domingo, 13 de abril de 2014

Opinião do dia: Aloysio Nunes

A CPI é para investigar o loteamento político da Petrobras. Esse episódio só reforça essa necessidade. A Transpetro, por exemplo, é um feudo do PMDB há 11 anos. As indicações políticas existem para facilitar o acesso a doadores de campanha. Tem muita gente com medo da CPI, existe um temor generalizado de políticos e grandes empresas. O mensalão é brinquedo de criança perto disso.

Aloysio Nunes, senador (SP), “Para oposição revelações reforçam CPI exclusiva”. O Globo13 de abril de 2014

Doleiro amigo de André Vargas tem ligação com a Delta

Empresa de Alberto Youssef, preso na Operação Lava-Jato, fez negócios com a empreiteira

Chico de Gois - O Globo

BRASÍLIA — Uma empresa do esquema de lavagem de dinheiro montado pelo doleiro Alberto Youssef, preso pela Polícia Federal durante a Operação Lavo-Jato, no mês passado, manteve negócios com a Delta Construções, de Fernando Cavendish. Esta empresa planejava fazer prospecção de petróleo na Bacia de Santos por meio de uma offshore, também pertencente a Youssef, sediada em Hong Kong.

A Malga Engenharia foi constituída em 26 de dezembro de 2012, primeiramente em Arujá, na Região Metropolitana de São Paulo, e, depois, transferida para a periferia da capital paulista. O capital inicial da empresa era de R$ 900 mil e tinha como sócios Adriano Roberto e Carla Zorron Lopes, com divisão de cotas iguais. O objetivo da companhia, de acordo com a Junta Comercial de São Paulo, era a prestação de “serviços de engenharia, obras de terraplenagem, locação de automóveis sem condutor e aluguel de máquinas e equipamentos agrícolas sem operador”.

Em 25 de setembro do ano passado, a Malga fez uma alteração contratual. Saiu Carla Zarron e entrou a GFD Investimentos Ltda, cujo endereço é o mesmo de Alberto Youssef. A GFD passou a figurar na sociedade com participação de R$ 891 mil, enquanto Adriano Roberto ficou com apenas R$ 9 mil. O representante da GFD é Carlos Alberto Pereira da Costa, tido pela Polícia Federal como empregado de Youssef.

Contratos de R$ 115 milhões no Dnit
A Malga Engenharia foi subcontratada pela Delta para obras de recuperação da BR-163. A construtora de Cavendish obteve um contrato do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes Terrestres (Dnit) para obras no trecho de 63 quilômetros entre os municípios de Marechal Cândido Rondon e Guaíra, no Paraná. O valor dos serviços foi de R$ 114,6 milhões, que contemplavam a recuperação da pista, de 44,95 quilômetros de acostamento, e 12,6 quilômetros de terceira faixa.

A ligação entre a Malga e a Delta foi possível graças a ações trabalhistas impetradas pelo advogado Euro Trento em defesa de alguns funcionários que eram contratados pela primeira. Profissional no Paraná, Trento foi localizado pelo GLOBO no Piauí, para onde se mudou recentemente. Ele disse que entrou com os processos contra a Malga, tendo a Delta como subsidiária, uma vez que era a empreiteira de Cavendish a detentora do contrato original com o Dnit. Ele afirmou que a Malga fazia um trabalho de acabamento na rodovia.

— Tivemos ganho de causa no ano passado. A empresa está pagando parceladamente. Alegaram que passam por dificuldades financeiras — disse.

Durante a CPI do Cachoeira, descobriu-se que a Delta Construções servia como escoadouro de milhões de reais que, segundo as investigações, eram utilizados para pagamentos de propinas e desvios de dinheiro público. A partir da Delta, a PF encontrou um laranjal de empresas fantasmas, que tinham como única função receber e repassar recursos para agentes públicos. A Delta acabou considerada inidônea pela Controladoria Geral da União e impedida de firmar contratos com o governo federal.

Uma destas companhias fantasmas, como informou a revista “Época” há dez dias, era a RCI Software, que surgiu agora também, no cruzamento de dados feito pela PF na Operação Lava-Jato. Duas outras empresas (JSM Engenharia e Terraplenagem e Rock Star Marketing), que receberam R$ 49,1 milhões do esquema de Cavendish, teriam sido destinatárias de R$ 1,5 milhão da MO Consultoria Comercial e Laudos Estatísticos, ligada a Youssef.

A PF descobriu que a MO Consultoria tinha como sócio formal o mesmo proprietário da RCI Software. Pela conta da MO, conforme a PF, passaram R$ 90 milhões, de 2009 a 2013. O “Correio Braziliense” informou sexta-feira que que a Rock Star repassou, em junho e julho de 2010, ano eleitoral, R$ 1,2 milhão para a MO Consultoria. Em 2007, a empresa recebeu R$ 2,3 milhões da Delta. Em 2008, foram R$ 7 milhões.

Apesar de, oficialmente, ter como objeto social a prestação de serviços de engenharia e locação de veículos e máquinas agrícolas, a Malga Engenharia firmou um contrato, em julho de 2013, com a Legend Win Enterprises, com sede em Hong Kong, para estudos de prospecção de petróleo na Bacia de Santos. O valor do contrato, segundo cópia obtida pela PF à qual O GLOBO teve acesso, é de US$ 11 milhões, e a duração da sociedade iria até julho de 2016. O representante da Legend Win é Leonardo Meirelles, sócio da Labogen, um laboratório que estava fazendo negócios com o Ministério da Saúde, num contrato de R$ 150 milhões — mas que, segundo o ministério, não foi adiante. O deputado licenciado André Vargas (PT-PR) é suspeito de ter ajudado justamente a Labogen, de Youssef, a obter contratos com o Ministério da Saúde.

A PF não tem dúvidas de que a Malga pertence ao esquema de Alberto Youssef. “A empresa Malga Engenharia é igualmente controlada por Leonardo Meirelles e Alberto Youssef, conforme abaixo será exposto. Destaque-se que trata-se (sic) de empresa de fachada, cuja imagem do endereço da mesma encontra-se abaixo e que não parece, prima facie, sediar uma empresa com capacidade para atuar em prospecção de petróleo, podendo indicar que o contrato tenha sido utilizado para justificar o ingresso de recursos estrangeiros no Brasil para a Malga Engenharia”, descreve o relatório da Polícia Federal.

O GLOBO entrou em contato com a Delta na sexta-feira. Foi orientado a enviar um e-mail com as dúvidas, mas as perguntas não foram respondidas.

Procuradoria do TCU pede que Dilma e conselheiros respondam por Pasadena

Relatório aponta indícios de ‘gestão temerária’ e falhas ‘acima do razoável’ na compra de refinaria

Andreza Matais e Murilo Rodrigues Alves – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Relatório do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) recomenda que os responsáveis pela negociação de compra da refinaria de Pasadena sejam responsabilizados por eventuais perdas da estatal. O negócio, que contou com o aval da hoje presidente da República, Dilma Rousseff, foi iniciado em 2006 e concluído em 2012, após um longo litígio e gasto superior a US$ 1 bilhão. O documento da procuradoria de contas, ao qual o Estado teve acesso, e que subsidiará a decisão dos ministros do tribunal, afirma que a alta cúpula da Petrobrás, "incluindo os membros do

Conselho de Administração", respondam "por dano aos cofres públicos, por ato antieconômico e por gestão temerária", caso sejam comprovadas irregularidades. Para o MP, as falhas dos gestores da Petrobrás na condução do negócio foram "acima do razoável". Em 2006, Dilma, que era chefe da Casa Civil do governo Luiz Inácio Lula da Silva, presidia o Conselho de Administração da Petrobrás. No mês passado, ao saber que o Estado publicaria uma reportagem que revelaria seu voto favorável à compra de 50% da refinaria naquele ano, a presidente divulgou nota na qual afirmou só ter apoiado o negócio porque foi mal informada sobre as cláusulas do contrato.

Em 2008, ainda como presidente do Conselho de Administração, Dilma passou a ser contra o negócio e atuou para tentar barrar a compra de 100% da refinaria, algo que, em razão de custos judiciais, encareceu ainda mais a transação, que precisou ser concretizada.

Palavra final. O relatório final do TCU, que usará o trabalho da procuradoria de contas como base, deve sair em julho, mês em que a campanha eleitoral será iniciada. Em entrevista no mês passado, o relator da caso de Pasadena no tribunal, ministro José Jorge, afirmou: "Como a compra passou pelo Conselho Administração e pela Diretoria, como regra geral do TCU, eles podem ser chamados a se explicar".

A procuradoria afirma que a Petrobrás foi "vítima" da "inabilidade de seus gestores em firmar acordos contratuais". Para o MP junto ao tribunal, da forma como o negócio foi fechado, o grupo belga Astra Oil adquiriu o direito "líquido e certo" de vender sua participação à Petrobrás, recebendo o valor fixado nos contratos. "Para ela (Astra Oil), tudo era possível, e, para a Petrobrás, ao que parece, restava acatar a decisão da sócia", afirma o relatório do Ministério Público de Contas.

Os auditores designados pelo ministro relator trabalham, ainda, com outra linha de responsabilização. A intenção dos técnicos é se basear no artigo 158 da Lei das S.A., que prevê punição aos gestores quando houver violação "ao dever de cuidado e diligência" ou "imprudência, negligência e imperícia".

A legislação impõe que "o administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios".

Belgas. A Astra impôs várias condições à estatal para firmar a parceria, exatamente o contrário do que deveria ter ocorrido, afirmam os procuradores. "Ela estava fora do negócio e tinha o direito, se não a obrigação, de exigir garantias mínimas da futura sócia, sobretudo ante o preço que se dispôs a pagar", diz o documento. "O poder de decisão não minimizou os riscos do negócio para a estatal brasileira. Ao contrário, só os aumentou", completa o relatório.

Um dos pontos criticados no texto é o fato de a Petrobrás pagar duas vezes pelo combustível estocado na refinaria, já que arcou pela unidade com estoques inclusos e, posteriormente, pagou mais uma vez pelos estoques. Há "evidências consistentes", diz o texto, de que o valor dos produtos estocados não estava incluso nos US$ 360 milhões pela aquisição porque a Petrobrás nem sequer tinha conhecimento do volume e do valor dos estoques.

A análise da operação ainda critica a oposição da estatal de levar adiante uma batalha judicial para não cumprir as cláusulas contidas no contrato de compra da refinaria. Laudo da Justiça dos EUA confirmou o valor de US$ 466 milhões pelo restante da unidades e ainda obrigou a Petrobrás a desembolsar US$ 173 milhões por garantia bancária dos sócios, juros, honorários e despesas processuais, o que fez com que a conta aumentasse para US$ 639 milhões.

O documento afirma que há de se apurar por que a Petrobrás não cumpriu a decisão proferida em abril de 2009. "Ao que parece, essa postura levou a empresa a arcar com milhares de dólares referentes a juros e correção monetária. E mais uma vez pede a responsabilização do Conselho de Administração caso se constate que não havia razões suficientes para o descumprimento da decisão arbitral, deve-se apurar a responsabilidade dos gestores e membros do Conselho de Administração."

Crise. A manifestação da presidente ao questionamento do Estado causou uma crise política, que acarretou na aprovação de uma CPI para investigar a estatal. Em meio ao caso de Pasadena, outras suspeitas recaíram sobre a Petrobrás. A principal delas envolve o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, alvo da Polícia Federal por suas ligações com o doleiro Alberto Youssef.

Processo corre em sigilo, diz Presidência da República

Governo diz desconhecer relatórios do tribunal de contas e estranha que seu conteúdo tenha sido repassado à imprensa

 - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA- A Presidência da República informou que desconhece o relatório dos procuradores de contas. “O processo no TCU segue sob sigilo e, portanto, estranhamos que tal informação tenha sido passada antes à imprensa do que aos interessados”, declarou Thomas Traumann, porta voz da Presidência.

Em nota ao Estado, em março, a presidente Dilma Rousseff, que comandava o Conselho de Administração da Petrobrás, responsabilizou a diretoria internacional por omitir informações sobre cláusulas do contrato. Dilma destacou que se tivesse conhecimento dessas cláusulas, apontadas no relatório do TCU como danosas à estatal, “seguramente não seriam aprovadas pelo conselho.”

Integrantes do Conselho que aprovaram a compra da refinaria Pasadena, em 2006, afirmam que o negócio foi autorizado porque baseado em um resumo, julgado, posteriormente, “falho” e que na ocasião se adequava ao planejamento estratégico da estatal.

O empresário Jorge Gerdau Johannpeter, que ocupou cadeira no Conselho até o início de abril, afirmou, no mês passado, em nota, que “ao aprovar em 2006 a operação de compra e 50% de participação na refinaria Pasadena não tinha conhecimento, como os demais conselheiros, das cláusulas Put Option e Marlim do contrato”. A primeira delas obrigou a Petrobrás a comprar 100% da refinaria, o que gerou prejuízos para a estatal. Disse que a decisão teve base em “avaliações técnicas de consultorias com reconhecida experiência internacional”.

O presidente da Editora Abril, Fabio Barbosa, que integrava o conselho, em manifestação pela Revista Veja, disse que a proposta “estava inteiramente alinhada com o plano estratégico vigente para a empresa, e o valor da operação estava dentro dos parâmetros do mercado, conforme atestou então um grande banco americano, contratado para esse fim”.

O ex-conselheiro Claudio Luiz Haddad afirmou que o colegiado dispunha de informações “fundamentadas” para a aprovação da compra. Segundo ele, o ex-diretor da área internacional, Nestor Cerveró, fez uma apresentação “consistente” do negócio e recomendou sua aprovação. O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), responsabilizou a diretoria internacional da Petrobrás. Ele disse que os conselheiros confiaram nos responsáveis pelo contrato de compra. O então presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, tem defendido a compra com o argumento de que era um bom negócio para a estatal. O ex-ministro Antonio Palocci não se manifestou.

Anotações de ex-diretor indicam repasses políticos

Paulo Roberto Costa tinha costume de fazer anotações de próprio punho sobre suas transações

- O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Considerado o “homem bomba” por suas conexões com o mundo político e a Petrobrás, o ex-diretor de abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa tinha por hábito anotar de próprio punho todas as informações acerca de seus negócios. A Polícia Federal encontrou na casa dele 36 pendrives, além de agendas e cadernos que revelam negócios suspeitos investigados na Operação Lava Jato.

Um desses documentos, revelado pelo Bom Dia Brasil da TV Globo, na última sexta-feira, registra repasses milionários de um suposto esquema que abastecia candidatos e financiava campanhas políticas.

Entre os papéis, a PF encontrou, conforme reproduzido pela reportagem, uma tabela dividida em três colunas. A primeira com nome de grandes empresas, a segunda com os executivos responsáveis pelas empresas e a terceira, intitulada “Solução”, subdividida em frases como: “Está disposto a colaborar”, “Já está colaborando, mas vai intensificar para campanha a pedido de PR” e “Já teve conversa com candidato e vai colaborar a pedido do PR”. A sigla seria uma referência a Paulo Roberto, na interpretação dos investigadores.

A revista Veja desta semana mostra outro documento apreendido na casa e no escritório de Paulo Roberto, sem identificação da fonte dos recursos, em que ele descreve supostos pagamentos ao Partido Progressista (PP) no valor de R$ 28,5 milhões; sendo que R$ 7,5 milhões seriam para o diretório nacional do partido, conforme entendimento da Polícia Federal.

Siglas também indicam, para os investigadores, que recursos foram repassados aos deputados Nelson Meurer (PP-PR) e João Pizzolati (PP-SC). Os recursos viriam de empresas fornecedoras da Petrobrás onde Paulo Roberto atuou de 2003 a 2012 por indicação inicialmente do PP e, mais tarde, do PMDB e PT. A revista menciona, ainda, os ex-deputados Pedro Henry (PP-MT) e Pedro Corrêa (PP-PE), ambos condenados no esquema do mensalão.

A arrecadação dos recursos, conforme os documentos obtidos pela revista, passava pela “contratação” da consultoria de Paulo Roberto por fornecedores da Petrobrás e, num segundo passo, na lavagem do dinheiro pelo doleiro Alberto Youssef. Ambos estão presos desde o mês passado na superintendência da PF em Curitiba.

Documento sugere que ex-diretor da Petrobras intermediava repasses a políticos

Paulo Roberto Costa teria ajudado no contato com empreiteiras

O Globo

BRASÍLIA - Uma tabela apreendida pela Polícia Federal na casa do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa revela que ele teria intermediado o contato de grandes empreiteiras e uma empresa de serviços com políticos. O documento foi revelado na noite desta sexta-feira pelo “Jornal das Dez”, da GloboNews. A tabela é dividida em três colunas, onde constam as empresas, executivos dessas companhias e a "solução" - que segundo a PF indicariam possíveis pagamentos a candidatos e financiamento de campanhas.

As empreiteiras citadas no documento são Mendes Júnior, UTC, Constran, Engevix, Iesa, Toyo Setal e Andrade Gutierrez. A lista de "soluções" apresentadas na tabela de Paulo Roberto está sempre relacionada a campanhas. Ao lado da empresa Mendes Júnior, consta como solução: "Está disposto a colaborar. Iria falar com executivos para saber se já ajudaram em algo". Na linha da "UTC/Costran", a anotação é: "Já está colaborando, mas vai intensificar mais para campanha a pedido de PR".

Segundo a Polícia Federal, “PR” seria uma referência ao próprio Paulo Roberto Costa.

A anotação sobre a Engevix diz que a empresa teria inclusive tido contato com o político: "Já teve conversa com candidato. Vai colaborar a pedido PR". No caso da Iesa, a anotação afirma que a empresa ainda não estaria colaborando por estar em processo de venda, mas viria a ajudar o esquema: "empresa passando por processo de venda, mas vai colaborar a partir de julho".

Única empresa sem ligação com a área de engenharia, a Hope RH é citada como se viesse colaborando, mas seus executivos teriam pedido para saber se o candidato tinha conhecimento: "Já vem ajudando. Pediu para certificar se candidato está ciente. Vai ajudar mais a pedido de PR", diz a anotação.

A Toyo Setal, por sua vez, também não teria iniciado sua colaboração com o grupo. De acordo com a anotação, empresa "Começa a ajudar a partir de março". A Andrade Gutierrez é a única empresa em que o campo de "solução" ficou em branco. Todas as empresas negaram à GloboNews qualquer irregularidade.

Para oposição, revelações sobre repasse a políticos reforçam CPI exclusiva

Humberto Costa, do PT, diz que é preciso saber se recurso é de origem ilícita

Vinicius Sassine – O Globo

BRASÍLIA — Para o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP), a revelação sobre a intermediação de Paulo Roberto Costa com a finalidade de repassar dinheiro a políticos reforça a necessidade de funcionamento da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras. O governo vem atuando para evitar a investigação e, se não for possível, para ampliar o foco da apuração, estendendo a CPI para assuntos relacionados ao cartel do Metrô de São Paulo e ao Porto de Suape (PE), uma forma de colocar na linha de tiro os pré-candidatos à Presidência Aécio Neves (PSDB-MG) e Eduardo Campos (PSB-PE).

– A CPI é para investigar o loteamento político da Petrobras. Esse episódio só reforça essa necessidade – afirmou o senador.

Segundo o tucano, a estatal "foi toda entregue a políticos" nas gestões de Lula e de Dilma Rousseff, até a chegada de Graça Foster à presidência da empresa, no começo de 2012.

– A Transpetro, por exemplo, é um feudo do PMDB há 11 anos. As indicações políticas existem para facilitar o acesso a doadores de campanha. Tem muita gente com medo da CPI, existe um temor generalizado de políticos e grandes empresas. O mensalão é brinquedo de criança perto disso – citou.

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), afirmou que não mudou a posição em relação à CPI, apesar da existência de novos documentos que apontam para o repasse de dinheiro de empreiteiras a políticos e partidos.

– É preciso ver se é recurso com origem ilícita, se tem a ver com algum contrato. Pode ser só uso de influência para conseguir recurso de campanha. Isso só mostra que os sistemas de financiamento de campanha no Brasil estão equivocados – observou o petista.

Para Costa, a CPI serviria apenas como um "palco de disputa política":

– As pessoas vão ficar caladas, não vão depor. Essa questão tende a se partidarizar, a se politizar.

Quem estiver com o nome lá (em listas de recebedores de dinheiro), não vai querer investigação. Os órgãos de fiscalização já estão atuando.

João Bosco Rabello: O sujeito (nem tão) oculto

- O Estado de S. Paulo

O simbolismo da operação de busca e apreensão na Petrobrás pela Polícia Federal é computado nos meios políticos como dano eleitoral que abala ainda mais o poder competitivo da presidente Dilma Rousseff , em busca da reeleição.

Porém, mais afasta do que aproxima o ex-presidente Lula de uma candidatura em 2014. Segundo o raciocínio, o ex-presidente é o sujeito (nem tão) oculto do enredo que, nas aparências, abala apenas a presidente e reforça o pretexto para a troca de candidatos.

As operações da Petrobrás investigadas pela Polícia Federal ocorreram no seu governo e, em que pese dele ter feito parte também a presidente, na condição de ministra das Minas e Energia e, depois, da Casa Civil, a fonte de poder era Lula.

É um contexto em que o pau que bate em Chico bate em Francisco. Se candidato, como deseja uma parcela do PT, Lula terá de enfrentar o mesmo calvário de denúncias que desabam sobre a sucessora, com a agravante de ter sido o chefe do governo à época dos acontecimentos.

Os malfeitos na Petrobrás ocorreram não só sob as vistas de ambos, mas com uma divergência, agora revelada pela presidente, quanto ao pivô das investigações, o ex-diretor Paulo Roberto Costa, preso sob acusação de conduzir uma operação de lavagem de dinheiro a partir de contratos intermediados junto à empresa.

Na versão da presidente, Costa sustentou-se como diretor à sua revelia e contra sua vontade. Outro preso, o doleiro Alberto Youssef, tem notórias ligações com parlamentares (ele soma 47 em suas contas), o mais vistoso, o ex-vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), cujo mandato pôs a serviço de um projeto de desvio de recursos públicos concebido por ambos.

Não por acaso, sumido do noticiário, Lula voltou à cena ao mesmo tempo em que a CPI da Petrobrás deu às denúncias alguma expectativa de investigação, fora do controle do governo.

O ex-presidente se insere no enredo como advogado da afilhada política, mas o faz em causa própria.

Não se sabe integralmente o teor da recente conversa de três horas entre Dilma e Lula, mas é certo que a versão da presidente para a aprovação da compra da refinaria de Pasadena, considerada pelo PT um tiro no pé, acendeu a luz amarela na relação entre criador e criatura.

Vai ganhando sentido agora a iniciativa de Dilma de situar-se como vítima de omissão da Petrobrás para fazer aprovar uma operação que, conhecidos seus termos , dela não receberia chancela.

Com a sua manifestação, Dilma vincula seu antecessor às fontes dos problemas do PT diante do que se afigura um escândalo maior ou da mesma proporção do mensalão.

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Suely Caldas: A Petrobrás capturada

- O Estado de S. Paulo

"Poucos ministérios têm o poder que tem a Petrobrás", dizia Carlos Sant'Anna, um funcionário de carreira que conhecia muito bem as entranhas da estatal e que a presidiu no último ano de ditadura militar. Manipular negócios de investimentos que movimentarão US$ 220,6 bilhões (R$ 507 milhões) até 2018 é poder de causar inveja e cobiça à classe política, governadores, deputados, senadores e seus partidos, ávidos por capturar dinheiro grande para financiar campanhas eleitorais. E muitos dos negócios fechados escapam da fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União porque envolvem conhecimentos técnicos muito específicos.

Exemplo: é mais fácil detectar superfaturamento na compra de uma refinaria no exterior, como Pasadena, do que identificar subfaturamento na exportação de gasolina, em que centavos de dólar subfaturados por barril vendido viram milhões multiplicados pelo volume final em centenas de operações efetuadas. E não só na exportação, muitas outras operações (compra de plataformas, por exemplo) são encomendas com especificações tão detalhadas que dificultam comparar valor no mercado. Só mesmo os próprios funcionários - que acompanham o cotidiano do mercado e os negócios da estatal - são capazes de identificar certas fraudes escondidas por trás do conhecimento técnico. Esse é o poder mencionado por Sant'Anna - e o alvo da cobiça dos partidos políticos, loucos por ganhar uma fatia de poder na Petrobrás.

Por isso, políticos com poder na Petrobrás partiram para aliciar funcionários. Um deles, Paulo Roberto Costa, empregado de carreira - feito diretor de Abastecimento por José Janene (PP), abençoado por Lula e José Dirceu e operador do PMDB -, foi preso há dias acusado de lavagem de dinheiro na Operação Lava Jato, da Polícia Federal (PF). O aliciado tem por meta arrecadar quantia predeterminada para os partidos que o puseram no cargo.

No governo Collor, o secretário de Assuntos Estratégicos Pedro Paulo Leoni Ramos designou o advogado João Muniz de Oliveira Alves para cooptar funcionários para o esquema que montou na Petrobrás. Na conversa, o advogado levantava suspeita contra o funcionário, sugerindo que seria demitido do cargo caso não cooperasse com o esquema. Fez isso com mais de uma dezena de executivos graduados, conseguiu a adesão de alguns, mas outros negaram e denunciaram o esquema à imprensa. Operado por três empresas que pertenciam a Sérgio Rocha, amigo e afilhado de casamento de Leoni Ramos, o esquema PP funcionou na Petrobrás até a demissão de seu mentor, em 30 de março de 1992. Foi a ponta do fio da meada que levou à queda de Collor nove meses depois.

Pedro Paulo Leoni Ramos volta à cena agora, no governo Dilma Rousseff, liderando o obscuro consórcio Constantinopla, que, associado a Furnas, arrematou a concessão da Hidrelétrica de Três Irmãos. A PF investiga ligações de suas empresas - GPI e Investminas - com o doleiro Alberto Youssef, preso e acusado de lavagem de dinheiro e distribuição de propina a partidos políticos. O TCU suspendeu a assinatura do contrato da usina por outro motivo, mas é provável que as empresas de Leoni Ramos saiam do consórcio. Já seu padrinho de casamento, o senador Fernando Collor, tem dois assentos garantidos na diretoria da BR Distribuidora.

Com Lula na Presidência, o método de cooptação do funcionário mudou. Loteados todos os cargos de direção entre partidos aliados, o funcionário passou a ser aliciado diretamente pelo partido. Acima de servir à Petrobrás, sua missão é arrecadar dinheiro grande para o partido. Esse novo modelo foi tão vulgarizado que o ex-presidente da Câmara dos Deputados Severino Cavalcanti bradou irritado o que PMDB, PT, PTB e PP fazem às escondidas em Brasília: "Quero é aquela diretoria que fura poço e acha petróleo!".

Dilma Rousseff afastou boa parte de diretores partidários, mas deixou remanescentes. E sobrou para Graça Foster administrar os estragos das fraudes herdadas da gestão anterior e explicar o inexplicável para evitar a criação da CPI no Congresso.

Suely Caldas é jornalista e professora da PUC-Rio.

São Paulo será peça-chave na campanha à Presidência

Campos e Aécio montam comitês no estado onde Dilma precisará de votos para neutralizar PE e MG

Mariana Timóteo – O Globo

SÃO PAULO — Os quase 32 milhões de eleitores, num estado que concentra 32,5% do PIB , já seriam suficientes para que qualquer candidato a presidente cobiçasse São Paulo. Mas, nesta eleição

— a primeira desde a redemocratização a não incluir na disputa um candidato que tenha São Paulo como base política —, o cenário está mais complexo, obrigando Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) a voltarem suas atenções como nunca para o estado.

Desde 2002, na primeira eleição de Lula, o PT não ganha em São Paulo no primeiro turno. Tentará fazê-lo agora. Aécio Neves também aposta suas fichas no estado. Nesta semana, sua campanha escolheu a capital paulista como palco de seu comitê central, frisando que Aécio passará a metade de seu tempo no estado. Eduardo Campos também terá seu QG nacional em São Paulo, abrindo mão de Brasília. Ele já alugou um apartamento no bairro de Moema (Zona Sul) e deve trazer a família. Campos vai morar na cidade a partir de terça-feira e despachar, a partir de quarta, em uma sala na sede do PSB na capital.

Os dois opositores lutam para serem mais conhecidos entre os paulistas e apostam num desgaste da imagem de Dilma para irem ao segundo turno. A presidente, segundo analistas, enfrenta outras adversidades: Aécio deve ganhar em Minas Gerais, o segundo maior colégio eleitoral, onde Dilma ganhou em 2010. E Campos, que deixou o governo de Pernambuco com aprovação de 58%, tem boas chances de ganhar no estado de mais de 6 milhões de eleitores, onde Dilma também venceu em 2010.

— São Paulo nunca foi tão importante numa eleição. Calculamos a chance de ir para o segundo turno de quem ganhar em São Paulo é de 100%, e a partir daí disputaremos a eleição real — disse o deputado federal Duarte Nogueira, presidente do PSDB-SP e principal articulador da campanha de Aécio no estado.

Além de haver uma grande chance de o vice do PSDB ser paulista, o partido aposta na aproximação entre seu candidato e nomes de peso no estado, como Geraldo Alckmin e Fernando Henrique Cardoso. A meta de Aécio, dizem seus articuladores, é obter pelo menos 30% dos votos do estado.

Desde setembro, ele fez 16 visitas públicas a São Paulo. Foi inclusive ao ABC paulista, reduto petista, ou “na toca do leão”, como definiu o deputado federal Marcus Pestana, presidente do PSDB mineiro, amigo e um dos principais articuladores da campanha tucana.

— O Nordeste está engarrafado, com Lula fazendo campanha para Dilma e com a popularidade do Campos. Mas, em São Paulo, o jogo está muito aberto. São Paulo é um local onde a sociedade civil é maior do que o Estado, onde se vota com maior autonomia — diz Pestana.

Já o PSB aposta tanto neste voto pragmático do paulista, “menos romântico que o voto carioca e menos ideológico que o voto nordestino”, disse o deputado federal Márcio França, presidente do PSB-SP, quanto numa rejeição histórica — “desde os tempos de Juscelino Kubitchek” — que o paulista teria em relação aos mineiros. Segundo a avaliação da campanha do PSB, Campos e Aécio devem chegar praticamente empatados a São Paulo, e é o estado que poderá decidir a ida de um ou de outro para o segundo turno.

— Parte do eleitorado paulista, que costuma ter um sentimento forte anti-PT, pode pensar assim: quem pode ganhar de Dilma num segundo turno? Aí vota no Campos, porque o Aécio no Nordeste não tem a menor chance — avalia um aliado, que prevê uma intensificação de Campos na disputa pelo voto do interior, enquanto Marina Silva, a vice, intensificaria a campanha nas grandes cidades, “já que ela é uma figura muito urbana”.

O PT ainda não anunciou uma estratégia específica de Dilma para São Paulo. Limitou-se a dizer que ela estará presente nos palanques do candidato a governador, Alexandre Padilha, nome escolhido por Lula para tentar explorar um desgaste com 20 anos de governo tucano no estado.

— E há, claro, o fator Lula, que sempre garante ao PT uns 30% de votos. Dilma deve focar em manter seu eleitorado tradicional: falar do Mais Médicos, do Minha Casa Minha Vida. Ela pode não chegar em primeiro lugar em São Paulo, mas, impulsionada por Lula, sempre terá uma votação expressiva por aqui — avalia o cientista político Carlos Mello, do Insper.
Segundo ele, o voto urbano em São Paulo, “que reage melhor às melhorias sociais do PT”, é bem diferente do voto do interior e, por isso, às vezes o jogo político fica embolado e imprevisível. Dos 32 milhões de eleitores, 17 milhões estão no interior, “o que garantiu nos últimos anos a vitória tucana”.

— É com este eleitor que será interessante observar a estratégia da campanha da oposição.
Segundo cálculos de um marqueteiro político haverá, em 2014, 45% de eleitores “prontos para serem convencidos”. Cerca de 30% optarão por Dilma, e 25% são “100% anti-PT".

— Até agora, só vejo Aécio e Campos disputando estes 25%, com um discurso voltado para a elite, o que, a meu ver, é uma estratégia errada. Eles têm que correr atrás dos 45%, criar um movimento de mudança como fez Barack Obama nos EUA, em 2008, e Tony Blair no Reino Unido, em 1997. Além de Lula em 2002, que só ganhou a eleição quando falou com um eleitor que não era o dele.

São Paulo, capital oficial da oposição

Aécio Neves e Eduardo Campos instalam comitês centrais de campanha na capital

Pedro Venceslau e Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

Enquanto a presidente Dilma Rousseff começa a estruturar em Brasília o quartel-general de sua campanha à reeleição, seus dois principais adversários, o senador mineiro Aécio Neves (PSDB) e o ex-governador pernambucano Eduardo Campos (PSB), decidiram transformar a cidade de São Paulo na capital brasileira da oposição.

Para se aproximar do principal colégio eleitoral do País, o pré-candidato do PSB se mudará para a capital paulista na quarta-feira, quando passará a morar em um flat de três quartos localizado em Moema, bairro nobre da zona sul da cidade. A escolha, porém, se deu por motivos estratégicos: o local fica próximo do Aeroporto de Congonhas. Já a família do ex-governador deve permanecer no Recife.

A região também servirá de exílio temporário para todos os integrantes do "Estado Maior" da campanha. Assessores, marqueteiros, aliados e operadores políticos se espalharão por hotéis e flats de Moema até outubro. A produtora que cuidará dos vídeos para a propaganda eleitoral de Campos também vai se instalar pelas redondezas para facilitar a vida do candidato. O local que abrigará o comitê central da campanha ainda não foi definido, mas o ex-governador já conta com um gabinete de trabalho esperando por ele na sede estadual do PSB.

Localizado em um amplo casarão de dois andares na Avenida Indianópolis, no Planalto Paulista, o espaço pode ser considerado modesto para quem até recentemente despachava no Palácio Campo das Princesas. Com cerca de 15 metros quadrados, a sala conta com um banheiro privativo, uma mesa de trabalho, um computador e uma pequena TV de plasma pendurada na parede.

Os únicos elementos da decoração são uma grande mapa de São Paulo e uma pequena bandeira vermelha e amarela do PSB. "O diretório passou por uma readequação para receber o Campos. Todo o segundo andar foi liberado para receber a equipe dele", conta Márcio França, presidente estadual da sigla. O deputado teve de se mudar para o térreo e ficará "acampado" por lá pelo menos até julho, quando a campanha começará oficialmente. "Virei um sem-teto", brinca o dirigente.

Quando o novo comitê estiver pronto, o lugar abrigará também a estrutura da campanha ao governo estadual do PSB. O próprio França é um dos nomes colocados para a disputa.

Jardins. Na primeira eleição presidencial desde a fundação do PSDB que não conta com um candidato nascido ou radicado em São Paulo, o mineiro Aécio Neves optou por instalar na capital paulista o coração de sua campanha ao Planalto.
Mas, ao contrário de Campos, ele optou por continuar morando no Rio de Janeiro para acompanhar, na medida do possível, a gravidez de sua mulher, que está esperando gêmeos com nascimento previsto para agosto. A casa provisória do senador em São Paulo será um hotel de luxo na Alameda Santos.

Dois graduados tucanos paulistas foram encarregados de escolher o local que abrigará a sede da campanha presidencial: o deputado Duarte Nogueira, presidente do PSDB paulista, e o senador Aloysio Nunes Ferreira, o mais cotado para assumir a coordenação-geral do processo. Depois de visitarem vários imóveis, eles enfim encontraram o lugar ideal. Os contratos ainda não foram assinados, mas a ideia é locar dois espaços contíguos: um casarão onde antes funcionava uma agência e um imóvel localizado no terreno ao lado, pertencente a um empresário amigo do vereador paulistano Andrea Matarazzo.

Irrecusável. Segundo Nogueira, a oferta foi irrecusável. "Ele se propôs a ceder o espaço em troca de pagarmos o IPTU, que está muito caro", diz. Os dois imóveis estão localizados entre as Ruas Guatemala e Bolívia, a poucos metros da bela Igreja Nossa Senhora do Brasil, na região dos Jardins. Uma das casas, a maior, deve funcionar como um núcleo operacional e de atividades políticas. "A ideia é criar um ponto de encontro e de mobilização", explica o presidente do PSDB paulista.

A sede da estrutura de internet da campanha de Aécio, que já é coordenada pelo ex-ministro Xico Graziano, está instalada perto dali, em um prédio em Pinheiros, na zona oeste. Já a produtora de vídeo, um dos locais mais frequentados pelos candidatos nas campanhas, ficará no Rio de Janeiro.

Lula cá. Enquanto Dilma segue em Brasília - a petista não se desligou do cargo para disputar a reeleição - seu principal cabo eleitoral, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ficará sediado em São Paulo na campanha.

Para evitar perda de tempo no trânsito e permitir que Lula grave participações para o País inteiro, o PT decidiu instalar um estúdio na edícula próxima à piscina de uma das casas onde funciona o Instituto Lula, no Ipiranga. Equipamentos de última geração para edição, gravação, iluminação e distribuição pela internet foram comprados e já estão instalados. A ideia do PT é montar em São Paulo um pequeno escritório para abrigar o tesoureiro da campanha, Edinho Silva.

Encontros privados em SP: o ‘petit comité’ de Aécio

Pré-candidato do PSDB mantém agenda de jantares e reuniões para ouvir demandas e apresentar pontos de sua plataforma de governo. Às vezes, sofre constrangimentos

Silvia Amorim – O Globo

SÃO PAULO — Além de uma ofensiva de compromissos públicos, São Paulo tornou-se, para a campanha do pré-candidato à Presidência da República Aécio Neves (PSDB), o centro de encontros privados do tucano com um seleto eleitorado. São jantares e almoços reservados — encontros que passaram a ficar mais frequentes no último mês. Nos últimos tempos, Aécio tem ido quase semanalmente à capital paulista para participar destas reuniões.

Os convidados vão da elite do empresariado brasileiro a lideranças religiosas. Em meados de março, por exemplo, o presidenciável foi recebido por representantes da comunidade judaica em jantar organizado pelo presidente do Hospital Albert Einstein e ex-secretário municipal da Saúde da gestão José Serra, Claudio Lottenberg. Uma semana antes, ele esteve no apartamento de um dos bisnetos de José Ermírio de Moraes para conversar com jovens empresários. Há cerca de dez dias, Aécio encontrou expoentes do PIB brasileiro num jantar oferecido na casa do empresário João Dória Jr.

Para um público reduzido, pouco mais de 50 pessoas, o “petit comité”, dizem os anfitriões, é uma iniciativa deles e não da equipe do senador.

— O objetivo não é apoiar ninguém. É levar aos candidatos nosso pleitos. Vamos fazer com o Eduardo Campos e tentar com a presidente Dilma — disse Lottenberg.

A dinâmica tem sido a mesma. Acompanhado de figuras de peso, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ou ex-ministros, Aécio ouve uma lista extensa de demandas e faz um resumo de suas propostas, direcionando o discurso de acordo com a plateia. Não há pedido explícito de voto, mas um convite a apoiá-lo é sempre deixado no ar.

— É importante que o candidato tenha essa pluralidade de diálogo. É algo extremamente normal neste momento que antecede o início oficial da campanha — disse o presidente do PSDB em São Paulo, deputado Duarte Nogueira, que integra a comitiva do mineiro.

Para garantir a privacidade, os encontros não entram na agenda pública do senador.

— Preferimos que não haja imprensa porque queremos que as pessoas tenham liberdade para falar sem constrangimentos. É um momento para diálogo e não debate — disse o ex-deputado Fábio Feldman, que organizou um dos primeiros encontros privados de que Aécio participou, com um grupo de ambientalistas, no fim do ano passado.

O clima nestes jantares costuma ser amistoso, e o público, simpatizante de Aécio. Mas isso não impede constrangimentos. Com os ambientalistas, o senador ouviu críticas pela postura do PSDB na aprovação do Código Florestal. A agenda de jantares deve continuar até junho.

Posição sobre Lula vai marcar diferença de Campos e Aécio

Sérgio Roxo – O Globo

Próximos nas propostas para recuperar a economia, os dois principais candidatos oposicionistas da eleição presidencial devem deixar claras suas diferenças ao abordarem os oito anos de Lula. Neste período de pré-campanha, enquanto Eduardo Campos (PSB) adotou o discurso de que os problemas começaram com Dilma Rousseff, o tucano Aécio Neves tem atacado, sem pudores, a gestão de Lula.

Por trás da estratégia adotada, está o passado. Enquanto o tucano sempre foi adversário nos 12 anos do PT no poder, Campos ocupou o Ministério da Ciência e Tecnologia no primeiro mandato de Lula e depois se beneficiou do dinheiro federal em seu estado.

No PSB, é dado como certo que não haverá críticas a Lula. Campos diz reservadamente que o vê como um pai na política. Em discursos e no programa eleitoral na TV este mês, a estratégia de poupar Lula é nítida.

— Nossa questão não é poupar ninguém. Mas há uma grande diferença entre o governo do Lula e da Dilma. O país parou de melhorar, a inflação voltou — afirma Beto Albuquerque (PSB-RS), líder do partido na Câmara.

O principal objetivo será convencer o eleitor de que Campos pode retomar os números do governo do ex-presidente, com aceleração do crescimento.

— Se o Eduardo for eleito, o Lula sabe que as conquistas e o legado dele estarão preservados — diz o presidente do diretório paulista do PSB, deputado federal Márcio França.

Para Albuquerque, as diferenças entre os dois governos podem ser provadas: em 2010, as pesquisas mostravam que a maioria da população não queria mudança, e hoje 70% querem.

Aécio já declarou que não se importa de enfrentar Lula ou Dilma na disputa de outubro.

— Para nós, o modelo Lula e Dilma é o mesmo. E é isso que queremos mostrar. É o aparelhamento, o abuso ético — diz o presidente do diretório do PSDB de SP, deputado Duarte Nogueira.

Os tucanos acreditam que a grande diferença em relação a Dilma é que Lula foi beneficiado por um cenário econômico externo mais favorável.

— O Lula é cozinheiro de despensa cheia — afirma Nogueira.

Mas Aécio deve centrar o foco no programa de TV no governo Dilma, porque reconhece que a gestão do ex-presidente é bem aceita pela população.

Analistas creem que o sucesso dos discursos sobre o governo Lula dependerão muito da estratégia de comunicação a ser adotada por Aécio e Campos. Neste quesito, o pré-candidato do PSB tem missão mais espinhosa.

— Campos disputa com Aécio o voto de quem é anti-PT e ao mesmo tempo tenta conquistar quem votou no PT no passado, mas não é petista de carteirinha — diz Fernando Antonio Azevedo, professor da pós-graduação em Ciência Política da UFSCar.

José Álvaro Moisés, professor de Ciência Política da USP, avalia que Campos conseguirá explicar seu distanciamento:

— Ele foi progressivamente se afastando do governo. Não está cuspindo no prato em que comeu.

Dora Kramer: PT dita o ritmo

- O Estado de S. Paulo

O prazo formal é de 90 dias úteis. Descontado o recesso de julho, o Conselho de Ética deveria examinar o caso do deputado licenciado André Vargas (PT) em meados de agosto, mas o relator Julio Delgado (PSB) diz que terá seu parecer pronto em junho, antes da Copa do Mundo.

Se até lá o petista não renunciar ao mandato o partido estará diante do seguinte dilema: ou segue o rito sumário do relator e dá por encerrado um episódio cujo desfecho já se sabe de antemão que dificilmente deixará de ser a cassação ou tenta procrastinar o processo mediante o uso de manobras regimentais.

Nesta hipótese, a proximidade das eleições pode prejudicar ou beneficiar André Vargas. Prejudica se o julgamento em plenário já na regra do voto aberto acontecer em pleno período quente das campanhas, fim de agosto, início de setembro, por exemplo. Beneficia de algum modo se à protelação se aliar a habitual ausência de quorum no período eleitoral, de modo a que o plenário só examine o assunto em outubro. Nessa altura Vargas teria apenas mais dois meses de mandato.

O processo de José Dirceu, também relatado pelo deputado Júlio Delgado, em 2005, começou em junho daquele ano e só chegou cinco meses depois ao plenário. Na ocasião, Dirceu usou de todos os estratagemas para protelar o processo. Dificultou a coleta de provas, contestou depoimento de testemunhas, orientou os aliados a interromperem a leitura do relatório, manobrou nos bastidores ainda na posse da influência como chefe da Casa Civil que acabara de deixar para assumir o mandato de deputado.

"Agora é diferente", diz o relator, que não precisa produzir novas provas, pois, segundo ele, "o material contra ele é notório". A começar pelo fato de ter mentido na tribuna da Câmara sobre suas relações com o doleiro Alberto Youssef, ato arrolado como quebra de decoro.

Mal menor. Semana passada o governo havia decidido que era melhor a presidente da Petrobrás, Graça Foster, não atender ao convite para falar no Senado para evitar contradição com a já famosa nota em que a presidente Dilma Rousseff disse que não teria aprovado a compra da refinaria de Pasadena se tivesse conhecimento de todas as cláusulas do contrato.

Como depois disso a situação se deteriorou e o ex-presidente Lula alertou internamente que a coisa poderia ainda piorar, o Planalto avaliou que a incongruência nessa altura é o de menos. Daí a mudança de posição. Graça Foster falará na terça-feira dando explicações técnicas sobre a transação, tentando não desmentir a presidente e ao mesmo tempo baixar a temperatura no Congresso.

Mas, em suma, dirá o que sempre disse: que para as circunstâncias da época, a compra da refinaria no Texas foi um bom negócio.

Dona da festa. Amanhã Marina Silva anuncia que os institutos de pesquisa devem excluir o nome dela da lista dos candidatos a presidente porque concorrerá como vice de Eduardo Campos.

O lançamento da chapa inicialmente seria feito no Rio, mas o PSB mudou para Brasília a pedido da ex-senadora, que acha importante o simbolismo da capital do País. Ademais, Marina ficou em primeiro lugar no Distrito Federal na eleição presidencial de 2010.

Toque de caixa. A urgência do governo para que o Senado aprove o projeto do Marco Civil da Internet na semana que vem - antes da conferência internacional sobre governança na internet, nos dias 23 e 24 de abril - reproduz situação em que os senadores são obrigados a votar medidas provisórias às vésperas do prazo de vencimento, devido à demora na tramitação na Câmara.
Suas excelências consideram essa pressão um desaforo.

Férias. Parada técnica de 20 dias antes da jornada eleitoral.

Merval Pereira: A seleção dos melhores

- O Globo

Até que ponto a escolha dos melhores de uma sociedade pode ser feita sem que se utilize o voto popular direto?

O Congresso de um país representa a média de seus cidadãos ou a escolha é afetada pelo dinheiro das campanhas políticas, cada vez mais caras, e pela influência de grupos de pressão, que podem representar corporações e até mesmo interesses ilegais organizados?

Qual é a melhor maneira de fazer com que a meritocracia prevaleça na escolha dos representantes do povo?

O cientista político Eric X. Li fez uma apresentação no ano passado no TED que se tornou viral. TED é uma fundação privada sem fins lucrativos dos Estados Unidos conhecida por conferências para a disseminação de ideias pela internet.

Segundo Eric Li, a seleção dos dirigentes na China, embora feita por um partido único, o Partido Comunista, é marcada por um sistema que leva dirigentes de pequenos municípios a galgarem degraus na hierarquia única e exclusivamente pela eficiência de suas ações. Diz ele que o período de 20 a 30 anos é consumido para que a seleção afunile até a chegada dos líderes no Comitê Central, formado na sua maioria por elementos vindos das camadas inferiores da sociedade.

Ele compara este tempo de seleção, em cada etapa do processo, com um MBA das melhores universidades americanas, e diz que o voto popular não faz falta na meritocracia que a China está organizando.

A isenção política das escolhas é, no entanto, improvável para os críticos do sistema, que veem o aparelhamento do Estado pelo Partido Comunista como o real objetivo da seleção.

Já Jorge Maranhão, o publicitário que dirige “A Voz do Cidadão” em busca do que chama de “cidadania de terceiro nível”, está reunindo líderes da sociedade para que se comprometam com valores que possam fazer a sociedade progredir.

São 20 temas, que representam os 20 componentes do que deveria ser o Ministério ideal, correspondente à formação histórica dos ministérios brasileiros. “Quando chegar a 500, terei um Congresso de Cidadãos que não têm interesse em mandatos, todas as pessoas assinam um termo de compromisso de que não concorrerão a postos eletivos”.

Maranhão vibra com a chance de ter “virtualmente uma amostra significativa, em 20 das principais áreas de políticas públicas, de propostas desinteressadas de aperfeiçoamento”. Sua ideia é “calar a crítica da aristocracia no mau sentido; o Brasil precisa que seus melhores se dediquem à questão pública, e não essa onda que os políticos criaram de que quem está na política tem de sujar a mão”.

Ele está convencido de que há uma massa crítica de cidadãos dispostos a sair de uma cidadania de primeiro grau, que se define pela solidariedade, ou da legalidade, como a preocupação com o meio ambiente, o espaço público e os equipamentos urbanos, para uma “cidadania atuante”, que é o uso de instituições de controle do Estado, independentemente de partidos.

“A verdadeira cidadania é a de controle social, que é uma dificuldade de colocar em pé. A cidadania de moralidade pública, no sentido amplo do termo. Onde você vai adequar os seus valores pessoais à sua conduta”.

A cidadania de terceiro grau é a mais evoluída, pois busca a coerência entre a consciência e a conduta social, mostra ao outro os limites de seus direitos. “Cidadãos que não aceitam mais o Estado ser aparelhado por conveniências políticas”, define.

Carlos Fernando Galvão, doutor em Ciências Sociais pela Uerj, lançou o Movimento Rio Cidadão, do qual emergiu a ONG Cidade Viva, ambos parados por falta de recursos. Publicou em 2010, pela Editora Claridade, o livro “Democracia — Do conceito à prática, da representação à participação”, com prefácio de Clóvis Rossi. Para ele, o sistema representativo dialoga com setores organizados, e para que alguém participe, tem de estar num movimento ou instituição.

“Contudo, é difícil você ver o sistema aberto a uma participação mais informal para o cidadão. Junto com a elite política e econômica, construímos o que chamo de uma elite do terceiro setor ou dos organizados. Mas a maioria das pessoas não é representada, de modo contínuo e satisfatório, por essas elites. A participação em comitês desde a base municipal, num sistema semelhante ao chinês, pode ‘descristalizar’ a representação e mobilizar, na prática e efetivamente, a base”, diz Galvão. “Temos que construir uma agenda cidadã, vinda da base, onde a participação, em complemento, mas para muito além da representação (não a excluo, de maneira alguma), discuta o que queremos e proponha projetos”.

Marco Aurélio Nogueira: Conta do sebastianismo

Mais uma vez retorna o coro do 'colta, Lula', mas a mudança teria alto custo

- O Estado de S. Paulo / Aliás

Política é cálculo e oportunidade, paixão e frieza. Iniciativa, capacidade de preparar o futuro, domar ventos e crises, interagir com a vida. Passa por reconhecer erros e assumir responsabilidades. É ação coletiva: carreiras solo dificilmente progridem e o companheirismo, as lealdades, as amizades pesam de forma determinante. O coro "volta, Lula", repetido à boca pequena e sempre mais recorrente, é um convite à reflexão sobre a natureza da política e especialmente sobre as chances de sucesso de suas operações, custos e resultados devidamente considerados.

Para começar do começo: por que cresce o coro? Sondagens de opinião não indicam declínio categórico do prestígio da presidente. Tem havido certas inflexões preocupantes, é verdade, mas seu nome permanece forte. Por que então pedem a volta do ex-presidente? Por que tamanha insistência de Lula em dizer que Dilma é a "sua" candidata, pois é a "melhor pessoa para vencer as eleições" e ele, Lula, se pudesse registraria em cartório a decisão de não sair candidato? Em sua visão, tudo não passaria de enorme boataria, não de uma intenção.

Se o que atiça o coro não é o ex-presidente, então temos um problema: há gente demais insatisfeita com o desempenho presidencial e insegura com a real capacidade eleitoral de Dilma. Petistas, empresários, banqueiros e peemedebistas pedem o retorno do ex-presidente. Há, também, os que usam a situação para negociar novos espaços, promover acertos de contas ou simplesmente tumultuar o ambiente. Mas é um fato que o mal-estar está instalado em Brasília. Motivos certamente não faltam. Problemas desgastantes sucedem-se sem parar. Petrobrás, crise energética iminente, André Vargas, inflação emergente, CPIs, riscos e tropeços da Copa: tudo desaba sobre a presidente e se converte imediatamente em fato político. E Dilma, pouco afeita aos humores e exigências da política, tende a submergir, a silenciar ou a tartamudear. Não passa confiança, nem firmeza.

Lula foi direto ao ponto: seria preciso "ir pra cima", enfrentar a oposição, defender o governo "com unhas e dentes", reagir antes que seja tarde demais. Salvar a presidente é garantir o futuro. Como há um componente congelado no cenário – o estilo, a personalidade e a biografia de Dilma, que não mudarão –, o contraste se agiganta. Dilma é enfezada, não tem carisma nem empatia. Lula é puro charme, transpira humildade e autenticidade, é franco, simples e didático. A astúcia em pessoa. Levanta multidões, agrada e sabe cortejar quem dele se aproxima. Alimenta uma legião de fãs e muitas expectativas. Perto dele, Dilma é opaca, não agrega nem entusiasma.

Os "sebastianistas" acreditam que Lula descongestionaria o ambiente, abriria novos espaços e daria novo fôlego a tudo. Animal político por excelência, Lula gerenciaria com mais competência as relações Estado/sociedade, acalmando tanto a movimentação social quanto o desarranjo e a pressão político-institucional, o que Dilma não tem conseguido fazer. Estão preocupados com o déficit de articulação e coordenação política que se evidenciou no País e ameaça a estabilidade econômica, a intermediação política, a continuidade das reformas, os arranjos político-sociais estruturados desde 2002 e, evidentemente, os negócios. Sem a resolução desse déficit, ficaria abalado o pacto informal entre as grandes empresas nacionais e multinacionais, os bancos, o agronegócio e a grande agricultura, a política tradicional e parte dos interesses organizados do mundo do trabalho.

Como esse pacto foi articulado por Lula, por que então não pedir a ele que embale a criança e injete oxigênio no que está ofegando? Com ele, seria possível voltar a sonhar; com Dilma, o sono continuaria agitado, instável. A aposta é que Lula tem personalidade, estilo e biografia para resgatar aquilo que fez a fortuna de seus dois governos, atualizando-os à nova fase do País.

Trata-se de uma construção mental que excita os ambientes, criando a sensação de que existe interna corporis, ao alcance da mão, uma alternativa para que o projeto de poder se reponha em melhores condições.

Há, porém, um custo alto na hipotética operação. Primeiro, porque a mera cogitação dela ajuda a enfraquecer o governo e a piorar a situação. Quanto mais Lula diz não querer o cargo, mais passa a impressão de que nem mesmo ele acredita em Dilma. Segundo, porque ela escancararia uma grosseira falha de estratégia: teria sido um erro entronar Dilma como sucessora de Lula.

Com ela, o País não seguiu na mesma toada. Ao ser "deslulizado", entristeceu. E o pacto que sustenta o governo ficou com maiores dificuldades operacionais. Terceiro, porque nunca é fácil trocar o piloto com o avião em pleno voo. Turbulências e trepidações serão certamente inevitáveis, figurinos e discursos precisarão ser refeitos às pressas, aliados perdidos terão de ser novamente agregados. Quarto, porque Lula, precisamente por ter muita sagacidade e talento (além de muito capital político), deve estar pensando se vale a pena entrar na disputa agora. Ele precisaria sacrificar Dilma, o que não é fácil nem propriamente dignificante. E precisaria concorrer num quadro que não se mostra tão tranquilo assim, ou seja, no qual teria tanto possibilidades de vitória glorificadora quanto de derrota.

Há, por fim, uma questão que complica o cálculo. Bastaria um bom timoneiro para que o navio volte a singrar os mares sem sobressaltos? A qualidade da nave e da marujada também pesa, e quase sempre de modo categórico. O mesmo vale para a cartografia que orienta o capitão: um mapa malfeito, desatualizado ou imperfeito pode levá-lo na direção de rochedos implacáveis ou deixá-lo à deriva. Como se trata de política, o mapa é o que costumamos chamar de projeto. E ele não existe de modo claro e suficiente.

Marco Aurélio Nogueira é professor titular de Teoria Política e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da UNESP

Miriam Leitão: De quem é o IBGE?

As crises do IBGE e Ipea são diferentes, mas assustam igualmente. O IBGE tem feito, com independência, pesquisas que trazem números incômodos para o governo. O Ipea, desde Lula, tem sofrido desvio de função. O adiamento do cronograma da Pnad Contínua, que levou à demissão de Marcia Quintslr, foi estranho pelo momento e pela maneira como foi feito. O instituto se rebelou.

A Pnad Contínua vem sendo preparada há anos. Houve um esforço de explicação, treinamento, prévias, porque a transição é muito complexa. Esse trabalho começou há três anos e todo o cronograma foi decidido com antecedência e vinha sendo cumprido. Afinal, o objetivo é ter uma grande base de dados pesquisados em 211 mil domicílios de 3.500 municípios.

No desemprego, nas primeiras divulgações, ela trouxe uma informação valiosa para as políticas públicas e das empresas: o de que olhando-se o Brasil além das seis regiões metropolitanas, o desemprego é dois pontos percentuais maior. Não são índices comparáveis. Não se pode dizer que o desemprego subiu de 5% para 7%. Mas se pode dizer que, com um novo e mais amplo termômetro, o quadro do mercado de trabalho é diferente do que se imaginava.

Os economistas vêm dizendo que a baixa taxa de desemprego reduziu o crescimento potencial do Brasil. O que o novo número indica é que talvez haja mais espaço para crescer — e empregar — do que se imagina e que no interior há mais mão de obra desocupada. Entre os jovens, o número é muito maior do que já é na PME. No Nordeste, chegam a quase 20% os jovens que procuram e não encontram emprego.

O quadro do mercado de trabalho brasileiro é mais complexo do que supõe a visão apenas economicista. Dados mais nacionais melhoram o debate. Um mercado de trabalho estrangulado — sem oferta de trabalhadores — não se dá ao luxo de discriminar. O nosso permanece pagando 70% menos para mulheres no mesmo nível de escolaridade. Cria mais barreiras à entrada de negros e não quer investir na qualificação de jovens, apesar de eles entrarem no mercado com mais escolaridade que seus pais.

Tudo isso estava começando a ter dados mais nacionais e mais exatos. O problema é que o novo índice reduziu o brilho de um dos números a se mostrar na campanha: o da taxa de desemprego de 5%. Uma bobagem esse temor, até porque a nova taxa também mostra tendência de queda do desemprego.

Mas aí entrou em ação a chefe da tropa de choque do governo, senadora e ex-ministra chefe da Casa Civil e candidata ao governo do Paraná, Glesi Hoffmann. Ela e seu conhecido colega Armando Monteiro levantaram dúvidas sobre as margens de erro nos dados de renda. O instituto decidiu suspender a pesquisa e só voltar com ela em janeiro de 2015.

O IBGE tem 80 anos de bons serviços prestados ao país. Enfrentou com coragem a tentativa de interferência dos governo Sarney e Collor. A presidente Wasmália Bivar é uma funcionária de carreira que manteve a tradição de independência, mas o adiamento do cronograma e a saída de Márcia Quintslr deixaram um temor no ar.

O Brasil já sabe os estragos que este governo pode fazer em uma instituição pública. O problema do Ipea não é o de um percentual errado. Há muita gente séria e competente, até entre os atingidos por esse erro, trabalhando no órgão. Mas a direção do instituto tem se dedicado mais a agradar ao governo do que em ser a voz crítica interna que sempre foi.

O Ipea tradicionalmente usa a vasta e rica base de dados do IBGE, e outros bancos de dados, para fazer estudos reveladores. Ainda há quem trabalhe assim no órgão. Na gestão do ex-presidente Márcio Pochmann, virou um centro de autolouvação petista. Pochmann afastou-se para ser candidato à prefeitura de Campinas, pelo PT, mas perdeu a eleição.

Foi horrível o erro da pesquisa sobre violência contra a mulher, mas o pior é o Ipea estar se dedicando à pesquisa de opinião, que nunca foi sua função. Também não faz sentido ter uma sucursal na Venezuela.

Distorcer a função de um Ipea prejudica o país, mas interferir no instituto oficial de estatísticas é trágico. Torço para que tudo se esclareça e que a senadora Hoffmann guarde distância do órgão. Ele é um patrimônio do Brasil. Não pode ser visto como governamental. O IBGE é do Estado brasileiro.

O IBGE sob domínio petista: O Estado de S. Paulo - Editorial

A suspensão, pela diretoria do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da divulgação dos resultados trimestrais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) - que apresenta a situação do mercado de trabalho no País - deixa claro que, se for necessário para evitar que informações eventualmente negativas sobre o desempenho da economia causem danos à candidatura da presidente Dilma Rousseff à reeleição, o governo do PT não hesitará um segundo para intervir em qualquer órgão público. Nem mesmo instituições como o IBGE, que construíram ao longo dos anos uma reputação reconhecida internacionalmente pela qualidade e isenção de seu trabalho e produzem informações essenciais para a formulação de políticas públicas e para decisões das empresas privadas e das famílias, escapam da volúpia petista pela permanência no poder.

A revolta do corpo técnico da Diretoria de Pesquisas da instituição, responsável pela produção dos principais indicadores por ela divulgados regulamente, não deixa dúvidas quanto ao caráter político da decisão. A diretora Marcia Quintslr, que se opunha à interrupção da divulgação dos resultados, demitiu-se do cargo que ocupava desde 2011 tão logo a suspensão foi anunciada. Em nota, coordenadores e gerentes estratégicos da Diretoria de Pesquisas disseram ser "insustentável" sua permanência nos cargos caso a suspensão seja mantida.

A constatação, pela Pnad Contínua, de que o desemprego médio no País em 2013 foi de 7,1% deve ter provocado grande irritação entre os membros do governo que acumulam a função de organizadores da campanha eleitoral de Dilma. Eles estavam acostumados a outro indicador, a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) também aferida pelo IBGE, que tem apontado para um desemprego em torno de 5% - número que certamente tem impacto eleitoral muito mais favorável para a candidatura oficial do que o da Pnad Contínua.

São, porém, pesquisas diferentes, baseadas em metodologias e critérios diferentes e com abrangências igualmente diferentes (a PME limita-se a seis regiões metropolitanas; a Pnad Contínua tem alcance nacional), daí a discrepância de seus resultados num determinado momento.

Ao anunciar a suspensão da divulgação dos resultados trimestrais da Pnad em 2014 - a próxima estava marcada para o dia 27 de maio - e o reinício dos anúncios em janeiro de 2015, quando o vencedor da eleição presidencial já tiver tomado posse, a diretoria do IBGE tentou justificá-la com argumentos técnicos. Entre outros, a direção do instituto alegou, em comunicado, que a suspensão é necessária para eliminar da pesquisa dúvidas e questionamentos, entre os quais a respeito de renda domiciliar per capita, que será utilizada para definir as quotas de Estados e municípios nos respectivos fundos de participação em tributos federais.

Os técnicos da Diretoria de Pesquisas consideraram "inaceitável" essa alegação e também a decisão de refazer o calendário de divulgação dos resultados da Pnad Contínua. Documentos técnicos publicados pelo IBGE e declarações da presidente da instituição, Wasmália Bivar, à imprensa mostraram que há tempos a metodologia da pesquisa não precisa mais ser revista ou testada.

A metodologia é utilizada desde 2006 e a Pnad Contínua começou a ser realizada em caráter excepcional em outubro de 2011, em pelo menos 20 regiões metropolitanas, além de cinco capitais estaduais e no Distrito Federal. Em janeiro de 2012, foi estendida para todo o território nacional e, de acordo com as Notas Metodológicas publicadas pelo IBGE no início deste ano, desde então faz parte do conjunto de pesquisas do instituto.

Em setembro do ano passado, em entrevista ao jornal Brasil Econômico, a presidente do IBGE afirmou que, "quando começarmos a produzir, teremos que divulgar um cronograma e não poderemos parar". O cronograma foi amplamente anunciado no início deste ano (os dois primeiros resultados foram divulgados na data prevista), mas, por alguma razão, Wasmália e outros diretores do IBGE decidiram suspender a divulgação. Não foi por razões técnicas.

Pedro S. Malan: Reduzido espaço de manobra

- O Estado de S. Paulo

Em junho próximo, o governo Dilma deve definir a meta de inflação para 2016. O mais provável é que, sem muito alarde, seja reafirmada a meta em vigor há anos, ou seja, 4,5% mais ou menos dois pontos porcentuais. O momento não sugere mudança, já que, em reiteradas declarações, nossa presidente e seu ministro da Fazenda insistem em que a inflação está "há dez anos" dentro da meta. Dado que a inflação média anual nos quatro anos do governo Dilma deverá ficar em cerca de 6% ou pouco mais, a expressão "dentro da meta" passou a significar "abaixo do teto da meta", que é de 6,5%.

Alguém poderia perguntar: e qual é o problema com isso, se a meta está sendo cumprida? Deixando claro que não há nenhum desastre à vista nessa área, o fato é que há problemas, sim. E o que é grave: o espaço para manobra, e para erro, é cada vez mais reduzido.

Na verdade, a inflação só está "dentro da meta/abaixo de seu teto" porque, preocupado com determinados itens de peso no cálculo do índice oficial de preços ao consumidor, o governo recorreu ao controle direto ou indireto de preços administrados, que cresceram apenas no insustentável nível de 1,5% em 2013, enquanto os preços livres aumentaram 7,3% - e os serviços, mais de 8%.

Com efeito, estimativas hoje disponíveis mostram que acumulamos uma "inflação reprimida" da ordem de 1,5 ponto porcentual no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo(IPCA). Em outras palavras, na ausência dos vários controles sobre preços administrados direta ou indiretamente pelo governo, a inflação brasileira estaria hoje certamente acima de 7%. Não há, portanto, espaço para o discurso do "estamos dentro da meta/abaixo do teto". Na realidade, não estamos.

Certamente teremos de voltar a uma inflação "dentro da meta" em 2015 e reduzi-la ainda mais em 2016 para que o discurso de que o objetivo é convergir ao longo do tempo para perto do centro da meta (4,5%) possa ter um mínimo de credibilidade. Uma estratégia de convergência que hoje, definitivamente, não depende apenas do Banco Central (BC) - o qual, justiça lhe seja feita, não embarcou no discurso do "abaixo de 6,5%" como a definição aceitável do "cumprir a meta".

O fato é que as expectativas quanto ao curso futuro da inflação estão há alguns anos desancoradas dos 4,5% do centro da meta. Supondo que esta não vai ser alterada agora em junho, e levando em conta que a inflação efetiva (isto é, não represada pelos controles de preços, que não se sustentam no tempo) hoje está bem acima do teto da meta, seria preciso reduzir a inflação efetiva atual em pelo menos dois pontos porcentuais.

E isso pode demandar de dois a três anos a partir de agora. A não ser que alguém espere que o BC possa elevar as taxas de juros para o "whatever it takes" (o nível que for necessário), ou que o real se valorize e se mantenha como tal por tempo relevante, ou que uma baixíssima taxa de crescimento force a queda da inflação por falta de demanda.

Ao menos pelos próximos seis ou nove meses o espaço de manobra para qualquer ação efetiva é extremamente reduzido - como é ainda mais o espaço para novos erros. Situações difíceis não implicam inexistência de opções. Mas estas podem exigir, para recuperação de confiança abalada, que o horizonte de tempo da política macroeconômica relevante não seja apenas o ano-calendário em curso, tampouco os próximos 12 meses, mas um período mais longo, à frente.

Refiro-me ao nosso verdadeiro calcanhar de Aquiles, nossa situação fiscal, que está a exigir uma sinalização: algo que seja factível, crível e defendido com convicção ainda neste ano de 2014. Falo do anúncio de uma decisão de começar a elaborar desde agora um programa fiscal para o triênio 2015-2017.

Estou convencido de que isso seria de interesse do País, e que poderia ser de interesse da própria presidente Dilma Rousseff, bem como dos outros principais candidatos ao cargo nas eleições de outubro. Afinal, estamos tratando da recuperação de uma margem de manobra, hoje muito reduzida, para respostas adequadas da política econômica - parte crucial da recuperação da confiança no Brasil.

Como já notei neste espaço, isso já foi feito mais de uma vez no passado recente, em 1998-1999 e em 2002-2003, e funcionou. Agora, em 2014, apesar da evidente recuperação da economia norte-americana e do clima mais confiante na capacidade da Europa de resolver gradualmente seus inúmeros problemas, não há nenhuma possibilidade de volta a um contexto internacional tão favorável quanto aquele que tanto beneficiou, por boa parte, o governo Lula.

Mais uma razão, se preciso fosse, para que o Brasil comece desde agora a fazer as coisas mais urgentes, a começar por destravar as inúmeras armadilhas visíveis à frente - algumas de "nossa" própria montagem, em particular nas áreas de energia elétrica, óleo e gás e infraestrutura.

Dentre as urgências no gradualismo está a questão fiscal: o nível, a composição e a eficiência tanto do gasto público quanto da arrecadação do governo. Daí a sugestão de um esforço, visando o próximo triênio, que tenha uma clara diretiva presidencial, expressa com crível convicção, de que é preciso começar a programar a redução da velocidade de crescimento das despesas primárias do governo em relação à velocidade de crescimento da economia. Bem como aumentar a participação dos investimentos em relação aos demais gastos.

Fica difícil quando se aceita a frase famosa de Néstor Kirchner: "Para mim, gasto é investimento". Ela expressa bem uma postura muita difundida entre nós. Mas sempre caberá perguntar: qualquer gasto? Porque haja Tesouro, haja carga tributária, haja aumento de dívida bruta, haja impostos sobre as gerações futuras, se qualquer gasto for considerado sempre como investimento em "alguma coisa". Sem definição clara de prioridades, sem fazer escolhas difíceis, sem avaliar o reduzido espaço para manobra - e para erro.

Pedro S Malan, economista, foi ministro da fazenda no governo Fernando Henrique Cardoso.

Helena Celestino: Reação à intolerância

- O Globo

Primeiro a boa ou a má notícia? A péssima: os resultados da eleição para o Parlamento Europeu de maio serão deprimentes, os números vão mostrar o crescimento dos radicais da extrema-direita. A bem ruinzinha: seus partidos ainda têm nomes desconhecidos fora das fronteiras de seus países, mas estão se unindo sob um título ambíguo — “Aliança pela liberdade da Europa”— para lutarem, juntos, contra a União Europeia. A boa notícia é uma espécie de jogo do contente: os grandes países da velha Europa não estão todos dominados pela praga do populismo dos partidos extremistas.

“Espero maus resultados, mas eles vão indicar mais o fim de uma época do que o início de um longo crescimento do extremismo”, sintetiza Alain Touraine, considerado pai da moderna sociologia e uma das tradicionais vozes da esquerda francesa.

Os sinais são contraditórios. Na semana em que o Reino Unido dá demonstrações de intolerância e bota sob vigilância a mais tradicional organização islâmica — a Irmandade Muçulmana —, a França aparentemente perde o medo e apresenta suas propostas para facilitar a vida das novas famílias, as múltiplas composições das uniões afetivas no século XXI. O presente deixado pela ex-ministra de Assuntos Sociais propõe uma pequena revolução do direito da família: reconhecimento de filhos gestados em barrigas de aluguel, inseminação artificial em casais de lésbicas, adoção de crianças por solteiros ou homos, e fim do anonimato dos doadores de sêmen.

Foi lançado com pouca pompa, numa adaptação ao estilo do novo premier, Manuel Valls: mais combativo, mas mais conservador em questões sociais. Encomendado a renomados especialistas, o calhamaço de 300 páginas ficou mofando nas gavetas do governo desde janeiro. A decisão de botar em discussão as propostas já é uma pequena ousadia, um sinal de vida da esquerda, emparedada pelo crescimento da Frente Nacional.

— Não vejo a extrema-direita desestabilizando a política francesa. A direita clássica não fez acordo com a Frente Nacional, e os socialistas estão reagindo. Mas a França é o pior caso na Europa Mediterrânea — diz Touraine.

Um pouco nos moldes do Tea Party americano, os extremistas europeus botam tudo junto e misturado nas suas plataformas eleitorais: desilusão com a política, crítica à austeridade receitada por Bruxelas, palavras de ordem contra imigrantes, judeus e ciganos, a defesa de uma família tradicional, o repúdio ao casamento gay. Esta mensagem antiestablishment faz sucesso com o eleitorado de esquerda do Movimento Cinco Estrelas do comediante italiano Beppe Grillo e agrada aos nazistas da Aurora Dourada, da Grécia. Junta também os radicais da Frente Nacional da França e os suíços da União Democrática, a direita nacionalista de maior sucesso na Europa.

“Surpreendentemente, a xenofobia e todos esses movimentos populistas de direita são mais fortes na Europa do Norte, onde a economia vai melhor”, diz Touraine.

A ideia generosa de uma Europa com livre circulação de pessoas, ideias e bens saiu de moda. Ganha força o movimento contrário, a Europa fortaleza, defendida pela extrema-direita, pela primeira vez com chances de organizar uma bancada no Parlamento Europeu. Para chegar lá, tem de eleger 25 deputados, de sete países diferentes.

Por conta disso, os eurocéticos estão se unindo. Começou no fim do ano passado, com Marine Le Pen e o holandês Geert Wilders prometendo fazer campanha juntos e este ano foi a vez de os nacionalistas da Áustria receberem belgas, eslovenos, suecos e italianos da mesma turma. “Mas não ficou só nisso, estão também atraindo os partidos mais tradicionais — como o Conservador do Reino Unido — e formações de esquerda, tipo Syriza, na Grécia”, informam Mark Leonard e José Ignacio Torreblanco, do European Council on Foreign Relations.

A sorte é que eles não se entendem. Mas as palavras de ordem racistas e xenófobas fazem estragos na reputação da Europa, aquela que nós gostamos pelo multiculturalismo estampado nas ruas, pela defesa de ideais de liberdade e o gosto de viver. Acuadas pela intolerância, a esquerda e a direita clássica tentam adaptar seu discurso à moda do momento, perdendo a oportunidade de reafirmar seus valores. A Suíça, em plebiscito, impôs cotas de imigração, numa violação absurda aos tratados de livre circulação no espaço europeu. Se ficar por isso mesmo, o próximo a romper as regras certamente será o Reino Unido. Os extremistas querem manter a livre circulação de capitais, mas gostariam de pôr barreiras à movimentação de pessoas, especialmente as pobres. Russos ricos sem papéis não têm a menor dificuldade de alugar um apartamento em Londres, simplesmente apresentam uma mala de dinheiro e pagam dois anos adiantado.

A melhor descrição do momento é a de Bob Dylan na sua velha balada do Thin Man: “alguma coisa está acontecendo aqui, mas você não sabe o que é, sabe Mr. Jones”? É bom que os europeus contrários ao fechamento da Europa compareçam para votar, já que será uma derrota para o mundo perder um espaço de liberdade.