terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Opinião do dia – Luiz Sérgio Henriques

O problema com categorias anacrônicas é que se chocam com as exigências da política em situações complexas. Imaginando interditar o funcionamento natural das instituições, possibilitam a interpretação de que, em outra época e latitude, se tenta armar um sistema de poder espraiado pelos organismos de Estado e pelo sistema de empresas públicas, como na Itália antes das "mãos limpas".

Lá, a investigação judicial teve como alvo um sistema que girava em torno de democratas-cristãos e socialistas (dos tempos de Bettino Craxi), ao passo que, no núcleo duro da esquerda, havia um agrupamento que, não sem contradições, elaborou o lema (atualíssimo!) da "democracia como valor universal". Aqui, desgraçadamente, pode-se conjeturar que o eixo central girou, ou gira, em torno do principal partido de esquerda, como a confirmar que tentações autoritárias desconhecem cor ideológica. Faltando freios legais, a sedução do poder é fatal: não há quem dela se esquive, ainda que com doce constrangimento e dose maciça de sofismas.
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*Tradutor e ensaísta, é um dos organizadores das 'Obras' de Gramsci no Brasil. Do artigo ‘Mãos limpas à brasileira’. O Estado de S. Paulo, 15 de fevereiro de 2015, (olhe na íntegra no arquivo do blog).

Delator repetiu esquema de Dirceu para abrir offshores

• Barusco usou escritório no Panamá que criou filial de consultoria de ex-ministro para constituir empresas envolvidas na Lava Jato

Andreza Matais - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Pedro Barusco, ex-gerente da Petrobrás, utilizou o mesmo procedimento do ex-ministro José Dirceu, condenado no processo do mensalão, para abrir em 2008 duas offshores no Panamá que movimentaram US$ 21,4 milhões do esquema de corrupção na estatal. A Pexo Corporation e a Rhea Comercial Inc. foram criadas a pedido de Barusco pelo escritório de advocacia Morgan y Morgan, que constituiu no mesmo ano uma filial da consultoria do ex-ministro no Panamá.

Uma offshore instituída pelo Morgan y Morgan também constava como sócia majoritária do hotel Saint Peter, que ofereceu no fim de 2013 emprego a José Dirceu na sua primeira tentativa de migrar para o regime semiaberto. No hotel, o ex-ministro trabalharia como gerente, com salário de R$ 20 mil.

Dirceu desistiu do emprego após o Jornal Nacional, da TV Globo, revelar que o presidente da offshore era Jose Eugenio Silva Ritter, um laranja do escritório que morava na periferia do Panamá e tinha centenas de empresas abertas em seu nome.

Os documentos aos quais o Estado teve acesso mostram que Ritter consta como signatário da constituição das duas offshores que Barusco confessou serem suas em delação premiada. Dianeth Isabel Matos de Ospino, que aparece na constituição das offshores de Barusco, também ajudou a criar a offshore do hotel Saint Peter.

Na delação premiada, Barusco contou aos investigadores que a Rhea Comercial acumulou de 2008 a março de 2014, US$ 14,2 milhões.

Conforme documentos do registro oficial do Panamá, a empresa continua ativa. Já a Pexo Corporation foi fechada em abril de 2014. Enquanto permaneceu em funcionamento, Barusco contou aos investigadores que abriu uma conta no Banco Safra, com US$ 7,2 milhões em nome dessa offshore. Em valores atualizados, pelo dólar de ontem, as duas empresas de Barusco movimentaram R$ 60,1 milhões no período de seis anos.

JD. A sucursal da empresa de Dirceu no Panamá existiu para os órgãos públicos brasileiros por ao menos um ano. Em abril de 2009, numa alteração contratual, o ex-ministro decidiu “tornar sem efeito” a abertura da filial no Panamá. O ex-ministro já negou, contudo, que a JD Assessoria e Consultoria tenha operado naquele país; sua constituição teria sido apenas no papel.
Nos depoimentos de delação premiada, Barusco não citou a coincidência de abertura de suas offshores pelo mesmo escritório usado por José Dirceu.

O ex-gerente acusou o PT de ter recebido entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões de propina referente a 90 contratos da Petrobrás fechados com grandes empresas entre 2003 e 2013, durante os governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Dirceu foi ministro da Casa Civil de 2003 a 2005.

O nome do ex-ministro foi mencionado por outro delator do esquema, o doleiro Alberto Youssef, que o acusou em depoimento de ser o intermediário do PT no recebimento de propina de empresas do esquema da Lava Jato.

Barusco era gerente na Diretoria de Serviços da Petrobrás, na época ocupada por Renato Duque – acusado na Lava Jato e cuja indicação para o cargo é atribuída a Dirceu – o que o ex-ministro nega.

Procurada pelo Estado ontem, a assessoria de Dirceu não havia respondido ao pedido de posicionamento até a conclusão desta edição. O ex-ministro já afirmou que “repudia, com veemência, as declarações do doleiro Alberto Youssef de que teria recebido recursos ilícitos do empresário Julio Camargo, da Toyo Setal, ou de qualquer outra empresa investigada pela Operação Lava Jato”.

A advogada Beatriz Catta Preta, que representa Pedro Barusco, não foi localizada ontem pela reportagem.

Receita investiga empresas da Lava-Jato por sonegação

• Fisco investiga sonegação e outros crimes tributários de empreiteiras e servidores acusados na Lava-Jato

Jailton de Carvalho – O Globo

BRASÍLIA - Na trilha da Operação Lava-Jato, a Receita Federal criou um grupo para investigar sonegação fiscal e outros crimes tributários cometidos por empreiteiras, doleiros e servidores públicos a partir do esquema de desvio de dinheiro na Petrobras. A informação foi revelada ao GLOBO por uma autoridade que acompanha as investigações.

A fiscalização especial poderá resultar em multas pesadas para empresas e pessoas físicas que movimentaram somas expressivas não declaradas ao Fisco. Na segunda etapa, a fiscalização poderá atingir partidos políticos beneficiados com recursos desviados de contratos de empreiteiras com a estatal.

A força-tarefa já começou a atuar. A base do trabalho, por enquanto, são os inquéritos e processos franqueados pela 13ª Vara Federal de Curitiba desde o início da Operação Lava-Jato. Os fiscais da Receita estão fazendo a investigação na ordem cronológica em que cada caso de corrupção apareceu nos inquéritos criminais. As propinas depositadas em contas no exterior estão na mira.

- Algumas fiscalizações começaram mais cedo, outras um pouco mais tarde. É muito trabalho. Estão na ordem das operações os doleiros, os operadores do esquema e por aí vai - disse ao GLOBO uma fonte vinculada ao caso.

Só com os delatores, R$ 500 milhões
Pelas informações da Receita, caso seja comprovada a sonegação fiscal, as multas serão de, no mínimo, 75% do valor devido e não informado ao Fisco - além da devolução dos valores devidos já corrigidos. Ainda não há um cálculo do valor sonegado, mas só os bens e valores acumulados por cinco delatores estão na casa dos R$ 500 milhões, conforme o Ministério Público Federal.

Nesta primeira etapa, a fiscalização está concentrada nos negócios dos quatro doleiros que foram alvo da Lava-Jato, e nas empresas e empreiteiras que fizeram transações com eles, especialmente com Alberto Youssef. O doleiro é apontado como um dos chefes de uma das organizações acusadas de fraudar contratos com a Petrobras. Os outros doleiros são Nelma Kodama, Raul Sour e Carlos Habib Chater, que, assim como Youssef, estão presos.

A investigação sobre os partidos e os políticos acusados de receber propina do esquema na Petrobras dependerá dos desdobramentos da investigação no Supremo Tribunal Federal (STF). O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já está preparando os pedidos de abertura de inquérito contra políticos. Nessa frente, uma força-tarefa criada pelo procurador está depurando os 42 casos de corrupção relatados por Youssef e Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras.

As investigações do Fisco deverão se limitar a movimentação financeira dos últimos cinco anos. Transações registradas em data anterior a este prazo perdem efeito para fins fiscais. Ou seja, estão fora do alcance do Leão. A Receita só poderia colaborar nas investigações do crime de evasão fiscal, que prescreve depois.

Ligação com o "SwissLeaks"
Numa outra frente, a Receita Federal vai pedir a autoridades francesas informações adicionais sobre brasileiros que fizeram movimentação na filial suíça do HSBC, que é acusada de acobertar um grande esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas de parte de seus clientes. Segundo o Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo, que realiza uma apuração batizada de "SwissLeaks", 5,5 mil brasileiros mantinham contas no HSBC, parte delas com dinheiro não declarado ao Fisco. Pelo menos 11 dessas pessoas estão sendo investigadas na Lava-Jato, como O GLOBO publicou sábado.

Só entre 2006 e 2007, o saldo das contas de brasileiros estaria em torno de R$ 7 bilhões. Fiscais tiveram acesso a parte dos dados divulgados. Em nota divulgada sexta-feira, a Receita informa que "análises preliminares de alguns contribuintes já revelam hipóteses de omissão ou incompatibilidade de informações prestadas ao Fisco brasileiro, entre outros casos".

A Receita quer saber se os titulares das contas fizeram movimentações adicionais, especialmente nos últimos anos. Isto porque, a exemplo do que acontecerá com os réus da Lava-Jato, valores sonegados há mais de cinco anos não podem mais ser cobrados.

Ainda não existem cálculos oficiais sobre os valores desviados da Petrobras. Para procuradores e delegados, isso só será possível na fase final das investigações. Mas, de qualquer forma, já se sabem que as cifras são impactantes. Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) informa que pessoas e empresas investigadas na Lava-Jato movimentaram R$ 23,7 bilhões de forma atípica nos últimos cinco anos, conforme revelou O GLOBO em novembro. Ano passado, empreiteiras ensaiaram fazer um acordo de leniência e devolver algo em torno de R$ 1 bilhão aos cofres públicos.

Petistas criticam pressão contra Cardozo

• Aliados defendem atuação de ministro da Justiça e dizem que Barbosa busca projeção com "ativismo jurídico"

• Oposição tentará convocar ministro no Congresso para que ele explique encontro com advogados da Lava Jato

Andréia Sadi, Gabriela Guerreiro – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Após o ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa defender a demissão de José Eduardo Cardozo, petistas e advogados saíram nesta segunda-feira (16) em defesa do titular do Ministério da Justiça.

O secretário de Comunicação do PT, José Américo, chamou de "lastimável" o pedido de Barbosa e disse que o ex-ministro do Supremo quer voltar à cena política "de olho" nas próximas eleições.

"Ele diz que se aposentou por dor nas costas, mas o objetivo era outro: militar e tentar um cargo político a curto prazo", disse à Folha.

A defesa da demissão de José Eduardo Cardozo foi feita por Joaquim Barbosa em mensagem divulgada no Twitter na noite de sábado (14). "Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a presidente Dilma demita imediatamente o ministro da Justiça".

Em mensagem posterior, Barbosa associou o pedido de demissão às notícias sobre os encontros que Cardozo teve com advogados de empresas investigadas pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que está subordinada a ele.

Para Américo, a postagem de Barbosa é "coerente" com a sua atuação durante o julgamento do mensalão, criticada pelo PT. O ex-ministro relatou o processo que condenou integrantes da cúpula do PT e do governo Lula.

"Ao polemizar com Cardozo, ele repete seu ativismo jurídico e mostra que o tempo todo tinha objetivo político", disse Américo.

Coordenador jurídico do PT, Marco Aurélio Carvalho também atacou Barbosa. "Por ironia do destino, ele se aposentou e hoje procura fazer o que sempre criticou: pediu carteirinha da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] para sobreviver". Em outubro, a OAB-DF concedeu a carteira de advogado ao ex-ministro do Supremo.

Durante seu mandato no STF, Barbosa criticou diversas vezes a classe dos advogados e chegou a expulsar Luiz Fernando Pacheco, defensor do ex-presidente do PT José Genoino no processo do mensalão, do plenário do STF. "Agora, precisará respeitar os seus pares e a liturgia da nobre função que abraçou", completou Carvalho.

O criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro disse que o pedido de Barbosa é "saudade dos holofotes" e "especialidade" do ex-ministro. "Como é Carnaval parece ser uma piada de salão: um ex-ministro do Supremo sair do ostracismo para tentar pressionar a presidente da República e pedir a demissão do ministro da Justiça".

Luiz Fernando Pacheco disse que a exigência de Barbosa demonstra "desrespeito" aos profissionais de direito e revela o "caráter populista" do ex-ministro do STF.

Oposição
A oposição vai apresentar pedidos de convocação para José Eduardo Cardozo explicar, no Congresso, os motivos dos encontros com advogados de empresas investigadas na Lava Jato. Apesar dos oposicionistas afirmarem que cabe à presidente Dilma Rousseff pedir explicações ao ministro, DEM, PSDB e PPS querem uma posição pública dele sobre as conversas.

"Vamos chamá-lo no Congresso numa convocação conjunta da oposição. O PT está numa ação orquestrada para tentar melar o jogo de toda maneira", disse o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE).

Os oposicionistas também pretendem pedir que a Comissão de Ética Pública do governo investigue a conduta de Cardozo.

"A avaliação se o ministro deve sair ou não é da presidente. Ela tem procurado manter distância da Operação Lava Jato, mas é obrigação dela se manifestar sobre o assunto", disse o presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN).

Procurado, o ministro da Justiça disse que já havia falado sobre o assunto neste domingo e não tinha nada para acrescentar.

Líderes da oposição acionarão Cardozo na Comissão de Ética

• Ministro também deverá ser chamado ao Congresso explicar reuniões com advogados de empreiteiras

Isabel Braga e Simone Iglesias – O Globo

BRASÍLIA - A oposição vai acionar a Comissão de Ética Pública da Presidência da República contra o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Os partidos querem explicações sobre as reuniões que o ministro teve com advogados de empreiteiras envolvidas na Operação Lava-Jato, algumas delas não registradas em sua agenda. Além da ação junto à comissão, líderes da oposição também se articulam para tentar aprovar uma convocação para que Cardozo vá ao Congresso dar explicações.

- Estamos diante de um visível caso de conflito de interesses. A presidente precisa dizer claramente ao país para quem ela governa: se é para o PT e seu projeto de poder ou para o país - disse o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).

O líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), propôs uma ação conjunta dos partidos de oposição na defesa da independência na investigação.

- Não cabe ao ministro trocar figurinhas com advogados de empresas investigadas pela Polícia Federal. Isso cria um ambiente para as mais variadas versões. A corrente majoritária do PT já atua há algum tempo para embolar o processo da Lava-Jato e isentar petistas e aliados - criticou Mendonça.

Parlamentares do PT apoiaram as reuniões de Cardozo com defensores das empreiteiras. Para o deputado Afonso Florence (PT-BA), faz parte do trabalho do ministro receber advogados. Quanto ao fato de algumas reuniões não aparecerem na agenda, Florence ponderou que não foi uma decisão política:

- Não há uma tentativa de esconder. Muitas vezes isso nem passa pelo ministro. São circunstâncias técnicas.

O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) também deu apoio.

- (Cardozo) É um ministro que conversa com a advocacia, diferentemente do ministro demissionário do STF que não recebia os advogados - disse ele, em referência ao ex-ministro Joaquim Barbosa, que pediu a demissão de Cardozo.

Efeito Lava Jato e pulverização do voto derrubam arrecadação dos partidos

• Para compensar a queda das doações de empresas privadas e o aumento do número de legendas que recebem recursos do Fundo Partidário, líderes das bancadas no Congresso articulam aprovação de emenda que amplia o repasse de dinheiro público às siglas

Daniel Bramatti e Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

São Paulo - Até agora, 2015 tem sido um ano complicado para os tesoureiros de 24 dos 32 partidos do País. Além de enfrentarem uma “seca” de doações de empresas, reflexo da Operação Lava Jato e da retração da economia, eles receberam em janeiro deste ano repasses do Fundo Partidário menores do que os embolsados no mesmo mês de 2014.

As perdas para o PT, o PMDB e o PSDB foram, respectivamente, de 42%, 35% e 30%. O sufoco, para muitas legendas, deve ser temporário, já que o Congresso se prepara para turbinar o Fundo Partidário com uma injeção adicional de recursos públicos de pelo menos R$ 100 milhões - uma tradição em todas as votações do Orçamento ocorridas desde 2011.

Para os maiores partidos, porém, poderá haver perdas mesmo com a “ajuda” a ser votada pelo Congresso. Das dez principais legendas, oito - PT, PMDB, PSDB, PP, PR, PSB, PTB e DEM - tiveram menos votos para deputado federal em 2014, em termos proporcionais, em comparação com 2010. Com isso, essas siglas terão redução em suas cotas do fundo, já que elas são distribuídas de acordo com o desempenho nas urnas.

Os partidos grandes perderam participação graças à pulverização dos votos entre as diferentes legendas, processo que alcançou nível recorde em 2014. Nada menos que 12 partidos “nanicos” conseguiram ampliar sua fatia de votos para a Câmara na eleição do ano passado. Além disso, cinco novos partidos foram criados desde 2011 - PSD, PROS, SD, PPL e PEN. Todos já entraram na divisão do “bolo” do Fundo Partidário.

O baque na arrecadação coincide com a retração das doações das empresas, que não se limitam aos anos eleitorais.

A Lava Jato, que investiga um esquema de corrupção e cartel de empreiteiras em obras da Petrobrás, interrompeu uma tendência de ampliação do financiamento privado que se manifestava até o ano passado.

Em abril de 2014 o Estado mostrou que PT, PMDB e PSDB, juntos, receberam cerca de R$ 1 bilhão em doações de pessoas jurídicas entre 2009 e 2013. Esse valor representava dois terços de tudo o que havia entrado nos cofres dos três maiores partidos do País no período.

Com a retração dos empresários, relatada por tesoureiros ouvidos pela reportagem, cresce agora a pressão pelo aumento do financiamento público. O valor que será acrescido ao Fundo Partidário é, por enquanto, um segredo compartilhado entre poucos líderes de bancadas e o relator-geral do Orçamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR). O aumento se dará por meio da apresentação de uma emenda na votação do Orçamento, que deve acontecer até o final do mês.

Nos últimos anos, esse acréscimo tem sido de R$ 100 milhões. A primeira manobra para elevar os valores no Congresso ocorreu em 2011, quando os partidos se articularam para “estatizar” as dívidas das campanhas eleitorais do ano anterior.

Apertar o cinto. Este ano, segundo alguns tesoureiros, existe também uma pressão no sentido contrário, vinda do Executivo, para que não haja o acréscimo ao Fundo Partidário. O argumento é que os governos em todos níveis têm cortado gastos para se ajustar às previsões de estagnação da economia e o aumento dos repasses para os partidos poderia trazer desgaste ao Congresso. As próprias legendas, no entanto, admitem que as chances de o acréscimo ser barrado são pequenas.

Sob a ameaça de queda abrupta das receitas, os dirigentes contam com a aprovação da medida para viabilizar a atividade partidária. A maior parte deles descarta as doações privadas. “Estamos toreando as contas, pois nossa base é o Fundo Partidário”, disse o diretor de Gestão Corporativa do PSDB, João Almeida.

No PT, o mais afetado entre as grandes legendas, a ordem é apertar o cinto. Além disso, o partido vai lançar uma campanha nacional de arrecadação entre seus filiados (mais informações no texto abaixo).

Os efeitos da Lava Jato e a pulverização de votos já afetam até partidos recém-criados, como o PSD do ministro das Cidades, Gilberto Kassab, fundado em 2011 e que participou de sua primeira eleição para a Câmara no ano passado.

De acordo com o tesoureiro do PSD, Flávio Chuery, a legenda trabalha com a previsão de contar apenas com verbas do Fundo Partidário em 2015.

As doações privadas de pessoas jurídicas foram descartadas do planejamento orçamentário do partido para este ano.

Para reforçar caixa, PT vai lançar campanha nacional entre filiados

• Legenda irá distribuir carnês para contribuições mensais; dirigentes da sigla falam em perda de R$ 1 milhão ao mês

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Diante de uma queda de 42% das receitas vindas do Fundo Partidário e do efeito da Operação Lava Jato, que afugentou os financiadores privados, o PT vai recorrer à sua militância para tentar reforçar o caixa partidário em 2015.

Nas próximas semanas, o partido vai lançar uma campanha nacional de arrecadação entre seus filiados. A intenção é distribuir carnês aos voluntários para que eles façam contribuições mensais e garantam a estabilidade financeira da legenda neste ano.

Segundo o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, as doações de empresas privadas ao partido simplesmente deixaram de existir. “Os empresários não querem nem saber de conversa”, disse ele recentemente a petistas.

Vaccari, que é investigado na Lava Jato por suspeita de intermediar o pagamento de propinas ao PT, tem dito que a operação é uma tentativa de criminalizar as doações feitas ao partido – segundo ele, legais e contabilizadas. “Estão tentando forçar a compreensão de que qualquer doação é propina”, defende o tesoureiro, que nega qualquer participação no esquema.

O PT ainda não calculou o impacto da Lava Jato e da pulverização de legendas nas contas partidárias. Alguns dirigentes falam em uma perda de R$ 1 milhão ao mês, correspondentes a cerca de 10% do orçamento petista, que foi de R$ 123 milhões em 2013.

Sem avião. Embora o partido não admita oficialmente, a falta de recursos já pode ser sentida. No dia 6 de fevereiro o diretório nacional se reuniu em Belo Horizonte antes da festa de 35 anos do PT. Além das comemorações, a Escola Nacional de Formação e a Secretaria de Comunicação promoveram encontros de dirigentes estaduais. Muitos deles tiveram que ir de carro até a capital mineira, pois a direção nacional se recusou a bancar passagens aéreas.

Na reunião que precedeu a comemoração dos 35 anos, Vaccari destacou a previsão de dificuldades financeiras em 2015 e pediu ao partido que aperte o cinto, já que o ano promete ser conturbado.
Além das atividades normais do partido que incluem duas sedes nacionais (uma em São Paulo e outra em Brasília) com dezenas de funcionários, uma escola nacional de formação política e uma agência nacional de notícias, o PT vai ter uma série de atividades fora do previsto neste ano.

Eleição extraordinária. As principais serão a segunda etapa do 5º Congresso Nacional do PT marcada para junho, em Salvador, mas que será precedida por dezenas de debates e encontros locais, e o Processo de Eleições Diretas Extraordinário, em novembro, no qual mais de 600 diretórios municipais que não cumpriram as metas de mulheres, jovens e negros em sua composição realizarão novas eleições.

Isso não impede que a direção do PT continue fazendo planos ambiciosos. O maior deles é colocar no ar um canal de TV na internet para divulgar conteúdo de interesse do partido.

Crise da Petrobras - Pequenos acionistas vão à Justiça contra perdas

Cadu Caldas - Zero Hora (RS)

Investidores que compraram ações da companhia nos anos de esplendor da petroleira ingressam na Justiça para tentar evitar prejuízos. Advogados alegam que corrupção prejudicou a rentabilidade dos papéis e reduziu a distribuição de ganhos

Ao mesmo tempo que investigações da força-tareta da Operação Lava-Jato apontam os desvios bilionários envolvendo a Petrobras, acionistas minoritários da companhia no Rio Grande do Sul tentam reaver parte do valor que perderam com o recuo no preço da ações.

Pelo menos uma dezena de processos já foi apresentada à Justiça contra a estatal, a União e até contra a empresa de auditoria responsável por verificar os balanços da petroleira. Apesar de a bolsa de valores ser considerada um investimento de risco, a justificativa é de que o esquema de corrupção dentro da companhia prejudicou a rentabilidade dos rendimentos e reduziu a distribuição de lucros.

– A Petrobras inflou o valor dos contratos e mentiu nas declarações oficiais para esconder indícios de corrupção. Os balanços fraudados para dissimular o pagamento de propina e a lavagem de dinheiro induziram os acionistas ao erro. Muitos deles são pessoas humildes, que investiram os recursos do fundo de garantia – afirma o advogado Marco Antônio Borba, responsável por cinco processos em Santa Cruz do Sul.

Entre os acionistas que tentam reaver prejuízos, está Cláudio Spengler que estima que possa perder mais de R$ 100 mil. O empresário comprou ações quando custavam R$ 32,50 em 2011. Três anos depois, valem R$ 9,99, redução de quase 70%.

– Eu investia em várias companhias, como Vale e Petrobras. Agora não quero mais saber. Quis aplicar o dinheiro e só perdi. Tirei o homebroker (sistema que possibilita a negociação de ações por meio da internet) da minha mesa e decidi focar no trabalho. A decepção é muito grande – lamenta Spengler.

Outro investidor, que prefere não se identificar, registra redução percentual ainda maior. Comprou R$ 70 mil em ações da estatal em um momento em que valiam R$ 42 cada. Renan Müller de Bastos, advogado que representa cinco investidores em Porto Alegre, lembra que as perdas não são relativas apenas ao valor das ações:

– Vamos pedir o recálculo do valor do dividendo. Por lei, as companhias são obrigadas a distribuir pelo menos 25% do lucro líquido aos acionistas. Mas, se esse lucro foi reduzido devido a desvios, a quantia precisa ser revista.

Empresa de Eike também é alvo
Não é só a Petrobras e a União que estão na mira dos investidores. A PricewaterhouseCoopers (PwC), empresa responsável por validar a contabilidade da estatal desde 2001, também será alvo de ação na Justiça estadual. O motivo seria a auditoria ter falhado no seu propósito e não indicar nenhuma anormalidade nos balanços mesmo com os desvios bilionários que estavam acontecendo na petrolífera. No fim do ano passado, após a deflagração da Operação Lava-Jato, a PwC se negou a assinar o balanço do terceiro trimestre de 2014 da estatal.

Por lei, as empresas de auditoria são obrigadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pelo Conselho Federal de Contabilidade a fazerem ressalvas nos relatórios caso tenham encontrado anomalias e incongruências na contabilidade.

– Os desvios eram bilionários e nenhum contador percebeu? Era muito dinheiro para ninguém perceber – diz o advogado Renan Müller de Bastos.

Como a compra de ações é considerado um investimento de risco, não é muito comum que investidores procurem a Justiça para recuperar eventuais perdas. Um exemplo recente envolveu a petroleira de Eike Batista. Quando a OGX foi à bancarrota, centenas de acionistas minoritários entraram com processos para reaver parte do dinheiro. Até o momento, não houve definição sobre a questão, que deve parar no Supremo Tribunal Federal (STF).

Reajuste de 6,5% volta à cena

• Diante da crise política, Dilma pode aceitar correção maior na tabela, apesar de resistência da Fazenda

Geralda Doca, Martha Beck – O Globo

BRASÍLIA - Diante da crise política e das dificuldades de relacionamento da presidente Dilma Rousseff com o Congresso e as centrais sindicais, o Palácio do Planalto voltou a cogitar um reajuste de 6,5% na tabela do Imposto de Renda (IR) na fonte em 2015, embora enfrente resistência da equipe econômica. A correção foi aprovada pelo Congresso em dezembro passado e vetada em 19 de janeiro pela presidente Dilma com a justificativa de que não haveria espaço fiscal para uma correção acima de 4,5%.

Em maio do ano passado, em pronunciamento em cadeia de rádio e TV pelo Dia do Trabalho, às vésperas da campanha eleitoral, Dilma se comprometera com a correção da tabela e, no dia 2 de maio, o governo editou uma medida provisória fixando o reajuste em 4,5%, a partir de janeiro.

Mas, com o recesso branco durante a campanha eleitoral, a medida provisória não foi votada e perdeu a validade em agosto passado. O Congresso incluiu a correção em outra medida, após as eleições, com apoio da oposição, e elevou o percentual para 6,5%. Com o veto presidencial, a tabela ficou sem correção, e o governo sinalizou nos bastidores que encaminharia ao Congresso uma nova medida com a correção de 4,5 % - o que ainda não aconteceu, acirrando ainda mais os ânimos no Congresso, que ameaça derrubar o veto da presidente ao reajuste de 6,5% nas próximas semanas.

A correção da tabela em 4,5% vai custar aos cofres do governo R$ 5,3 bilhões neste ano. Na justificativa do veto, a presidente Dilma informou que o reajuste de 6,5% custaria R$ 7 bilhões. Preocupado com o ajuste das contas públicas, Levy já teria considerado em suas contas os 4,5%, mas resiste em ampliar essa despesa.

Reaproximação com centrais sindicais
Segundo fontes, a decisão está com o Palácio do Planalto e a Casa Civil, que avaliam as dificuldades políticas que a presidente Dilma enfrenta no Congresso e o desgaste junto ao movimento sindical. A correção de 6,5% da tabela é uma hipótese cogitada para evitar um derrota no Congresso com a derrubada do veto presidencial. Também é vista como uma forma de reaproximação com as centrais sindicais, que no momento estão trabalhando fortemente para derrubar no Legislativo as medidas do ajuste fiscal que restringiram o acesso ao benefícios trabalhistas (seguro-desemprego, abono e pensões).

Como o governo até agora não editou uma nova medida provisória com a correção da tabela, os assalariados que recebem mais de R$ 1.787,77 continuam tendo que pagar imposto. Nos últimos quatro anos, a tabela foi corrigida anualmente em 4,5%, percentual abaixo da inflação. Em 2010, essa política foi adotada pelo então presidente Luiz Inácio Lula e assegurou aos trabalhadores o reajuste anual no período entre 2011 e 2014.

Segundo o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves (Juruna), para o movimento sindical, a correção da tabela do IR é uma questão da qual as centrais sindicais não abrem mão. Ele destacou que a melhor solução seria a presidente Dilma editar logo a medida provisória, antes da votação do veto pelo Congresso.

- Seria um gesto positivo da presidente nesse momento. Poderia ajudá-la numa reaproximação com o movimento sindical - destacou Juruna.

Os dirigentes sindicais alegam que os trabalhadores estão pagando mais imposto - e que isso prejudica a economia.

O esforço fiscal quase Impossível de alcançar

• Obstáculos em série dificultam a meta de superávit de 1,2% do PIB este ano. Saída será cortar investimentos e elevar ainda mais os impostos, dizem analistas

Cássia Almeida – O Globo

Quando o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, anunciou a meta de economizar 1,2% do PIB no fim do ano passado, antes mesmo de assumir, o esforço parecia grande, mas possível. Do fim de 2014 até agora, tudo piorou. Dos números fiscais ao cenário político, do estoque de água e luz à cotação do dólar. O primeiro mandato de Dilma deixou um rombo de 0,63% do PIB, o equivalente a R$ 32,5 bilhões, a economia caminha ladeira abaixo, levando junto a receita do governo, a ameaça de racionamento de água e luz está cada vez maior, e a Operação Lava-Jato tirou as principais empreiteiras do país dos leilões de concessões e dos investimentos da Petrobras. E agora, volta a discussão de correção de 6,5% da tabela do Imposto de Renda.

O que parecia uma meta possível de alcançar agora só traz desconfiança. Para poupar os quase R$ 100 bilhões prometidos, o caminho será árduo para União, estados e municípios. Mesmo com o aumento de impostos na gasolina, no crédito e até nos batons, a economia com risco de entrar em recessão mina o esforço de arrecadação. O economista Raul Velloso diz que houve queda de 1% nas receitas federais em dezembro. E já há analistas prevendo que o PIB vai cair 0,5%, mesmo se não houver racionamento de água e luz. Se acontecer, a recessão será de 1%. A produção industrial já deu o tom da atividade em 2015. Como caiu muito em dezembro, se o setor não se recuperar e produzir o mesmo do último mês de 2014 o ano inteiro, já está contratada uma queda de 4% na indústria este ano. Com peso de 17,2% no PIB, o estrago pode ser grande. Mesmo com todos esses obstáculos, Velloso acredita que a meta será cumprida, por meio de uma contenção brutal dos gastos:

- O ajuste vai ser sangrento, vai espirrar pressão de todos os lados. Levy vai sentar em cima do caixa, vai atrasar pagamento, protelar, jogar para o ano que vem. Vai levar o secretário do Tesouro para casa, dormir com ele. É um ajuste emergencial, só dá para fazer um ano, senão forma fila na Esplanada.

O corte de gastos sozinho não vai dar conta do tamanho do aperto. E aí, podem vir mais aumentos de impostos, afirma Fernando Montero, economista-chefe da Tullett Prebon Brasil:

- A situação é difícil por todos os lados que se queira ver.

A inflação, que costuma ser boa para as contas públicas por inflar as receitas, não terá o efeito esperado. Segundo Montero, o efeito de alta dos preços só aparece se houver um avanço rápido da inflação, e não como estamos hoje já com a inflação acima do teto da meta de 6,5%. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) está em 7,14% em 12 meses.

- Partindo de um déficit de 0,63% do PIB em 2014, numa economia paralisada, com a inflação já muito elevada, será muito difícil puxar dois pontos de primário em 2015 (1,2% da meta mais o buraco de 0,65% de 2014) - afirma Montero.

Para ele, mesmo que se confirmem as expectativas de corte de despesas e de aumento de receitas, ainda faltará dinheiro para economizar 1,2% do PIB: "O governo, em suma, anuncia corte de R$ 49 bilhões em despesas correntes e um aumento de R$ 21 bilhões em receitas. Pode cortar adicionais R$ 20 bilhões em investimentos. Ao todo, um impressionante esforço de R$ 90 bilhões. Infelizmente, mesmo comprando os anúncios pelo seu valor de face, absolutamente irreais no caso das despesas, falta muito dinheiro (precisaria vir na forma de mais impostos)", diz Montero, em seu relatório semanal.

Tanto Velloso quanto Montero veem corte de investimento na conta da poupança. Velloso toma por base o ajuste feito pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003. O investimento público, que respondia por 0,9% do PIB, caiu para 0,3%.

- O investimento representa 1,2% do PIB, pode cair para 0,3%. Já tem 0,9 ponto do ajuste pronto.

Gabriel Leal de Barros, economista da Fundação Getulio Vargas, diz que o governo terá que lançar mão de todo o arsenal usado em outros ajustes.

- É um senhor ajuste, uma série de riscos vai fazer com que o ajustamento se prolongue por mais de dois anos, até 2017.

O arsenal citado por ele é corte de despesas e investimento e aumento de impostos.

A professora da Coppead Margarida Gutierrez lembra que a recessão já prevista e a ameaça de racionamento de luz e água não estavam no cenário quando a meta de 1,2% foi fixada:

- Ainda há a Operação Lava-Jato paralisando o país. Todos esses fatores atuam na direção de exaurir a confiança do empresário, que adia o investimento. A queda da arrecadação vai ser muito maior do que se projetava, mesmo com recomposição dos impostos. Não vai compensar, a não ser que haja outros impostos.

Margarida diz que, mesmo diante de tantos obstáculos, há como fechar as contas com economia de quase R$ 100 bilhões. E cita os refinanciamentos de dívidas federais, os Refis, que podem gerar receita extra de R$ 20 bilhões.

A solução de elevar impostos num país que reserva 36% de toda a sua produção anual para bancar o Estado não será muito bem-vinda, principalmente com um Congresso pouco disposto a fazer concessões à Presidência. E o Tesouro precisa destinar R$ 8 bilhões ao BNDES, para cobrir o subsídio dado aos financiamentos do banco. O gasto foi de R$ 100 milhões em 2014. E tem mais: a receita do Tesouro com dividendos das estatais pode vir abaixo do esperado. Em 2014, contribuiu com R$ 18,9 bilhões.

- Tudo indica que esses dividendos serão menores este ano - afirmou João Augusto Salles, economista da Lopes Filho & Associados.

Conta do HSBC da Suíça teria recebido cerca de US$ 6 mi de propinas

• Em delação premiada, o ex-gerente da Petrobrás Pedro Barusco afirma que abriu em banco de Genebra conta em nome de offshore

Jamil Chade - O Estado de S. Paulo

GENEBRA - No centro de uma polêmica global por ajudar corruptos e evasores de todo o mundo, o HSBC de Genebra abriu conta e recebeu o depósito de dinheiro em sua sede suíça proveniente de propinas no caso da Petrobrás. Isso é pelo menos o que revela em sua delação premiada o ex-gerente executivo de engenharia da Petrobrás Pedro Barusco, que abriu um total de 19 contas em nove bancos na Suíça para receber propinas.

A informação faz parte do "Termo de Colaboração Premiada" entre Barusco e o Ministério Público Federal.

O documento aponta que o ex-gerente da Petrobrás "reconhece ter também recebido o valor aproximado de US$ 6 milhões em nome da Offshore Vanna Hill, em nome de sua esposa Luciana Adriano Franco em conta bancária no Banco HSBC, Genebra, os quais reconhece como sendo produto ou proveito de crimes por ele praticado".

O texto indica que Barusco renunciou "a todo e qualquer direito sobre eles e comprometendo-se a prontamente praticar qualquer ato necessário à repatriação desses valores em benefício do país". Sua esposa, no mesmo documento, "reconhece o depósito mencionado" e "igualmente renuncia a todo e qualquer direito sobre eles".

Na delação, a data da abertura da conta não é indicada. Mas entre os detalhes colhidos pelo MP está o registro de uma transferência no dia 12 de novembro de 2011 do HSBC para a empresa criada por Barusco no Panamá, a Rhea Comercial. O valor seria de US$ 980 mil.

Para realizar seus depósitos no HSBC, Barusco afirma ter se utilizado dos serviços do Bernardo Friburghaus, operador que também aparece na delação premiada de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobrás.

Lavagem. Na semana passada, uma revelação feita por uma rede de jornais de todo o mundo apontou como o HSBC funcionou como um instrumento para lavar dinheiro, gerando uma polêmica internacional sobre o papel dos bancos e da Suíça no combate à corrupção.

Segundo os dados, o banco HSBC ajudou a mais de 8,7 mil brasileiros a depositar US$ 7 bilhões em contas secretas na Suíça. No mundo, o banco auxiliou a mais de 100 mil clientes a levar para a Suíça suas fortunas, nem sempre declaradas em seus países. A lista desses clientes é um exemplo de como o sistema bancário do país alpino lucrou ao manter contas de criminosos, traficantes, ditadores e milionários que optaram por não pagar impostos ou pilharam seus países.

No Brasil, a Receita Federal se limitou a indicar que abriu investigações para apurar "hipóteses de omissão ou incompatibilidade de informações" prestadas ao Fisco Brasileiro por brasileiros correntistas do Banco HSBC.

No caso do HSBC, o Brasil aparece com destaque na lista, sendo o quarto país com maior número de clientes no ranking das nacionalidades que mais usaram o banco e as contas secretas. No total, foram mais de 6,6 mil contas. Entre as personalidades brasileiras estava Edmond Safra. No mundo, a lista conta com nomes como Fernando Alonso, Emilio Botin, David Bowie, Tina Turner ou o Rei Abdallah, da Jordânia.

Os documentos foram colhidos pelo Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo e revelam a frequência pela qual personalidades viajavam para a Genebra para consultar suas contas e administrar suas fortunas.

Bloqueio. Em março de 2014, Barusco tentou fazer transferências e retirar seu dinheiro da Suíça. Mas indicou em sua delação que suas contas foram congeladas naquele mês pelas autoridades suíças, que já investigavam o caso. A Operação Lava Jato, que investiga desvios de recursos em contratos da Petrobrás foi deflagrada justamente em março do ano passado.

A Justiça suíça confirmou a informação e indicou que o sistema criado por Barusco de abertura de diversas contas e a criação de empresas offshore refletem um esforço de "camuflar" a origem do dinheiro. Os suíços, porém, evitam dar detalhes sobre o volume de dinheiro bloqueado.

Barbosa critica advogados que recorrem a políticos

- Agência Estado

SÃO PAULO - O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa criticou há pouco, por meio de sua conta no Twitter, a relação entre advogados e políticos. "Se você é advogado num processo criminal e entende que a polícia cometeu excessos/deslizes, você recorre ao juiz. Nunca a políticos!", afirmou, por volta de 1h da madrugada desta terça-feira de carnaval.

Segundo ele, aqueles que recorrem à política para solucionar questões referentes ao mundo jurídico não têm objetivo de buscar Justiça. "Buscam corrompê-la. É tão simples assim", comentou o ex-ministro, que se aposentou antecipadamente do STF em julho de 2014.

As críticas a advogados de defesa que recorrem a políticos foram feitas três dias após Barbosa defender, também por uma rede social, a demissão do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. "Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a Presidente Dilma demita imediatamente o Ministro da Justiça," escreveu.

As declarações do jurista se dão em meio a informações de que Cardozo teria se encontrado com advogados que defendem empresários envolvidos no suposto esquema de desvio de recursos da Petrobras, investigado pela Operação Lava Jato. As reuniões não teriam sido publicadas na agenda oficial do ministro, o que levou a oposição a criticar a falta de transparência do ministro na condução dos encontros.

Ainda no fim de semana, Cardozo disse ao jornal O Estado de S. Paulo que só recebeu em audiência advogados da Odebrecht, como consta de sua agenda, e negou que tenha tratado da Lava Jato com Sérgio Renault, defensor da UTC, ou com advogados da Camargo Corrêa.

Oposição cobra investigação a ministro da Justiça

• Líderes cobram que José Eduardo Cardozo seja investigado pela Comissão de Ética da Presidência devido aos encontros com advogados de empresa investigada na Lava-Jato

Eduardo Militão – Estado de Minas

BRASÍLIA – A oposição quer que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, tenha a conduta na Operação Lava-Jato investigada pela Comissão de Ética Pública da Presidência da República. O chefe da Polícia Federal está sob pressão depois da divulgação de um encontro dele com advogados da empreiteira Odebrecht, suspeita de participação no esquema de propinas na Petrobras. No domingo, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa havia pedido a demissão do petista. Ontem, foi a vez do líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR), afirmar que uma autoridade não pode se reunir com “organizações criminosas que assaltaram a Petrobras”.

Bueno e o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), estudam pedir a convocação de Cardozo na CPI da Petrobras. O deputado cobra ainda que ele seja investigado pela Comissão de Ética da Presidência. “Queremos convocar o ministro para que ele possa prestar esclarecimentos diante das versões contraditórias apresentadas até agora”, disse o senador ao jornal O Globo. “Podemos chamar na CCJ ou na de Fiscalização”, antecipou.

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), defendeu o correligionário. “A quem interessa a demissão de um ministro da Justiça independente, chefe de uma Polícia Federal que apura o que tem que apurar, sem interferências?”, questionou o senador em uma rede social. A presidente Dilma Rousseff declarou duas vezes ser preciso “saber investigar” e que as empreiteiras da Lava-Jato são importantes para a economia nacional.

O governo federal atua para que elas não entrem em processo de falência – o que colocaria em risco obras de infraestrutura. Em nota endossada pela Odebrecht, o Ministério da Justiça diz que Cardozo fez sua obrigação ao receber advogados, pois isso é uma previsão legal. O encontro de 5 de fevereiro teve a presença do vice-presidente jurídico da empresa, Maurício Ferro. Defensores da empreiteira disseram que pediram a audiência formalmente e protocolaram, sob sigilo, uma representação e um pedido de certidão. Se não obtiver a certidão, a construtora deve ir à Justiça.

Nenhum diretor da empreiteira foi preso, mas os executivos Rogério Santos Araújo e Márcio Faria da Silva sofreram ações de busca e apreensão. De acordo com a Procuradoria da República no Paraná, a Odebrecht pagava propinas em espécie a funcionários da Petrobras. Pesam contra a maior construtora do Brasil um inquérito criminal na PF e um civil público no Ministério Público de São Paulo, para apurar a retirada de dutos da Petrobras na construção do estádio do Corinthians, que custou R$ 1 bilhão e teve financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa confessou ter recebido US$ 31,5 milhões em subornos da Odebrecht, parte deles no exterior. O doleiro Alberto Youssef disse que a construtora pagou R$ 10 milhões ao ex-deputado José Janene (PP-PR). O ex-gerente Pedro Barusco admitiu ter recebido R$ 1 milhão da empresa. Ele afirmou ainda que Rogério Araújo lhe entregou uma lista de empresas a serem “convidadas” a participar das obras na Refinaria Abreu e Lima, como parte do cartel de empreiteiras que atuava na Petrobras.

A Odebrecht negou ter feito pagamentos às empresas de Youssef usadas para lavar dinheiro do esquema. Disse que pagou Paulo Roberto apenas por sua participação na Brasken, empresa formada com capital da petroleira e da construtora. A empresa “nega veementemente” qualquer acusação de fraudes. Depois da Lava-Jato, o Ministério da Justiça deixou de publicar em seu site 80 dias da agenda do ministro, informou o jornal Folha de S.Paulo. A pasta disse que houve problema técnico que estaria sendo corrigido.

Memória

Lavanderia organizada
A Operação Lava-Jato investigou um grupo de quatro doleiros que teria movimentado ao menos R$ 10 bilhões. Os recursos tinham origens diversas: tráfico internacional de drogas, contrabando de diamantes, lavagem de dinheiro empresarial e corrupção. Ao chegar a Alberto Youssef, a Polícia Federal e o Ministério Público se depararam com o ex-deputado José Janene (PP-PR), falecido em 2010, e um esquema de desvio de dinheiro na Petrobras. 

Segundo os investigadores, o esquema consistia em um cartel de empreiteiras que combinava licitações na estatal. Um “clube” acordava o rodízio de obras. Os contratos eram superfaturados em 3%, em média. Com esse adicional, os valores chegavam a funcionários da Petrobras e partidos políticos que bancaram suas indicações: PT, PMDB e PP. 

 Um dos cálculos do MPF estima as perdas em R$ 2,1 bilhões, sendo R$ 500 milhões recuperados por acordos extrajudiciais com os delatores do esquema. Mas a própria Petrobras admitiu uma cifra de R$ 88 bilhões em perdas, que envolvem não só corrupção.

Ministérios têm atuação restrita no 2º mandato de Dilma Rousseff

• Maioria das pastas tem atuação limitada devido às indefinições no Orçamento e nas indicações para cargos do segundo escalão

Paulo de Tarso Lyra – Correio Braziliense

BRASÍLIA – Um mês e meio depois de a presidente Dilma Rousseff tomar posse para o segundo mandato, o governo ainda se arrasta do ponto de vista administrativo. Não são apenas os problemas enfrentados com os escândalos de corrupção da Petrobras ou o quadro econômico desgastado que provocou a recessão em 2014 – os dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ainda não foram anunciados, mas o Banco Central mostrou uma retração de 0,15% no ano passado – que paralisam o governo. A ausência de nomeações no segundo e terceiro escalão e a não aprovação do Orçamento de 2015 amarram os ministros empossados em primeiro de janeiro.

Dos 39 titulares da Esplanada, os que mais apareceram até o momento foram os integrantes da equipe econômica: Joaquim Levy (Fazenda); Nelson Barbosa (Planejamento) e Alexandre Tombini (Banco Central). “É natural que isso aconteça. Os números da economia não são bons e o ajuste, com a correção de rumos, precisa ser feito. Por isso, eles tornaram-se os protagonistas neste período inicial”, explicou um dos ministros mais próximos à presidente Dilma.

No Congresso, a percepção não é bem essa. “O que está faltando neste governo é política. Sem ela, nada funciona”, afirmou um senador petista. “Já vi governos péssimos do ponto de vista administrativo que se sustentaram apenas politicamente. E obtiveram êxito”, lembrou o parlamentar. “Dilma está errando tanto porque ela nunca foi congressista, nunca organizou uma campanha política, nunca precisou passar o chapéu em busca de financiamento”, resumiu. “A conversa é a essência da política”, completou.

No encontro que teve na quinta-feira com o ex-presidente Lula, Dilma ouviu a recomendação de que liberasse os ministros para conversar com os congressistas para “sentir a temperatura e os ânimos da base”. Na prática, isso seria transformar em realidade os planos feitos pela própria presidente, ao compor, em dezembro, uma equipe ministerial, em tese, com mais capacidade de diálogo com os setores que representam e mais habilidade para promover a negociação política com as legendas as quais são filiados.

Incertezas Sob esse argumento foram escolhidos Kátia Abreu para a Agricultura; Armando Monteiro para o Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC); Cid Gomes (Educação); Eliseu Padilha(Aviação) e Gilberto Kassab (Cidades). Além dos seis ministros que integram o conselho político da presidente: Aloizio Mercadante (Casa Civil); Jaques Wagner (Defesa); Miguel Rossetto (Secretaria-Geral); Pepe Vargas (Relações Institucionais); Ricardo Berzoini (Comunicações) e José Eduardo Cardozo (Justiça).

Até o momento, essa engrenagem pouco funcionou. “Tem muita gente nos ministérios reclamando, de braços cruzados. Não há certeza sobre quem ficará e quem será substituído nem, tampouco, orçamento para tocar os projetos”, lamentou um assessor que trabalha diretamente com um parlamentar da base de apoio do governo”. Para o diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) Antônio Augusto de Queiroz, muitos ministros ainda estão montando as equipes. “Isso não quer dizer que as pastas não estejam pensando em projetos a serem apresentados. Mas isso requer tempo e dinheiro”, explicou Queiroz.

Ele lembra que Kátia Abreu e Armando Monteiro, por exemplo, fazem a interlocução com os respectivos setores para implementar políticas específicas. Outro ministro palaciano reforça as declarações de Toninho. “Em breve, a Kátia terá de apresentar o plano safra de 2015, e o Armando, uma política para incrementar as exportações”, argumentou o auxiliar da presidente. Outros interlocutores palacianos lembram que a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e a própria Kátia têm atuado em busca de soluções para a crise hídrica.

Aliado avança Quem se aproveita da inércia do PT e do governo, até o momento, é o PMDB. A legenda manteve o direito de comandar as duas casas do Congresso, com a reeleição de Renan Calheiros (AL) para o Senado e a vitória de Eduardo Cunha (RJ) na Câmara, em substituição a Henrique Eduardo Alves (RN). Cunha entregou para a oposição a presidência da Comissão de Reforma Política – o responsável pelos trabalhos será o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ).

O acerto entre Cunha e Renan é que os projetos sobre o tema que estiverem em tramitação na Câmara e no Senado sejam analisados e votados de maneira concomitante, para que a reforma seja aprovada com agilidade – tirando das mãos do PT a bandeira da reforma política, desfraldada durante as manifestações de junho de 2013 e ao longo da campanha de reeleição da presidente Dilma Rousseff. “O governo está anestesiado. Com o PT fraco, fica mais fácil diminuir o protagonismo do Planalto”, afirmou um integrante da cúpula do PMDB, desconsiderando o fato de que o vice-presidente da República, Michel Temer, é filiado ao partido.

A briga do PMDB com o PT não significa que o aliado vá estimular o debate sobre o impeachment da presidente Dilma. “Eu sempre fui muito claro em relação à esse assunto e vou continuar sendo. Não vejo espaço para isto. Não concordo com esse tipo de discussão e ele não terá o meu apoiamento”, afirmou Cunha. A oposição está marcando, pelas redes sociais, uma grande manifestação para 15 de março, pedindo a saída da presidente. “Vivemos uma crise ética sem precedentes. Só no caso da Petrobras, estamos falando de R$ 88 bilhões em desvios. O impeachment é uma previsão constitucional. Falar isso não é golpe”, defendeu o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).

O que diz a lei
O Orçamento de 2015 ainda não foi aprovado pelo Congresso, apesar de fevereiro estar quase no fim. Os impasses entre o Planalto e a base aliada impediram a votação da matéria antes da virada do ano e, agora, resta ao Executivo federal contentar-se com os chamados duodécimos, liberações mensais de uma parte das verbas destinadas exclusivamente para o pagamento do custeio da máquina.

A liberação desses recursos impede que o país fique completamente paralisado. Eles são usados para pagar salários, assegurar a manutenção dos serviços públicos, o pagamento dos encargos sociais, dos precatórios, serviços da dívida, e as ações de prevenção de desastres.

De acordo com o artigo 53 do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015, que espera a sanção da presidente da República, a programação constante do projeto orçamentário poderá ser executada para o atendimento de uma extensa lista de despesas, mesmo sem o orçamento anual aprovado: alimentação escolar, procedimentos médicos em média e alta complexidade, tratamento de pessoas com HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis, benefícios do Regime Geral de Previdência Social, bolsas de estudo, Bolsa-Atleta, pagamento de estagiários e ações de prevenção a desastres a cargo da Defesa Civil, entre outros.

Concentração para o ajuste
A presidente Dilma Rousseff aproveitou a segunda-feira de carnaval com a família. Ela está na base naval de Aratu, na Bahia, desde sexta-feira, quando deixou Brasília acompanhada do ministro da Defesa, Jaques Wagner. Dilma deve retornar a Brasília amanhã e está prevista uma reunião com o grupo de coordenação política do governo, composto pelos ministros palacianos (Aloizio Mercadante, Pepe Vargas e Miguel Rossetto) acrescidos do próprio Wagner, do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo e da Comunicação, Ricardo Berzoini. Entre os temas mais urgentes a serem discutidos pelo grupo, as articulações para a aprovação das medidas provisórias que alteraram regras tributárias e trabalhistas e são as primeiras propostas que integram o ajuste fiscal elaborado pela equipe do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Papéis definidos

Confira os principais titulares da Esplanada com a missão de fazer a interlocução do governo

Joaquim Levy (Fazenda)
» O ministro com maior destaque até o momento, chegou ao governo com a chancela do Bradesco para acalmar os mercados e impor o ajuste fiscal de que o país precisa

Aloizio Mercadante (Casa Civil)
» Homem forte do governo, cuida de todas as grandes negociações do Executivo que envolvem o Congresso e as demais pastas da Esplanada

Miguel Rossetto (Secretaria-Geral da presidência)
» Escolhido para dialogar com os movimentos sociais e com a esquerda do PT, já que integra a tendência Democracia Socialista

Pepe Vargas (Relações Institucionais)
» Responsável pelas articulações diretas com os líderes aliados

Jaques Wagner (Defesa)
» Tem aumentado suas atribuições e recebido mais missões da presidente Dilma, que deseja aproveitar a experiência do baiano na articulação política

Kátia Abreu (Agricultura)
» Presidente licenciada da Confederação da Agricultura e da Pecuária do Brasil (CNA), a ministra foi escolhida para afinar o diálogo do governo com os ruralistas, que preferiam Aécio Neves (PSDB-MG) na corrida presidencial

Armando Monteiro (Desenvolvimento, Indústria e Comércio)
» A exemplo de Kátia, tornou-se depositário das esperanças da presidente em reatar as relações com os representantes do PIB brasileiro

Cid Gomes (Educação)
» Apesar de ser filiado a uma legenda pequena – o Pros – e que, ainda por cima, contesta a indicação do cearense para a pasta da Educação, Cid é considerado pela presidente um negociador hábil

Gilberto Kassab (Cidades)
» Em tese, as mesmas credenciais atribuídas a Cid Gomes. Mas passou a ser persona non grata no PMDB devido à tentativa de ressuscitar o PL

BH: Marcio Lacerda toma a rédea do processo de sucessão

• Prefeito fica no PSB e vai comandar escolha do presidente da sigla e do candidato a seu cargo

- O Tempo (MG)

Apesar dos rumores de mudança para o PPS, o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), disse na reunião do diretório municipal do seu partido que irá continuar filiado e assumirá o protagonismo na sucessão da direção da sigla e do seu cargo. Ao tomar as rédeas da legenda, Lacerda ainda sinaliza que poderá ser candidato ao Senado em 2018.

A mais de um ano da eleição municipal, o prefeito Marcio Lacerda vai concentrar as ações internas da legenda e preparar o terreno para lançar um candidato que poderá lhe suceder. Durante o encontro da direção municipal na semana passada, Lacerda usou como carro-chefe de sua oratória a “união”. Lacerda disse que irá se aproximar dos militantes e comandar a legenda para escolher um nome forte para concorrer à Prefeitura de Belo Horizonte, mesmo que não tenha citado nenhum pré-candidato.

“Os militantes ficaram muito satisfeitos com o que Marcio Lacerda disse na reunião. O recado foi para inflar o desejo de candidatura própria do partido. A construção será feita com o protagonismo de Lacerda, e ele está assumindo a responsabilidade como prefeito. Ele é o mais indicado para liderar o processo”, relatou o atual presidente do PSB de Belo Horizonte, João Marcos Lobo, que estava presente na reunião.

Lobo ainda reiterou que o prefeito fez questão de afastar os rumores de que deixará o PSB rumo ao PPS, o que tranquilizou os correligionários. “Não existe a menor possibilidade de Lacerda deixar o PSB. Ele foi taxativo ao dizer que só foi filiado a um partido e que se manterá nele”, afirmou o presidente socialista.

Embora o PSB caminhe para ter novamente candidato próprio, a sigla precisará costurar um nome com o PPS e PV, já que Luzia Ferreira (PPS), nomeada por Lacerda como secretária de governo, e o vice-prefeito Délio Malheiros (PV) são cotados para disputar o Executivo da capital no ano que vem.

A três legendas planejam, em nível nacional, a criação de uma federação partidária com a participação também do Solidariedade. A ideia da aliança é lançar nomes de consenso para disputar as prefeituras de todo o país.

O presidente estadual do PSB, o deputado federal Júlio Delgado, entende que é possível PPS, PSB, PV e SD se unirem em torno de um nome e ainda se coloca à disposição para ser o escolhido. “As legendas estão fazendo um grande esforço para ter candidatos em todas as cidades do país e em Belo Horizonte não será diferente. Não temos um nome do PSB, mas eu tenho residência em Belo Horizonte. Quem sabe? Vamos aguardar”, disse o parlamentar que é natural e tem sua base eleitoral em Juiz de Fora, na Zona da Mata.

Afinados. Criado em dezembro de 2014 na Câmara dos Deputados, o blocão envolvendo o PPS, SD, PV e PSB espera irradiar a aliança para todas as Assembleias do país. Em Minas, a proximidade das legendas pode facilitar a construção de um nome para concorrer ao Executivo de Belo Horizonte.

Bernardo Mello Franco - Bloco do eu sozinho

- Folha de S. Paulo

Em meio ao debate da reforma política, há quem sonhe em ressuscitar uma ideia enterrada pela Constituição de 1946: o lançamento de candidaturas avulsas. A proposta foi reapresentada pelo senador José Antônio Reguffe (PDT-DF). Ele quer permitir que candidatos disputem cargos públicos sem estar filiados a um partido.

O projeto pega carona na insatisfação geral com o establishment político. Segundo o Datafolha, 71% dos brasileiros não têm um partido de preferência. É o maior percentual desde o início da pesquisa, em 1989.

"Grande parcela da população brasileira hoje não acredita em partido político nenhum", discursou Reguffe na tribuna. No texto, ele escreveu que "uma reforma política séria passa pelo respeito e valorização do eleitor e das pessoas de bem desse país, e não pelo fortalecimento de máquinas partidárias".

O conceito de pessoa de bem é tão elástico quanto o sistema partidário atual. Em uma campanha, pode ser reivindicado por uma freira ou por um empreiteiro disposto a bancar a própria eleição para facilitar seus negócios com o governo.

A bandeira das candidaturas avulsas já foi defendida por Marina Silva e Joaquim Barbosa. Ambos devem parte de sua popularidade à associação do carisma pessoal a um discurso contra "tudo o que está aí".

Marina disputou duas eleições presidenciais por siglas provisórias. Deixou o PV nove meses depois da primeira e deve sair do PSB seis meses após a segunda. Na prática, foi candidata de si mesma, o que contribuiu para as derrotas ¬--especialmente a de 2014, quando lhe faltou tropa para reagir à artilharia petista.

A falta de suporte partidário também pode ser fatal para governantes, como mostram as quedas de Jânio Quadros e Fernando Collor. Os partidos formam as bases da democracia representativa. O Brasil precisa depurá-los e fortalecê-los, e não transformar a política em um grande bloco do eu sozinho.

Teorias da conspiração – Editorial / O Estado de S. Paulo

Mais do que nunca, a direção do Partido dos Trabalhadores (PT), acuada por sucessivos escândalos de corrupção, resolveu que o ataque é a melhor defesa - mesmo que isso signifique distribuir caneladas toscas. O partido decidiu atribuir suas agruras, agora oficialmente, a uma trama liderada por seus adversários da "direita". A teoria da conspiração consta da última resolução publicada pelo Diretório Nacional do PT.

Confundindo-se com o próprio Estado, o PT considera que todas as acusações contra o partido visam, na verdade, a desestabilizar o País - e os petistas então convocam a militância a "defender a democracia e as conquistas do povo". Para isso, conforme se lê na mesma frase da resolução, é preciso "denunciar as tentativas de desqualificar a atividade política e de criminalizar o PT".

Não é a primeira vez que o partido se diz vítima de uma campanha que, segundo seu discurso, tem como verdadeiro alvo a classe política em geral. Nem parece o mesmo partido cujo principal líder, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já se referiu ao Congresso, nos idos de 1993, como o abrigo de "300 picaretas". Mas aqueles eram tempos em que o PT era oposição - orgulhosamente raivosa e sem nenhuma dificuldade para boicotar as verdadeiras conquistas dos brasileiros, como o controle da inflação proporcionado pelo Plano Real.

Agora, após 12 anos na Presidência, o PT parece considerar que nenhuma forma de oposição é aceitável e que qualquer movimento que lhe soe como ameaça à sua permanência no poder só pode ser qualificado como "golpista". A resolução, não por coincidência, usa esse termo e, ato contínuo, propõe um movimento que forme "em torno da reforma política democrática uma vontade majoritária na sociedade".

Que a reforma política é necessária, não há dúvida. Quando proposta pelo PT, no entanto, a tal "reforma" deve ser entendida como uma manobra para facilitar a perpetuação do partido no poder - contra as "elites que não conseguem vencer e nem convencer pelas ideias", conforme diz a resolução.

O cardápio da reforma petista é conhecido. Em primeiro lugar, o partido quer o fim das doações de empresas para campanhas eleitorais. A proposta, em si, é correta, mas, na boca dos dirigentes petistas, ela se presta à mistificação segundo a qual foi esse tipo de financiamento que resultou nos escândalos do mensalão e do petrolão. Nessa lógica de botequim, os políticos (especialmente os do PT) seriam vítimas de um sistema que os corrompe. É uma forma de dizer que o malandro não delinquiu porque é desonesto, mas porque a isso foi levado pelas circunstâncias.

Embora desdenhe do mundo político, a resolução petista "conclama a militância" a articular "partidos, organizações e entidades" para criar "uma força política capaz de ampliar nossa governabilidade para além do Parlamento". Ou seja, como está enfrentando enormes dificuldades no Congresso, o PT quer apelar às ruas para garantir a "governabilidade" - eufemismo para o completo controle petista sobre o processo político e social.

Para conseguir esse objetivo, nada melhor do que inventar um complô da oposição contra a principal estatal e maior empresa do País. A resolução do PT denuncia "as tentativas daqueles que investem contra a Petrobrás" e diz que as seguidas acusações de corrupção envolvendo o partido são fruto da "instrumentalização" das investigações, feitas "de forma fraudulenta", com "objetivos partidários". As denúncias, afirmam os petistas, "pretendem, na verdade, revogar o regime de partilha no pré-sal, destruir a política de conteúdo nacional e, inclusive, privatizar a empresa". Botar em pratos limpos a roubalheira que dilapidou a Petrobrás equivale, portanto, a um crime de lesa-pátria.

Como se vê, é difícil de escolher, na resolução do PT, que parte simboliza melhor as imposturas do partido. Talvez a melhor passagem seja a que diz que o PT "reafirma a disposição firme e inabalável de apoiar o combate à corrupção" e que "qualquer filiado que tiver, de forma comprovada, participado de corrupção deve ser expulso". Os mensaleiros, ovacionados como "guerreiros do povo brasileiro" pela militância petista, que o digam.

Míriam Leitão - Yanis, o grego

- O Globo

Charmoso, firme, com respostas prontas para as autoridades europeias e os analistas, Yanis Varoufakis é osso duro de roer pelos alemães. Ele é o novo ministro das Finanças da Grécia e tem dito seguidos "nãos" ao ministro alemão Wolfgang Schäuble. Ontem, fracassou nova reunião de ministros europeus sobre a Grécia. O maior problema não é o país em si, mas o risco de contágio político.

O pessimismo aumentou em relação à possibilidade de encontrar uma saída para o impasse. Mas as negociações continuam. O governo de Alexis Tsipras rejeita a proposta de mais um prazo para continuar seguindo o mesmo cardápio de medidas austeras; quer um empréstimo ponte para adotar novos estímulos de crescimento, com outros termos e condições. A Alemanha não aceita ceder. Quer a extensão do mesmo programa austero e ontem os jornais gregos publicaram a frase que Schäuble vem repetindo: "A Grécia não pode viver além das suas possibilidades e fazer propostas pelas quais os outros devem pagar."

O ministro Yanis Varoufakis publicou um artigo no "New York Times" em que rebateu a crítica de analistas, de que ele estaria blefando ao endurecer na mesa de negociação. "Com certeza não estou blefando, a diferença entre nós e o governo que nos antecedeu é que estamos determinados a enfrentar poderosos interesses para dar novo impulso à Grécia e ganhar a confiança de nossos parceiros. Estamos determinados a não sermos tratados como uma colônia endividada, que merece sofrer o que tem que sofrer."

Seria mais fácil, para quem tenta isolar a Grécia ou prefira a sua saída da zona do euro, se o novo governo enviasse um ministro que vestisse o figurino radical. E ele tem seguidamente usado a filosofia e a história da Alemanha na mesa de negociação. Em vez de citar um pensador marxista, por exemplo, ele citou Kant no artigo do "NYT", para garantir que não estava usando a fórmula de estratégia e blefe "motivada por uma agenda radical de esquerda". E completou: "A maior influencia aqui é Immanuel Kant, que nos ensinou a opção livre e racional de fazer o que é certo para escapar da imposição dos expedientes."

O que a Alemanha não parece entender é que o programa deu certo. A Grécia ainda não consegue pagar a sua dívida, mas ela reduziu drasticamente o déficit público, conseguindo superávit primário, déficit nominal dentro do limite europeu e queda forte do rombo externo. A virada nos indicadores econômicos se deu após um programa que empobreceu a classe média, reduziu o número de funcionários, diminuiu os ganhos dos aposentados. A Grécia, antes, era um país com um número exorbitante de funcionários públicos e regras de aposentadoria generosas demais. Um grego se aposentava 13 anos mais jovem do que um alemão. Excessos foram cortados. Mas hoje o país está com altíssimo desemprego. Um em cada dois jovens da Grécia está desempregado.

"O princípio da maior austeridade para a economia mais deprimida é obsoleta, mas seria atraente se não causasse tanto sofrimento desnecessário", disse o ministro grego. Yanis Varoufakis é desconfortável para quem quer endurecer o jogo com a Grécia porque ele é um professor conceituado, culto, e tem argumentos racionais.

A zona do euro teme ceder à Grécia e fortalecer os movimentos que surgem, como o Podemos, na Espanha. O grupo político nasceu dos movimentos populares e tem o mesmo discurso antiausteridade. A Espanha também fez um enorme esforço, mudou seu quadro econômico completamente e está começando a crescer. Precisa incentivar esse dinamismo para criar emprego para os jovens. As eleições serão em dezembro. Por outro lado, a própria Angela Merkel tem problemas em casa. Perdeu eleições regionais neste fim de semana, vendo fortalecer a direita, que é contra a ajuda aos outros países.

A Alemanha pode estar pensando que o risco da saída da Grécia não abalou os mercados. Seria, portanto, uma opção mais barata do que o custo de concessões em série. No entanto, nunca se sabe o quanto o colapso grego pode afetar outros países através das pouco conhecidas conexões entre os mercados financeiros.

Noah Feldman - Grécia vira à esquerda, e a Europa, à direita

Na Europa, quanto pior é a situação para a economia, pior para a extrema-direita e melhor para e melhor para extrema-esquerda

- O Globo

Por que a Grécia optou por um governo de esquerda num momento em que os eleitores descontentes de outras partes da Europa viraram à direita?

No norte do continente, os partidos preferidos dos eleitores frustrados são os de direita e anti-imigrantes. Então, por que os gregos desolados foram para a esquerda, elegendo o Syriza para comandar o país? Optar pela esquerda em vez da direita é ainda mais surpreendente porque a Grécia é uma das portas de entrada para novos imigrantes na Europa.

E caso o partido Podemos na Espanha continue a crescer, o contraste entre o norte e sul da Europa será ainda mais impressionante. Uma combinação entre economia, política e história pode lançar luz sobre essas diferenças. A resposta mais simples — e mais surpreendente — pode ser a seguinte: quanto pior a economia, pior para a extrema-direita e melhor para a extrema-esquerda.

As economias do sul da Europa vivem um problema mais profundo do que seus pares no centro e no norte do continente. Isso gera dois efeitos distintos, que juntos explicam a diferença entre uma virada à esquerda ou à direita.

Primeiramente, a Grécia enfrenta exigências de aplicação de medidas de austeridade feitas pelos membros do norte da União Europeia (UE), sobretudo da Alemanha. Isso significa que os gregos percebem o “bandido” como um agente externo, e não interno. Assim, identificam o neoliberalismo de Angela Merkel como a fonte imediata de seu infortúnio.

A resistência em reduzir o funcionalismo estatal, cortar orçamento, trabalhar mais por menos dinheiro e ter férias menores se torna a resistência contra a economia de mercado propriamente dita. A esquerda radical ex-comunista se torna o canal natural para tal resistência. O programa econômico da esquerda simplesmente nega que tais medidas, no fim das contas, serão benéficas, e em vez disso sustenta a promessa de mandar às favas a Europa.

No norte da Europa, as economias podem estar em crise, mas nenhuma força política europeia externa está pressionando por reformas estruturais fundamentais. Os frustrados eleitores que veem suas conquistas trabalhistas reduzidas, mesmo que moderadamente, elegem, portanto, um alvo diferente. Aqueles que chegaram recentemente — os imigrantes — são os tradicionais objetos de sua crítica. O contrato social pode parecer estar se desestruturando como resultado do neoliberalismo, mas, como ninguém forçou tais mudanças sobre as sociedades do norte da Europa, é bem mais fácil culpar os imigrantes de serem um peso para o Estado, ao tornarem o contrato social muito caro. Não importa se é verdade: a questão é culpar qualquer um, menos a si próprio.

O segundo efeito dos problemas econômicos no sul da Europa é que os eleitores estão genuinamente procurando por uma alternativa viável de política econômica. Na Grécia do pós-Guerra, a chamada esquerda “hard” (situada, digamos, como à esquerda do socialismo democrático) tem uma história de participação política significativa no governo.

Em contraste, a extrema-direita do norte da Europa não tem um programa econômico crível e nem um histórico de participação em governos no pós-Guerra. Pode-se votar nos xenófobos do Partido dos Democratas Suecos ou do Partido do Povo Dinamarquês porque se está furioso com a forma como o país anda — mas não se pode votar neles acreditando que possuem algum programa econômico que tornará as coisas melhores. Tudo o que prometem é fechar as fronteiras a novos imigrantes. Ou seja, os partidos de extrema-direita do norte da Europa podem surgir em parte da frustração econômica, mas suas políticas estão focadas em questões sociais e culturais, e não econômicas. Votar nesses partidos é uma espécie de luxo para eleitores que percebem que suas economias estão em dificuldade, mas não em queda vertiginosa.

E há igualmente a diferença histórica entre norte e sul da Europa. Na Grécia, assim como na Espanha, a extrema-direita chegou ao poder no período pós-Guerra. Os coronéis que governaram a Grécia entre 1967 e 1974 se apoiaram numa ideologia de direita anticomunista. Na Espanha, o generalíssimo Francisco Franco foi mais ou menos o último fascista europeu vivo — e ele governou até a morte em 1975.

Essa experiência significa que gregos e espanhóis não precisam fantasiar sobre como é um governo de direita: eles sabem muito bem. Isso gera um poderoso desestímulo em votar nesses partidos de modo que possam ir além do protesto para o governo. Na Grécia e na Espanha, os eleitores sabem que a extrema-direita não tem soluções mágicas para os problemas econômicos. E sabem também que, qualquer que seja o limite, governos de centro-esquerda e centro-direita trouxeram mais prosperidade econômica do que seus rivais extremistas.

No norte da Europa, a história é mais complexa. A Alemanha, é claro, passou pela experiência do Nacional-Socialismo, mas poucas pessoas politicamente ativas hoje lembram dos anos nazistas. Em nenhum lugar no norte da Europa a extrema-direita governou de fato desde a Segunda Guerra — e isso apesar do pavor do comunismo nos anos da Guerra Fria. A falta de uma experiência real com a extrema-direita alimenta a fantasia de alguns eleitores do norte da Europa de que as coisas podem ser magicamente resolvidas se a extrema-direita pudesse ter mais influência no governo.

No centro da Europa está a França, meio norte e meio sul em termos geográficos e culturais. O programa econômico gaulês nem é liberal nem é socialista, mas algo entre os dois: dirigido pelo Estado e orientado nacionalmente. No fim, o fator mais importante é certamente a economia: enquanto a França não seguir o mesmo caminho de Grécia ou Espanha, é provável que alguns dos franceses mais frustrados economicamente votem em Marine Le Pen.
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Noah Feldman é professor de Harvard e colunista da Bloomberg News