sábado, 25 de julho de 2015

Opinião do dia - Eliane Cantanhêde

Recordar é viver. Os bombeiros estão em ação, mas não custa lembrar que, em entrevista ao Estado em 10 de março, sua primeira exclusiva sobre a crise, o ex-presidente Fernando Henrique disse com todas as letras (acentuadas pela mágoa) que não faria acordos nem tinha nada a tratar com seu sucessor Lula: “Ele quer é acusar. Ele é o bom, nós somos os maus. Então, não há como dialogar com quem não quer dialogar”.
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Eliane Cantanhêde é jornalista, do artigo ‘Travessia no deserto’. O Estado de S. Paulo, 24 de julho de 2015.

Suíça rastreia US$ 13,7 mi de propina da Odebrecht

Ricardo Brandt, Fausto Macedo e Julia Affonso – O Estado de S. Paulo

• Operação. Força-tarefa sustenta que documentação obtida em país europeu constitui conjunto robusto de provas que incriminam dono da maior empreiteira do Brasil, Marcelo Odebrecht; juiz Sérgio Moro decreta nova prisão preventiva da cúpula da empresa

CURITIBA - A força-tarefa da Operação Lava Jato apresentou ontem dados sobre a movimentação de contas da Odebrecht na Suíça e sustentou que a documentação constitui um conjunto robusto de provas que incriminam os executivos e o dono da maior empreiteira do País, Marcelo Bahia Odebrecht. O material serviu de base para que o juiz federal Sérgio Moro decretasse nova prisão preventiva da cúpula da empreiteira. O empresário e outros dirigentes ligados ao grupo, além da cúpula da Andrade Gutierrez - a segunda maior empreiteira brasileira - foram denunciados ontem pelo Ministério Público Federal. A partir de agora eles são acusados formalmente de crimes como corrupção ativa,organização criminosa e lavagem de dinheiro.

A Justiça Federal no Paraná, base da Lava Jato na primeira instância, terá de decidir se acolhe ou não a denúncia. Ontem, Moro atendeu pedido da Procuradoria da República para decretar nova prisão preventiva de Marcelo Odebrecht e dos executivos Márcio Faria, Rogério Araújo e Alexandrino Alencar. O juiz considerou que eles, em liberdade, representariam riscos à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal. Segundo a força-tarefa da Lava Jato os extratos bancários confirmam os depósitos de propinas nas contas de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Pedro Barusco, ex-gerente de Engenharia da estatal, Renato Duque, ex-diretor de Serviços, Jorge Zelada e Nestor Cerveró, ex-diretor de Internacional.

A remessa de dados de investigação das autoridades da Suíça foram consideradas a prova cabal do envolvimento da Odebrecht com o esquema de corrupção. Segundo os procuradores, dados de offshores ainda desconhecidas pela Lava Jato, como a Smith 8c Nash Engeinnering Company, Arcadex Corporation, Havinsur SJA, Golac Project, Rodira Holdings, Sherkson Internacional, são a trilha para rastrear a lavagem de cerca de R$ 1 bilhão em contas secretas.

Os documentos apresentados e os resumos das autoridades suíças feitos à força-tarefa da Lava Jato e levados ontem ao conhecimento de Moro, indicam que a Odebrecht, teria realizado depósitos via 10 empresas offshores nas contas dos dirigentes da Petrobrás. Duas delas já eram conhecidas, a Constructora Dei Dur e a Klienfeld. São contas usadas supostamente pela empreiteira para os pagamentos e por beneficiários para recebimento de recursos. Ao todo, segundo a força-tarefa, a Odebrecht distribuiu R$ 389 milhões em propinas para ex-diretores da Petrobrás por meio de deslocamento de valores por offshores e contas na Suíça.

Deste montante foram rastreados, segundo os documentos da Suíça, pelo menos US$13,7 milhões e mais 1,9 milhão de francos suíços depositados em contas de offshores de Costa (Sagar, Quinus e Sygnus), de Pedro Barusco (Pexo) e outra de Duque (Milzart). Todas contas foram abertas na Suíça e em Mônaco.

"Prova material". De acordo com o juiz da Lava Jato, "pelo relato das autoridades suíças e documentos apresentados, há prova, em cognição sumária, de fluxo financeiro milionário, em dezenas de transações, entre contas controladas pela Odebrecht ou alimentadas pela Odebrecht e contas secretas mantidas no exterior por dirigentes da Petrobrás". "Trata-se de prova material e documental do pagamento efetivo de vantagem indevida pela Odebrecht para os dirigentes da Petrobrás, especificamente Paulo Costa, Pedro Barusco, Renato Duque, Nestor Cerveró e Jorge Luiz Zelada."

Os pagamentos ocorriam de duas formas, segundo o MPF: diretamente, pela utilização de contas em nome de três offshores das quais é a beneficiária final e, portanto, controladora, com transferências diretas dessas contas para contas controladas por dirigentes da Petrobrás. A outra forma de pagamentos era feita de maneira indireta - por meio da realização de depósitos de contas offshores em empresas baseadas em paraísos fiscais, que depois repassavam os recursos contas dos então diretores da estatal. O próprio Costa fez delação premiada e confessou ter recebido US$ 23 milhões em propinas da Odebrecht.

Ministério Público denuncia presidentes de empreiteiras

Estelita Hass Carazzai e Graciliano Rocha – Folha de S. Paulo

• Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo estão presos desde 19 de junho no Paraná

• Investigação na Suíça encontrou evidências de pagamentos da Odebrecht no exterior a ex-diretores da estatal

O Ministério Público Federal apresentou à Justiça nesta sexta-feira (24) denúncias contra o empresário Marcelo Odebrecht, o presidente da Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, e outros executivos das duas maiores empreiteiras do país, para que sejam processados pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Presos em caráter preventivo em Curitiba desde o dia 19 de junho, eles são acusados de participar do desvio de R$ 632 milhões dos cofres da Petrobras nos últimos anos, durante a execução de obras em refinarias, gasodutos e outros projetos da estatal.

Segundo o Ministério Público Federal, as duas empresas movimentaram mais de R$ 1 bilhão em contas usadas para pagar propina a funcionários da Petrobras, operadores do esquema de corrupção e três partidos que davam sustentação política aos diretores da estatal, o PT, o PMDB e o PP.

De acordo com os procuradores, as duas empresas faziam parte de um cartel que combinava o resultado das licitações da Petrobras e pagava suborno para garantir os contratos. Outras sete empreiteiras acusadas de envolvimento com o esquema já são alvo de ações na Justiça.

"A mensagem é que o Brasil não vai compactuar com a prática de crimes, por mais poderosos que sejam seus autores", afirmou o procurador Deltan Dallagnol, um dos integrantes da força-tarefa que conduz as investigações da Operação Lava Jato.

Os procuradores exibiram pela primeira vez evidências que ligam a Odebrecht a contas que repassaram propina na Suíça aos ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque e ao ex-gerente da estatal Pedro Barusco.

Documentos enviados pelo Ministério Público da Suíça indicam que empresas controladas pela Odebrecht no exterior são a origem de US$ 15,7 milhões encontrados em contas secretas mantidas pelos ex-funcionários da Petrobras.

A descoberta destes pagamentos –que há meses são negados pela empresa– levou o juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato no Paraná, a decretar novamente a prisão preventiva de Marcelo Odebrecht e outros executivos da empresa nesta sexta-feira.

Os suíços enviaram documentos em que as subsidiárias da Odebrecht aparecem como controladoras de pelo menos cinco contas registradas em nome de empresas registradas em paraísos fiscais, por onde fluíram os pagamentos aos ex-dirigentes da Petrobras.

O modelo era tão sofisticado, segundo o Ministério Público, que o dinheiro passava por três transferências bancárias antes de chegar aos destinatários finais. Segundo as autoridades suíças, as contas associadas à Odebrecht movimentaram o equivalente a R$ 1 bilhão nos últimos anos.

Nafta
O Ministério Público afirmou ainda que a Petrobras teve prejuízo de R$ 6 bilhões entre 2009 e 2014 com a venda de nafta para a Braskem, petroquímica do grupo Odebrecht. A nafta é a principal matéria-prima da indústria de plástico.

De acordo com a denúncia, Paulo Roberto Costa interferiu nas negociações entre a Braskem e a Petrobras em 2009 para garantir que o preço da nafta ficasse abaixo do que era cobrado no mercado internacional.

Em depoimentos, Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef disseram aos procuradores que a Braskem concordou em pagar US$ 5 milhões por ano para garantir o combinado. Segundo eles, o dinheiro foi dividido por Costa com o PP e o ex-deputado José Janene (PP-PR), morto em 2010.

Lava-Jato liga Odebrecht a propina paga na Suíça

Propinoduto desvendado

Germano Oliveira, Thaís Skodowski, Cleide Carvalho e Silvia Amorim – O Globo

• Documentos ligam Odebrecht a pagamentos feitos a dirigentes da Petrobras na Suíça

CURITIBA - Em nova denúncia oferecida ontem à Justiça a partir de investigações da Operação Lava-Jato, o Ministério Público Federal (MPF), pediu a condenação de 22 envolvidos no esquema de corrupção na Petrobras para beneficiar contratos das duas maiores construtoras do país: Odebrecht e Andrade Gutierrez. Além de executivos das duas empreiteiras, também foram denunciados gestores da estatal e operadores do esquema. Para fundamentar o novo pedido de condenação, os procuradores envolvidos na investigação apresentaram um minucioso detalhamento de transações financeiras, incluindo o rastreamento de contas no exterior, que ligam recursos movimentados pela Odebrecht ao dinheiro depositado em contas de funcionários da Petrobras na Suíça. Estes, por sua vez, repassavam recursos a políticos de PT, PP e PMDB, que lhes davam respaldo político. A Odebrecht, que nega relação com essas transações, movimentou pelo menos US$ 17 milhões, dizem os promotores.

No topo da lista dos denunciados estão os presidentes das construtoras Marcelo Odebrecht e Otávio Marques de Azevedo, presos desde 19 junho em Curitiba. Se a denúncia de ontem for aceita pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, os executivos e os outros denunciados passarão à condição de réus e serão julgados pelo magistrado. Pelo cálculo do MPF, os prejuízos da Petrobras em contratos com as duas empreiteiras chegam a R$ 7,2 bilhões, quase o dobro do valor que os procuradores pedem a título de ressarcimento, até agora, em todas as ações movidas pela Operação Lava-Jato.

Os procuradores dizem ter desvendado o esquema sofisticado usado pela Odebrecht para levar vantagens em contratos com a estatal, que se diferenciava da ação das outras empreiteiras investigadas na Lava-Jato. Isso inclui a identificação da ligação da Odebrecht com contas e Offshores usadas para lavagem do dinheiro da propina no exterior, como as chamadas Smith & Nash Engineering, Havinsur, Arcadex, Golac Project e Sherkson. O procurador Deltan Dallagnon, que lidera a força-tarefa da Lava-Jato, apresentou ontem em Curitiba documentos que comprovam mostram a titularidade da Odebrecht. Isso foi possível com a chegada ao Brasil de documentos vindos da Suíça nesta semana.

Andrade Gutierrez propinas por operadores
Segundo a denúncia, a empreiteira recorreu a até três níveis de lavagem de dinheiro para despistar o pagamento de propina. As Offshores eram abastecidas por empresas da Odebrecht nos Estados Unidos e Panamá, que, por sua vez, transferiam parte desse dinheiro a contas ligadas aos então executivos da Petrobras Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Renato Duque no exterior. Por vezes, antes de chegar a esses destinatários, a propina passava por contas de intermediários, também mapeadas pelos procuradores. O volume movimentado no esquema entre 2006 e 2014, segundo a denúncia, superou R$ 1 bilhão.

- Essas Offshores não têm o nome da Odebrecht, mas têm como titular real a empreiteira comprovadamente - afirmou Dallagnol.

A denúncia detalha ainda o esquema de pagamento de propina no caso dos contratos entre a Odebrecht e a Petrobras para a obra do Centro Administrativo da Petrobras em Vitória, no Espírito Santo, e o fornecimento de nafta a Braskem.

No caso da Andrade Gutierrez, o outro alvo da denúncia, são listadas oito obras ligadas às diretorias de Abastecimento e de Serviços. Para os procuradores, o pagamento de propina pela empreiteira deu-se basicamente por meio de empresas de fachada, que eram contratadas e recebiam sem nunca terem prestado qualquer serviço. O dinheiro, seja por meio de saques ou transferências para contas bancárias, acabou, segundo a denúncia, nas mãos dos de Paulo Roberto Costa, Fernando Soares e Pedro Barusco.

Entre os denunciados ontem pelo MPF por organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção, estão o doleiro Alberto Youssef, Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Renato Duque, além de executivos das construtoras e operadores políticos. Um novo personagem da Petrobras também foi denunciado: o gerente-geral Celso Araripe.

O MPF calculou em R$ 389 milhões o valor das propinas distribuídas pela Odebrecht e em R$ 243 milhões, os da Andrade Gutierrez.

- Nos aproximamos da verdade com documentos vindos da Suíça. Não há espaço para a teoria da conspiração. Temos um suspiro de esperança, um suspiro republicano. Estamos criando uma nova história, para punir todos os criminosos. As investigações não param aqui - afirmou o procurador Dallagnol, num recado aos advogados de defesa.

No balanço, 139 denunciados até agora
O MPF aproveitou ontem para fazer um balanço da Operação Lava-Jato: 139 pessoas denunciadas e 30 condenadas. Por causa dos 156 inquéritos abertos até agora e das cinco ações por improbidade abertas, já foram recuperados R$ 870 milhões, restituídos por acordos de delação premiada. Outros R$ 385 milhões são objeto de repatriação. Com multas e ressarcimentos aos cofres da União, já foram arrecadados R$ 4 bilhões. Cerca de R$ 2 bilhões que estão bloqueados em bancos do Brasil e do exterior.

O MPF pede da Odebrecht o ressarcimento de R$ 6,7 bilhões. Da Andrade Gutierrez, os procuradores querem R$ 486 milhões. A Andrade Gutierrez foi envolvida em atos de corrupção e pagamentos de propinas na Diretoria de Abastecimento em obras como da Refinaria da Comperj, no Rio de Janeiro. Já na diretoria de Serviços, a empreiteira pagou propinas no valor de R$ 1,5 bilhão em 2010. Três executivos da construtoras estão entre os denunciados.

- Inicialmente os valores eram feitos através de Fernando Baiano com a Andrade pagando à Tecnit, de Baiano. Eram feitos contratos frios para justificar a saída de dinheiro, quando na verdade não havia prestação de serviços, e sim propina. Constatou-se saídas de dinheiro das contas de Baiano e Armando Furlan Junior, seu sócio, com saídas inferiores a R$ 100 mil para não alertar o Coaf. Esse dinheiro era disponibilizado em espécie para Paulo Roberto Costa - disse Dallagnol.

Riscos recentes ameaçam meta da inflação, diz diretor do BC

Fábio Monteiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA -O diretor de Política Econômica do Banco Central, Luiz Awazu Pereira da Silva, disse nesta sexta-feira (24) que acontecimentos recentes geraram novos riscos para a inflação em 2016.

"O progresso até agora na luta contra a inflação precisa ser equilibrado contra os riscos mais recentes que ameaçam o nosso objetivo central", afirmou o diretor. O principal objetivo do BC hoje é trazer a inflação para 4,5% em dezembro de 2016.

Awazu, que não especificou quais são os riscos recentes, disse que o trabalho de política monetária atual visa evitar que o impacto de curto prazo da inflação em 2015 contamine os indicadores tanto para 2016 quanto para os anos posteriores.

Mantendo a linha de discursos anteriores do BC, o diretor afirmou ainda que é importante ter cautela na atual conjuntura e que é primordial continuar vigilante.

A declaração, dada em evento com economistas no Rio de Janeiro, foi recebida pelo mercado como uma indicação de que a autoridade monetária vai manter o aperto monetário e realizar um novo aumento de 0,50 ponto percentual da taxa Selic na reunião de quarta-feira (29).

A taxa básica está hoje em 13,75% ao ano.

"O espaço do BC para reduzir a intensidade do ciclo e aumentar 0,25 ponto percentual diminuiu", disse Flavio Serrano, economista sênior do Besi Brasil. Para ele, a inflação em alta e a queda na atividade tornam a decisão do BC mais complicada.

Ele lembrou ainda que a mudança na meta de superavit primário para 2015 e para os anos seguintes, anunciada nesta semana pelo governo, gera mais dificuldades para o controle de expectativas da inflação.

Para Leandro Padulla, da MCM Consultores, a proximidade entre a fala e a reunião do Copom revela que o BC considera um novo cenário. O economista acredita que um dos principais motivos para o discurso duro de Awazu tenha sido a disparada do câmbio, que tem apresentado forte subida desde o anúncio do governo de redução da meta de superavit.

Juro pode subir, indica Barbosa

- O Globo

• Banco Central alerta contra "no vos riscos inflacionários " e defende vigilância

SÃO PAULO E RIO - O primeiro alerta veio do Banco Central. Logo pela manhã, o diretor de Política Econômica da autarquia, Luiz Awazu Pereira da Silva, advertiu contra "novos riscos inflacionários" surgidos no país e defendeu uma postura vigilante. E, logo depois, foi a vez de o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, admitir que a redução das metas de superávit primário poderá pressionar a inflação no curto prazo e levar a uma alta ainda maior da taxa básica de juros. — Você teve uma redução de meta com redução de gasto, não houve redução da meta para ampliar gastos....

Acho que a política fiscal continua neutra ou contracionista. Por outro lado, tem o impacto indireto, que não é fruto da política fiscal, é a reação do mercado à revisão das metas fiscais que, nesse curto prazo, tem sido uma depreciação cambial que pode, indiretamente, bater na inflação e requerer resposta da política monetária — afirmou Barbosa em entrevista à agência Reuters. O ministro, porém, disse acreditar que esse movimento poderá ser in vertido nas próximas semanas. E isso apesar da escalada da cotação do dólar, que ontem bateu um recorde de 12 anos, num reflexo das preocupações com o risco de o Brasil perder o grau de investimento. Mas, para Barbosa, o esclarecimento da estratégia fiscal de médio e longo prazos tende a atenuar "a resposta inicial na taxa de câmbio e na taxa de juros, de modo a não criar nenhum problema para a política monetária".

"Cenário mais realista", alega ministro
O governo anunciou na quarta-feira uma redução drástica das metas de superávit primário deste e dos próximos dois anos. A meta em 2015 foi cortada de 1,1% para 0,15% do Produto Interno Bruto (PIB). Para 2016 e 2017, os objetivos foram reduzidos a 0,7% e 1,3% do PIB, respectivamente, contra 2% anteriormente nos dois anos. Além da disparada do dólar , os mercados de juros futuros reagiram mal às novas metas fiscais, com apostas de que a taxa básica — a Selic, atualmente em 13,75% ao ano e ainda em processo de elevação para controlar a inflação — subirá mais neste ciclo de aperto e demorará mais para começar a ser reduzida. Barbosa disse que já era esperada uma reação negativa do mercado às novas metas, reduzidas mais fortemente devido à frustração com as receitas do governo.

O ministro voltou a defender que os novos objetivos fiscais são mais realistas e suficientes para estabilizar a dívida pública. Ele argumentou que o governo usa diversas variáveis para chegar às projeções do comportamento da dívida, como proporção do PIB, crescimento, inflação, câmbio, juros e composição do endividamento — bem como o impacto das operações de swaps cambiais (operação equivalente à venda de dólares no mercado futuro) no pagamento de juros líquidos. — É importante trabalhar com cenário bem realista. É importante mostrar que, mesmo com esse cenário realista, a situação fiscal está controlada — afirmou Barbosa. No cenário do governo, a relação dívida bruta/ PIB vai subir até 2016 e chegar ao patamar de 66%, frente a pouco mais de 62% agora. A partir de 2017, ela se estabilizaria, cenário já rechaçado por boa parte dos economistas, cujas projeções indicam que a proporção pode chegar a 70%.

—Não é uma redução da meta para se gastar mais. É uma redução gerada principalmente pela desaceleração econômica e pela revisão das receitas adicionais que esperávamos neste ano — insistiu ele, acrescentando que não há, no momento, estudos para elevar impostos e buscar mais receitas . Mesmo com a crise política entre o Executivo e o Legislativo, o ministro afirmou que o governo continuará enviando medidas ao Congresso Nacional para dar continuidade ao ajuste fiscal: — O Estado brasileiro e a sociedade brasileira têm todos os instrumentos necessários para resolver os problemas que temos. O problema é construir consenso gradual sobre essa estratégia de solução.

Numa democracia, essa construção leva algum tempo, mas ela acontece. Na quinta-feira, o ministro se reuniu com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB- AL), para pedir apoio às propostas de redução da meta fiscal, que precisam do aval do Congresso. O próximo desafio será um encontro com o presidente do Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que recentemente anunciou seu rompimento pessoal com o governo . Para Barbosa, a economia brasileira vai começar a se recuperar no quarto trimestre deste ano, de forma gradual — embora a projeção do governo seja de que o PIB encolha 1,49% em 2015. Mais cedo, Awazu, do BC, adotara um discurso mais comedido.

E que foi interpretado por analistas como um sinal de juros mais altos no momento em que os mercados temem enfraquecimento da austeridade fiscal. — O progresso até agora no combate à inflação precisa ser equilibrado diante de riscos mais recentes que ameaçam nosso objetivo central. Portanto, devemos permanecer cautelosos nessa conjuntura particular — afirmou Awazu, em discurso no Rio. E ele completou: — É primor dial ser vigilante para garantir que a política monetária reflita o balanço de riscos do momento e permaneça adequadamente calibrada para atingir nossos objetivos — disse Awazu, referindo- se ao objetivo de ver a inflação no centro da meta de 4,5% ao fim do ano que vem.

Turbulência passageira
Os contratos de juros futuros mais curtos ampliaram a alta após as declarações. Operadores já apostam em um alta de mais 0,5 ponto percentual da taxa básica de juro na reunião da próxima semana do Comitê de Política Monetária (Copom). O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, disse ontem que a turbulência do mercado, após a redução da meta, é passageira. Segundo Edinho, a política econômica está definida e oferece previsibilidade ao mercado. O ministro afirmou, ainda, que a presidente Dilma Rousseff escolheu uma equipe econômica que tem credibilidade e responsabilidade. Para Edinho, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é importante para o país e para o governo.

Dilma chama governadores para propor pacto por ajuste

Dilma recorre a governadores por 'pacto'

Tânia Monteiro, Rafael Moraes e Luciana nunes Leal – O Estado de S. Paulo

• Presidente se reúne com chefes de Executivos estaduais em busca de apoio no Congresso para a votação de medidas do ajuste no 2° semestre

A presidente Dilma Rousseff convidou os 27 governadores, aí incluídos os da oposição, para tentar trabalhar um "pacto pela governabilidade". A reunião será na próxima quinta-feira. Dilma decidiu chamá-los por conta da grave crise política e econômica que o País enfrenta. O objetivo principal é tentar pedir ajuda aos governadores de todos os partidos para que atuem junto às suas bancadas no Congresso, no início do segundo semestre, com objetivo de aprovar as medidas pendentes do ajuste fiscal, a repatriação de recursos e outras medidas que poderiam ter impacto na melhoria das contas públicas.

Embora não admita publicamente, o movimento, na prática, passa pela tentativa de isolar o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que se declarou inimigo número um do Planalto e das medidas que o governo quer ver aprovadas. Alguns dos governadores ligados a Dilma defendem que, da reunião, possa sair também um apoio político à presidente, em contrapartida ao movimento de oposicionistas que querem o seu afastamento do governo.

"Dilma foi eleita em um processo democrático, está há poucos meses a frente de um novo governo, vive a impopularidade, mas outros políticos já viveram, como Fernando Henrique Cardoso. Eu mesmo, durante meus primeiros dois anos de governo. Mas não vejo motivos para que ela saia. Impedir um governo de governar é um golpe", disse o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD). O chefe do Executivo do Estado do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), também defendeu o diálogo de colegas de diferentes partidos com o governo. "Nada impede a gente de sentar e conversar. O que falta no País é conversa. Nesse ponto, (o vice-presidente) Michel Temer tem um papel preponderante, é o melhor interlocutor, com o Congresso, com os governadores", afirmou.

O governador fluminense tem insistido na defesa de Dilma e na tese de que o PMDB tem responsabilidade de garantira sustentação do governo. Ao contrário de Cunha, que rompeu com a presidente e prega que o PMDB deixe o governo o mais cedo possível, Pezão defende que o partido mantenha o apoio a Dilma até abril de 2018, prazo para que os candidatos nas eleições daquele ano deixem os cargos. "Estou sempre falando em governabilidade porque é dessa maneira que vamos enfrentar a crise, retomar o desenvolvimento econômico. A gente tem o vice-presidente, tem que ajudar o governo. Não tem que sair. Meu ponto de vista é que devemos ficar até abril de 2018. Não há problema em estar no governo e, no prazo da desincompatibilização, lançar candidato próprio a presidente", sustentou.

"Fantasia" A tese do diálogo, no entanto, não encontra respaldo entre muitos chefes de Executivo estadual. Um dos governadores consultados pelo Estado, que preferiu falar sem ser identificado, disse que a proposta "não encontrará apoio entre muitos governadores porque as posições são muito heterogêneas". "É uma fantasia", classificou, ressaltando, no entanto, que considera viável que se discutam pontos de convergência de interesses dos estados e do Planalto com os governadores.

Há assuntos, por exemplo, como a reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que interessam a alguns, mas que são contestados por outros, que são beneficiados hoje pela guerra fiscal. "Precisamos de responsabilidade, serenidade e compreensão de todos", disse um interlocutor direto da presidente, ao comentar que a iniciativa da reunião certamente ajudará a melhorar o clima no país e a desanuviar a crise política.

Esse auxiliar direto lembra que a ajuda dos governadores neste momento é "fundamental" e ela é benéfica não só para o Planalto, mas para eles também. O governo federal lembra que grande parte das obras que puderam ser realizadas nos Estados foram possíveis por causa da ajuda financeira do Executivo federal. Da mesma forma, os financiamentos externos que os governadores pediram precisaram de aval federal. Agora, então, seria a hora de todos se juntarem para tirar o País da crise. A mobilização dos governadores junto às suas bases para garantir a aprovação de medidas de impacto econômico no Congresso vai ser o principal apelo que a presidente fará.

Ministros do PT criticam Levy, Edinho e cortes no orçamento

Fernanda Krakovics – O Globo

• Na reunião, Rui Falcão defende mudança na política de comunicação

BRASÍLIA - Nervosos com a baixa popularidade do governo Dilma e com o cenário ruim na economia, ministros do PT, reunidos na terça-feira, fizeram duras críticas a Joaquim Levy (Fazenda) e Edinho Silva (Comunicação Social), que estava presente.

Ministros da área social, sobretudo Tereza Campello (Desenvolvimento Social), estavam inconformados com os cortes no orçamento. A reunião ocorreu na véspera do anúncio da redução da meta fiscal. Apesar da medida ser defendida pelo PT, ela não melhorou os ânimos em relação à política econômica do governo.

- O problema é que a arrecadação caiu muito, então o superávit (redução da meta) não vai dar folga - disse um ministro que participou da reunião.

A política de comunicação foi atacada. O presidente do PT, Rui Falcão, e o ex-ministro Gilberto Carvalho defenderam o direcionamento das verbas de publicidade para veículos, sites e blogs simpáticos ao governo. Edinho defendeu a manutenção do critério de mídia técnica, de acordo com a audiência dos veículos.

Estavam presentes Patrus Ananias (Desenvolvimento Agrário), Nilma Gomes (Igualdade Racial), Eleonora Menicucci (Mulheres), Carlos Gabas (Previdência), Arthur Chioro (Saúde), Juca Ferreira (Cultura) e a presidente da Caixa, Miriam Belchior.

PSDB rechaça ensaio petista de conversar com FHC

Erich Decat, Rafael Moraes Moura – O Estado de S. Paulo

• Líderes do PSDB dizem não a grupo do PT que lançou ideia de reunir FHC e Lula em busca de uma trégua para Dilma

Representantes da direção nacional do PSDB e lideranças do partido no Congresso rechaçaram a possibilidade de uma aproximação entre a oposição e o PT neste momento de aprofundamento das crises econômica e política. Na avaliação de diferentes setores do PSDB, não há razão para os tucanos iniciarem dialogo com os petistas em busca de uma trégua para a gestão Dilma Rousseff.

Segundo o jornal Folha de S. Paulo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria interessado em se reunir com seu antecessor no Palácio do Planalto, Fernando Henrique Cardoso, principal líder tucano. Entre os temas do encontro estaria a discussão envolvendo possível processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. "Esse tipo de iniciativa é consequência do momento que eles estão vivendo, de fase terminal. E absoluto desespero.

Na questão política, não temos nenhuma razão para esticarmos a mão", ressaltou o vice-presidente do PSDB, Alberto Goldman. O presidente estadual do PSDB em Minas Gerais, deputado Marcus Pestana, um dos principais aliados do presidente nacional da legenda, senador Aécio Neves (MG), considerou as investidas dos adversários como um "teatro". "Neste momento, falar em diálogo, algo que nunca houve? É um teatro, um factoide para tentar sair das cordas", disparou Pestana. "Esse tipo de iniciativa é uma mistura de desespero e cinismo. Lula se acha esperto e está tentando socializar a crise, mas ela é totalmente deles. Nos "inclua" fora dessa", acrescentou o mineiro.

Para o dirigente, a reação de FHC de ter informado que o ex-presidente Lula não precisaria de interlocutores para marcar um encontro foi apenas um "gesto educado". "Ele é um estadista, mas, na verdade, o sentimento é de que quem pariu Mateus, que o embale", disse. As reações dos tucanos também foram expressas num artigo publicado ontem pelo Instituto Teotônio Vilela, órgão de estudos e formação política do PSDB. "Foram anos em que o PT reiteradamente provocou o embate, estimulou a divisão, recusou a opinião crítica (qualquer uma), atacou instituições e transformou adversários em inimigos. Agora, quando o calo aperta de vez, a postura muda num passe de mágica. Será?", questiona trecho do texto.

O ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, o advogado Sigmaringa Seixas, os ex-ministros Nelson Jobim e Antonio Palocci e o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), são os "patronos" da tentativa de aproximação no PT. "Sou plenamente favorável (a esse encontro). Acho que isso deveria acontecer mais no Brasil: ex-presidentes conversando. Nos Estados Unidos, é a coisa mais normal do mundo ex-presidentes se reunirem, inclusive a convite do presidente em exercício. Sempre que você estabelece diálogo entre lideranças nacionais, é bom para o País", disse Edinho. "O momento é de trazer para a mesa de diálogo pessoas com experiência e equilíbrio", afirmou Delcídio.

As primeiras conversas para pôr de pé o "pacto pela governabilidade" ocorreram no início de março, pouco antes dos protestos contra a presidente Dilma, que vê com simpatia a tentativa de aproximação com Fernando Henrique, até mesmo pelo simbolismo do encontro. A época, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, apelidado no PT de "pelicano" (o mais petista dos tucanos), conversou com o ex-presidente. Diante do assédio de outros governistas, porém, Fernando Henrique divulgou uma nota. "O momento não é para a busca de aproximações com o governo, mas sim com o povo. (...) Qualquer conversa não pública com o governo pareceria conchavo na tentativa de salvar o que não deve ser salvo", escreveu ele.

PSDB diz que é 'tarde' para aceno do PT à oposição

- Folha de S. Paulo

O PSDB reagiu com fortes críticas à revelação de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Palácio do Planalto trabalham por uma aproximação com o tucano Fernando Henrique Cardoso.

O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), muito ligado ao presidente da sigla, senador Aécio Neves (MG), disse que só depois de terem se "afundado na Lava Jato, despencado nas pesquisas e falado em golpismo" os petistas decidiram "conversar".

"Nosso diálogo é com a sociedade. Tarde demais", afirmou. Procurada, a assessoria de Aécio disse que não localizou o senador. Outros aliados dele também usaram argumentos pesados contra a iniciativa dos petistas.

Em nota intitulada "Distância dos bandidos", o deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA) disse que acha "um desrespeito o convite que Lula e Dilma fazem. É um grave erro ele [FHC] aceitar. Os problemas do Brasil só serão resolvidos sem essa dupla nociva no comando".

Mesmo pessoas ligadas ao ex-presidente tucano recomendaram "cautela". Temem que o PT queira transformar FHC em "sócio da crise" que dragou o governo federal.

Ajustes são insuficientes para reverter crise econômica, diz Marina

Fernando Taquari – Valor Econômico

SÃO PAULO - Terceira colocada na disputa pela Presidência da República na eleição de 2014, a ex-senadora Marina Silva (PSB) previu um cenário de instabilidade para o país ao afirmar nesta quinta-feira que as medidas de ajuste fiscal adotadas pelo governo federal não serão suficientes para reverter o cenário de crise na economia no curto prazo.

Marina retomou as críticas feitas durante a campanha eleitoral ao enfatizar que o governo Dilma Rousseff (PT) errou ao insistir por muito tempo no consumo interno como solução para enfrentar a instabilidade dos mercados depois da crise financeira de 2008. Segundo ela, o país não fez o dever de casa e agora colhe indicadores negativos na economia.

“Esse caminho não tinha como se sustentar por muito tempo. E não revertendo no tempo certo, agora, não vamos ter nenhum tipo de panaceia que vá resolver a situação da noite para o dia. Infelizmente, quem estava levando a cabo e aprofundando a gravidade da crise no Brasil sabia, sem sombra de dúvidas, que isso aconteceria”, disse.

A ex-senadora afirmou ainda que os pedidos de impeachment da presidente Dilma são um reflexo da insatisfação da população com a falta de compromisso do governo petista. “A pessoa se elege com uma promessa e em seguida muda da água para o vinho. Não se pode ganhar uma eleição num país como o nosso sem um programa de governo”, declarou.

“Temos inflação alta, temos juros altos, desemprego que pode chegar a 10% e um país que pode continuar com retração econômica em 2016. Foi uma situação levada ao extremo para se ganhar a eleição, prejudicando os rumos de uma nação”, acrescentou. Marina também comentou a crise política no país e defendeu as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público no âmbito da Operação Lava-Jato, que investiga a formação de cartel e o pagamento de propina a autoridades em contratos da Petrobras.

“Vivemos momentos difíceis. É preciso dar todo apoio às investigações”, declarou. A ex-senadora, que está à frente do projeto de criar o partido Rede Sustentabilidade, disse também que o governo federal deveria investir em alianças programáticas para garantir a governabilidade e não ficar refém de uma base aliada composta apenas na “distribuição de pedaços do Estado”. “Esse é o resultado desse presidencialismo que era de coalizão e agora virou presidencialismo de confusão”.

A ex-senadora participou na noite desta quarta-feira, na capital paulista, de um evento sobre democracia e internet. Durante sua apresentação, disse que, apesar dos erros do governo Dilma, não se pode culpar a presidente por todas as mazelas da corrupção no país. “Está todo mundo feliz no Brasil em dizer que a Dilma é a culpada pela corrupção. Não é sustentável acharmos que a corrupção é um problema de uma pessoa, de um grupo ou partido”, afirmou Marina, ressaltando que o Brasil só avançará no combate à corrupção quando isso for reconhecido como um problema de toda a sociedade.

Dilma vai defender PT e governo em programa do partido na TV

Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

• Presidente foi alvo de panelaços no último discurso em cadeia nacional, no Dia da Mulher

• Em discurso no ABC, Lula disse estar cansado de "mentiras e safadezas" e de agressões à petista

BRASÍLIA - Meses após ser alvo de um panelaço durante pronunciamento na TV no Dia da Mulher, Dilma Rousseff decidiu gravar para o programa do PT que será exibido em rede nacional no próximo dia 6.

A filmagem está marcada para este sábado (25), em Brasília, sob a coordenação do marqueteiro do PT, João Santana. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do PT, Rui Falcão, já gravaram participação na última segunda-feira (20).

O mote do programa será a defesa do PT e do governo. A ideia é argumentar que a situação está ruim, mas ainda é melhor que antes dos 13 anos de administrações petistas no governo federal.

O ator José de Abreu, militante ativo nas redes sociais em defesa dos petistas, apresentará o programa.

Esta será a primeira vez no ano que Dilma aparecerá no programa do PT. Assessores palacianos afirmam que a presidente busca sair do isolamento político. A gravação é também um aceno à base petista e faz parte da operação de se reaproximar da legenda em meio à crise política.

Desde a reação à sua fala no dia 8 de março, Dilma vinha evitando aparições na TV. A presidente foi alvo de manifestações em 12 capitais enquanto discursava, o que assustou o Planalto e deu combustível para as manifestações de rua de abril.

Após o panelaço, Dilma se blindou: cancelou o pronunciamento no 1º de maio, em uma decisão inédita desde o seu primeiro mandato. Dias depois, a presidente também não apareceu no programa do PT do primeiro semestre. Mesmo sem a aparição de Dilma, o programa do partido foi alvo de panelaço em pelo menos dez Estados e no Distrito Federal.

Dilma amarga baixos índices de aprovação –chegou ao final do primeiro semestre avaliada como ruim ou péssima por 65% do eleitorado.

Governadores
Com o agravamento da crise, a presidente vem tentando fazer acenos à oposição para tentar barrar um eventual processo de impeachment contra ela.

Ela também decidiu irá convidar governadores para participar de uma reunião que está sendo articulada para a próxima quinta-feira (30), em Brasília, para selar uma espécie de "pacto de governabilidade" no país.

A presidente quer que eles atuem em suas bancadas no Congresso para impedir que projetos que custem caro aos cofres públicos sejam aprovados no Legislativo, em tempos de ajuste fiscal.

Na noite desta sexta-feira(24), na posse da nova direção do Sindicato dos Bancários do ABC, Lula comparou as críticas ao PT com a perseguição sofrida pelos judeus durante o Holocausto.

"Tenho a impressão de que muitas vezes a gente vê na televisão e parece os nazistas criminalizando o povo judeu. Parece os romanos criminalizando os cristãos, parece os fascistas criminalizando o povo italiano, parece tantas outras perseguições."

O ex-presidente afirmou ainda estar "cansado de mentiras e de safadezas", e de "agressões à primeira mulher que governa este país".

Lula admitiu que problemas como a inflação e o desemprego entraram na casa do brasileiro, mas ressaltou que resolver essa questão é prioridade da presidente.

"Se o Brasil está hoje numa situação complicada–e nós sabemos que está e que a preocupação chegou dentro da casa –, não é problema para a gente se alarmar. Temos pessoas lá em Brasília para cuidar deste pais", acrescentou.

Apesar da intenção de ter um diálogo com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, como revelou a Folha, Lula não poupou os tucanos. Sem citar FHC ou o partido, ele disse que pessoas que dizem que o Brasil vai quebrar "quebraram o país duas vezes".

Colaborou Bela Megale, de São Paulo

Executivo da OAS se oferece para contar à Lava Jato segredos devastadores sobre Lula

Robson Bonin, com reportagem de Adriano Ceolin – Revista Veja

• Em troca de benefícios legais, Léo Pinheiro promete revelar, em delação premiada, o que viu, ouviu e fez nos anos em que compartilhou da intimidade do ex-presidente

Léo e Lula são bons amigos. Mais do que por amizade, eles se uniram por interesses comuns. Léo era operador da empreiteira OAS em Brasília. Lula era presidente do Brasil e operado pela OAS. Na linguagem dos arranjos de poder baseados na troca de favores, operar significa, em bom português, comprar. Agora operador e operado enfrentam circunstâncias amargas.

O operador esteve há até pouco tempo preso em uma penitenciária em Curitiba. Em prisão domiciliar, continua enterrado até o pescoço em suspeitas de crimes que podem levá-lo a cumprir pena de dezenas de anos de reclusão. O operado está assustado, mas em liberdade. Em breve, Léo, o operador, vai relatar ao Ministério Público Federal os detalhes de sua simbiótica convivência com Lula, o operado. Agora o ganho de um significará a ruína do outro.

Léo quer se valer da lei sancionada pela presidente Dilma Rousseff, a delação premiada, para reduzir drasticamente sua pena em troca de informações sobre a participação de Lula no petrolão, o gigantesco esquema de corrupção armado na Petrobras para financiar o PT e outros partidos da base aliada do governo.

Por meio do mecanismo das delações premiadas de donos e altos executivos de empreiteiras, os procuradores já obtiveram indícios que podem levar à condenação de dois ex-ministros da era lulista, Antonio Palocci e José Dirceu. Delatores premiados relataram operações que põem em dúvida até mesmo a santidade dos recursos doados às campanhas presidenciais de Dilma Rousseff em 2010 e 2014 e à de Lula em 2006.

As informações prestadas permitiram a procuradores e delegados desenhar com precisão inédita na história judicial brasileira o funcionamento do esquema de sangria de dinheiro da Petrobras com o objetivo de financiar a manutenção do grupo político petista no poder.

É nessa teia finamente tecida pelos procuradores da Operação Lava-Jato que Léo e Lula se encontram. Amigo e confidente de Lula, o ex-presidente da construtora OAS Léo Pinheiro autorizou seus advogados a negociar com o Ministério Público Federal um acordo de colaboração.

As conversas estão em curso e o cardápio sobre a mesa. Com medo de voltar à cadeia, depois de passar seis meses preso em Curitiba, Pinheiro prometeu fornecer provas de que Lula patrocinou o esquema de corrupção na Petrobras, exatamente como afirmara o doleiro Alberto Youssef em depoimento no ano passado.

O executivo da OAS se dispôs a explicar como o ex-presidente se beneficiou fartamente da farra do dinheiro público roubado da Petrobras.

Marina Silva: 'Não se sacrifica o destino de uma nação para ganhar uma eleição'

Veja

• Ex-candidata à Presidência atribuiu atual crise política ao sistema que divide nacos do Estado para satisfazer interesses pessoais

A ex-candidata presidencial Marina Silva disse na noite desta quinta-feira que a crise política, agravada com a ruptura do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), com o governo, é fruto do sistema político no país. "Isso é resultado do que é esse presidencialismo que era de coalizão e que, agora, virou um verdadeiro presidencialismo de confusão", afirmou, após participar de um evento na cidade de São Paulo.

Marina argumenta que, desde 2010, alerta para o problema de se "distribuir pedaços do Estado" para atender a interesses e formar maioria no Congresso Nacional. "A composição do governo, com raras exceções, tanto para a formação dos ministérios quanto para constituir maioria no Congresso não é feita em cima de um programa e, ao não ser feito em cima de um programa, mas da distribuição de pedaços do Estado para atender interesses de grupos ou indivíduos, dá no que está dando agora", complementou.

A ex-presidenciável, ainda filiada ao PSB e no processo de criação de sua Rede Sustentabilidade, voltou a reclamar do processo eleitoral do ano passado e de como Dilma Rousseff venceu com uma proposta de "mentiras". "Não se sacrifica o destino de uma nação para ganhar uma eleição", afirmou. Marina atribui ao uso de mentiras da campanha da sua então adversária o alto número de pessoas que hoje defendem o afastamento da presidente. "As pessoas se elegem com uma promessa e, em seguida, mudam o que prometeram da água para o vinho. É claro que há uma insatisfação da sociedade."

Ela destacou que esse quadro deve ser tomado como lição e que o país deve aprender a exigir plataformas e programas eleitorais claros dos candidatos. "A gente precisa aprender com tudo isso, não se pode ganhar uma eleição para um país como o nosso sem um programa de governo, com um cheque em branco para depois se fazer o que quiser", ponderou.

A ex-senadora também afirmou que não se pode apenas eleger culpados pela corrupção, mas que a questão deve ser tratada pela sociedade. Para ela, o país deve sair da posição de "espectador da democracia" para passar a autor do processo democrático. "Aqui no Brasil está todo mundo feliz de dizer que a culpada pela corrupção é a Dilma. Quando a corrupção virar um problema nosso, criaremos instituições para coibi-la", disse Marina. "Não é sustentável acharmos que a corrupção é o problema de uma pessoa, de um grupo ou de um partido", prosseguiu, ao citar outros políticos que viram alvos de argumentações simplistas como culpados pela existência de corrupção no país, como os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e José Sarney (PMDB).

Marina argumentou que o Brasil só saiu da ditadura quando ela virou um problema de toda a sociedade e não apenas dos militares. "Enquanto a ditadura era um problema apenas dos militares, a coisa era feia."

Lava Jato - Marina repetiu considerar que o Brasil passa por "um momento muito difícil", mas preferiu não falar diretamente sobre sua posição em relação a um eventual pedido de afastamento da presidente. Sobre a Lava Jato, disse que "é preciso dar todo apoio às investigações", que devem ser feitas com autonomia para os trabalhos da Polícia Federal e do Ministério Público, além do Tribunal de Contas da União - em referência ao julgamento das contas do governo Dilma em 2014 e do uso das chamadas pedaladas fiscais. Para Marina, esse é o único caminho para o país sair "do fundo do poço".

"Não é uma questão de instrumentalizar a crise, é como a gente de fato faz para de fato resolvê-la, indo a fundo nas investigações, punindo os culpados e fazendo o necessário para tirar o país do fundo do poço, como estamos, do ponto de vista político, econômico, moral, ético. Esse é o esforço que precisa ser feito, olhando para crise no mérito da crise e não no sentido de qual é a vantagem que tiro dela."

Lula diz estar 'de saco cheio' de 'safadezas'

Cristiane Agostine – Valor Econômico

SANTO ANDRÉ (SP) - Ao discursar para uma plateia de sindicalistas do ABC paulista na noite desta sexta-feira, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que está “de saco cheio”, reclamou de “safadezas” e comparou as críticas ao governo federal e ao PT à perseguição de nazistas aos judeus.

Vestido de preto e com a voz rouca, o ex-presidente afirmou, logo no início de seu discurso, que está “cansado de mentiras e safadezas” e saiu em defesa de sua sucessora, a presidente Dilma Rousseff, cujo governo é aprovado por apenas 7,7% da população, segundo pesquisa CNT/MDA divulgada nesta semana.

“Sinceramente ando de saco cheio, profundamente irritado”, disse Lula, ao participar da posse da diretoria do Sindicato dos Bancários do ABC, em Santo André.

O ex-presidente reclamou de agressões à presidente e da criminalização às esquerdas do país. “Tenho a impressão de que muitas vezes a gente vê na televisão e parece os nazistas criminalizando o povo judeu. Parece os romanos criminalizando os cristãos, parece os fascistas criminalizando o povo italiano, parece tantas outras perseguições”, afirmou a uma plateia com cerca de 200 pessoas.

Lula voltou a afirmar que a “elite perversa” não suporta as conquistas sociais e disse que isso explica o “ódio, as mentiras e as atitudes canalhas de alguns segmentos neste país”. “Eu nunca tinha visto na vida pessoas que se diziam democráticas, que não aceitaram até agora o resultado de uma eleição que elegeu uma mulher”, afirmou o ex-presidente.

Em um discurso de pouco mais de vinte minutos, Lula destacou a preocupação dos trabalhadores com o aumento do desemprego e o crescimento da inflação e tentou comparar a crise econômica aos problemas vividos pelo país no passado, quando a inflação era de 80% ao mês. “Não há um momento na história deste país que não tivemos uma crise”, disse. O petista afirmou ainda que quando assumiu o governo, em 2003, as taxas de desemprego e de inflação eram maiores do são atualmente no governo Dilma.

“A inflação está alta agora, assustando muita gente, mas está com perspectiva de cair, porque a Dilma tem obsessão de não permitir que a inflação ultrapasse o limite que já chegou, 9% ao ano, não 80% ao mês. Lembrando que quando eu peguei este país o desemprego estava a 12%, a inflação estava a 12,5% “,afirmou aos sindicalistas.

O ex-presidente disse ainda que não há “nenhuma razão para ter medo do futuro” e afirmou que o país é comandado por “mulher da maior dignidade”. “Não tem pessoa com caráter mais forte do que a Dilma. E ela está sendo vitima de uma conjuntura que está prejudicando chinês, americano, alemão”, afirmou.

Lula, no entanto, reconheceu que a situação econômica do país é grave. “Se o Brasil está hoje numa situação complicada — e nós sabemos que está e que a preocupação chegou dentro da casa —, não é problema para a gente se alarmar, é problema para ficarmos apreensivos. Sabemos que temos pessoa lá em Brasília que vai cuidar deste país”.

Marco Aurélio Nogueira - Sobre crises, golpes e saídas

- O Estado de S. Paulo

O tema das crises é polêmico. O uso comum do termo sugere cenários apocalípticos, mas sua raiz etimológica não: em grego, krisis significa essencialmente a abertura de uma situação à espera de um desfecho – um momento de decisão, em que se define a sorte de um processo político, de um governo ou de um paciente. Toda crise contém a semente de algo novo. Nesse sentido, ela valoriza o manejo, a direção: é a hora de o talento se sobrepor às imposições da realidade.

No mundo atual, tudo está "em crise": da economia e do Estado à política e à sociabilidade. A modernidade capitalista, ao se radicalizar, fez com que nada mais pudesse ter estabilidade e funcionar sem altas doses de incerteza. A sociedade não tem como se reproduzir sem ajustes sucessivos. Implodem-se as instituições dedicadas à organização e ao direcionamento (como os partidos políticos), com o que se vai projetando uma complicada "crise de autoridade e hegemonia": os que controlam o governo não conseguem mais dirigir e abusam da coerção, da fraude e da corrupção.

No Brasil, em particular, depois de um período em que os governos proclamaram que o País estaria imune a problemas e que o avanço social havia se tornado "definitivo", entramos em fase depressiva, na qual o tom do ajuste e da dificuldade prevalece sobre o do sucesso e da felicidade.

Entre o primeiro momento – os anos Lula – e os dias de hoje, tivemos o governo Dilma, entre 2011 e 2014. Foi um período complicado, marcado pelo improviso, pela falta de liderança e capacidade de governo, pela tentativa fracassada de fixar uma "nova matriz econômica" e por um agravamento da disfuncionalidade do sistema político. O sistema perdeu o eixo, não tanto por suas regras, mas, sim, pelo fracasso de seus operadores: a "classe política" e os partidos.

O governo foi-se inviabilizando, até cair numa vala, bloqueada por todos os lados.

Dilma não teve como corrigir a rota, desprovida que esteve de habilidade, apoio e convicção. Nas eleições presidenciais de 2014, a crise já atingira nível agudo e o jeito foi esconder os problemas para ganhar as eleições e seguir em frente. Para isso, adversários foram agredidos e a presidente-candidata adotou uma postura falsa e demagógica. As urnas a beneficiaram, mas por pouco.

Seu segundo governo começou com a crise a pleno vapor. Não teve como usufruir de qualquer tipo de tolerância da sociedade ou dos políticos. A economia pedindo água, políticas públicas sendo desativadas, a base aliada se decompondo, o País atarantado, sem saber para onde ir. O encolhimento dos políticos, sua entrega à política pequena, o empobrecimento assustador da linguagem do poder, a ruindade do ministério, a falta de coordenação, tudo ajudou a que o governo, três meses após a posse, fosse jogado nas cordas, de onde não consegue sair.

As cassandras ressurgiram. Cresceu a imagem da crise que a tudo arrasta e contamina. Eduardo Cunha se julga vítima de um "golpe" do Planalto, Dilma Rousseff vê na oposição a seu governo uma atitude "golpista" e o PSDB associa a vitória do PT em 2014 a um "estelionato eleitoral". Cogita-se abertamente da queda de Dilma e de seu impedimento, como se o governo não mais existisse. Ninguém olha a crise nos olhos.

Coube ao senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) lembrar que "Dilma não é Collor", afastado da Presidência em 1992. "Dilma tem respeitabilidade pessoal, um partido e o apoio de movimentos sociais".

A associação oportunista entre crise e mudança de governo impede que se valorize a que há de avanço democrático no País.

Há ganhos importantes de transparência e fiscalização. Corrupção, trambiques, enriquecimento ilícito, manipulação política de empresas, financiamentos irregulares de pessoas e partidos, tudo está vindo à tona em escala inédita, sob o impulso de um eficiente trabalho institucional. O Poder Judiciário agigantou-se, a Polícia Federal, o Ministério Público e os Tribunais de Contas ganharam poder, a mídia cresceu em capacidade investigativa e de denúncia. A situação só não evoluiu mais positivamente porque falta mobilização social, não há liderança política de peso e o Parlamento está suspenso no ar, com vários de seus integrantes, a começar dos presidentes da Câmara e do Senado, investigados por transgressão. E, também, porque o governo não pode entregar seus anéis mais preciosos.

As vias para a saída da crise se estreitaram, mas não estão bloqueadas.

Sem iniciativa, o governo se fecha em copas: não negocia, não cede, não concede. Os políticos o atacam, mas não conseguem feri-lo de morte. No caos instaurado, o governo se equilibra e respira. Mas lhe falta o básico para reagir.

O espalhafatoso rompimento do presidente da Câmara com o governo não joga o País numa "crise institucional". É como insinuar que a continuidade das tensões provocadas pela Lava Jato ameaça o Estado democrático. Há, no entanto, uma evidente e complicada crise no País, que deita raízes na crise na economia, na governabilidade, na ética e na política.

O mais inteligente, agora, é ver como o avanço das investigações pode abrir espaço para a emergência de novas lideranças, para a busca de articulações que isolem os retrógrados, fortaleçam as instituições e reagrupem os democratas. Se um sistema político dá sinais de falência, outro desponta impulsionado pelo ativismo social e pela democratização que se vem processando desde os anos 1980. Toda crise, afinal, destrói, desorganiza e força a reorganização.

Se há um Eduardo Cunha querendo travar o governo, se o caos geral ameaça a economia, exaspera a sociedade e cria insumos para regressões institucionais, mas se há, ao mesmo tempo, indícios claros de que se está varrendo um tanto de entulho privatista, oligárquico e antirrepublicano, então os democratas (do governo e da oposição) deveriam conversar. Coisa, aliás, que já poderiam estar fazendo há tempo.
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*Marco Aurélio Nogueira é professor titular e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp

Merval Pereira - Diálogo inviável

- O Globo

Há um pressuposto equivocado nessa proposta de diálogo entre os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique, o de que toda conversa é boa em uma democracia. Foi-se o tempo em que uma conversa institucional com o PT poderia significar algum avanço democrático.

Desde que o mensalão foi desvendado, em 2005, qualquer conversa desse tipo tornou-se inviável, pois o PT revelou-se um partido que adota meios corruptos para fazer política, e usa o Estado para financiar seus esquemas, com o objetivo de dominar a máquina pública pelo maior tempo possível, negando a alternância no poder, ponto fundamental da democracia representativa.

O PT não é, certamente, o único partido político que se envolveu em corrupção na História do Brasil, mas é, até que se prove o contrário, o único que sequestrou o Estado brasileiro para montar um esquema de domínio político na tentativa de se perpetuar no poder.

Até o mensalão, os esquemas corruptos eram manipulados por grupos políticos avulsos, ou mesmo por indivíduos, e até a origem do esquema, usado originalmente em Minas pelo grupo do governador tucano Eduardo Azeredo, tinha o objetivo de financiar campanhas regionais com a manipulação de verbas oficiais.

Ao levar para o plano nacional esquemas que funcionavam regionalmente e de maneira eventual, o PT inaugurou uma nova fase da corrupção brasileira, muito mais danosa à democracia, porque se alimenta da própria máquina do Estado para continuar dominando-a indefinidamente.

Conceitualmente perverso, o avanço sobre estatais como a Petrobras e a Eletrobras - para, por meio do desvio de recursos do Estado brasileiro, controlar a vida partidária nacional e desvirtuar o sistema de coalizão partidária através de distribuição de verbas ao Legislativo - envenena o nosso sistema democrático, desmonta a convivência harmônica entre os Poderes da República, quebra o sistema de pesos e contrapesos próprio da democracia representativa.

A corrupção generalizada no país não é de hoje, como já destaquei em outras colunas, e o fato de ter se espalhado até o mais modesto município brasileiro só mostra que a impunidade fez aumentar a possibilidade de corrupção. Ao mesmo tempo, está sendo desmontado na Petrobras um esquema corrupto que não é trivial e que já mostrou suas garras no episódio do mensalão.

Vou repetir aqui alguns conceitos que já desenvolvi em outras colunas, para mostrar como a questão é intrincada. Em vez de combater a corrupção disseminada, como prometia fazer antes de chegar ao poder, o Partido dos Trabalhadores, ao contrário, aderiu à maneira brasileira de fazer política e transformou-a em um método de dominação do Poder Legislativo e de perpetuação de poder.

Quando Lula disse que no Congresso havia 300 picaretas, em tom de crítica, parecia o líder político que queria mudar a maneira de governar o país. Mas, ao chegar a sua vez de mostrar a que veio, Lula comandou um governo que institucionalizou a corrupção para garantir apoio político, aperfeiçoando e aprofundando as técnicas que eram usadas naturalmente pelos políticos brasileiros há décadas.

Que havia corrupção na Petrobras muito antes de o PT chegar ao poder, ninguém discute. O que é espantoso é que essa corrupção tenha chegado ao ponto a que chegou e tenha se tornado institucional, um método de dominar o poder político no país.

Como partido organizado e bem comandado, o PT transformou a roubalheira generalizada em instrumento de controle político.

O que mudou nos anos petistas é que a roubalheira nas principais áreas do governo foi monopolizada pelo esquema político que almeja a hegemonia. Sem mudar essa postura diante da democracia, não há razão para a busca de um diálogo.

Igor Gielow - As mortes de Lulinha

- Folha de S. Paulo

Em 2008, o diário "Extra" flagrou um menino negro nadando numa poça resultante de um vazamento na favela onde morava em Manguinhos, zona norte do Rio.

Consta que o então todo-poderoso presidente Lula se comoveu com a cena e resolveu transformar o local em vitrine de regeneração sob a bandeira do PAC, programa que tinha uma "mãe", Dilma Rousseff.

O menino, Christiano Pereira Tavares, foi levado ao palanque das autoridades para as devidas fotos e a promessa de construção de uma piscina na "comunidade", o eufemismo do politicamente correto para esses lugares esquecidos pelos políticos depois dos comícios.

Agora, o mesmo "Extra" informa que Lulinha, como o garoto foi apelidado após encontrar Lula, morreu aos 15 anos sob suspeita de overdose na unidade de saúde que ostenta sua foto sorridente na parede.

Manguinhos segue pobre, e a piscina, segundo o relato, abandonada. A família de Lulinha melhorou um pouco de vida, mas o quadro de desagregação segue inalterado.

Além de tragédia, a morte do garoto, se confirmada pelos motivos apontados, encarna um retrato da decadência do legado da era PT no poder. O investimento no combate à miséria, prioridade digna mesmo que tenha sido só eleitoreira, é tisnado pela realidade –do petrolão que já grassava à época ao desastre de gestão que atolou o país sob Dilma.

Sem bonança externa e com o sorriso de Levy, a classe que emergiu pela via perversa do consumo vai voltando para seu nicho anterior; brilha solitária na ruína a TV de tela plana na qual a irmã de Lulinha, grávida aos 14 anos, vê desenhos animados.

Não morre apenas Lulinha. Morre uma ilusão que teve, como toda farsa, lampejos de euforia. Morre o país cujo futuro radiante, para quem quis acreditar, havia chegado. A construção da realidade, ainda mais com os atores à disposição, será dolorosa.

Lulinha não verá nada disso.

Cristovam Buarque - Não estamos à altura

- O Globo

Difícil imaginar que João Goulart sofreria golpe militar, se seus apoiadores tivessem percebido e reconhecido os próprios erros e assegurado apoio e confiança na população. O golpe de 1964 foi consequência de forças diretamente golpistas autoritárias, mas também da omissão e incompetência dos democratas.

Tanto quanto as campanhas ideológicas dos golpistas, o golpe se apoiou no descontentamento popular com a inflação, o desemprego, a instabilidade por greves, as disputas internas na base de apoio; a incapacidade daqueles ao lado do presidente para perceber os erros cometidos; a euforia de que tudo estava bem e não havia o que temer, o mandato estava garantido e os militantes e sindicalistas prontos para uma guerra nas ruas em defesa da Constituição e do governo; e ainda a falta de percepção da força dos opositores, inclusive externa, no tempo da Guerra Fria. A causa de golpes também é a incapacidade dos governantes de reconhecerem a realidade.

Em 1964, o Brasil estava dividido entre esquerda e direita sem diálogo, cada lado com seus interesses econômicos e ideológicos acima do interesse maior do Brasil.

Cinquenta anos depois, atravessamos um momento parecido: com vantagens, fim da Guerra Fria e despolitização das forças armadas, e com desvantagens, raiva popular diante da corrupção e sentimento de traição pós-eleitoral, além de que o Fla-Flu partidário está menos preparado ideologicamente.

A disputa entre governo e oposição outra vez impede um entendimento político em favor do futuro do Brasil. Desta vez, felizmente, os golpistas são raros, mas também são raros os que percebem os prejuízos na interrupção do mandato da presidente e os que percebem os prejuízos que decorrerão da continuidade por mais três anos e meio do governo sem credibilidade, com uma equipe frágil politicamente e uma base dividida, unida por interesses menores por cargos.

Os próximos meses estão entre as consequências arriscadas da interrupção do mandato de um presidente (o segundo dos quatro eleitos diretamente depois da redemocratização) ou as consequências previsíveis da continuidade do atual governo. A única alternativa tranquilizadora para os próximos anos é uma concertação negociada dos democratas comprometidos com: estabilidade política e monetária, com crescimento econômico e com avanço social e respeito ecológico.

Ainda é tempo de evitar a tragédia e o desastre, mas esta ideia parece ingenuidade diante da nossa incapacidade como líderes nacionais. Neste momento, a culpa é de todos nós, por não estarmos à altura do desafio histórico do momento. E se não encontrarmos uma saída negociada, o povo na rua convocará por cima da Constituição uma eleição geral antecipada, com impeachment de todos.

Se não somos golpistas por ação, estamos golpistas por omissão, devido ao oportunismo ou à incompetência, perdidos e em disputas sem o sentimento de interesse nacional e de longo prazo.

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Cristovam Buarque é senador (PDT-DF)

Alberto Carlos Almeida - De crises, raposas e atitudes

Valor Econômico - Eu & Fim de Semana

Considerando-se as regras da política e a nossa tradição quanto a como fazê-la, é surpreendente o recente comportamento do deputado Eduardo Cunha a partir da divulgação da delação premiada acerca de suposto recebimento de propina de sua parte. O presidente da Câmara dos Deputados, em decisão de caráter estritamente pessoal, rompeu com o governo. Em entrevista, afirmou que se tornara oposição, em que pese o fato de ser o presidente de uma casa legislativa e de seu partido fazer parte da aliança governista, ter acesso a cargos públicos, recursos do orçamento e ao poder federal. Em uma metáfora bem conhecida no meio político, diz-se que Cunha ciscou para fora.

A crise política que atinge o governo Dilma não é novidade no Brasil. Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva também foram vítimas de escândalos de corrupção, cobertura midiática desfavorável, queda de popularidade e conflitos políticos entre parceiros de aliança em busca de melhor posicionamento e de mais acesso, vis-à-vis seus sócios, aos recursos disponíveis. É humana a propensão a acreditar que tudo que ocorre no presente é mais grave do que aconteceu no passado. Há até nome para isso: presentismo.

Lula conheceu uma grave crise política entre meados de 2005 e o fim daquele ano. Muitos diziam na época que o mensalão havia sido o maior e mais grave escândalo da história do Brasil. Todos se recordam do conflito ocorrido no coração do governo Fernando Henrique entre os senadores Antônio Carlos Magalhães (ACM) e Jáder Barbalho. Os dois líderes mais importantes de dois dos três maiores partidos da base de apoio ao governo subiram à tribuna do Senado para desferir ataques mútuos. Mais que isso, cada um deu início à sua própria CPI com a finalidade de investigar ilícitos do opositor. Nasceram assim a CPI dos bancos e a CPI das empreiteiras.

Ter consciência de que nossa falha interpretação das crises políticas, em virtude das limitações cognitivas humanas, acaba por conferir maior peso ao presente do que ao passado não nos impede de identificar diferenças entre as crises. No caso do governo Dilma, há duas particularmente importantes: os avanços institucionais, que deram maior poder à polícia, ao Ministério Público e à Justiça, e o fato de que, pela primeira vez, o presidente da Câmara não é aquele da preferência do governo. Há o episódio Severino Cavalcanti, quando o candidato do governo Lula a presidente da Câmara, Luiz Eduardo Greenhalgh, foi derrotado. Severino ficou no cargo menos de um ano. Eleito em fevereiro de 2005, perdeu apoio de seus pares em setembro e teve que se afastar.

Agora, em 2015, o governo Dilma decidiu enfrentar a candidatura de Cunha à presidência da Câmara, lançando o deputado petista Arlindo Chinaglia, que já havia presidido a casa no início do segundo mandato de Lula. Qualquer governo deseja que o presidente da Câmara seja um aliado. O poder dele é imenso. Aqueles que acompanham o noticiário souberam que Eduardo Cunha colocou para votar iniciativas legislativas que estavam na Câmara há mais de dez anos. Apenas esse fato mostra quão grande é o poder desse cargo e quão relevante é para o governo ter nele um ocupante com o qual esteja afinado.

O presidente da Câmara é quem define a agenda legislativa. Se seu poder fosse somente esse, já seria grande. Mas vai muito além, uma vez que ele é o vértice superior da articulação política legislativa. Todos vimos como os postos-chaves das principais comissões legislativas da Câmara dos Deputados foram ocupados em fevereiro: Cunha emplacou em tais posições seus aliados. No recente episódio de rompimento de Cunha com o governo, quando se declarou textualmente na oposição, ele permitiu que novos passos fossem dados para a instalação da CPI do BNDES. A simples mudança de posição pode levar a haver ou não uma CPI. Como se vê, o poder do cargo é imenso.

Eis a novidade desta crise política: o governo Dilma, desde fevereiro, tem na presidência da Câmara um deputado que não trabalha afinado com a presidente. Fernando Henrique não passou por isso, e Lula só passou por algo semelhante durante o breve mandato de Severino Cavalcanti.

A segunda novidade tem a ver com a evolução, de um lado, da legislação que permite o combate à corrupção, e de outro, com o fortalecimento das carreiras de policial, promotor e juiz. Com o passar dos anos, novas leis foram aprovadas. Todas apontaram em uma mesma direção: as empresas e o setor público passaram a ser mais vigiados e controlados. Não apenas as leis explicitamente voltadas para o combate aos ilícitos financeiros foram nessa direção, mas também outros tipos de controles que têm como finalidade dar mais poder ao fisco na consecução de seu objetivo maior. Um exemplo prosaico disso é a adoção da nota fiscal eletrônica.

Mais instrumentos de controle foram parar nas mãos de policiais, promotores e juízes, que vêm sendo treinados em um novo ambiente, no qual eles sabem que seu sucesso depende exclusivamente do bom e eficiente cumprimento de seu papel profissional. No passado, políticos e juízes guardavam relações de parentesco. Não raro, havia políticos que eram irmãos, tios, sobrinhos ou primos de juízes. De uma maneira ou de outra, tinham crescido juntos, na família, na escola, e eventualmente, na faculdade. Como disse, no passado.

Com o advento da sociedade de massas no Brasil, deixou de ser comum que juízes e políticos se originem na mesma elite. Quando isso ocorria, o sucesso do político era sinônimo do sucesso do juiz. Hoje, como atestam Joaquim Barbosa e Sérgio Moro, isso deixou de acontecer. O mesmo que vale para os juízes vale para os promotores e, em menor dimensão, para os policiais. Estes eram, no passado, mais vítimas do desmando dos políticos. Policiais que de fato investigavam poderiam ser afastados de suas posições. Hoje, isso é impensável.

Eduardo Cunha é alvo de mais controles jurídicos e institucionais e de policiais, promotores e juízes mais independentes. O governo federal nada pode fazer para protegê-lo. Se o governo tivesse esse poder, o escândalo do mensalão não teria tido o desfecho que teve. Dito isso, a reação de Cunha, ao se colocar na oposição por conta de uma investigação, tem menos a ver com o que o governo pode fazer para protegê-lo e mais com suas propensões políticas.

O que mais surpreende na reação de Cunha é que não está de acordo com a tradição pemedebista de fazer política. O PMDB é um partido de raposas. Como se sabe, a adjetivação de raposa aplicada à política tem a ver com esperteza, habilidade, dissimulação. Por favor, não façam julgamento de valor. Essas características podem não ser úteis em outros mundos profissionais, mas são no mundo da política. A raposa caça sorrateiramente. Ela se aproxima da presa sem ser percebida. Só assim consegue atingir seu objetivo. Os políticos, em muitas situações, não revelam suas verdadeiras preferências e objetivos -essa é a condição, com frequência, para alcançá-los. Cunha vem fazendo o oposto.

Cunha teria agido dentro da tradição do PMDB se, quando houve a divulgação do escândalo que o envolve, tivesse feito a seguinte declaração: "O Brasil mudou, as instituições mudaram, e com isso é inteiramente compreensível que o Poder Executivo não exerça influência alguma sobre as investigações levadas a cabo no âmbito do Poder Judiciário. Não considero que esse episódio tenha a ver com o governo ou com a presidente. Assim, vou me defender e provarei na Justiça que todas essas denúncias são falsas e não passam de calúnias".

Feita essa declaração, Cunha passaria a agir cada vez mais como oposicionista. Eis o comportamento de raposa. Eis o comportamento tipicamente político.

Ao partir para a briga direta, para a explicitação de sua posição, Cunha começou a ser politicamente isolado. O PMDB prontamente emitiu uma nota, afirmando que o rompimento de Cunha não era a posição do partido. O deputado Miro Teixeira já se pronunciou acerca das condições de um possível afastamento do presidente da Câmara. Líderes de oposição já explicitaram que decisão política é diferente de decisão pessoal. O conteúdo e a forma da reação de Cunha às denúncias que o atingem apenas pioram sua situação.
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Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de “A Cabeça do Brasileiro” e “O Dedo na Ferida: Menos Imposto. Mais Consumo”

“A mão que afaga” - Instituto Teotônio Vilela (ITV)

Durante seus 35 anos de existência, o PT sempre manteve pelo menos um traço de coerência: apostou na divisão do país para travar a luta política e, quando já estava no governo, abusou da cizânia como arma eleitoral e instrumento de perpetuação no poder. Agora, que o governo Dilma está nas cordas, os petistas acenam com diálogo. Qual PT é o verdadeiro?

Nos últimos dias, com a situação política, econômica (cuja cereja do bolo foi a nova meta de déficit prevista para este ano), social e ética do país atingindo níveis de deterioração nunca antes vistos, os petistas puseram para circular a versão de tanto Lula quanto Dilma buscam diálogo com a oposição, mais especificamente com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em favor da “governabilidade”. Agora governadores também seriam alvo deste “pacto”, segundo o Valor Econômico.

Sim: debater o país, buscar as melhores alternativas de forma suprapartidária e republicana são práticas desejáveis e típicas de democracias e de democratas maduros. São, no entanto, tudo o que o PT jamais fez nos seus 35 anos de história e, principalmente, nos 13 anos no poder até agora.

Foram anos em que o PT reiteradamente provocou o embate, estimulou a divisão, recusou a opinião crítica (qualquer uma), atacou instituições e transformou adversários em inimigos. Agora, quando o calo aperta de vez, a postura muda num passe de mágica. Será?

Quem por acaso tiver alguma dúvida deveria revisitar os discursos de Lula tanto quando presidente – em que tudo acontecia no Brasil como “nunca antes na história” – e também quando, depois de sair do Planalto, aboletou-se sobre palanques pelo país afora e manteve-se em sua campanha permanente.

Quem ainda alimentar alguma suspeita sobre em qual PT deve-se acreditar, pode gastar horas assistindo aos programas de TV da presidente Dilma na campanha do ano passado ou revendo suas frases ensaiadas para serem repetidas nos debates presidenciais, segundo as quais o problema do Brasil do presente estava sempre no passado.

Fernando Henrique foi o anátema desta estratégia. Tudo de ruim que possa ter ocorrido no Brasil nos últimos 20 anos foi sempre creditado a ele pela narrativa petista. Nas campanhas eleitorais do PT, culminando com a mais torpe delas, a do ano passado, o ex-presidente foi sempre retratado como o Judas a ser malhado pelas agruras – principalmente as atuais – dos brasileiros.

Depois de anos de distorção e mentiras, agora, num passe de mágica, o PT transforma Fernando Henrique no esteio da governabilidade. Das duas, uma: Ou os petistas estão finalmente reconhecendo a importância de fato do ex-presidente para a história contemporânea do país ou estão, mais uma vez, exercitando seu conhecido oportunismo. Em que PT apostar?

Ao mesmo tempo em que assopra, o partido de Lula e Dilma morde. Ao mesmo tempo em que põe para circular a tese do diálogo, o velho PT de guerra prepara, junto com seus satélites, vários atos ao longo de agosto para tentar tachar, segundo a Folha de S.Paulo, de “antidemocráticas” e “golpistas” as manifestações de insatisfação em relação ao governo petista programadas para o próximo dia 16. Qual PT vale?

Ao mesmo tempo, Lula também planeja correr o Nordeste para defender-se e ao governo – provavelmente expiando a culpa pela penúria atual nos bodes de sempre e não na gestão de sua pupila. Em quem confiar: em quem diz buscar diálogo ou em quem vocifera contra os adversários em reuniões quase diárias pelo país afora?

No mesmo momento, petistas no governo também tentam modificar critérios para aplicação de verbas publicitárias oficiais de maneira a privilegiar veículos alinhados ao petismo, em detrimento de parâmetros técnicos de alcance e audiência. Em quem apostar: nos que acenam com equilíbrio ou em quem ensaia manipular recursos públicos para – novamente – tentar cercear a imprensa?

A história é boa conselheira e pode servir sempre para iluminar o presente e ilustrar decisões e opiniões. O país quer ver saídas, desde que expressem um sentimento verdadeiro. Não é, por toda a história pregressa, o comportamento de quem até hoje agiu sempre de maneira contrária ao que agora acena. A história ensina: a mão que afaga é a mesma que apedreja.