sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Opinião do dia - Antônio Imbassahy

"Assistimos hoje a posse de uma presidente desacreditada, desorientada e sem foco. Como um náufrago, apelou a pedidos de apoio, certamente antevendo as consequências de problemas criados por ela mesma – Parece patológico ela agora falar em corrigir erros na Petrobras e reconhecer tardiamente que a empresa foi assaltada, como se não tivesse ela própria participação e responsabilidades relevantes nos últimos 12 anos da vida da estatal.

Ao dizer que alguns servidores causaram o escândalo da Petrobras, finge esquecer que participou de todas as decisões, primeiro como ministra de Minas e Energia, depois chefe da Casa Civil e presidente do Conselho de Administração da estatal e, por fim, como presidente da República. Quem nomeou os comandantes da organização criminosa que se apoderou da Petrobras foram ela mesma e Lula.

Justamente aqueles que sofreram alterações desastrosas em sua primeira canetada após a eleição. Nem ela mesma acredita naquilo que diz, como indicou a leitura sem entusiasmo de um discurso artificial e carente de conteúdo, mais uma vez elaborado por seu marqueteiro. É um discurso dissonante do Brasil real, ambíguo e com sinais de que o banqueiro-ministro terá ações limitadas. Quem ainda tinha esperança do suposto governo novo com ideias novas certamente teve a sua definitiva frustração."

Antônio Imbassahy (BA), líder do PSDB na Câmara, criticou os apelos por apoio feito pela presidente Dilma Rousseff em seu discurso de posse.

Promessas repetidas e lema reciclado

Defesa do legado com promessa de mudanças

• Em discurso no Congresso, presidente diz que protegerá Petrobras de "inimigos externos" e lança slogan "Brasil, pátria educadora, já usado em 2013; cerimônia é acompanhada por 40 mil

- O Globo

BRASÍLIA- Em uma cerimônia com público estimado em cerca de 40 mil pessoas — aquém do esperado pelo PT —, a presidente Dilma Rousseff tomou posse de seu segundo mandato na tarde de ontem, no Congresso Nacional. Diante de dezenas de parlamentares, ministros e representantes de outros países, sobretudo da América Latina, a presidente fez um discurso de cerca de 40 minutos. Nele, defendeu de forma enfática seu primeiro governo, mas admitiu que há forte desejo de mudanças na população, lembrando que essa foi o tema mais citado durante a campanha. Reiterou promessas que já havia feito e sustentou a necessidade de um ajuste fiscal para retomar o crescimento econômico.

Assim como no plenário do Congresso, em que a presença de aliados do governo foi majoritária, as ruas da Esplanada dos Ministérios, que dão acesso à Praça dos Três Poderes, foram ocupadas em boa parte por militantes partidários, muitos trazidos em caravanas de diversos estados pelo PT para festejarem a posse. Sob um sol de 31 graus, era possível ver militantes usando camisas com as cores do PT, vermelho e branco, e um reduzido público vestido "à paisana", sem representação partidária.

Promessas de campanha
O esperado anúncio de novas medidas para ajustar a política fiscal e estimular o crescimento a partir deste ano não ocorreu. Dilma apenas repetiu a necessidade do ajuste e citou iniciativas que já havia prometido na campanha: apresentação de propostas para punir corruptos e corruptores; envio para de um projeto de lei para incentivar o crescimento de micro e pequenas empresas; mudanças na legislação para o governo federal participar mais na segurança pública e novas metas para programas habitacionais, de Saúde e de Educação profissionalizante.

A presidente ressaltou que o ajuste nas contas públicas ocorreria "com o menor sacrifício possível para a população" e reafirmou o compromisso com a manutenção dos direitos trabalhistas e previdenciários. A fala de Dilma, no entanto, ocorreu ainda sob o impacto do anúncio das medidas que restringem o acesso a benefícios como abono salarial, seguro desemprego e pensão por morte, para reduzir os gastos públicos. Já no Palácio do Planalto, após a solenidade no Congresso, Dilma pronunciou uma versão reduzida do discurso que havia feito no Congresso e reforçou a promessa:

— Hoje, depois de 12 anos de governo popular e de grandes transformações, o povo tem o direito de dizer: nenhum direito a menos e nenhum passo atrás, só mais direitos e só o caminho à frente. Esse é o meu compromisso sagrado. Esse é o juramento que faço.

Ao citar o combate à corrupção em seu discurso no Congresso, Dilma mencionou as irregularidades na Petrobras, mas isentou-se de responsabilidade, atribuindo os erros a "alguns servidores" que "não souberam honrá-la". Em um tom agressivo, afirmou ter muitos motivos para defender a Petrobras de "predadores internos e de seus inimigos externos" Prometeu apurar "com rigor tudo de errado que foi feito" mas atacou de forma genérica o capital estrangeiro, afirmando que não irá permitir o que chamou de "cerco especulativo de interesses contrariados" com a adoção do regime de partilha e da política de conteúdo nacional.

Enquanto Dilma discursava no Planalto, houve o encontro de personagens de duas crises políticas dos governos petistas: a presidente da Petrobras, Graça Foster, que está sendo mantida no cargo devido à insistência de Dilma, e a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra, que deixou o cargo em 2010 sob acusação de tráfico de influência. Erenice foi secretária-executiva de Dilma na Casa Civil, no governo do ex-presidente Lula. Graça e Erenice conversaram brevemente e evitaram contato com a imprensa.

A poucos meses de deixar a Presidência do Uruguai, José Mujica roubou a cena na solenidade do Congresso e também foi aplaudido ao se encontrar com Dilma no Planalto. No plenário da Câmara, foi tietado por diversos convidados, que aproveitaram para fazer selfies com o uruguaio. Bem-humorado, Mujica posou para fotos ao lado do sucessor, Tabaré Vasquez, e da presidente chilena, Michele Bachelet.

Um dos últimos atos da cerimônia foi a posse aos ministros. Houve saia-justa. Considerado um dos nomes mais polêmicos escolhidos por Dilma, o ministro do Esporte, George Hilton (PRB), flagrado em 2005 carregando malas de dinheiro vivo no Aeroporto da Pampulha (MG), foi vaiado no Planalto. A posse de Kátia Abreu (PMDB) na pasta de Agricultura também gerou mal-estar. Enquanto a maioria dos ministros empossados foi aplaudida pelo público, a ruralista amargou um constrangido silêncio quando seu nome foi citado.

Dilma anunciou o novo lema de governo: "Brasil, pátria educadora", uma demonstração de que o tema será prioritário, apesar de ter desbancado seu partido, o PT, no comando da Educação, e colocado no lugar o ex-governador do Ceará Cid Gomes (PROS).

Encontro com Lula
Com a nova composição ministerial, atendendo a pedidos de partidos aliados, Dilma pretende conseguir apoio do Congresso para aprovar medidas de enfrentamento aos problemas na economia. Em seu discurso de posse, ela fez um chamado aos parlamentares da base, que em seu primeiro governo alternaram momentos de rebeldia e pouca cooperação, com barganhas por cargos e emendas em troca da votação de medidas de interesse do Palácio do Planalto. Dilma pediu que ajudem o governo a superar os "desafios" de melhorar a vida dos cidadãos e combater a corrupção.

Ciente de que enfrentará tempos difíceis e que irá precisar de todo o apoio político com que puder contar, a presidente também fez um gesto a seu principal cabo eleitoral, o ex-presidente Lula. Citado no discurso como o "maior líder popular da nossa História", Lula chegou no Salão Nobre do Planalto minutos antes de Dilma subir a rampa e foi a primeira pessoa com quem a presidente falou ao entrar no local. Eles se abraçaram e Lula assistiu a parte do evento, mas não ficou até o final. Quando Dilma retornou ao salão para dar posse aos ministros, o ex-presidente já havia deixado o local.

Governistas rejeitam pacote anticorrupção

• Proposta citada por Dilma Rousseff em discurso de posse deve encontrar resistência entre partidos de sustentação ao Planalto

Fábio Brandt, Isadora Peron, Daiene Cardoso, Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A aprovação do "pacote anticorrupção", citado por Dilma Rousseff em seu discurso de posse, deve encontrar resistência na própria base de sustentação ao governo. Dentro das bancadas aliadas no Congresso, há políticos que consideram a medida como ação de marketing. Outros dizem que ela deveria tornar efetivas as leis já existentes.

O pacote, que Dilma prometeu enviar ao Congresso no primeiro semestre, é composto por cinco projetos que, segundo ela, visam "garantir processos e julgamentos mais rápidos e punições mais duras".

"O que tem que ser feito é uma reforma política. É mais urgente que esse pacote", diz o líder do PP na Câmara dos Deputados, Eduardo da Fonte (PE). Outro foco de ceticismo com relação à proposta parte do PTB. Seu líder, Jovair Arantes (GO), afirma que a aprovação não é automática. "Aprovamos o que for importante. O que não for, a gente bota para trás", diz.

PP e PTB são dois partidos que ganharam ministérios no segundo governo de Dilma Rousseff numa tentativa da presidente de garantir sua governabilidade. Enquanto o PP emplacou o ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi, o PTB fez o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Armando Monteiro Neto.

Apesar da declaração de Dilma a favor das medidas, três das cinco propostas já tramitam no Congresso e não recebem apoio da presidente para serem aprovadas. Em outubro, após prometer o pacote em sua campanha eleitoral, oEstadopublicou um levantamento mostrando que aguardam aprovação do Legislativo as seguintes propostas: transformar em crime o enriquecimento não justificado de agentes públicos, transformar em crime a prática do caixa dois em campanhas eleitorais e dar mais agilidade aos processos contra pessoas com foro privilegiado. Os projetos ainda não apresentados são: permitir o confisco de bens adquiridos de forma ilícita e agilizar processos sobre desvio de recursos públicos.

Mesmo no PMDB, contemplado com seis ministérios, existe um foco de resistência. Vice-líder do partido na Câmara, Lúcio Vieira Lima diz que os projetos em tramitação não vão para frente por falta de vontade política e joga a culpa no governo. "Há mecanismos que poderiam já ser aplicados e não são". Um exemplo é a Lei Anticorrupção, em vigor desde janeiro de 2014, mas ainda sem regulamentação do Executivo.

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE) afirma que o governo não procurou sua base antes de anunciar a intenção de mandar os projetos para o Legislativo. Mesmo assim, disse acreditar não haver dificuldades para aprová-los. "Qualquer medida que venha a apertar o cerco à corrupção terá aprovação", diz.

A oposição também se pronunciou sobre o assunto. O líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes (SP), cita a mesma Lei Anticorrupção para dizer que Dilma já poderia ter colocado em prática medidas anticorrupção. "Ela poderia começar a fazer a parte dela", disse. Para o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), o anuncio do pacote é "uma tentativa de atenuar o desgaste" provocado pelo escândalo da Petrobrás. O deputado oposicionista Júlio Delgado (PSB-MG) lembrou que a aprovação do pacote também dependerá dos novos congressistas. "Se eles forem envolvidos pelo clima do Parlamento, não vai prosperar", disse.

Oposição diz que Dilma é 'escapista' ao falar de estatal

• Presidente afirma que defenderá Petrobras de 'inimigos externos' e é criticada

• Para PSDB e DEM, discurso da petista foi 'sem substância' e contou com promessas 'pouco confiáveis'

- Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - O discurso feito pela presidente reeleita Dilma Rousseff (PT) em sua cerimônia de posse no Congresso Nacional foi criticado como "pouco confiável" e "sem substância" por lideranças de oposição ao governo federal.

Segundo elas, ao dizer que defenderá a Petrobras de "predadores internos e de inimigos externos", a petista adotou um discurso "escapista", sem reconhecer que sua administração tem também responsabilidade pelo escândalo na empresa estatal.

"A frase é demagógica, da boca para fora. Não existem inimigos internos ou externos da Petrobras, mas corruptos indicados pelo PT", criticou o presidente nacional do DEM, Agripino Maia. "Dá um tom de insinceridade ao discurso dela", acrescentou.

Para o vice-presidente nacional do PSDB, Alberto Goldman, os verdadeiros inimigos da empresa estatal são a presidente e o seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

"Não há inimigo externo. Não vejo nenhuma potência externa querendo prejudicar a Petrobras. Não existem piores inimigos que Dilma, Lula e a gangue", criticou.

Na avaliação do líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Antônio Imbassahy (BA), ao culpar "predadores internos" pelo escândalo de corrupção, a presidente "finge esquecer" que participou de decisões da empresa estatal --a petista fez parte do Conselho de Administração da empresa no governo Lula.

"Parece patológico a presidente agora falar em corrigir erros na Petrobras e reconhecer tardiamente que a empresa foi assaltada, como se não tivesse ela própria participação e responsabilidades relevantes nos últimos doze anos da empresa estatal", criticou, por meio de nota.

Para o líder tucano, a sociedade assistiu à posse de uma presidente "desacreditada", "desorientada" e "sem foco". "Nem ela mesma acredita naquilo que diz, como indicou a leitura sem entusiasmo de um discurso artificial e carente de conteúdo", criticou.

Novo lema
O discurso feito pela presidente de que a área da educação será a prioridade de seu novo mandato também foi visto com ressalvas por dirigentes oposicionistas.

Na avaliação de Agripino Maia, a defesa feita pela petista é tardia e deveria ter sido encampada antes, nos últimos quatro anos.

"Por que ela não fez antes? A presidente faz uma avaliação como se tivesse assumido agora o governo federal. É um elenco de enunciados de intenção", criticou.

Para Alberto Goldman, a petista deveria ter detalhado melhor o que pretende fazer para melhorar a qualidade do ensino público no país.

"É preciso dizer como fazer e o que fazer, não basta dizer que a educação é essencial. As frases assim caem no vazio, não dão impacto, porque não têm substância. É um governo perdido", observou.

Segundo Imbassahy, o discurso de Dilma na posse é "ambíguo" e "dissonante" da realidade do país. "Quem ainda tinha esperança em um suposto governo novo certamente teve a sua definitiva frustração", afirmou.

Oposição falta à posse e critica discurso

• Líderes do DEM e do PSDB dizem que presidente não foi sincera e que falou para alegrar a base aliada

- O Globo

BRASÍLIA- A oposição reagiu ontem ao discurso da presidente Dilma Rousseff, especialmente à parte em que ela atribuiu a crise da Petrobras a ataques de "predadores internos e inimigos externos"! Segundo o líder e presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), essa "pérola" tira a credibilidade de todo o resto do discurso. O líder do PSDB na Câmara, deputado Antônio Imbassahy (BA), afirmou que Dilma pediu socorro ao Congresso para sair da crise, como se fosse um "náufrago" antevendo o desastre. Segundo o tucano, ela assume o segundo mandato desacreditada, desorientada e sem foco.

No Congresso, a parte do plenário onde ficam os parlamentares de oposição estava vazia. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), cancelou a participação. O governador de Goiás, o também tucano Marconi Perillo, só compareceu à solenidade de posse dos ministros, no Palácio do Planalto.

— A completa insinceridade da presidente Dilma, quando fala da Petrobras, tira toda a credibilidade de sua fala. Se tem predador interno na Petrobras são os corruptos nomeados pelo PT para destruir a empresa. E, se há inimigos externos, isso se dá pela fragilidade dos gestores do PT em perceber isso — disse.

Discurso para agradar à base
Agripino afirmou que a nação não leva mais a sério o que a presidente diz e que ela aproveitou a oportunidade para fazer um discurso para agradar a sua base.

— A presidente, quando foi falar que precisa da ajuda do Congresso, falou em "minha base". Essa é a democracia dela: o Congresso como instituição não interessa. Quer dizer que ela endereça as coisas para sua base aprovar? Com essa fala, Dilma revelou o motivo do loteamento do ministério — disparou Agripino.

O democrata também criticou o novo lema do governo, anunciado por Dilma: "Brasil, pátria educadora".

— Ela nunca foi presidente? Está assumindo pela primeira vez? E o (Fernando) Haddad? Não foi ministro da Educação? Ou Dilma passou uma descompostura nos ministros da Educação nesses 12 anos ou acha que está assumindo pela primeira vez.

O líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira, disse que não se interessou em ver o discurso da presidente no Congresso porque ela não cumpre o que fala. O tucano disse que prefere ver suas ações para colocar em prática as promessas de campanha repetidas no discurso.

— Eu não ouvi e não gostei. Eu tenho na memória o discurso inaugural do primeiro mandato. As propostas se revelaram falsas. O primeiro discurso de posse de Dilma, ela esqueceu. Eu, não.

O líder do PSDB afirmou ainda que, em geral, não se interessa por discursos inaugurais. Sobre a parte em que Dilma diz que vai fazer os ajustes sem tirar direitos dos trabalhadores, Nunes lembrou que ela acabara de divulgar um pacote que endurece a concessão de benefícios para trabalhadores e aposentados.

— Dilma é uma pessoa versátil. O que ela fala não pode ser levado a sério. É preciso ver suas ações.

Imbassahy, que não compareceu à posse, criticou o discurso da presidente, afirmando que Dilma mentiu na campanha e voltou a mentir na posse, ao reafirmar compromisso com a manutenção dos direitos trabalhistas e previdenciários:

— Nem ela mesma acredita naquilo que diz, como indicou a leitura sem entusiasmo de um discurso artificial e carente de conteúdo, mais uma vez elaborado por seu marqueteiro. É um discurso dissonante do Brasil real, ambíguo e com sinais de que o banqueiro-ministro terá ações limitadas. Quem ainda tinha esperança do suposto governo novo com ideias novas certamente teve sua definitiva frustração.

Discursos miram 2018

• Em São Paulo, Alckmin critica o PT e seu nome é sugerido para a próxima disputa presidencial, enquanto em Minas Gerais Aécio é alvo de petistas

- Zero Hora (RS)

Nos dois maiores colégios eleitorais do país, as posses dos governadores mostraram que a disputa pela Presidência da República em 2018, de certa forma, já começou. Em São Paulo, o reeleito Geraldo Alckmin (PSDB) fez discurso recheado de críticas indiretas ao PT e teve o nome reforçado como postulante ao Planalto.

Enquanto isso, em Minas Gerais, o petista Fernando Pimentel anunciou um "balanço geral" das contas do Executivo nos últimos 12 anos de comando tucano. Um dos alvos poderia ser o ex-governador Aécio Neves, derrotado por Dilma Rousseff (PT) em outubro e também nome natural do PSDB para 2018. Alckmin, que não participou da posse de Dilma, avaliou que o eleitor paulista vem rejeitando o "populismo fácil" e pregou o fim do intervencionismo do governo federal.

Pimentel ataca ex-governador
– São necessárias iniciativas que alavanquem o potencial do indivíduo, sem tutelá-lo – disse o tucano, que fez apenas uma breve menção à crise hídrica atravessada por São Paulo.

A posse de Alckmin não teve a presença de líderes do PSDB, como Fernando Henrique Cardoso, José Serra e Aécio, mas a disputa interna tucana foi tema nos bastidores.

– Alckmin é um candidato natural, e o próprio Aécio reconhece isso. Aécio também é um candidato natural – disse o coordenador jurídico da campanha de Aécio no ano passado, deputado federal Carlos Sampaio (PSDB-SP).

Em Belo Horizonte, Pimentel também atacou Aécio, mas sem citá-lo nominalmente:

– Minas Gerais não tem dono, não tem rei, não tem imperador – afirmou Pimentel.

De férias no interior mineiro, Aécio divulgou um vídeo nas redes sociais criticando o governo.

– Não vamos nos dispersar – disse Aécio, repetindo um lema do seu avô, Tancredo Neves.

Pezão, o pidão
Com dificuldades até para pagar a ceia de Natal de policiais militares e bombeiros, o governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), prometeu reduzir entre 20% e 25% o orçamento das secretarias com a revisão de contratos. Assegurou ainda que pretende cortar em até 35% as gratificações especiais aos servidores, mas garantiu que descarta aumentar impostos. Depois, Pezão avisou que começaria uma peregrinação por Brasília em busca de recursos federais

– Agora vocês me deem licença porque vou pegar o meu "São Pidão" e levar para a posse da presidente Dilma em Brasília – brincou o governador fluminense.

Após a meia-noite
O primeiro a tomar posse, ainda de madrugada, foi o petista Tião Viana, no Acre. A cerimônia ocorreu nos primeiros minutos de 2015.

– Comecei comendo lentilha, o que, dizem, dá prosperidade. Então espero poder conseguir ter um ano de muita sorte e êxito – disse o governador acriano.

Poema falso
O novo governador da Bahia, Rui Costa (PT), iniciou o discurso lendo um poema falsamente atribuído a Clarice Lispector na internet. Não mencionou, entretanto, a autoria do texto.

"Sonhe com aquilo que você quer ser, porque você possui apenas uma vida e nela só se tem uma chance de fazer aquilo que quer", diz um trecho lido pelo governador.

Protesto por salários
A posse do governador do Distrito Federal (DF), Rodrigo Rollemberg (PSB), teve manifestação de funcionários públicos que criticavam a gestão de Agnelo Queiroz (PT) e exibiam faixas com pedido de quitação dos salários atrasados.

O DF sofre com a interrupção de serviços públicos devido à falta de pagamento ao funcionalismo.

O Facebook e os empossados
A rede social foi usada pelo governador eleito de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), para homenagear Eduardo Campos. Em depoimento em vídeo, prometeu dar continuidade ao trabalho do ex-governador e trabalhar pela união do Estado. Campos foi vítima de um acidente aéreo em agosto de 2014, quando estava em campanha para o Planalto.

A página pessoal do governador de Alagoas, Renan Filho (PMDB), também foi utilizada para anunciar secretários na quarta-feira.

Demissões e cortes
O governador de Mato Grosso, Pedro Taques (PDT), anunciou que demitirá 2 mil funcionários que ocupam cargos comissionados. A iniciativa faz parte de um prometido choque de gestão.

Em Mato Grosso do Sul, o tucano Reinaldo Azambuja quer dar exemplo. Decidiu cortar pela metade o próprio salário. Com isso, passará a receber R$ 16,2 mil mensais.

Marina tenta emplacar terceira via, agora com próprio partido

• Para cientista político, duros embates da eleição fragilizaram imagem da ex-ministra, que precisa recuperar terreno

Isadora Peron - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, deve manter-se, nos próximos quatro anos, como nome natural da terceira via política, com discurso de alternativa a PT e PSDB. Mas a forma como ela foi derrotada na eleição presidencial do ano passado, após duros embates com a presidente Dilma Rousseff, poderá dificultar uma nova candidatura competitiva à Presidência em 2018.

“Se a gente olhar por um lado, a Marina teve mais votos agora do que em 2010, mas a maneira como ela foi derrotada desta vez compromete muito mais o futuro próximo dela”, avalia o cientista político Cláudio Couto, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

Alçada a candidata favorita após a morte do cabeça da chapa do PSB, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, em um acidente aéreo em agosto, Marina viu sua candidatura à Presidência desidratar-se após uma série de ataques do PT e de sucessivos erros cometidos durante a campanha. Ela, que havia chegado a dividir a liderança com Dilma, terminou o 1.º turno em terceiro lugar, com pouco mais de 21 milhões de votos.

Rede. Para continuar no páreo, Marina terá como primeiro desafio formalizar a criação do seu novo partido, a Rede Sustentabilidade. A militância já voltou a recolher assinaturas para criar a sigla, depois da tentativa frustrada do ano passado.

Se tudo ocorrer como planejado, a ex-ministra desembarca do PSB nos próximos meses, após a Rede conseguir o registro na Justiça Eleitoral. O grupo sofreu baixas após as eleições, mas tenta se reorganizar e não abandonou o sonho de ser o representante da “nova política”. Essa imagem, porém, foi arranhada depois de a ex-ministra decidir apoiar o tucano Aécio Neves no 2.º turno da eleição.

Partido. Diante da perda do seu grande líder e com a saída de Marina, o PSB também trabalha para não perder o protagonismo que teve no pleito passado. A ideia é transformar o partido em uma alternativa de terceira via. Apesar de a sigla também ter apoiado Aécio no 2.º turno, o PSB começou a se afastar do PSDB e promete fazer uma “oposição de esquerda” contra o governo Dilma, do qual fez parte durante quase todo o primeiro mandato.

No mês passado, o partido se juntou com o PPS, o PV e o Solidariedade para formar um bloco parlamentar que atuará na Câmara e que deverá ser a segunda maior força da Casa nesta nova legislatura. O grupo não descarta a possibilidade de uma fusão no futuro, para a criação de uma única legenda mais fortalecida.

Também faz parte da estratégia do PSB o lançamento da candidatura do deputado Júlio Delgado para a presidência da Câmara, em fevereiro, a fim de marcar a posição de independência. O líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), e o deputado Arlindo Chinaglia (PT), são os candidatos lançados até o momento.

O PSB planeja ainda transformar o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), que foi candidato a vice na chapa de Marina, em uma liderança nacional. Sem mandato, ele recusou um cargo no governo do Rio Grande do Sul para ficar em Brasília e ajudar a articular a atuação do PSB na oposição.

Anúncio realizado pós-reeleição mostra que estilo não mudou

• Apesar de ter prometido mais diálogo no segundo mandato, característica centralizadora de Dilma permanece inalterada

Rafael Moraes Moura, Tânia Monteiro - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA Depois de dizer que o primeiro compromisso do segundo mandato seria construir pontes e buscar união, a presidente Dilma Rousseff logo demonstrou que o slogan "governo novo, ideias novas" - mote do horário eleitoral produzido pelo marqueteiro João Santana - seria substituído pelo velho receituário da atual gestão, marcado por centralização na tomada de decisões, pouca disposição para o diálogo e desapreço pela pequena política. A dúvida, agora, é saber se, confrontada com um quadro econômico mais adverso e menos apoio no Congresso, a versão Dilma 2.0 se manterá à imagem e semelhança da Dilma 1.0.

Um dos casos mais emblemáticos do velho jeito Dilma de governar veio à tona na última segunda-feira, quando o Palácio do Planalto convocou a imprensa para anunciar mudanças nas regras de pagamento de cinco benefícios trabalhistas - abono salarial, seguro-desemprego, seguro defeso, pensão por morte e auxílio-doença - sem ter consultado antes a base parlamentar sobre o teor das propostas. O pacote também foi alvo de críticas de centrais sindicais, que alegaram não ter sido previamente chamadas para discutir as medidas. Parlamentares da base do governo já admitem que as novas regras, encaminhadas ao Congresso via medida provisória, deverão encontrar resistência na tramitação.

Replay. Não foi o único caso da transição. O velho estilo também se repetiu por diversas vezes após a vitória no 2.º turno. Mistérios sobre os nomes do primeiro escalão que comporiam o novo governo, falta de atendimento de reivindicações de aliados e demora em tomar decisões deram a tônica da transição. Isso fez com que, entre petistas e não petistas, as velhas queixas e cobranças pela necessidade de um estilo diferente de governar fossem mantidas na transição do primeiro para o segundo mandato.

"Você começa a conversar com ela, ela não deixa acabar o raciocínio, porque ela acha que sabe de tudo. Ela não é uma boa ouvinte", reclamou ao Estado um ministro que deixa o governo. "Ela não tem a verve da política, no sentido do debate, nessa visão de que é preciso disputar o projeto da sociedade. Ela quer realizar as coisas e ponto."

Ciente da manutenção dos ataques, a própria Dilma tratou de rebatê-los. "Esse regime é presidencialista, eu escuto todo mundo, escuto todas as opiniões, cotejo. Eu consulto todo mundo", disse Dilma no último dia 22, ao ser questionada sobre a disposição para ouvir, durante café da manhã com jornalistas no Palácio do Planalto.

"Temos de ser capazes de conviver de forma harmônica, sem haver ruptura, sem haver atritos que não sejam aqueles usuais. Agora, em lugar nenhum do mundo, você vê alguém interditando alguém para qualquer cargo." Na época, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra tentava fazer o Planalto recuar da indicação da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para o Ministério da Agricultura. Em vão

Para o professor Ricardo Caldas, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, Dilma adotou um estilo autocrático no primeiro mandato, como pôde ser verificado na condução da política econômica.

"A presidente foi alertada várias vezes sobre a necessidade de mudar a equipe e alterar o rumo, mas insistiu em manter o mesmo grupo e o resultado é isso que estamos vendo agora", comentou o especialista.

Na opinião do coordenador do setorial de Direitos Humanos do PT, Rodrigo Mondego, a presidente precisa ampliar o diálogo com os movimentos sociais, após uma relação "muito ruim" no primeiro mandato. "O Congresso está mais conservador e o conjunto da sociedade também. A Dilma está fechando as portas para as forças progressistas com as quais ela poderia abrir diálogo", disse Mondego. "Se não ouvir mais, vai apanhar das ruas e do Congresso."

Falta clareza em pacote econômico, dizem especialistas

• Medidas estão em linha com pleito do mercado financeiro, mas ainda não há detalhamento sobre como ajustar as contas

Marina Gazzoni e Ricardo Leopoldo – O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff afirmou que fará um ajuste nas contas públicas no seu segundo mandato para retomar o crescimento do País, mas ressaltou que isso será feito sem cortar direitos trabalhistas e previdenciários. O discurso de posse para o novo governo está alinhado com as propostas da nova equipe econômica anunciada no fim de 2014, mas ainda falta clareza sobre de que forma o governo pretende reequilibrar as contas públicas, afirmaram economistas consultados peloEstado.

As primeiras medidas dentro da nova linha foram anunciadas no fim do ano passado e trouxeram regras mais rígidas para o seguro-desemprego e pensão por morte. Na ocasião, foram classificadas pelo governo como "correção de distorções" e não cortes de benefícios.

"Não há dúvida que a presidente Dilma vai fazer um ajuste ortodoxo de curto prazo", afirmou o diretor de pesquisas para a América Latina da Goldman Sachs, Alberto Ramos. "O populismo em economia não funciona. Ajuste fiscal e ataque vigoroso à inflação são essenciais para a volta do crescimento."

Apesar de reconhecer os desafios da economia brasileira nos próximos anos, Dilma disse que "colheu resultados positivos na economia". Ela afirmou que em todos os anos entregou a inflação dentro da meta e que a taxa de desemprego está "nos menores patamares já vivenciados na história de nosso país". Nos quatro anos do seu governo, a inflação ficou mais próxima do teto da meta, de 6,5% ao ano, do que do centro de 4,5%. Neste ano, a expectativa do mercado, divulgada pelo Banco Central, é que a inflação oficial feche a 6,38%. No lado do emprego, o número de vagas formas criadas nos 11 meses de 2014 é o menor para o período desde 2003, segundo estatísticas do Ministério do Trabalho.

A menção da redução da dívida líquida em seu mandato no discurso de Dilma chamou a atenção do economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. "A nova equipe econômica deixou claro que sua atenção é com a dívida bruta. Ainda há uma dualidade de sinais de um lado e de outro", disse. A diferença entre os dois indicadores é que a dívida bruta do setor público, ao contrário da líquida, aumentou no primeiro mandato de Dilma. Uma das razões é que pesam sobre a dívida bruta os aportes do Tesouro Nacional nos bancos públicos e nas estatais.

Propostas. Na linha econômica, Dilma também prometeu um governo focado na redução da burocracia, aumento da competitividade e do investimento. Ela disse que enviará ao Congresso uma proposta para criar um mecanismo de transição entre o Simples e os demais regimes tributários.
A presidente também disse que vai lançar a terceira fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a segunda fase do Programa de Investimento em Logística. Outra bandeira anunciada é o estímulo ao mercado privado de crédito de longo prazo, um pleito antigo do BNDES.

Merval Pereira - Faz de conta

- O Globo

A presidente Dilma Rousseff, que tomou posse ontem para um segundo mandato, continua vivendo no mundo de "faz de conta" que o marqueteiro João Santana criou para a campanha eleitoral, e trouxe de lá mais um lema que se choca com a realidade que a presidente insiste em negar.

Quando afirma que o projeto de nação que representa prevaleceu nas urnas, ela entra em contradição com a admissão de que o país exige mudanças, que se propõe a realizar mesmo que afirme sempre que tudo vai às mil maravilhas. E deleta da memória que "fez o diabo" para se reeleger, utilizando ferramentas nada democráticas, que nada têm a ver com um projeto de nação, mas com um projeto de poder.

"Brasil, pátria educadora" seria um bom mote para um governo renovador, se não fosse apenas um achado propagandístico, e refletisse um verdadeiro objetivo prioritário, desmentido logo de cara com a escolha do ex-governador Cid Gomes para o Ministério da Educação, sem o menor contato com a área e sem projeto educacional digno de nome.

O improviso da escolha do ministro, que chegou a recusar o cargo, indicando o quanto lhe importa a "pátria educadora"" mostra bem que o projeto que a presidente Dilma anunciou ontem é oco de conteúdo, e entra na lista de mais um dos muitos passes de mágica com que a presidente se acostumou a ganhar eleições e a governar da boca para fora.

Ao tentar dar um sentido mais amplo ao dístico, afirmando que ele indica que "devemos buscar, em todas as ações do governo, um sentido formador, uma prática cidadã, um compromisso de ética e sentimento republicano" a presidente Dilma só fez ampliar mais ainda a falsidade da afirmativa, pois a escolha do ministro da área, que será "a prioridade das prioridades"; deveu-se apenas à necessidade de dar um lugar de destaque ao PROS — um partido criado de improviso para dar abrigo à dissidência dos Gomes e permitir que fizessem a campanha de Dilma contra a candidatura original de Eduardo Campos, do PSB.

Uma distorção do presidencialismo de coalizão que gerou escândalos como o mensalão e agora o petrolão, na prática do toma lá dá cá, que pode ser tudo, menos ético. E, se o compromisso é com a ética republicana, como explicar o surgimento de escândalos de tamanha magnitude na Petrobras?

Quando se referiu ao esquema de corrupção na estatal, a presidente Dilma mais uma vez fugiu da realidade que a envolve diretamente, por ter sido a controladora da área nos últimos 12 anos de governos petistas, ao dizer que a empresa foi vítima de servidores que não souberam honrá-la.

Ora, a empresa foi vítima de uma armação política engendrada pelo Palácio do Planalto para financiar partidos políticos aliados, e o que aconteceu em consequência nada teve de ocasional ou dependeu deste ou daquele funcionário da Petrobras.

A empresa foi usada pelo PT como alimentadora de um esquema político que não quer largar o poder tão cedo.

Ao longo de seu discurso no Congresso, a presidente Dilma desfilou por um mundo paralelo em que parece ainda viver, sem assumir a responsabilidade pela situação caótica em que entregou o país para si mesma, e parecendo não se sentir responsável pela correção de rumos que terá de ser feita neste segundo mandato.

O mais próximo de uma autocrítica, se quisermos ter boa vontade, foi quando reconheceu que as mudanças que precisam ser feitas dependem da credibilidade e da estabilidade da economia. Mas então se desdisse, afirmando que isso "nunca foi novidade" pois sempre orientou suas ações pela centralidade do controle da inflação e pelo imperativo da disciplina fiscal.

Se sempre foi assim, o que aconteceu para que tudo desandasse nos quatro anos anteriores, em que esteve à frente do governo, que agora precisa de ajustes tão duros e prolongados? A única explicação plausível é que, ao contrário do que todos dizem, era o ministro Guido Mantega quem comandava a economia, e a presidente Dilma não tinha nada a ver com as decisões tomadas. Como na Petrobras.

Dora Kramer - Faltou a verdade

- O Estado de S. Paulo

A desconexão entre as palavras e os fatos é uma constante nos pronunciamentos da presidente Dilma Rousseff. Raramente surpreende nesse quesito, mas, ontem, no discurso de posse no Congresso Nacional, ela superou-se em vários momentos.

Em especial quando anunciou em tom solene o lema do segundo mandato: "Brasil, pátria educadora", significando que o governo dará à educação total prioridade nos próximos quatro anos. Fosse real, essa primazia deveria necessariamente corresponder à escolha de alguém de reconhecido saber na área para comandar o ministério da Educação.

A realidade, no entanto, faz daquele emblema um mero slogan: o ministro é o ex-governador do Ceará, Cid Gomes, nomeado para contemplar o PROS (11 votos na Câmara) e recompensá-lo pela saída do PSB quando o partido deixou a base do governo.

Na fase de especulação de seu nome, Cid Gomes chegou a dizer que não queria a pasta e, depois, quando já confirmado, sua única manifestação sobre o setor foi a ideia de alterar o currículo do ensino médio. A respeito da "expertise" do novo ministro para conduzir o País à condição de "pátria educadora" nada se sabe.

Assim como não se ouviu de nenhum dos outros escolhidos para ocupar os "lotes" da Esplanada dos Ministérios uma palavra sequer sobre as políticas que pretendem executar nas respectivas áreas ou do mérito de cada um para as tarefas. O critério foi exclusivamente partidário e a distribuição feita de acordo com o número de votos de cada legenda no Parlamento.

Nesse aspecto, outro ponto do discurso da presidente em que as palavras não correspondem aos fatos: Dilma Rousseff prometeu se empenhar em prol de uma reforma política que permita a adoção de "práticas mais modernas e éticas". Isso tendo acabado de montar um Ministério com base em práticas obsoletas e antiéticas.

As promessas feitas pela presidente não correspondem à formação do Ministério. Para o bem e para o mal. Na economia, a equipe assume com a missão de cortar gastos, ajustar, equilibrar as contas e conter a inflação.

Dilma, no entanto, em seu discurso desenhou um cenário condizente com tempos de bonança total com grandes investimentos, nível de emprego crescente, salário mínimo em valorização, verbas para Estados e municípios investirem em transportes coletivos, muito dinheiro para saúde e educação, enfim, o melhor dos mundos onde não existem as dificuldades de que dão notícias as próprias medidas tomadas pelo governo.

Sobre corrupção e Petrobrás, Dilma Rousseff continuou na mesma toada da campanha eleitoral invertendo a realidade: não foi nos governos do PT que o esquema de corrupção na estatal cresceu e levou à situação que a Operação Lava Jato agora desvenda.

Na versão dela, foi graças aos governos do PT que "malfeitos de alguns funcionários" foram descobertos. A desvalorização da companhia, pela narrativa da presidente, não é resultado dos desmandos, mas produto de "um cerco especulativo".

Dificilmente Dilma poderá fazer frente aos compromissos firmados nesse discurso. Com destaque para aqueles que dependem de votação no Congresso. Como a emenda constitucional que anunciou para permitir à União atuar na segurança pública nos Estados, hoje prerrogativa dos governadores.

O loteamento de ministérios não garante votos no Parlamento - até porque o nomeado fica satisfeito, mas os não contemplados formam um grupo maior de insatisfeitos - assim como determinados discursos não têm o poder de transformar fábulas em realidade.

Com a desvantagem de afetar gravemente a credibilidade do autor. Ou autora. Nesse momento de início do 2.º mandato, era de se esperar que a presidente Dilma Rousseff se dirigisse ao País
justamente no sentido oposto: falando a verdade.

Bernardo Mello Franco - Não sei quem fui

- Folha de S. Paulo

Não se deve esperar muita autocrítica de um discurso de posse. É um momento de celebrar a própria vitória, dizer palavras bonitas e repetir promessas para o futuro. Mesmo assim, Dilma Rousseff poderia ter mantido os pés mais perto do chão em sua fala de ontem no Congresso. A presidente exagerou nos autoelogios e ficou devendo um diagnóstico realista sobre os motivos da crise que ronda seu governo.

Dilma falou do remédio, mas não explicou a doença. Admitiu que as contas públicas precisam de um "ajuste", mas omitiu que o tranco só será necessário por causa das barbeiragens em sua primeira gestão. "Sempre orientei minhas ações pela convicção sobre o valor da estabilidade econômica, da centralidade do controle da inflação e do imperativo da disciplina fiscal", disse.

É difícil acreditar nisso quando se sabe que ela era a verdadeira responsável pela política que produziu deficits sucessivos nos últimos quatro anos. A situação se deteriorou tanto que agora a presidente se viu obrigada a entregar a Fazenda a um economista identificado com a oposição.

Dilma recorreu ao malabarismo para defender o primeiro pacote de cortes, que tirará dinheiro dos trabalhadores para tapar o rombo no Tesouro. A redução de benefícios, que ela tanto criticava na campanha, virou mera "correção de distorções" e de "eventuais excessos". Se os problemas eram tão simples, seria interessante saber por que seu partido levou 12 anos para descobri-los.

Por fim, a presidente indicou que não conhece ou não quer reconhecer a extensão do esquema que pilhava os cofres da Petrobras. Tratou os desfalques milionários na estatal como obra de "alguns servidores que não souberam honrá-la", como se o escândalo não envolvesse altos dirigentes da empresa e políticos dos maiores partidos que a apoiam.

Reconhecer os erros do primeiro mandato seria uma fórmula mais indicada para quem precisa tanto de confiança ao iniciar o segundo.

João Bosco Rabello - Sem expectativas

- O Estado de S. Paulo

Ponto central das solenidades que constituem a cerimônia de posse de governos, o discurso presidencial no Congresso, pela sua feição geralmente programática, tem na expectativa que gera sua principal função.

É dele que os atores políticos e econômicos, internos e externos, e a sociedade extraem a linha de ação de um governo e avaliam a melhor forma de se conduzirem, moldando suas estratégias para uma gestão que se anuncia sob o compromisso constitucional.

A intensidade desses momentos é sempre mais reduzida em casos de reeleições, pela continuidade de um governo que já se conhece da experiência do primeiro mandato, do qual se espera correções de rumos, ampliação de realizações ou simplesmente a consolidação de ações que mereçam conclusão.

É portanto nesse pronunciamento presidencial que o governo diz o que pensa fazer, explicitando ações e conceitos que vão orientá-lo na gestão que se inicia. O discurso da presidente reeleita, Dilma Rousseff, ontem, não teve nenhum desses elementos.

A dissimulação dos problemas faz parte do jogo político quando é exercida em favor de um espaço mais generoso para as propostas que possam incutir otimismo, mas mesmo essa concessão não se aplica à fala presidencial de ontem - uma consolidação enfadonha de declarações produzidas no bimestre final do primeiro mandato.

Poderia ser dito que a presidente Dilma fez o discurso possível, mas também essa conclusão não exprime fielmente o contexto da posse no Congresso Nacional. O que mais sobressai no discurso da presidente é a dificuldade de contornar uma realidade negativa sem expor contradições.

Dilma reafirmou a opção por um ajuste amplo na economia, com disciplina fiscal, respeito à meta de inflação e outros pressupostos que alinham sua segunda gestão ao que seu partido condena como política neoliberal.

E o faz inserindo esses pressupostos entre as virtudes de seu primeiro mandato, o que remete o ouvinte à dúvida sobre até onde irá a autonomia da nova equipe econômica, autorizada a aplicar uma receita recessiva para desfazer as consequências de erros que não são admitidos por quem a convocou.

No campo político, a presidente não só dissimula as preocupações com os graves episódios de corrupção que abalarão sua base de sustentação política, como faz um contorcionismo poucas vezes visto para isolar seu governo, e o partido pelo qual se elegeu, das investigações em curso na Petrobrás.

Propõe um pacto contra a corrupção, atribuindo ao seu governo os méritos pelo resultado das ações do Ministério Público e da Polícia Federal, sugerindo que os resultados positivos dessa assepsia não ocorreriam sem o estímulo do Palácio do Planalto.

Aqui a presidente vai mais longe e ultrapassa a fronteira da dissimulação e das generalidades para reescrever a história recente, contando com uma amnésia coletiva para apagar a memória do boicote de seu governo às CPIs da Petrobrás.

A fala na posse manteve assim a característica preventiva adotada por Dilma desde o estouro do caso da Petrobrás.

O Ministério do segundo mandato, ao qual deu posse coletiva ontem, se insere nesse contexto preventivo: contempla todos os partidos de sua base, distribui estratégica e proporcionalmente o poder federal entre eles, e reúne perfis conhecidos pela capacidade combativa, do que são exemplos Eliseu Padilha, Eduardo Braga, Aldo Rebelo, Kátia Abreu, Ricardo Berzoini, entre outros chamados no ambiente político como "bons de briga".

Esses nomes não estarão a serviço apenas da luta congressual com a oposição, mas também do combate interno, cuja intensidade se pode medir na reação do PT à guinada conservadora na economia, que já atinge direitos trabalhistas e previdenciários. Tem-se, portanto, lado a lado, um roteiro recessivo na economia e um Ministério para resistir ao "fogo amigo".

Luiz Carlos Azedo - Nós, o povo…

• O recurso ao patriotismo, em situações de paz, é um velho expediente de governos enfraquecidos, que buscam mais apoio popular ao associar a oposição aos inimigos externos

- Correio Braziliense

Dos gestos da presidente Dilma Rousseff durante a posse — o que nunca foi o seu forte —, o mais significativo foi espontâneo, instintivo, do qual se arrependeu imediatamente. Ao receber os primeiros aplausos das autoridades brasileiras, dos líderes estrangeiros e dos poucos convidados com acesso ao plenário do Congresso, a petista ergueu a mão com o punho fechado, que logo abriu ao tomar consciência da inconveniência dessa atitude num ambiente tão protocolar. Mas que tinha todo o sentido, se considerarmos o apelo ao patriotismo do seu discurso de posse.

Dilma prometeu democratizar o poder, lutar pela reforma política e governar com o povo e para o povo. Propôs um pacto nacional contra a corrupção. No momento, essa é a sua maior dor de cabeça, face ao envolvimento de políticos da base do governo e do seu próprio partido com o escândalo da Petrobras e as dificuldades financeiras e operacionais que a maior estatal do país enfrenta.

Disse mais uma vez que seu governo foi o que mais apoiou o “combate aos malfeitos”, com leis mais severas e autonomia à Polícia Federal. Anunciou que enviará ao Congresso um novo pacote de medidas anticorrupção, entre elas a modificação da legislação eleitoral para tornar crime a prática de caixa dois e outra mudança em lei para agilizar o julgamento de processos envolvendo desvios de recursos públicos.

Retórica patriótica
Foi aí que ganhou força o apelo ao nacionalismo. “Temos muitos motivos para preservar e defender a Petrobras de predadores internos e de seus inimigos externos. Vamos apurar tudo de errado que foi feito e fortalecê-la cada vez mais. Devemos saber apurar sem enfraquecer a Petrobras”, afirmou. A presidente da República invocou uma “alma coletiva”, que chamou de “projeto de nação”, o qual seria detentor do mais profundo e duradouro apoio popular de nossa história democrática.

Como é de praxe no discurso petista, voltou a caracterizar a ascensão da legenda ao poder como uma espécie de refundação da República, ao qual deu ares de nova independência do Brasil, “a partir do extraordinário trabalho iniciado pelo governo do presidente Lula, continuado por nós”. Não fez nenhuma autocrítica em relação aos erros do primeiro mandato, nenhuma referência aos desacertos do governo, como se tivesse vencido as eleições de lavada, o que não foi o caso. Ignorou a existência da oposição, que não compareceu à posse, e repetiu o oba oba da campanha eleitoral:

“Temos hoje a primeira geração de brasileiros que não vivenciou a tragédia da fome. Resgatamos 36 milhões da extrema pobreza e 22 milhões apenas em meu primeiro governo. Nunca tantos brasileiros ascenderam às classes médias. Nunca tantos brasileiros conquistaram tantos empregos com carteira assinada. Nunca o salário mínimo e os demais salários se valorizaram por tanto tempo e com tanto vigor. Nunca tantos brasileiros se tornaram donos de suas próprias casas.”

Dilma tentou caracterizar como projeto de nação o que na verdade é um projeto de poder do PT, que para viabilizá-lo usou de todos os meios possíveis , os imagináveis e alguns inimagináveis. “Este projeto pertence ao povo brasileiro e, mais do que nunca, é para o povo brasileiro e com o povo brasileiro que vamos governar.”

O apelo aos excluídos — “uma população que tinha tão pouco, tornou-se pouco para uma população que conheceu, enfim, governos que respeitam e que a respeitam, e que realmente se esforçam para protegê-la” — foi associado ao discurso mudancista. “O povo brasileiro quer mudanças, quer avançar e quer mais. É isso que também eu quero. É isso que vou fazer, com destemor mas com humildade, contando com o apoio desta Casa e com a força do povo brasileiro.”

O recurso ao patriotismo, em situações de paz, é um velho expediente de governos enfraquecidos, que buscam mais apoio popular ao associar a oposição aos inimigos externos. A ditadura militar, ironicamente, é um exemplo de que isso não dá certo a longo prazo, ainda que momentaneamente tenha eficácia. Na verdade, essa é a vacina que o marqueteiro de Dilma Rousseff, João Santana, encontrou para a borrasca que se aproxima do governo.

A Operação Lava-Jato deverá ser retomada em fevereiro, com o fim do recesso do Judiciário, quando serão anunciados os nomes dos políticos e autoridades do governo envolvidos com o esquema de corrupção da Petrobras. O mais absurdo dessa estratégia é a subordinação da política de educação à doutrinação ideológica, que parece ser a prioridade do governo quando Dilma lança como lema do segundo mandato o slogan: “Brasil, pátria educadora”. Com outras palavras, foi o que os militares fizeram nos tempos da campanha do “Ame-o ou deixe-o” do governo do general Emílio Médici, o mesmo que prendeu e torturou a atual presidente da República, com a Educação Moral e Cívica.

Fernando Gabeira -The best and the brightest

- O Estado de S. Paulo

Na década de 1960, John F. Kennedy chamou os melhores e mais brilhantes acadêmicos e empresários para compor seu governo. Apesar disso, ou mesmo por causa disso, muitos erros foram cometidos, sobretudo na política externa dos EUA. No primeiro governo de Barack Obama, a escolha de um Prêmio Nobel de Física, Steven Chu, para ocupar a pasta da Energia ainda representa uma tentativa de se associar à competência e ao brilho intelectual. Mas a verdade é que a pretensão de Kennedy parece ter sido enterrada pelo curso da política e suas duras realidades.

O Ministério de Dilma Rousseff é uma espécie de fim da picada no caminho aberto por Kennedy. Ao começar, Lula chegou a ter alguns notáveis, como Márcio Thomaz Bastos, na Justiça. Desde a redemocratização, entretanto, não se escolhia um Ministério tão opaco e alheio aos temas que terá de enfrentar.

Novo governo, novas ideias. Esse era o slogan de Dilma. Foi para isso que as pessoas brigaram nas ruas e nas redes, bloqueando amigos, estigmatizando elites e malhando reacionários de todos os matizes?

No ano anterior à Olimpíada, Dilma entrega o Esporte à Igreja Universal. Já entregara a Pesca ao senador Marcelo Crivella, que, ao assumir, declarou que não sabia nem como se combinavam isca e anzol. Agora, tudo indica que o novo ministro dos Esportes é daqueles que num jogo de futebol perguntam: quem é a bola?

Na Ciência e Tecnologia, Dilma optou pelo PCdoB. Aldo Rebelo é o nome. Ele é contra inovações científicas que ameacem o emprego e chegou a apresentar um projeto proibindo-as. Emocionalmente, é uma posição compreensível. Mas equivale à dos trabalhadores que destruíam máquinas no princípio da Revolução Industrial. O movimento, no início da primeira década do século 19, chamava-se ludismo por causa do nome de um dos seus líderes, Ned Ludd.

Ter uma posição de defesa do emprego, mesmo contra o avanço da produtividade, é uma escolha de que discordo, respeitando-a. Mas nesta altura da revolução digital, nomear para Ciência, Tecnologia e Inovação um quadro que, de certa forma, se opõe a esse processo irreversível, parece-me um absurdo.

O ritmo de inovação é vertiginoso na tecnologia da comunicação. Para acompanhá-lo Dilma escolheu Berzoini, fixando-se no único aspecto que parece interessar-lhe: como dominar ou, ao menos, neutralizar as grandes empresas do ramo.

Os meninos que hoje nos acusam de reacionários talvez não conheçam bem o mundo político brasileiro. Quem é Jader Barbalho? Por que chamavam Eliseu Padilha de Eliseu Quadrilha, no Congresso?
Nada disso talvez possa interessar-lhes. O bem triunfou sobre o mal e o Brasil segue sua trajetória vitoriosa rumo ao futuro, liderado pelo coração valente de Dilma Rousseff.

Kennedy buscava seus quadros na academia e na indústria. Dilma procura-os nas brechas do Código Penal. Vai ser preso logo? Aguenta pelo menos seis meses no cargo?

Tudo bem. Vocês são o progresso e se preparam para realizar um governo novo, com novas ideias. No intervalo, jogam umas pedras na oposição, desqualificam os argumentos adversários.
Barbalhos e Padilhas, o esporte entregue a Deus e as inovações ao PCdoB, o governo e seus aliados parecem ter conseguido o impossível: uma realidade paralela, um Brasil do João Santana e desses caras que usam a imagem de Che Guevara como perfil, insultam à vontade e quando são apertados contra a parede alegam: mas o FHC também fazia.

Sem norte moral próprio, alguns usam o ex-presidente como referência. Se Fernando Henrique Cardoso insultasse velhinhos num asilo, eles também o fariam sem nenhum temor: isso pode.

Dilma conseguiu construir o pior governo possível para enfrentar a mais grave situação do País. Envolta no escândalo da Petrobrás, ela diz: alguns funcionários foram colhidos pelo combate à corrupção. Nada mais acidental do que isso. Houve um surto de gripe e alguns funcionários acabaram contraindo a doença.

A corrupção na Petrobrás era um dado sistêmico e fazem tudo para esconder o saque bilionário. Prometem um governo com novas ideias e propõem o bispo Macedo como patrono dos nossos esportes, além de uma posição quase ludista para o Ministério da Ciência. Extrapolaram. Não deixam a mínima esperança de que pelo menos tenham a intenção de fazer algo novo.

Certas experiências históricas podem acabar na cadeia. Algumas pessoas choram comovidas diante do relatório da Comissão da Verdade. Tempos terríveis, é compreensível.

No futuro, entretanto, podem lamentar, envergonhadas, quando surgir a verdade sobre seu próprio período de governo. E essa verdade vai aparecer em todo o seu esplendor. Companheiros que agitam suas bandeiras vermelhas hoje podem, numa escala menor, ficar tão constrangidos como os que, no passado, marcharam com Deus pela família e propriedade .

Muitos assistem a tudo isso com o dedo médio apontado para a tela. Um dedo duro pode ser visto de várias formas. Mas eles sabem o que estou dizendo. Que tal irem comemorar na casa do Barbalho?

Com a formação de seu novo governo Dilma está sendo cruel até com quem não votou nela. Diria: principalmente com quem não votou nela. Temiam um circo de horrores? Vejam isto, para começo de conversa.

Corre na política uma lenda de que basta ter um bom ministro da economia: o resto não conta. Ela foi adotada por Dilma. Parece um materialismo vulgar. Mas é pior do que isso. É uma perigosa fuga da realidade. Como se educação, energia, ciência, comunicações, esportes e até pesca em nada tivessem relação com a própria economia. E como se não fosse também uma realidade o sentimento de desencanto que nos comunica a única certeza da Dilma: ninguém do primeiro escalão será preso nos próximos meses.

Temos um Gabinete de ministros. Todos em liberdade.

Jornalista

José Roberto de Toledo - De milagres e ministros

- O Estado de S. Paulo

O melhor da posse de Dilma Rousseff é que quem ganhou levou. Como notou o jornalista Fernando Rodrigues, já faz um século desde a última vez que o Brasil teve sete presidentes eleitos direta e consecutivamente e que foram empossados. Como, à época, mulheres não votavam, nunca o País teve um período democrático tão longo e duradouro quanto hoje. Necessário, mas insuficiente.

O ciclo de desenvolvimento via expansão do mercado interno e inclusão social parece ter se esgotado. Mais do mesmo já não basta. Insistir nas mesmas ações esperando resultados diferentes é definição de loucura, não de coerência ideológica. A presidente rendeu-se às circunstâncias e mudou porque precisou. Cercou-se do time que imagina ser necessário para: 1) completar o mandato, 2) conseguir aprovar o arroz-com-feijão no Congresso.

O possível ela fez agora; o impossível, sabe-se lá quando. Vai depender do desempenho da nova equipe econômica e do tempo que os cortes a serem executados levarão para surtir efeito positivo - isso, pressupondo-se que o efeito será positivo. Novo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa disse esperar uma recuperação rápida após o ajuste fiscal: "A economia brasileira sempre mostrou muita capacidade de adequação às mudanças".

Vai aí uma dose de otimismo temperada por generosa pitada de desejo. Quanto mais demorar para a economia mostrar recuperação, maior será a pressão dentro do governo e do PT para a retomada do modelo antigo. Por isso, a dupla Levy-Barbosa não corre uma maratona, nem mesmo uma São Silvestre. No máximo, uns 800 metros com barreiras, muitas barreiras - e fogo-amigo. Dilma fixou o deadline no seu discurso de posse: "o impossível se faz agora".

Milagre mesmo vai ser o novo ministério escapar de noticiário que inclua as palavras investigação, denúncia e suspeição. Nada pessoal. É a ordem natural das coisas quando o cargo de ministro é mero contrapeso a apoio político-partidário. Quem é nomeado nesses termos está ali para atender aos seus correligionários - e, se der, ao público. Nessa ordem. Tem sido assim de Sarney a Dilma, passando por Collor, Itamar, FHC e Lula.

Como a única coisa que se aprende da história é que não se aprende com a história (apud Hegel), um presidente democrático após o outro tem formado ministérios que foram uma sucessão de decepções. A única vantagem da nova equipe montada por Dilma é que as expectativas (salvo as depositadas na equipe econômica) são tão baixas que qualquer coisa positiva virá a ser surpresa.

As expectativas são proporcionais ao cofre de cada pasta. A área econômica corta a maior fatia do bolo. Em 2014, foram R$ 622 bilhões em refinanciamento da dívida interna e R$ 278 bilhões em serviço dessa dívida. Esses R$ 900 bi são proporcionais à taxa de juros e à aposta do mercado sobre a capacidade do governo de pagar a dívida. A conta saiu 20% mais cara no ano passado do que em 2013, já descontada a inflação. Sucesso será diminuí-la.

A segunda maior fatia está no prato do Ministério da Previdência, a ser comandado pelo petista Carlos Gabas, um servidor de carreira da área. Foram R$ 391 bilhões em 2014, mas em dinheiro carimbado: pagamento de pensões, aposentadorias e benefícios fixados em lei. Tem pouca margem de manobra, fora uma reforma previdenciária que precisaria passar pelo Congresso.

As 3ª, 4ª e 5ª maiores fatias são quase equivalentes e estarão sob a guarda do PROS (Cid Gomes, na Educação), do PDT (Manoel Dias, no Trabalho) e do PT (Jaques Wagner, na Defesa). Juntos, gastaram cerca de R$ 200 bilhões em 2014. Na Educação, a mina de ouro foram os R$ 13,5 bi para financiar alunos em faculdades particulares - já na mira de cortes da nova equipe econômica.

Depois vêm Saúde (PT), Cidades (foi para Gilberto Kassab, do PSD) e Transportes (PR). Dos top 10, o PMDB ficou só com o 9º e o 10º: Minas e Energia e Agricultura. Isso já foi um milagre.

Vinicius Torres Freire - Dilma entre dois amores

• Na posse, presidente anuncia "ajuste" numa economia que, para ela, não estaria desajustada

- Folha de S. Paulo

Um articulista capaz poderia ter criado um modo mais convincente de a presidente explicar por que os planos anunciados de política econômica de Dilma Rousseff 2 representam o desmanche de Dilma Rousseff 1. Só que não. No seu discurso de posse, a presidente quis vestir dois santos com uma roupa só. Um deles ficou pelado. Mais que um defeito de retórica, a ambivalência ranheta talvez venha a se tornar um problema real.

Tanto bons como maus resultados na economia muita vez não dependem de vontades, erros e acertos de governos. Ainda não se descobriu como dar cabo da alternância de altas e baixas econômicas. Além do mais, ocorrem choques e outros reveses inesperados da vida, entre outras mumunhas da história.

A presidente, no entanto, optou por dizer que fará um "ajuste", palavrão "neoliberal", naquilo que não está desajustado.

"Sempre orientei minhas ações pela convicção sobre o valor da estabilidade econômica, da centralidade do controle da inflação e do imperativo da disciplina fiscal", discursou. Um cínico poderia dizer que, se o valor da estabilidade norteou as ações do governo, então houve um fracasso impremeditado, por imperícia, ingenuidade ou mero azar.

Afinal, não é possível que se considere estável uma economia em que, por exemplo, os passivos crescem sem limite (a dívida pública e o deficit externo crescem), mas a economia permanece estagnada, incapaz de produzir o suficiente a bom preço (tem inflação).

Seja como for, virá algum "ajuste". A presidente diz tal coisa como se tivesse de acabado de engolir um sapo-boi, como se tivesse se rendido a uma força de ocupação, sua nova equipe econômica, mas ainda gritando "no pasarán!".

"Assim como provamos que é possível crescer e distribuir renda, vamos provar que se pode fazer ajustes na economia sem revogar direitos conquistados ou trair compromissos sociais assumidos", discursou a presidente.

É possível. Melhor ainda, também teria sido possível fazer uma polí- tica socioeconômica progressista sem arruinar as contas públicas ou desordenar setores centrais da economia.

Mas não parece ser assim que pensa a presidente nem gente que se diz de esquerda, para quem estabilidade e o plano econômico de Dilma 2 são coisa "de direita". Sim, ser de esquerda é endividar o governo à matroca e, assim, transferir anualmente 6% do PIB em juros da dívida para os mais ricos, entre outras tolices inadvertidamente cruéis.

Isto posto, ainda resta a dúvida a respeito do grau de convicção da presidente ao aceitar o plano anunciado de "ajuste" (contenção de gastos, juros maiores, real desvalorizado). No caso da Petrobras, a presidente ainda não se rendeu à evidência de crise iminente, como parece ter sido o caso da política econômica.

Dilma Rousseff dobrou sua aposta fantasista ao atribuir a desgraça da empresa a uma conspiração e ao reafirmar algumas das políticas que contribuíram para avariar as finanças da petroleira e para criar o ambiente propício à corrupção (reservas de mercado, exigência excessiva de conteúdo nacional, obrigações excessivas criadas pelo modelo de partilha).

A presidente vai chegar ao limite do risco de ruína antes de ceder?

Míriam Leitão - País cenográfico

- O Globo

A presidente Dilma continua no país cenográfico da campanha. A corrupção vem dos outros: "dos predadores da Petrobras e inimigos externos"; seu governo já tinha feito um "vigoroso processo de aprimoramento de gestão" na empresa. Ela sempre deu prioridade ao combate à inflação, ao ajuste fiscal, produziu um "salto de qualidade na logística" e respeitou o sustentabilidade.

Dilma disse que seu governo foi o que mais combateu a corrupção. O combate à corrupção tem sido feito por órgãos de Estado, como a Polícia Federal. Ou então por instituições com independência constitucional, como o Ministério Público e a Justiça. No que dependeu da sua base no Congresso, foi feita uma vergonhosa CPI da Petrobras na qual se serviu uma pizza.

Ninguém imaginava que ela fosse admitir o quanto o aparelhamento político-partidário da Petrobras e a desorganização administrativa na empresa estão por trás do pior momento da vida da estatal. Mas ela tentou pôr a realidade pelo avesso e se apresentou como a líder do combate à corrupção na empresa e no país.

Num dos piores momentos do discurso, ela tentou jogar sobre os críticos das opções técnicas feitas pelo governo a culpa pela crise da Petrobras. "Não podemos permitir que a Petrobras seja alvo de um cerco especulativo de interesses contrariados com a adoção do regime de partilha e da política de conteúdo nacional". Esse não é o problema. O que enfraqueceu a empresa, e disso todos sabem, foi o saque aos seus cofres com a corrupção contaminando inúmeras atividades da Petrobras numa operação cujos contornos ainda não estão inteiramente conhecidos. Mas nada têm a ver com o debate técnico sobre qual é o melhor regime de explorar o petróleo. A empresa não consegue sequer ter um balanço auditado. Aqui o contorcionismo ultrapassou os limites. O país precisa de um combate sistemático à corrupção, mas isso não se faz tergiversando sobre o que realmente está acontecendo na nossa maior e mais importante empresa.

Houve momentos em que dava a impressão de que ela pisaria no planeta Terra. "As mudanças que o país espera para os próximos quatro anos dependem muito da estabilidade e da credibilidade da economia". Sim, dependem. E por isso ela trocou de orientação econômica. Mas não foi isso que ela disse para completar a frase. Segundo Dilma, no seu governo sempre houve a "centralidade do controle da inflação, e o imperativo da disciplina fiscal". A verdade é que no primeiro mandato a inflação nunca esteve na meta de 4,5% e chega-se ao fim dos quatro anos com os piores resultados fiscais em quase duas décadas.

Ela disse que a dívida líquida caiu. Na verdade, o importante é a dívida bruta, e esse indicador aumentou nove pontos percentuais do PIB durante seu primeiro mandato. A farra das transferências para o BNDES ajudaram a mascarar esse aumento quando o dado que se olha é a dívida líquida.

Dilma entrou em contradição quando disse que o mais importante é retomar o crescimento e "o primeiro passo para isso passa por um ajuste nas contas públicas". Estranho. Ou bem o ajuste é necessário, ou bem ela sempre respeitou o "imperativo da disciplina fiscal".

A presidente disse que dará prioridade ao desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação. Seu ministro dessa área será Aldo Rebelo, que tem certa incompatibilidade com o tema. Dilma lançou o lema do segundo mandato que seria "simples, direto e mobilizador". O lema é: "Brasil, pátria educadora". Segundo ela, a educação será a "prioridade das prioridades". Ela executará isso através do ministro Cid Gomes.

Definiu o Brasil como "o país líder, no mundo, em políticas sociais transformadoras" e atribuiu apenas aos governos do PT todos os avanços de inclusão que aconteceram no país, recriando a ideia do "nunca antes".

Segundo Dilma, seu governo "investiu muito e em todo o país sem abdicar do compromisso de sustentabilidade ambiental". A taxa de investimento caiu no ano passado 7% e houve retrocessos na política ambiental. E esse foi o discurso feito no Congresso e não dedicado à militância.

Celso Ming - Começa o ajuste

- O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma explicou ontem, no seu discurso de posse, por que 2015 será de ajuste na economia.

Se passou a ser necessário o ajuste é porque a economia está desajustada. Se a presidente teve de dar explicações e justificativas é porque o anúncio do ajuste vinha sendo mal recebido, especialmente por quem só quer os benefícios e não pagar os preços.

O ajuste a gente já sabe, em princípio, o que terá de ser, embora faltem os pormenores do plano de execução. Trata-se de reequilibrar as contas públicas, de reconduzir a inflação à meta, de derrubar o déficit nas contas externas, de recuperar o investimento e a confiança, para garantir o crescimento do PIB e do emprego.

O ambiente é adverso para uma operação de saneamento econômico. O momento é de aprofundamento da temporada de queda dos preços das commodities, mercadorias que compõem mais de 50% das exportações. O Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) começará a reverter sua política monetária altamente expansionista e isso significa que a grande abundância de dólares nos mercados também começará a ser reduzida. O Brasil terá de pagar mais pelos financiamentos em moeda estrangeira.

Nem da Europa nem do Japão se espera recuperação significativa da atividade econômica e a China entrou em franca desaceleração. É um quadro de estreitamento dos mercados internacionais que pode ser atenuado se a economia dos Estados Unidos se recuperar, como se espera.

No âmbito interno, não dá para contar com a retomada vigorosa do crescimento econômico porque a temporada exige sacrifícios e ajuste de contas. A média das projeções do mercado (Pesquisa Focus) prevê um avanço do PIB não superior a 0,6%. Mais um ano de crescimento econômico medíocre implica continuidade da baixa capacidade de arrecadação do setor público.

O fim do represamento dos preços administrados, especialmente da energia elétrica e das tarifas dos transportes urbanos, implica inflação alta e, portanto, juros também em elevação. Não dá para deixar de levar em conta que a corrupção, os escândalos e a deterioração do patrimônio da Petrobrás aumentarão as dificuldades.

A nova equipe econômica conta com apoio dos mercados e dos empresários, mas enfrentará forte resistência política, a começar de segmentos importantes do PT. Se o ajuste terá sucesso ou não é o que ainda vamos ver. Convém pensar que terá, porque se não tiver, será preciso recomeçar.

O que tem de ser perguntado é se além da implantação do ajuste mudará também o modelo de política econômica. A questão é relevante porque alguns analistas entendem que a presidente Dilma não mudou seu jeito de ser. Nesse entendimento, bastará que os indicadores apontem certa recuperação para que ela se sinta tentada a abandonar o caminho do fortalecimento dos fundamentos da economia e volte a seus experimentos que produziram os estragos já conhecidos.

Outra aposta é a de que o sucesso do ajuste será suficientemente forte para que a política econômica então vencedora, a mesma do primeiro período Lula, continue em vigor. É esperar alguns meses mais para ter uma ideia melhor de como as coisas se desdobrarão.