• Dilma afirma que Brasil deve estar acima de projetos partidários ou pessoais e pede a todos que repudiem o vale-tudo na política

Em sinal de trégua, diante do clima bélico para o governo na Câmara, o presidente do Senado, Renan Calheiros, disse ontem que não considera prioridade a análise pelo Congresso das contas da presidente Dilma Rousseff, que pode levar a um pedido de impeachment. Para o senador — investigado pela Lava-Jato —, isso seria colocar “fogo no país”. Em reunião com os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, Renan apresentou um conjunto de 28 medidas para a retomada do crescimento, após o ajuste fiscal. Há propostas como a adoção da idade mínima para a aposentadoria ou a cobrança do SUS por faixa de renda. O documento, chamado de Agenda Brasil, sugere reformas em impostos e a criação de mecanismos rápidos para licenciamento ambiental. Dilma pediu aos brasileiros que repudiem o vale-tudo na política e que coloquem o país à frente de projetos partidários e pessoais.

Aceno à pacificação

Bárbara Nascimento e Catarina Alencastro - O Globo

BRASÍLIA E SÃO LUÍS- Em seu primeiro aceno explícito a uma possível pacificação com o governo, o presidente do Senado, Renan Calheiros, recebeu ontem os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, apresentou uma proposta de medidas para a retomada do crescimento econômico e afirmou que não tratará como prioridade a análise das contas da presidente Dilma Rousseff, que estão prestes a ser julgadas pelo Tribunal de Contas da União. Essas contas são vistas pelos adversários do Planalto como o principal argumento para a eventual abertura de um processo de impeachment por violação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas Renan, que é investigado na Operação Lava-Jato, deixou claro que cumprirá o papel de bombeiro a favor do Planalto:

— As pessoas perguntam sobre impedimento, sobre apreciação de contas dos governos anteriores. Isso não é prioridade. À medida que o Congresso tornar isso prioritário, nós estaremos tocando fogo no Brasil. Não é isso que a sociedade quer de nós.

Diante do comportamento beligerante do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, em relação ao governo, a presidente Dilma passou a apostar suas fichas no Senado, onde acredita que haverá mais ponderação, especialmente em relação às matérias que afetam a economia. Ainda na semana passada, a presidente convidou Renan para uma conversa no Planalto.

Ontem, Dilma recebeu no Alvorada 43 senadores e 21 ministros para uma reunião seguida de jantar. Ressaltando não se tratar de “confrontação com a Câmara”, ela fez um apelo para que os senadores da base aliada barrem as pautasbomba aprovadas pelos deputados. Afirmou que não se pode minimizar a crise econômica.

— Estou correndo o risco de me tornar repetitiva, mas insisto porque o país precisa encarar o desafio agora — disse Dilma em discurso, segundo senadores que participaram do jantar.

A presidente afirmou que o Senado precisa exercer seu papel de Casa revisora, e explicou que não é possível aprovar projetos que, por exemplo, dão mais de 70% de aumento salarial.

— Ela fez um apelo para ter a colaboração do Senado, sem confrontação, para ajudar o país nessa hora de dificuldades — disse o senador Jorge Viana (PT-AC), ao deixar o jantar.

“Quanto pior, melhor para quem?”
Além da aproximação com o Senado, a presidente deixou claro horas antes, em um evento no Maranhão, que apelará ao embate público contra os adversários para enfrentar a crise política. Ela pediu aos brasileiros que não aceitem a teoria de que devem enfraquecer o governo por desgostarem dele e que “repudiem o vale-tudo”.

— O Brasil precisa, mais do que nunca, que as pessoas pensem primeiro nele, Brasil. Pensem no que serve à nação, à população brasileira, e só depois pensem em seus partidos e em seus projetos pessoais. O Brasil precisa de estabilidade para fazer essa travessia, é como dentro de uma família. Quando há uma dificuldade, não adianta um ficar brigando com o outro porque não resolve a situação. É necessário que as medidas que sejam urgentes sejam tomadas — defendeu, completando em seguida:

— Ninguém que pensa no Brasil, ninguém que pensa no povo brasileiro deve aceitar os que falam assim: “Ah, eu não gosto do governo, então vou enfraquecê-lo”. Aí eu aposto no quanto pior, melhor. Quanto pior, melhor para quem? É pior para a população. É pior para todos nós. Quero aproveitar para fazer um apelo aos brasileiros: vamos repudiar sistematicamente o vale-tudo para atingir qualquer governo. Seja o governo federal, o governo dos estados e dos municípios. No valetudo, quem acaba sendo atingido pela torcida do “quanto pior, melhor” é a população.

Dilma reclamou da aprovação, pelo Congresso, de pautas-bomba que geram mais despesas para o governo. O evento em São Luís, que tinha o objetivo de entregar 2.020 moradias do Minha Casa Minha Vida, acabou se transformando num ato de apoio à presidente. Além dos beneficiários do programa, militantes de movimentos de moradia estavam presentes. O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), aliado de Dilma, afirmou que os que estavam ali davam um abraço simbólico na democracia.

— Nós aqui do Maranhão defendemos a democracia contra qualquer tipo de golpe. É claro que todos nós somos contra a corrupção. Defendemos a investigação e a punição de quem quer que tenha feito coisa errada. Temos que separar as coisas. Com respeito à Constituição, à democracia e às regras do jogo — discursou.

A presidente também conseguiu apoio no Senado, onde parlamentares do PT atacaram a oposição e criticaram, inclusive, o TCU, que julgará as “pedaladas fiscais”. Ex-ministra da Casa Civil de Dilma, a senadora Gleisi Hoffmann (PTPR) disse que vários ministros da Corte estariam “engajados no esforço de inviabilizar o mandato da presidente escolhida por voto popular”.

— Curiosamente, são os ministros políticos os mais engajados — atacou.

O líder do PT na Casa, Humberto Costa (PE), conclamou setores da sociedade a rejeitar o golpe e a buscar um grande pacto político e social. O senador petista disse que haverá uma convulsão social se Dilma deixar o poder, e que nenhuma coalizão para sustentar um governo pósqueda seria aceita, pois os movimentos sociais e beneficiários das conquistas do governo petista vão para as ruas fazer o embate político.

— A presidente Dilma não vai renunciar e não vai ser impedida de governar! Não pensem esses entusiasmados golpistas que vamos para casa colocar o pijama e assistir à novela das oito — avisou.

Hoje, uma reunião entre os líderes do Senado deve decidir quando será votado o principal projeto de interesse do governo — que acaba com a desoneração das folhas de pagamento e eleva o imposto sobre o faturamento das empresas.

— É evidente que vamos apreciar todos os pontos do ajuste. Combinamos reunião de líderes amanhã, a pauta da semana será uma consequência dessa conversa. O ministro Levy vai dar um sinal com relação à colaboração que ele recebeu de agenda para o país — disse Renan.

Propostas divididas em três áreas
Renan apresentou a Levy um documento intitulado Agenda Brasil, com 28 sugestões. O encontro, na residência da presidência do Senado, incluiu, além de Levy e Barbosa, os ministros de Minas e Energia, Eduardo Braga, e da Secretaria de Portos, Edinho Araújo. O documento de três páginas entregue por Renan será analisado por Levy, mas várias demandas já vinham sendo discutidas entre os dois e são consideradas convergentes com a agenda da Fazenda.

As propostas são divididas em três áreas: medidas para facilitar o ambiente de negócios, equilíbrio fiscal e proteção social. Entre as sugestões estão: repatriação de ativos financeiros, medidas para aumentar a segurança jurídica de contratos, e a reforma do ICMS e do PIS/Cofins.

Na proteção social, o documento propõe avaliar a possibilidade de cobrança diferente de procedimentos do SUS por faixa de renda. Entre as medidas de equilíbrio fiscal, fala em “ampliar a idade mínima para a aposentadoria, mediante estudos atuariais e levando-se em conta a realidade das contas da Previdência Social”.

O fato de alguns pontos terem convergência imediata animou a área econômica do governo. Desde o início do ajuste fiscal, Renan vinha fazendo críticas às medidas de Levy justamente por não incluírem propostas de incentivo ao crescimento. A sinalização foi de que é possível chegar a um entendimento para que o governo consiga destravar as votações do ajuste fiscal.

— Com vontade política fica muito mais fácil caminhar — disse um membro da equipe econômica.

Levy citou, entre as propostas que tem procurado emplacar, iniciativas de mais abertura econômica, realinhamento de preços e “uma série de boas notícias” na parte da energia elétrica, com o intuito de garantir maior previsibilidade.

— Renan e os senadores disseram que estão preparando as condições para entrar nessa nova fase. Passando dessa primeira fase de puro ajuste fiscal, vamos pegar algumas coisas que a gente já está fazendo e botar dentro de uma agenda mais formal — disse o ministro. (Colaboraram Fernanda Krakovics, Luiza Damé e Maria Lima)

Aécio: ‘ Não cabe ao PSDB escolher o melhor desfecho para a crise’

• Em homenagem a Campos, oposição evita apoiar tese de impeachment

Júnia Gama – O Globo

RECIFE- Uma semana após o PSDB defender no Congresso a realização de novas eleições, os principais presidenciáveis tucanos, o senador Aécio Neves ( MG) e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, tentaram ontem distanciar o partido de uma solução para a crise política e econômica que vive o governo Dilma Rousseff. Em evento para homenagear o ex-governador Eduardo Campos, morto em agosto do ano passado, tanto Alckmin quanto Aécio evitaram a defesa do afastamento de Dilma.

Ao GLOBO, Aécio defendeu que o PSDB não deve ser “protagonista” no processo de desgaste do governo e deve concentrar seus esforços na blindagem às instituições que estão levando adiante a “depuração” na política, como o Ministério Público e a Polícia Federal. Após o evento, em entrevista, o senador afirmou que não cabe ao partido escolher o “melhor desfecho” para a crise.

— Não cabe ao PSDB escolher qual o melhor desfecho para essa crise, até porque as alternativas que estão colocadas não dependem do PSDB. Seja a continuidade da presidente, seja a discussão na Câmara dos Deputados da questão do impeachment, seja a questão do TSE, o papel do PSDB é garantir que as instituições funcionem na sua plenitude — disse.

Alckmin defendeu o aprofundamento das investigações das denúncias de corrupção no governo, mas descartou a tese de afastamento da presidente.

— Essa questão de impeachment não está colocada neste momento, não há nenhuma proposta hoje de impeachment no Congresso Nacional. O que precisa agora é investigar, investigar e investigar e cumprir a Constituição. (...) Só existirá nova eleição se anular a eleição passada, isso hoje não é discutido. O que nós precisamos é passar a limpo a roubalheira, e o país crescer. Não é possível o país ter 2% de PIB negativo — afirmou.

A ex-senadora Marina Silva, que também prestou homenagem a Campos, fez um discurso conciliatório, destacando a necessidade de se ter uma “agenda conjunta” para superar os momentos difíceis. ela deverá deixar o PSB.

— Acima de nós está o Brasil, a democracia, nossa Constituição, 200 milhões de brasileiros que querem um Brasil melhor. Temos que ter a humildade, cada um de nós aqui, de compreender que, em momentos difíceis, as respostas não estão individualmente com nenhum de nós, mas entre nós. É preciso que se juntem para uma agenda em que o Brasil esteja em primeiro lugar — disse Marina.

Os discursos de quase todos os presentes ressaltaram que o Brasil passa por um momento de crise política e econômica e citaram a necessidade de superação desse cenário. Os políticos, no entanto, evitaram fazer do evento um palanque partidário contra ou a favor do governo. Somente após a homenagem, em entrevistas, os tucanos atacaram o governo Dilma.

Único representante do governo no evento, o ministro Jaques Wagner, em linha com o que Dilma disse no Maranhão, afirmou que é preciso colocar “o interesse do país na frente”.

— Nós temos o ideal de construir o Brasil que todos queremos: da inclusão social, da democracia, do respeito às diferenças, da prosperidade. E vamos construir, com altos e baixos, com divergências que são super bem-vindas na democracia, senão não teríamos a propulsão da caminhada, que é o debate entre os diferentes, mas sempre colocando o que é fundamental, o interesse do país na frente — disse.

‘PMDB tem espaço demais’

• Luiz Marinho, próximo de Lula, diz que Dilma enfim tomou iniciativa

Sérgio Roxo e Tatiana Farah - O Globo

SÃO PAULO - Petista dos mais próximos de Lula, o prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, classificou ontem de “bobagem” a redução de ministérios como forma de enfrentar a crise e afirmou que o PMDB já tem muito espaço dentro do governo, enquanto o PT tem “espaço insuficiente”.

— Para que mais espaço para o PMDB? Ele tem espaço demais. Cuida da articulação política, Integração, Minas e Energia, Portos. Tem coisa para caramba. Mas, se a solução for pôr 100% do PMDB, então ponha 100% do PMDB. Eu sinceramente acho uma visão muito estreita. Se os parlamentares estão dizendo “esse ministro não representa o partido”, tem de enfrentar essa discussão, não adianta ficar postergando. De repente não é a quantidade de ministros, mas como colocar pessoas dos partidos que representem efetivamente os partidos.

O petista afirmou que a presidente deu os primeiros passos para sair da crise, ao iniciar o diálogo com líderes e movimentos sociais:

— A presidenta Dilma aparentemente resolveu tomar as iniciativas de diálogo com vários segmentos. Espero que isso se restabeleça e que o partido não tenha mais que fazer esse tipo de reclamação — disse o prefeito, para quem o governo deve “sair dessa perplexidade e agir”.

Marinho, como tem feito o PT, atacou a política econômica do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Além de defender que o governo adote medidas como as tomadas por Lula em 2008, para ampliação do crédito e do consumo, ele criticou a decisão do ministro de apenas liberar estados e municípios para fazerem convênios internacionais no ano que vem:

— É preciso que o Levy tire o pé da garganta dos municípios e dos estados.
O petista desconsiderou a possibilidade de o ex-presidente Lula assumir um ministério para garantir foro privilegiado por conta das investigações da Operação Lava-Jato, que apura crimes de corrupção e cartel nos contratos da Petrobras.

— Não faz sentido o Lula ser ministro. Se ele tivesse de ir para o governo, teria de ser uma necessidade da presidenta — disse ele, apontando que Dilma demora a seguir os conselhos do ex-presidente: — Ouvir, ela sempre ouviu. Só não dava sequência ao que ouvia. Afinal de contas, ela não é surda.

Alckmin esfria ímpeto de tucanos por impeachment de Dilma

Pedro Venceslau – O Estado de S. Paulo

• O governador disse que agora o que precisa é investigar e cumprir a constituição

Depois de ver os líderes das bancada do PSDB no Congresso Nacional defenderem o impeachment da presidente Dilma Rousseff e a realização de novas eleições presidenciais na semana passada, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, criticou nesta segunda-feira (10/8) a possibilidade de um pedido de impedimento. "Essa questão de impeachment não está colocada neste momento. Não há nenhuma proposta hoje de impeachment no Congresso Nacional. O que precisa agora é investigar, investigar, investigar e cumprir a Constituição", afirmou.

A declaração foi feita no Recife, onde o governador participou, ao lado do senador Aécio Neves, presidente do partido, de uma solenidade em homenagem ao governador Eduardo Campos, morto em 2014. Os aliados de Alckmin na Executiva da sigla reclamaram na semana passada com emissários de Aécio que o partido não debateu o tema em suas instâncias de decisão. Dizem que, neste momento de acirramento da crise, a estratégia tucana deve ser desenhada com a participação de todas as correntes internas.

Ao afirmar ontem na capital pernambucana que "as alternativas que estão colocadas não dependem do PSDB", Aécio agiu para evitar que se instalasse uma crise entre os líderes das bancadas tucanas no Congresso Nacional e a ala paulista do partido. O senador José Serra (PSDB-SP) e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também desaprovaram a radicalização dos parlamentares.

'Ansiedade'
Alckmin evita abordar o tema em público e delega as críticas para aliados. Mas, em conversas reservadas, ele reprovou a "ansiedade" das bancadas do PSDB no Congresso, especialmente na Câmara.

Segundo tucanos próximos ao governador paulista, a homenagem feita quinta-feira no Palácio dos Bandeirantes ao vice-presidente Michel Temer (PMDB) serviu para marcar diferença entre a estratégia "incendiária" deflagrada por Aécio no Congresso e o zelo pela institucionalidade que marca o discurso da velha-guarda do partido, que se concentra majoritariamente em São Paulo.

Embora se diga pessoalmente favorável ao impeachment, Alckmin avalia que o PSDB erra ao pressionar o Tribunal Superior Eleitoral e o Tribunal de Contas da União, já que a sigla não tem qualquer influência sobre a decisão dos dois colegiados. Aliados de Alckmin reclamam, ainda, que o líder na Câmara, Carlos Sampaio (SP), "está muito acelerado".

Dilma convida e Lula recusa convite para ministério

Por Andrea Jubé e Lucas Marchesini - Valor Econômico

BRASÍLIA e SÃO LUÍS (MA) - A presidente Dilma Rousseff determinou que ministros petistas convidassem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir um ministério. O convite foi formulado a Lula pelos ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Jaques Wagner (Defesa) e Edinho Silva (Comunicação Social), que se reuniram com o ex-presidente em São Paulo na sexta-feira. Lula rejeitou a oferta porque acredita que sua missão, no momento, é viajar o país para defender o governo, o PT, e o seu legado. Dilma, Lula e o vice-presidente Michel Temer almoçam juntos na quarta-feira (12) para tratar da crise política e de uma possível reforma ministerial.

O encontro entre Dilma, Lula e Temer mostra a disposição de que haja um entendimento entre PT e PMDB por uma saída conjunta da crise. Dilma pediu a Temer que continue à frente da articulação política. Lula chega hoje a Brasília para participar da Marcha das Margaridas, ato das trabalhadoras rurais. Lula volta à capital federal na sexta, para um debate sobre o Plano Nacional de Educação (PNE).

Dilma vem sendo pressionada a promover uma reforma ministerial para aplacar a insatisfação na base aliada. O próprio Lula defende mudanças, a fim de substituir os titulares de algumas Pastas que não exercem influência sobre suas bancadas.

Paralelamente, voltou a pressão no PT e partidos aliados para que Mercadante deixe a Casa Civil: um dos principais auxiliares de Dilma segue apontado como pouco habilidoso no diálogo com a base. Uma fonte do Planalto disse ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, que aliados têm buscado outros interlocutores de Dilma, como Jaques Wagner ou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. A presidente, contudo, tem em Mercadante um de seus auxiliares mais leais, um "soldado" - nas palavras de uma fonte do palácio - disposto a todo o momento às missões que ela lhe confiar e não abre mão dele. No momento, Mercadante articula um encontro de empresários com Dilma, que deve ocorrer na próxima semana.

Dilma não designou uma pasta específica para Lula, mas fontes do governo apontam para o Ministério das Relações Exteriores ou, eventualmente, a Casa Civil. Caberia a Lula um posto onde pudesse atuar como articulador político, o que esvaziaria as atribuições do vice-presidente Michel Temer, coordenador político do governo. A projeção de Temer - sobretudo após o apelo nacional para que "alguém" seja capaz de unificar o país - tem gerado temor entre petistas, diante do vácuo do partido na interlocução política.

Paralelamente, Dilma intensifica as viagens na tentativa de melhorar sua popularidade e fazer a defesa de seu mandato. Ontem ela cumpriu duas agendas em São Luís, no Maranhão, ao lado de um de seus principais aliados político, o governador Flávio Dino (PCdoB): entregou 2.020 unidades do Minha Casa, Minha Vida, e inaugurou o Terminal de Grãos do Maranhão, no Porto de Itaqui.

Dilma repudiou o "vale-tudo" de quem põe interesses pessoais ou do partido acima dos interesses do país. Ela pediu "estabilidade" para atravessar "o momento de dificuldade" pelo qual o Brasil está passando. Estavam presentes movimentos sociais ligados ao PCdoB, como as Uniões da Juventude Socialista (UJS), dos Estudantes (UNE) e dos Estudantes Secundaristas (Ubes), que interromperam os discursos oficiais com palavras de ordem em defesa de Dilma. "Estamos passando por momento de dificuldade, mas o Brasil é muito mais forte que esse momento. Estamos em uma travessia, não estamos parados", disse a presidente, exortando os brasileiros a não ficarem "inseguros ou apreensivos".

Dilma também fez menção à "pauta-bomba" que a Câmara vem aprovando. Ela disse que não aceitará "medidas que levem o caos às finanças do governo federal, dos Estados e dos municípios". Ela concluiu alertando que, no "vale-tudo" político, quem acaba sendo atingido pela torcida do quanto pior melhor é a população".

O senador Aécio Neves (MG), presidente do PSDB, respondeu às declarações da presidente: "Faltaram mais uma vez humildade e sinceridade à senhora presidente para reconhecer que o vale-tudo ao qual se referiu foi praticado, não pelas oposições, mas por ela própria e por seu governo para vencer as eleições."

Eleição antecipada é tema fora de pauta, diz Alckmin

Por Marina Falcão - Valor Econômico

RECIFE - O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), disse que a antecipação das eleições não está em discussão dentro do PSDB, pois depende da impugnação da chapa eleita pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O tucano também descartou o apoio neste momento do partido ao impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). "A questão não está colocada neste momento no Congresso. Precisamos investigar, investigar e investigar e cumprir a Constituição", disse, após homenagem ontem no Recife ao governador Eduardo Campos, falecido há um ano.

Os dois temas dividem o PSDB. A realização de novas eleições agora frustraria os planos de Alckmin de ser candidato à presidência em 2018, já que o candidato natural do PSDB no momento seria o senador Aécio Neves, presidente da legenda.

Também no Recife, Aécio disse que não cabe ao PSDB escolher qual o melhor desfecho para a crise pela qual passa o Brasil, porque as alternativas colocadas não dependem do partido. Ele afirmou a jornalistas que "pessoalmente" tem vontade de participar das manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) no domingo, mas que tem ciência da sua responsabilidade institucional como presidente do PSDB. "Estou consultando os demais dirigentes do partido para tomar uma posição essa semana".

Para Alckmin, o Brasil passa por um problema conjuntural, de falta de credibilidade, e outro estrutural, de limitação de crescimento. "O Brasil ficou caro antes de ficar rico", disse, destacando a importância das reformas política, tributária e administrativa.

O governador paulista afirmou que os problemas pelos quais passa o país são de responsabilidade do governo e não da oposição, mas defendeu que o país precisa funcionar enquanto as instituições apuram. "A tarefa hoje é preservar e gerar emprego".

Alckmin disse que é preciso "passar a limpo a roubalheira" e colocar o Brasil no rumo para crescer. "Não é possível ter 2% de PIB negativo". Parafraseando Campos, afirmou que "não se pode ter intimidade com a crise", ou seja, é preciso tomar medidas rápidas para não se acostumar com ela.

Durante seu discurso em homenagem a Campos, Alckmin, acompanhado de seu vice, Márcio França (PSB-SP), disse que o Brasil "precisa muito do PSB". Afirmou que Campos "era um homem da esperança, não do agouro e do apocalipse".

Segundo Aécio, o governo cria as maiores dificuldades porque até hoje não teve a capacidade "de fazer a mea culpa" e insiste na terceirização de responsabilidades. "Caberá ao governo e não à oposição superar a crise que ele mesmo criou". O senador afirmou ainda que o PSDB terá a "coragem necessária para apontar equívocos, com responsabilidade para compreender que existe um Brasil para sobreviver a essa aguda crise na qual o PT nos mergulhou".

Em fala comedida no palanque de homenagem a Campos, Aécio ressaltou a falta que faz hoje o ex-governador em um momento de crise. Se vivo estivesse, Campos seria palavra de cobrança e denúncia, mas de absoluta responsabilidade com o país, disse. "Governos são circunstanciais, efêmeros, passageiros, com maior ou menor tempo eles se vão, mas o Brasil não, está aí para ser construído".

Moro diz que Lava Jato não pode ser um ‘soluço’

Por Julia Affonso, Fausto Macedo e Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba

- O Estado de S. Paulo

• Juiz que conduz as ações criminais sobre corrupção na Petrobrás prega reformas na legislação; ‘população quer saber se a Justiça funciona ou não’

O juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Lava Jato, disse que a população quer saber o ‘efeito final’ dos processos criminais, ‘saber se a Justiça funciona ou não’. ”Não podemos ter a Operação Lava Jato como um soluço que não gere frutos para o futuro”, alerta Moro.

Para o magistrado, ‘são necessárias reformas na legislação que aumentem a efetividade do nosso sistema’. Moro avalia que o excessivo número de recursos nas ações criminais ‘forma uma cultura de impunidade”. Para ele, o grande desafio a ser enfrentado pelo Direito brasileiro é a efetividade dos julgamentos criminais.

Sérgio Moro falou sobre o tema na manhã desta segunda-feira, 10, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre. As informações foram divulgadas no site do TRF4. O evento fez parte do curso “Direito Comparado – corrupção e processo penal: experiência nos Estados Unidos e no Brasil”, promovido pela Escola da Magistratura (Emagis) da Corte federal.

Moro fez uma comparação entre os dois países. O juiz da Lava Jato criticou o adiamento da punição. Segundo Moro, que é o responsável pelo julgamento em primeira instância dos denunciados na Operação Lava Jato, a presunção de inocência deve ter vínculo com a questão probatória. “No Brasil, existem casos criminais em que a prova incriminatória é esmagadora, mastodôntica, com a responsabilidade demonstrada, e o réu insiste em ir até o final do processo, apostando na impunidade.”

Moro fez referência a um artigo que escreveu em colaboração com o juiz federal Antônio Bochenek, publicado no Estadão, em que ambos manifestaram a necessidade de uma alteração na legislação do processo penal brasileiro que permita a prisão após a condenação já em primeira instância, tornando excepcional a liberdade na fase de recurso. “No Brasil vinculamos a presunção de inocência ao trânsito em julgado do processo, e têm homicidas confessos que ficam 10 anos sendo julgados em liberdade.”

Sérgio Moro disse que a legislação brasileira incentiva o recurso. “”Nos Estados Unidos, o condenado responde a eventuais recursos já na prisão”, ele observou. O juiz destacou que o sistema judicial brasileiro se assemelha mais à legislação italiana, caracterizando-se pela ‘excessiva morosidade’.

Moro usou como exemplo a “Operação Mãos Limpas” deflagrada naquele país europeu na década de 1990, que culminou com um número de investigados bem superior ao da Lava Jato.

“O caso, ocorrido entre 1992 e 1994, descobriu uma corrupção sistêmica disseminada na Itália. Cerca de 40% dos crimes acabaram sem julgamento de mérito. Boa parte se perdeu nos labirintos do processo penal italiano”, lamentou.

Para evitar um desfecho parecido em investigações de grande porte no Brasil é que Moro insiste em uma mudança de cultura jurídica. Para ele, uma ferramenta poderia ser o instituto da admissão de culpa, usado comumente nos Estados Unidos.

O magistrado destacou que na América 80% a 90% dos casos criminais encerram-se com o reconhecimento da culpa, sendo resolvidos em nível regional. Para Moro, nos casos em que a prova é esmagadora, não se justifica o tempo e o custo do processo.

No instituto da admissão de culpa, também conhecido como transação penal, ocorre uma espécie de Justiça Criminal Consensual, na qual os casos são resolvidos em negociações entre o indiciado e o Ministério Público, evitando a abertura de processo criminal.

“Para a população, o que importa é o efeito final, é saber se a Justiça funciona ou não. Não podemos ter a Operação Lava Jato como um soluço que não gere frutos para o futuro. São necessárias reformas na legislação que aumentem a efetividade do nosso sistema”, avalia Moro.

Papel da mídia. Questionado por participantes do evento da Escola da Magistratura (Emagis) do TRF4 sobre os limites da imprensa no caso Lava Jato, Moro afirmou que a Constituição diz que o processo é público e que o segredo de Justiça só deve existir em dois momentos: para garantir a eficácia de uma investigação e para evitar a exposição da vítima.

“A publicidade do processo é o preço que se paga por se viver em uma democracia. É uma garantia à sociedade, principalmente em casos de crimes contra a administração pública. Esses processos devem estar submetidos ao escrutínio popular”, concluiu.

Presidente da CNBB: "O povo já não aguenta mais tanta corrupção"

Ana Dubeux , Dad Squarisi /Correio Braziliense

• Chefe da Igreja Católica no Brasil critica, em entrevista ao Correio, a relação escusa entre os poderes político e econômico e afirma que o eleitor é o juiz dos candidatos

Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e arcebispo de Brasília, dom Sergio da Rocha considera missão da Igreja participar da política. Mas a atuação segue os propósitos católicos, baseados na ética e no bem comum, diferentemente dos interesses partidários e corporativos que ditam governos e campanhas eleitorais. Atento observador da sociedade, o arcebispo afirma que, em tempos de crise, a Igreja tem de exercer o papel do profeta: questionar, transformar, sem receio de desagradar ao senso comum. Esse posicionamento explica a decepção com a atabalhoada reforma política conduzida no Congresso — “a gente esperava muito mais” — e a ressalva ao pacto pela governabilidade — “Um pacto não vai deixar de lado, por exemplo, a luta contra a corrupção”. A postura cristã também fundamenta a posição da CNBB contra a redução da maioridade penal, apesar da imensa vontade popular. Paulista da cidade de Dobrada, dom Sérgio diz “ter cabeça de cidade, mas coração rural”. Aos 55 anos, está encantado com a receptividade do brasiliense, em particular nas regiões mais simples. Mas chama a atenção para os problemas sociais. Cita em particular o drama dos imigrantes, que vêm de regiões conflituosas da Ásia e da África e vivem em condições precárias nas cidades do DF.

A CNBB se posicionou firmemente em favor da reforma política. Houve avanço?

A gente esperava muito mais. O assunto merecia ser muito mais discutido pela sociedade civil organizada. É claro que se trata de um tema complexo, permite diferentes posturas, mas não quer dizer que não era importante. Ou que a Igreja não tinha nada a ver com isso. É claro que a Igreja tem a ver com isso! Ninguém é cristão apenas dentro da Igreja, só dentro do templo. Nós somos cristãos fora dele, no dia a dia. A Igreja não pode ficar só na sacristia. Tem de sair, ir ao encontro das pessoas. Precisa ter a palavra dela. Não sei se o projeto da reforma política ainda consegue avançar, mas pelo nível da tramitação, é difícil esperar muito mais. E não é porque um assunto está há muito tempo no Congresso que ele deve ser resolvido logo. Por mais urgente que seja, se não há uma participação maior da sociedade, fica difícil ter esperança de que um projeto vai realmente atender à necessidade da população. É preciso escutar mais para tomar decisões sábias.

A corrupção é outro grave problema?

A corrupção também poderia ser superada com a ajuda de uma reforma política. Poder-se-ia ao menos prever melhor medidas que ao menos ajudariam a superar o problema da corrupção, que é uma praga. O próprio papa Francisco diz que a corrupção é uma praga que clama aos céus. É algo que destrói a vida das pessoas. O processo ainda não está concluído no Congresso; portanto, ainda não se pode perder a esperança.

O que fazer para melhorar?

Esse campo é muito delicado, qualquer coisa que se afirme é motivo de controvérsia. Por isso, a CNBB não dogmatizou a questão. Alguns entenderam de uma forma que não era adequada. A igreja não se manifestou ameaçando ninguém. Na verdade, era uma ocasião para refletir, para se informar mais, para participar mais da vida política. Política no Brasil está muito restrita a partidos. Não se pode ficar refém de partidos. O povo, as comunidades têm de participar. No caso da Igreja, é claro que não temos postura político-partidária. Insistimos na importância da participação. Por exemplo, a questão do financiamento de campanha: esse é ponto que precisa ser mais bem considerado. Converse com as pessoas — não precisa ser um especialista — e diga que uma determinada empresa ofereceu milhões para um determinado candidato. Nunca ouvi ninguém dizer que acreditava que isso era por patriotismo.

O poder econômico interfere?

Não estou dizendo que está tudo errado. Estou dizendo que, no mínimo, é de se questionar as intenções. Com tantas necessidades no país, com tantas obras assistenciais precisando de dinheiro, como é que alguém vai entender que uma empresa oferece tanto? A gente tem visto que, no fundo, essa questão tem, sim, relação com a corrupção.

A empresa deve doar?

A CNBB foi uma das mais de cem entidades que participaram dessa coalizão em favor da reforma política. Ali a postura é contrária ao financiamento por parte de empresas. Se não se criar uma nova forma de fazer política no Brasil, é muito complicado a gente continuar com esse esquema baseado em interesse mais particular, de grupos, de bancada. Precisamos criar mecanismos legais para que a política, os políticos, as autoridades coloquem o bem comum acima de tudo. Muitas vezes vemos brigas tremendas, mas nem sempre esses conflitos são por causa do bem do povo. São por interesses de grupos. Seria bom que brigassem por interesse público.

O movimento do Ministério Público e da Polícia Federal, com a Operação Lava-Jato, é uma tentativa de mudança para que a corrupção não continue sendo uma praga?

Creio que essas entidades têm dado um contribuição muito importante. Permitem uma nova maneira de pensar política, de fazer política, de resgatar a ética. Esperamos que possa surgir um novo modo de fazer política desse processo doloroso que estamos vivendo. O povo já não aguenta mais tanta corrupção.

As mídias sociais ajudam na politização da população?

Elas têm um alcance imenso, mas há uma ambiguidade presente. Insistimos para que essa crise política e econômica não descambe em uma crise institucional, pondo em risco a ordem democrática. É importante, em momentos de crise, que haja diálogo, respeito entre as instituições. E o que acontece nas redes sociais? Delas sai de tudo. As redes sociais não são território imune, sob o ponto de vista moral. Ao contrário, ali também podem se expressar posturas, atitudes, propostas que não são convenientes.

Alguns grupos falam em um grande pacto para manter a governabilidade. A CNBB está pronta a integrar algum desses grupos?

Depende do que se entende por pacto, que é uma palavra de múltiplos significados. Hoje nós estamos em um momento de polarização política muito forte e com uma diversidade muito grande de partidos. Temos contato com diversas autoridades, inclusive a presidente da República. Tivemos esse momento inicial de diálogo e continuamos dispostos a dialogar para buscar o melhor ao nosso povo. Mas creio que qualquer pacto jamais vai sacrificar a verdade ou a justiça. Ao contrário, um pacto não vai deixar de lado, por exemplo, a luta contra a corrupção. O que significa, então, esse pacto? É colocar o bem do povo acima de qualquer interesse particular, partidário etc. Preocupa muito esse jeito corporativista de fazer política.

Está cada vez mais arraigado?

Sim, e com isso fica muito difícil superar aquilo que está na raiz da corrupção, que é esse tomá lá dá cá. A coisa pública fica em um segundo plano, e os interesses partidários, pessoais ou de grupos prevalecem. Sempre haverá a necessidade de vigilância, com a Justiça Eleitoral e a Polícia Federal, por exemplo. Mas eu diria que o primeiro juiz deveria ser o eleitor. Se o povo tivesse um pouco mais de discernimento na época da eleição, daria menos trabalho para a Justiça Eleitoral. Se o primeiro tribunal fosse a consciência do eleitor, restaria menos trabalho para os tribunais que cuidam de tudo isso. É lógico que nunca haverá eleitores perfeitos, com discernimento pleno. Mas nada exclui de ter uma reflexão mais séria.

A Igreja pode ajudar nisso. Na verdade, sempre ajudou.

A Igreja ajuda, e alguns até acham que a CNBB ajuda demais, que ela interfere além da conta. A CNBB não tem postura político-partidária. Se um ponto ou outro de seu ensinamento e de suas práticas coincidir com a de algum partido, não é por opção nossa. A CNBB, desde os seus inícios, foi objeto de questionamento, de discordância. Em outros períodos da nossa história, a CNBB também era questionada, e sempre será. Mas, se ela for questionada por fidelidade a Cristo, a valores éticos, é até melhor.

Essa postura mais crítica, de maior conscientização, será uma característica de seu mandato?

Acredito que estamos dando continuidade ao que já se fazia anteriormente. O que acontece é que o momento que temos vivido tem levado a CNBB a pronunciamentos. O que estamos fazendo agora é ter presente essa missão da Igreja nas atuais circunstâncias, de crise. Crise exige mais profetismo. Só que é preciso cuidado: se pegarmos a palavra crise nas suas origens, ela tem o sentido de purificar para surgir algo novo. Nós estamos esperando que desse processo todo, que é doloroso, possa surgir um novo jeito de fazer política, um novo jeito de servir o povo.

A sociedade assiste a dois movimentos muito fortes. Ao mesmo tempo em que o STF legitima a união homossexual, existem setores que defendem de forma veemente a família tradicional. Qual é a posição da CNBB e da Arquidiocese nesse debate?

A posição da Igreja tem sido muito clara porque até o momento não houve alteração doutrinária. A mudança não tem sido doutrinal, tem sido pastoral. Quando se fala de matrimônio, tem-se presente o homem e a mulher que se unem dentro das condições da Igreja. O que tem-se discutido é a questão de direitos civis. A Igreja tem insistido que não se pode equiparar o conceito de matrimônio como base da família e que dá base para o sacramento. A Igreja é contra qualquer forma de discriminação injusta, mas é preciso que se reafirme o valor do matrimônio fundamentando a vida familiar.

Essa visão da Igreja, a seu ver, é um avanço?

Há grupos que aceitam e até vão além, mas há grupos, dentro da Igreja inclusive, que têm dificuldade com essa postura defendida pelo papa.

Daí a necessidade de se fazer uma coisa mais lenta?

Olha, a Igreja tem uma tradição milenar. Nas diferentes épocas, mas a Igreja às vezes enfatiza um aspecto. O que existe são mudanças pastorais. É claro que é preciso uma fundamentação teológica. Sem um alicerce, uma casa não fica em pé. Para ter novas posturas, é preciso trabalhar e aprofundar os fundamentos, que são bíblicos, teológicos, filosóficos, antropológicos. Por quê? Por trás dessa e de outras discussões, existem diferentes concepções de pessoa humana. O critério pastoral da Igreja não é agradar ao mercado. Isso é perigoso. Para agradar ao mercado, nós nos transformaríamos em uma religião de mercado. Seríamos uma empresa que oferece um produto que o mercado quer. Se amanhã os “consumidores de religião” quiserem algo diferente, nós não podemos simplesmente ir a reboque do mercado. Lógico que a Igreja tem de considerar as situações concretas, as aspirações, os problemas, as mudanças efetivas na sociedade e na cultura. Mas a Igreja não pode mudar simplesmente porque há um gosto para lá ou para cá, senão nós entraríamos no âmbito da moda.

Isso explicaria, então, a CNBB se posicionar contra a redução da maioridade penal, diferentemente da maioria da população brasileira?

Sim. Se nosso critério fosse seguir aquilo que a maioria pensa, então é claro que não teríamos posturas proféticas. O profetismo é sempre uma palavra que questiona. A palavra profética é questionadora, é transformadora. Quando você quer agradar pura e simplesmente, você diz: “Bom, já que todo mundo está assim, vamos por aí”. Sobre a maioridade penal, lamentavelmente têm faltado dados mais efetivos a respeito da realidade. Têm havido discussões acaloradas no Congresso, mas faltam dados. E aí entra um fator que pesa. Há, de fato, situações, crimes, que comovem as pessoas. Então a tendência de muita gente é responder emocionalmente. Nós somos solidários com quem sofre, com as vítimas da violência. Sabemos que há famílias que vivem dramas terríveis, sejam praticados por maior ou menor. Nós nos compadecemos, não quer dizer que não temos coração. Acontece que se deixar levar pela comoção diante de certos fatos não é suficiente para mudar a legislação brasileira.

Há uma falsa impressão de que encarcerar jovens vai resolver o problema da criminalidade.

A nota da CNBB usa a palavra “equívoco”, de forma respeitosa, porque pode haver no meio da discussão gente muito bem-intencionada. Não estamos dizendo que as pessoas que defendem a redução são maldosas. Mas temos insistido que se coloquem em prática as medidas socioeducativas já previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente. O ECA não tem sido devidamente aplicado. As autoridades têm o seu papel nisso. É preciso políticas públicas para a criança e o adolescente. Nós precisamos investir em escola, pelo amor de Deus! Na mesma nota da CNBB, nós da Igreja nos dispusemos, como comunidade, a ser um espaço para ações socioeducativas, esportivas, culturais. A juventude precisa disso. Acho muito triste se responsabilizar. É como se o problema da criminalidade e da violência tivesse a ver com os menores: uma vez reduzindo a maioridade, o problema estaria resolvido. É aí que está o equívoco. E ainda tem o nosso sistema carcerário. Ele está em situação tal que não dá para dizer que vai educar e formar um adolescente.

Houve muitas críticas à nota e até a utilização indevida por parte de parlamentares. No momento em que a democratização da informação possibilita o surgimento de críticas mais pesadas, a Igreja tem trabalhado de uma forma diferente para fazer esses comunicados?

Procuramos comunicar nossa postura, respeitando a pluralidade que possa existir. No caso da maioridade penal, a Igreja reflete seriamente, a partir de valores éticos, a dignidade do adolescente, o valor da criança. As pessoas podem dizer: “Ah, mas ele é menor infrator, ele está em conflito com a lei”. Sim, mas não perde a dignidade. Aí está o problema. Muitos entendem que dignidade depende de condições. Então um morador de rua não tem dignidade nenhuma? Não tem direito nenhum, pode fazer dele o que quiser? No caso do adolescente infrator, vá ouvir a mãe dele. De um modo geral, eles são vítimas de violência da sociedade.

Durante muito tempo a Igreja se afastou, mas agora há uma reaproximação com os fiéis. Qual é a importância desse reencontro no DF?

A vida em comunidade tem crescido cada vez mais. Isso é muito importante não só para a sociedade, mas também para a igreja. Aquele estilo tradicional de grande paróquia, centralizada na matriz, não costuma dar resultado pastoral, não favorece a vida comunitária. Na medida em que nós vamos valorizando comunidades — com capela ou sem capela —, nós estamos tendo um fenômeno no DF que faz recordar os inícios do Cristianismo. Durante 300 anos, a Igreja existiu nas casas. Nós não tínhamos templos. Tínhamos a igreja acontecendo em residências, sobretudo naquele período em que era proibido se manifestar publicamente. Hoje, também pela nova maneira de se organizar a cidade — existem condomínios que não permitem a construção de igreja —, precisamos cultivar ainda mais a igreja como comunidade pequena. É preciso oferecer a experiência de Deus por meio da oração, mas é também preciso um espaço de vida fraterna. As pessoas vivem muito sofridas. Às vezes nas suas casas, nas suas famílias, não têm essa experiência.

O senhor tem encontrado muitas famílias fragmentadas?

Temos encontrado, e a Igreja está muito preocupada. Tanto que teremos em outubro, em Roma, o Sínodo sobre a Família. Devo ser um dos quatro bispos que representarão o Brasil. Passaremos um período longo com o Papa e outros bispos do mundo. Estamos preocupados porque vemos isso na prática. Encontramos famílias muito fragilizadas, não só nos laços internos. As pessoas são muito sofridas também em consequência de problemas sociais — tem muita violência, o que leva as pessoas a um estilo de vida muito triste.

Há problemas no lar também?

O problema da família fragilizada tem a ver com o dia a dia dos membros. As pessoas não se encontram mais. É lamentável. Antes, ao menos havia uma refeição dominical... Então a família vai enfraquecendo e as pessoas perdem uma referência fundamental. A igreja fica preocupada, mas não queremos ficar apenas no sentimento. Estamos buscando entender melhor a situação do matrimônio da família e, a partir daí, oferecer a nossa contribuição. Um dos aspectos importantes é a Igreja se apresentar como família. E não como uma instituição burocrática.

O papa Francisco é muito aberto em relação à família, não?

Na verdade, o Papa e a Igreja em seus documentos têm reafirmado a importância da família. Respeita-se essa pluralidade de situações na sociedade, mas não se perdeu e não se quer perder de modo algum o referencial bíblico. A primeira fonte para o trabalho pastoral e para a reflexão teológica é a fonte bíblica. Embora haja muita mudança cultural, a família não deixa de ter o seu papel. O papa quer é que a Igreja esteja atenta a essas diversas situações.

Como as pessoas em segunda união?

Exatamente. A Igreja está procurando servir cada vez melhor essas pessoas, de forma que elas se sintam amadas por Deus e acolhidas pela igreja. Porém, a igreja não deixa de propor o valor da fidelidade conjugal, da perenidade do matrimônio. Para aqueles que não têm conseguido alcançar esses valores ou a vivência desses valores, o papa tem insistido na misericórdia — tanto que ele instituiu o ano da misericórdia — na atenção e na acolhida a essas pessoas. A Igreja procura oferecer acolhimento, mas sem deixar de ser fiel aos valores que recebemos da Sagrada Escritura e da tradição da Igreja Católica.

Essa mesma compreensão se estende aos homossexuais?

A questão da homossexualidade precisa ser considerada como tal. Não é de agora que a Igreja começou a tratar desse assunto ou a ter uma postura pastoral de atenção maior, de acolhida, de misericórdia. Em 1986, um documento muito interessante e pouco conhecido foi publicado pela Congregação pela Doutrina da Fé, então presidida pelo cardeal Ratzinger, depois papa Bento. O título era O cuidado pastoral das pessoas homossexuais. Já se procurava dar mais atenção, compreender, acolher essas pessoas de tal modo que elas também se sentissem amadas por Deus e pela Igreja. Hoje o papa Francisco, naturalmente, tem enfatizado a misericórdia nos vários relacionamentos humanos.

Por que?

É importante considerar que uma pessoa tem o seu valor, sua dignidade inerente à natureza dela. A Igreja defende que a dignidade de uma pessoa é incondicional. Não pode depender de condições sociais, por exemplo, ou de sexualidade. Por isso uma pessoa homossexual, enquanto ser humano, deve ser respeitada, valorizada, acolhida. Agora é claro que a Igreja sempre propôs para as pessoas das mais diferentes condições, inclusive homossexuais, o Evangelho, a palavra de Deus, uma vida moralmente reta, a ética nos relacionamentos humanos, a ética na sexualidade. Não quer dizer que pelo fato de a Igreja ou do papa atual estar compreendendo cada vez melhor essas pessoas que a Igreja vá dizer “cada um faz o que quer, vive como quer”.

Enxerga uma política diferente aqui no governo do DF?

Uma política diferente, em primeiro lugar, precisa se pautar pela honestidade. Sobretudo no uso dos recursos públicos. Segundo, tem de se considerar a justiça social, até que ponto as medidas tomadas efetivamente ajudam os mais pobres. Isso exige políticas públicas concretas, não apenas desejo. E o terceiro ponto: o diálogo com a sociedade precisa acontecer. Eu me alegro aqui no DF porque o governador tem mostrado abertura para o diálogo e para parcerias. Como a Igreja tem uma atuação ampla no campo social, no serviço da caridade, nós esperamos que esse novo jeito de fazer política implique o uso de recursos públicos que priorize essas áreas.

O senhor destaca alguma parceria?

Um dos pontos fortes é o serviço prestado à população de rua. É um projeto que já vem vindo, mas que recebeu um novo apoio. A Igreja, por meio da Casa Santo André, no Gama, tem atuado bastante nesse campo. Mas nós temos creches, escolas, asilos... a Igreja tem um número imenso de obras sociais que necessitam também do apoio público. Necessitam de parcerias, não de privilégios.

A situação dos imigrantes o preocupa?

Esse é outro ponto que gostaria de destacar. É preciso dar muito mais atenção a esse fenômeno, que está crescendo no DF. São pessoas que vêm de regiões pobres, sofridas ou em conflito — Ásia, África, Oriente Médio. Estamos recebendo um número muito grande de imigrantes, e eles se concentram em algumas áreas, uma delas é Samambaia. A Comissão de Justiça e Paz da arquidiocese tem acompanhado muito de perto essa realidade, e estamos procurando oferecer a nossa ajuda. Aí está um campo inteiramente novo, e desejamos mais parcerias. É claro que é um problema em nível nacional. Mas em nível local, independentemente disso, essas pessoas estão aí. Chegam de uma forma que às vezes não é muito clara e vivem de uma forma muito limitada, com direitos muito restritos. Muitas vêm de situações de conflito político religioso ou de guerras, então é difícil para elas encontrar ajuda até nas suas representações diplomáticas. Quem é que cuida dessa gente? Elas ficam como se fossem pessoas que não olham por elas.

Brasília é uma cidade diversa e plural?

Sem dúvida. Nós estamos em uma época em que, no mundo — veja a Europa, parte dos Estados Unidos —, um dos grandes desafios é a convivência pacífica entre pessoas de origens e culturas diversas. Eu acho tão bonito! Quando encontramos isso na nossa cidade, precisamos valorizar. Mas não vejo essa característica de Brasília ressaltada fora daqui. Você sai de Brasília e não é muito comum as pessoas falarem desse aspecto. É como se aqui não tivesse coisa boa. Se uma capital federal tem essa virtude, temos de valorizar. Então eu me sinto já brasiliense nesse sentido.

O senhor gosta de fazer caminhada, sair pela cidade?

Eu insisto no seguinte — e isso não é apenas postura pessoal. É postura pastoral. Não se conhece a realidade do povo, da Igreja, das famílias ficando dentro da casa paroquial ou dentro do carro. Há uma diferença imensa. Percorrer a rua, entrar nas casas, conversar com as pessoas, ouvi-las, é muito diferente. Eu valorizo estatísticas, mas números não substituem pessoas. Mesmo com pesquisas para conhecer a realidade, você só a conhece caminhando no meio das pessoas, estando com elas. E isso seria muito bom, por exemplo, da parte dos políticos ou de quem exerce o poder público. Geralmente, essa proximidade do povo se dá em época de eleição. Como é que alguém vai defender interesses efetivos da população se não estiver próximo?

Depois da eleição, todos somem.

É uma pena. Na Igreja, o papa Francisco tem estimulado os bispos, os padres, a terem a atitude de estar com o povo. Amar uma pessoa de longe pode ter algum valor. Mas é pouco.

O que o encanta em Brasília?

Essa mistura de gente de toda parte do país. A convivência respeitosa que, de modo geral, podemos observar. Tem gente do Brasil inteiro, tem gente de fora do Brasil, e a convivência é muito boa. É uma das virtudes de Brasília. Quando vou para fora e se fala de Brasília, o pessoal sempre pensa em problemas, em mazelas, em coisas políticas. Mas há uma coisa em Brasília muito bonita: aqui parece uma grande família. Veja, por exemplo, Ceilândia. É claro que há bastante gente do Nordeste, mas vem gente de toda parte. Cada grupinho que você encontra, você pergunta, cada um é de um lugar.

Qual é sua avaliação após quatro anos à frente da arquidiocese?

Destaco dois aspectos. O primeiro é esse, da presença da igreja na sociedade. O que nós fizemos até agora vale, traz esperança, mas ainda temos muito pela frente. O segundo aspecto é o de missão. A igreja missionária não fica fechada sobre si. Olha para além dos muros. Olha para os mais feridos, os mais sofridos. E, por último, há alguns campos que ainda não conseguimos trabalhar direito, e que estamos insistindo. Por exemplo: o campo das artes, da cultura, do esporte. A evangelização de quem está no mundo artístico e esportivo é necessária pelo seguinte: quem está ali precisa de Deus. Se é gente, precisa de Deus.

Alguma atividade a mais?

Temos tido aqui na arquidiocese as conversas de Justiça e Paz. Elas acontecem aqui no auditório da Cúria, que tem o nome do nosso caríssimo cardeal Dom Falcão. Elas acontecem na primeira segunda-feira do mês. Por que isso é muito bom? Primeiro porque nós não precisamos apenas de diálogo, precisamos instituir mecanismos de diálogo. E não é um diálogo igrejeiro. Pelo contrário, tem sido sempre situação social, política, cultural. Na última vez foi sobre tolerância. O governador já esteve nessas conversas, ministros já vieram, assim como secretários de estado, especialistas e estudiosos. É um espaço modesto porque não atinge todo mundo, mas é fermento na massa, uma luzinha para iluminar o caminho. E temos também as pastorais sociais, que têm se fortalecido. Temos a Pastoral do Menor (nem todo mundo aceita o nome, mas tem sido esse), a Pastoral Carcerária, da Saúde, da Criança. Tem crescido essa presença da Igreja na sociedade, mas ainda estamos muito longe do ideal.

O trabalho pastoral é a sua marca mais importante?

Creio que sim, com simplicidade, com modéstia. O trabalho pastoral é um dos valores que a Arquidiocese de Brasília está cultivando nos últimos anos. Eu cheguei com uma experiência de contato mais direto com o povo no Nordeste. Durante seis anos, fui bispo auxiliar de Fortaleza. Vocês podem imaginar o que é viver no Ceará, conhecer o povo do interior e da capital. Depois fui arcebispo de Teresina por cinco anos. Foram onze anos em que, graças a Deus, aprendi muito com a Igreja no Nordeste e com o povo nordestino. Esse aproximar-se, esse acolher de maneira mais efetiva — ainda não aprendi totalmente, estou aprendendo ainda — a generosidade, a simplicidade, são coisas que aprendi muito lá.

Isso determinou o trabalho pastoral no DF?

Sim. Desde a minha chegada, comecei organizar essas visitas paroquiais. Elas têm um sentido grande para o bispo conhecer a paróquia e o povo. Eu insisti muito que o bispo não fosse sozinho. Que fosse acompanhado pelos padres da região ali visitada, e pelos leigos, leigas. Na Paróquia Santo Antônio, em Ceilândia, mais de 600 pessoas estão colaborando, de porta em porta. Hoje (sexta-feira) eu visitei creches, visitei hospital. Fiquei admirado com a acolhida das pessoas.

Por que?

Eu me surpreendi porque não esperava que houvesse abertura para esse tipo de atividade pastoral numa cidade tão grande. Claro que o estilo de vida é urbano de modo geral, e na grande cidade, esse tipo de proximidade pode não ser favorecido. Brasília se caracteriza por essa convivência de gente de todo lado.

Como é o estilo pessoal de dom Sergio?

Sempre procurei ser muito simples, e acho que isso é em razão das minhas origens. Tenho cabeça de cidade, mas coração rural. A vida no interior era muito simples, de quem dava mais valor ao estar junto, ao conviver, ao caminhar junto, ao trabalhar junto do que a ter muitos bens de consumo. Hoje o padrão de vida está pesando. Os bens de consumo pesam mais do que qualquer ouro valor. Uma pessoa acha que para ser feliz precisa comprar muitas coisas, e ela nunca é feliz assim. Nunca vai saciar essa sede.

O senhor imagina algum dia um papa brasileiro?

Nós primeiramente tivemos a surpresa feliz de um papa latino-americano. Vejo sim, com esperança, que outros possam sair da América Latina. Necessariamente do Brasil, não sei. Mas creio que ficou mais claro que é possível sim que um papa tenha sua origem na América Latina e que dê uma contribuição imensa para a Igreja.

E sobre a vocação de jovens?

As vocações estão surgindo mais da comunidade, não tanto das famílias. Às vezes a família do menino nem atua muito da paróquia, mas ele, por alguma razão, participa. E ninguém entra mais novinho. O seminário daqui só aceita para o ensino superior, nos cursos de filosofia e de teologia. E exige-se que todos participem da paróquia. Mas em Brasília há um fenômeno. Estou construindo um novo seminário, o chamado propedêutico, porque não cabe mais tanta gente interessada. Sabem quantos meninos querem entrar por ano no seminário? Cerca de cem! Desse total, estamos recebendo por ano de 20 a 25 novos seminaristas em Brasília. Nós somos rigorosos na seleção e no acompanhamento — para o bem deles. Isso é sinal de que a Igreja em Brasília é viva.

Eu já me sinto um brasiliense

"Quando eu saio de Brasília, sinto falta. Quando a gente está fora de uma cidade e sente que precisa voltar para estar em casa, é porque já é de casa. De origem, sou caipira do interior de São Paulo, mas trago no coração muito o Nordeste. E aqui eu me sinto em casa também porque sempre me encontro no meio de muitos nordestinos. Uma das coisas que inicialmente as pessoas podem estranhar, sobretudo no Plano Piloto, mas depois veem que é um dos grandes valores de Brasília, é a área espaçosa, o verde. Você vai a uma cidade grande, como outras capitais, fica sufocado entre os prédios. Não se pode perder isso, de preservar esse valor de Brasília. Mas eu já sinto falta é do povo mesmo. É muito bom estar nas nossas comunidades. E gosto também de estar nas comunidades do Plano Piloto, viu? Aqui tem muita vida, ao contrário do que alguns imaginam. Vida de igreja! Nos blocos, nos prédios...além das paróquias e das capelas, há comunidades pequenas nos blocos e nas quadras. Gente que se reúne para rezar, para ler a Bíblia, para comemorar aniversário. E, finalmente, sinto muita falta da Catedral. Acho que Brasília poderia ser cada vez mais representada pela Catedral, porque são mãos, são braços que se elevam para o infinito, para Deus, conforme o próprio Niemeyer dizia. O Distrito Federal seria marcado pela abertura ao infinito, a Deus, Àquele que dá sentido maior para a nossa vida. São as mãos em oração. Por um lado, não está representado lá diretamente, mas essas mãos também acolhem, são estendidas. A Catedral expressa melhor essas mãos erguidas, as mãos para Deus. Mas eu diria que dá para você entender também essas mãos como acolhida.