quarta-feira, 28 de agosto de 2013

OPINIÃO DO DIA – Luiz Werneck Vianna: combinar representação e participação

O deslocamento da razão política pelas artes calculadoras da economia, resultado a que chegamos quase sem sentir, embalados pelo pragmatismo sem princípios que se fez dominante, deixou em sua esteira uma consequência nefasta: a ruptura com a cultura política que medrou nas lutas pela democratização do País e se encorpou no processo constituinte da Carta de 88. Aquele foi um tempo de reflexão e de tomada de decisões acerca de sob que instituições deveríamos viver, quando decidimos que nossa democracia política deveria combinar as formas de representação com as de participação, criando, a fim de efetivar esta última, um rico repertório, indo do controle de constitucionalidade das leis por provocação de entidades da sociedade civil aos conselhos, entre outros, os de saúde e os de educação, em que a vida social se deveria fazer presente.

Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador da PUC-Rio. In “Razões para um mundo fora do eixo”. O Estado de S. Paulo, 25/8/2013.

Crise no Itamaraty - ‘Como é distante o céu do inferno': Dilma rebate alegação de diplomata

Ao falar pela primeira vez da crise no Itamaraty, a presidente Dilma reagiu a declarações do diplomata Eduardo Saboia, que comparara a situação do senador boliviano Roger Molina à de um preso político. "É tão distante o DOI-Codi da embaixada brasileira em La Paz como é distante o céu do inferno”, retrucou ela. A presidente ontem cancelou a nomeação do ex-embaixador na Bolívia para posto da Suécia

Dilma critica diplomata

Presidente rejeita comparação com DOI-Codi e diz que operação pôs em risco a vida de boliviano

Paulo Celso Pereira, Eliane Oliveira, Maria Lima e Júnia Gama

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff se pronunciou ontem pela primeira vez sobre a operação que trouxe o senador boliviano Roger Pinto Molina ao Brasil. Em tom grave, criticou duramente a decisão tomada pelo encarregado de negócios brasileiros na Bolívia, Eduardo Saboia, que saiu de La Paz com Molina e foi até Corumbá de carro, em um trajeto de 22 horas. Ex-presa política durante a ditadura militar, a presidente rechaçou categoricamente a comparação, feita pelo diplomata, de que a situação de Molina, retido há 455 dias na embaixada, era semelhante à de um preso no DOI-Codi. O Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna foi um dos mais cruéis centros de repressão da ditadura brasileira.

- Nós não estamos em situação de exceção, não há nenhuma similaridade. Eu estive no DOI-Codi, eu sei o que é o DOI-Codi. E asseguro a vocês: é tão distante o DOI-Codi da embaixada brasileira lá em La Paz como é distante o céu do inferno. Literalmente isso - afirmou Dilma, criticando o risco que o senador boliviano teria sofrido durante a fuga. - Não tem nenhum fundamento acreditar que é possível que um governo, em qualquer país do mundo, aceite submeter a pessoa que está sob asilo a risco de vida. Se nada aconteceu, essa não é a questão. Poderia ter acontecido. Um governo não negocia vidas, um governo age para proteger a vida.

A fala da presidente ocorreu na saída de um evento no Senado para comemorar os sete anos da Lei Maria da Penha. A presidente assegurou ainda que o governo brasileiro havia tentado, em vários momentos, negociar o salvo-conduto que permitiria a saída segura de Molina do país. Segundo ela, a embaixada brasileira era confortável, e o primeiro dever do Brasil era proteger a vida do senador, sem correr os riscos de tirá-lo do país.

- O Brasil jamais poderia aceitar, em momento algum, sem salvo-conduto do governo boliviano, colocar em risco a vida de uma pessoa que estava sob sua guarda. A embaixada do Brasil é extremamente confortável. Nós negociamos em vários momentos o salvo-conduto, não conseguimos. Lamento profundamente que um asilado brasileiro tenha sido submetido à insegurança a que ele foi. Lamento. Porque um Estado democrático e civilizado, a primeira coisa que faz é proteger a vida, sem qualquer outra consideração. Protegemos a vida, a segurança e garantimos conforto ao asilado - disse Dilma, sem entrar nas considerações políticas sobre as relações de seu governo com o de Evo Morales.

O tom das declarações de Dilma Rousseff foi apenas uma mostra de como ela reagiu, um dia antes, ao se reunir com o ex-ministro das Relações Exteriores Antonio Patriota. Na noite de segunda-feira, Dilma exigiu de Patriota a cabeça do diplomata Eduardo Saboia, tido como responsável direto pela operação e, ontem à tarde, mandou documento ao Senado cancelando a indicação de Marcel Biato, que até junho era embaixador brasileiro na Bolívia, para assumir a embaixada em Estocolmo, Suécia.

Segundo uma fonte próxima à presidente, Patriota explicou que não havia possibilidade de exonerar Saboia antes do resultado de uma sindicância, que poderá ou não, em 30 dias, resultar em procedimento administrativo disciplinar (PAD). A conversa foi dura e terminou com a demissão do chanceler, que, ao retornar a seu gabinete, fez um discurso dizendo que sua saída tinha por objetivo preservar a instituição Itamaraty.

Informado das declarações da presidente, Eduardo Saboia reagiu com apreensão. Ele reafirmou que tinha o objetivo de defender a vida do boliviano, que estava em processo acelerado de depressão e falando em suicídio pelo longo confinamento em um cubículo da embaixada do Brasil.

- Reze por mim. Só digo uma coisa: eu defendi a vida. O governo não se empenhou para tirá-lo de lá - disse Saboia, completando ao saber do tom das declarações de Dilma. - Eu estou sereno.

Ele discordou da afirmação da presidente de que "um governo não negocia vidas". Ele comparou a situação de Molina à dos americanos que se refugiaram na residência do embaixador canadense no Irã, após a invasão da embaixada dos Estados Unidos em Teerã, em 1979.

- O senador Roger Pinto ficou mais tempo na embaixada do Brasil do que o pessoal no Irã. Os americanos ficaram confinados 440 dias, com o governo americano se empenhando para tirá-los de lá. O Molina ficou 452 dias confinado. E o governo não se empenhou - criticou Saboia.

Instalada comissão que vai apurar fuga de Molina da embaixada

Foi instalada ontem a comissão que vai apurar a saída de Roger Pinto da embaixada brasileira em La Paz. O grupo será presidido pelo auditor fiscal da Receita Dionísio Carvalho Barbosa, que atualmente é assessor da Controladoria Geral da União. Também participarão dos trabalhos, que terão até 30 dias para serem concluídos, os embaixadores Clemente de Lima Baena e Glivânia Maria de Oliveira.

Quanto a Marcel Biato, a atitude de Dilma, que enviou mensagem à Comissão de Relações Exteriores do Senado pedindo a retirada de seu nome, deixou claro que há suspeita, no Planalto, de que o diplomata teve conhecimento ou algum tipo de participação no plano de fuga. Biato já tinha até recebido o "agreement" do governo da Suécia e faltava a aprovação no Congresso brasileiro.

Após vários dias defendendo publicamente a operação que coordenou, a expectativa entre os amigos do diplomata é que Saboia silencie. Sua mulher, que também é diplomata e está lotada em Santa Cruz de La Sierra, e sua filha continuam na Bolívia e, a partir de agora, Saboia terá de se defender no processo administrativo aberto pelo Itamaraty. Assim, a tendência é que ele passe a se pronunciar sobre o caso apenas por meio de seu advogado. A primeira medida para evitar exposição foi, inclusive, o cancelamento da visita que ele faria amanhã ao Senado.

O recato também deve ser a regra para Molina. O encontro que ele teria ontem com senadores foi cancelado, por precaução, pelo presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Ricardo Ferraço (PMDB-ES). O senador brasileiro foi quem conseguiu o jato executivo que levou o boliviano de Corumbá para Brasília, durante o fim de semana. Segundo Ferraço, o boliviano ainda teme que o governo brasileiro possa ceder às pressões do governo de Evo Morales e voltar atrás na concessão do asilo.

- Ele não veio ao Senado em função do agravamento da crise, desses desdobramentos. A situação dele ainda é vulnerável. A condição de asilado exige cautela, então decidimos esperar as coisas se estabilizarem. Se ele viesse, uma coletiva de imprensa teria perguntas de todo tipo, e a situação seria delicada. A evolução dos fatos nos últimos dias impôs cautela, e ele se convenceu de que, na posição de asilado, não poderá sair por aí dando opinião - explicou Ferraço.

Com aval do Palácio do Planalto, o petista Jorge Viana (AC) entrou no circuito. Ele conhece Molina há muitos anos - apenas um lago separa a área de atuação de ambos na fronteira entre os países. Viana conversou com o senador boliviano para aconselhá-lo a não ir ao Congresso ou falar em público. Molina foi alertado de que sua situação é extremamente complicada e que, caso se exponha, sua permanência no Brasil fica em risco.

- Disse para ele não vir ao Senado, não dar entrevista e esperar os encaminhamentos das autoridades brasileiras. Expliquei que falar qualquer coisa agora iria trabalhar contra ele, e é óbvio que sua permanência aqui poderia ficar em risco. Conversei com ele novamente hoje (ontem), por telefone, e ele concordou. Tudo o que ele quer agora é ter paz e ver sua família, que está no Acre - disse Viana ao GLOBO.

Fonte: O Globo

Patriota se disse responsável pela saída de senador da Bolívia

Fernanda Odilla

BRASÍLIA - Tão logo soube que o senador boliviano Roger Pinto Molina entrara no Brasil, Dilma Rousseff quis saber quem fora o responsável pela operação que abriu uma crise no Ministério das Relações Exteriores e derrubou o chanceler Antonio Patriota.

Foi o chanceler quem disse à presidente, por telefone, que o boliviano havia entrado no país. A Folha apurou que Dilma e Patriota se falaram no sábado. O tom da conversa entre os dois teria sido tenso.

Patriota estava no aeroporto de Guarulhos (SP), prestes a embarcar para a Finlândia, e, segundo relatos, parecia incomodado. Fez vários telefonemas e avisou que poderia ter de voltar para Brasília.

Uma das ligações foi para um funcionário do Itamaraty, que confirmou que o senador havia entrado no país após passar 455 dias na embaixada em La Paz.

Patriota teria demonstrado surpresa e apreensão com a notícia. Imediatamente pediu a um assessor para que o colocasse em contato com a presidente. A primeira tentativa, contudo, foi frustrada.

Ele telefonou então para o chanceler da Bolívia, David Choquehuanca, informando que acabara de saber da retirada do senador oposicionista.

Na conversa, teria dito que havia sido uma decisão de um funcionário da embaixada devido às condições de saúde do senador. Prometeu que providências seriam tomadas pelo governo brasileiro.

Em seguida, Patriota falou com Dilma. Apesar de afirmar que a condição de saúde do senador era séria, disse que a decisão não fora tomada em Brasília.

Dilma quis saber quem planejara a operação. Patriota apontou o encarregado de negócios, Eduardo Saboia, mas se responsabilizou pela retirada do oposicionista, uma vez que havia sido ele que indicara Saboia para o cargo.

Patriota voltou então à capital federal.

No dia seguinte, o Itamaraty divulgou nota citando Saboia e anunciando que uma investigação interna seria aberta para apurar o caso.

Na segunda-feira, Patriota deixou o cargo e foi indicado para representar o Brasil na ONU. O senado precisará sabatiná-lo.

Fonte: Folha de S. Paulo

Em defesa de Saboia

"Ao expor à execração pública o diplomata Eduardo Saboia, o governo brasileiro se curva, mais uma vez, a conveniências ideológicas" - Aécio Neves (PSDB), senador por Minas Gerais

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), prováveis candidatos a presidente em 2014, partiram ontem em defesa do diplomata Eduardo Saboia. O parlamentar mineiro classificou de “deplorável” a condução do episódio pelo governo da presidente Dilma Rousseff.

“Ao expor à execração pública o diplomata Eduardo Saboia, o governo brasileiro se curva, mais uma vez, a conveniências ideológicas. Mais grave ainda, abandona as melhores tradições da nossa diplomacia”, declarou Aécio. Ele ressaltou que Saboia atuou movido por uma questão humanitária. “Fez o que qualquer homem de bem faria numa situação como a que ele vinha enfrentando há 15 meses: agiu para permitir que um cidadão perseguido pelo governo da Bolívia, e que há meses obtivera asilo do governo brasileiro, pudesse voltar a viver com dignidade”, afirmou.

Eduardo Campos, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, também elogiou a atuação do diplomata. “Eu só posso ter uma opinião: salvamos uma vida de uma doença terrível, que é a depressão. Cumprimos uma tradição, própria do povo latino e brasileiro, que é abrigar. Tenho, por dever de consciência, que cumprimentar o diplomata que fez isso”, ressaltou.

Campos comparou o caso ao do avô Miguel Arraes. “Chegou ao ponto em que o embaixador (da Argélia no Brasil) colocou meus avós em um carro e os levou até o aeroporto. Como você acha que uma pessoa que cresceu ouvindo essa história vai reagir (ao caso Molina)? Não interessa se ele é de esquerda ou de direita”, disse, referindo-se ao episódio em que um diplomata do país africano ajudou o político brasileiro a fugir do país durante a ditadura, em 1965.

Fonte: Correio Braziliense

Eduardo Campos e Aécio parabenizam Saboia

Aécio afirma que Dilma se curvou a "conveniências ideológicas"

SANTOS (SP) e BRASÍLIA - O governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos, parabenizou ontem o diplomata Eduardo Saboia, que acompanhou o senador boliviano Roger Molina na fuga para o Brasil. Campos, cujo avô, Miguel Arraes, deixou o Brasil no regime militar em condições semelhantes, também defendeu que o caso não seja motivo para um impasse diplomático entre a Bolívia e o Brasil.

- Salvamos uma vida e cumprimos uma tradição que é própria do povo latino e do brasileiro, que é a de abrigar. E isso não deve, de forma alguma, atrapalhar a relação diplomática que o Brasil tem com a Bolívia. Essa é uma causa humanitária - disse Campos.

Campos falou sobre o episódio da fuga de Arraes do Brasil:

- Eu tenho, por dever de consciência e até por homenagem à história do meu avô e ao embaixador que salvou a vida dele e da minha avó, de cumprimentar o diplomata brasileiro que fez isso - disse Campos.

Em nota, o senador Aécio Neves se solidarizou com Eduardo Saboia: "É deplorável, sob todos os aspectos, a atitude tomada pelo governo da presidente Dilma no episódio envolvendo a transferência do senador boliviano. Ao expor à execração pública o diplomata Eduardo Saboia, o governo brasileiro se curva, mais uma vez, a conveniências ideológicas. Mais grave ainda, abandona as melhores tradições da nossa diplomacia", escreveu.

Fonte: O Globo

PPS defende, em nota, que Brasil mantenha asilo a senador da Bolívia

Por: Valéria de Oliveira

O PPS defendeu, em nota divulgada nesta segunda-feira, que o governo brasileiro mantenha o asilo que concedeu ao senador boliviano Roger Pinto Molina. O político estava asilado na embaixada brasileira em La Paz há 15 meses e veio para o Brasil por decisão do encarregado de negócios, que respondia pela embaixada, o diplomata Eduardo Saboia, na última sexta-feira. O político estava com depressão e falava em suicídio, segundo Saboia. A nota do partido é assinada por seu presidente nacional, o deputado federal Roberto Freire (SP). Leia, abaixo, a íntegra do texto.

“Nota pública

O Partido Popular Socialista (PPS) avalia que o governo brasileiro deve manter o asilo que concedeu ao senador da Bolívia Roger Pinto Molina e entende que, embora a forma como ele deixou seu país e foi trazido para o Brasil deva ser esclarecida, o diplomata Eduardo Saboia agiu dentro da premissa da solidariedade humanitária e preocupado com a saúde do senador.

O problema já poderia estar resolvido se o governo da Bolívia não tivesse, de forma abusiva, negado salvo-conduto ao senador nos termos dos tratados internacionais sobre asilo.

Roberto Freire
Presidente nacional do PPS”

Fonte: Portal do PPS

Saboia diz que mostrará e-mails de autoridades brasileiras e bolivianas

Ministro da Justiça pediu médico para examinar senador em Corumbá

Maria Lima

BRASÍLIA - À procura de um advogado para defendê-lo no processo administrativo aberto pelo Itamaraty para avaliar sua conduta, o ex-encarregado de negócios do Brasil na embaixada da Bolívia, ministro Eduardo Saboia, afastado de suas funções por tempo indeterminado, disse ontem estar pronto para enfrentar a batalha e provar que agiu estritamente dentro dos preceitos constitucionais e humanitários.

Certo de que enfrentará uma luta pesada, Saboia disse, entretanto, que usará, em sua defesa, documentos e e-mails trocados com autoridades brasileiras e bolivianas em busca de uma solução para o caso.

- Eu tenho uma defesa dentro do Direito administrativo e constitucional. Estou respaldado. Tenho documentos que comprovam que a situação era de um quadro que ia se agravar ainda mais, com risco iminente de um desfecho ruim. Naquele momento, eu avaliei que (a fuga) era a única ação possível dentro do que prevê a Constituição, que é dever de um servidor público que tem valores - disse Saboia.

Ele assume integralmente a responsabilidade pela operação de fuga do senador boliviano Roger Pinto Molina, asilado há 15 meses na embaixada brasileira em La Paz, e nega que o embaixador Marcel Biato tenha participado do plano.

No sábado à tarde, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ligou para o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, pedindo que o senador boliviano fosse atendido por um médico da rede pública em Corumbá (MS). Um médico da rede municipal de saúde foi ao hotel em que o senador estava, examinou-o e disse que não havia risco de vida. Molina foi liberado para seguir para Brasília de avião.

Saboia se disse confortado com as mensagens de apoio e solidariedade que está recebendo de colegas diplomatas, ex-colegas de trabalho, familiares e brasileiros de todo o país.

- Essas manifestações me alegram muito, me dão conforto e mostram que tenho amigos que comungam dos mesmos valores que eu. É uma sensação boa, mas tenho uma longa luta pela frente. Preciso de muita oração - disse.

Ele não quis fazer comentários sobre a resposta dura da presidente Dilma Rousseff, com a demissão do ministro Antônio Patriota e seu afastamento das funções, para dar satisfação política ao presidente da Bolívia, Evo Morales.

- O meu caso é uma coisa específica. Eu fiz para ajudar uma pessoa, para resolver uma situação concreta e faria tudo de novo por razões humanitárias. Era a única saída que eu tinha - disse o diplomata.

Ele também não quis comentar o fato de a comissão formada pelo governo para investigar a operação de fuga do senador boliviano ser presidida por um auditor fiscal, em vez de diplomatas. O presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que participou da operação de resgate, queria levar Saboia para falar amanhã aos senadores, mas o diplomata acha que será difícil, porque agora fará o que for melhor para sua defesa.

O senador Roger Molina também cancelou uma entrevista coletiva que daria ontem à tarde no Senado, com medo de agravar sua situação perante a crise diplomática e política que se criou. Não se sabe, por exemplo, se haverá um pedido de extradição do senador, considerado fugitivo pelo governo boliviano.

- Eles estão muito assustados e falarão na hora certa. Mas estamos todos certos de que lutamos o bom combate - disse Ferraço. (Colaborou: Eliane Oliveira)

Fonte: O Globo

'Pôr meu filho como bode expiatório seria lamentável', diz pai de diplomata

Gilberto Saboia pede que Dilma faça "uma análise desapaixonada"

Maria Lima

BRASÍLIA - O embaixador aposentado Gilberto Vergne Saboia se diz aflito, mas orgulhoso, de ver o filho no olho do furacão após trazer o senador boliviano Roger Molina para o Brasil. Com uma longa carreira diplomática, inclusive como membro da Comissão de Direito Internacional da ONU, Gilberto Saboia defende como legítima e legal a ação do filho.

Ao comentar as declarações da presidente Dilma Rousseff, Gilberto Saboia disse que entende a reação de Dilma, mas pediu que ela aja de forma "desapaixonada" e entenda os limites entre ética e hierarquia. Ele está indo do Rio, onde mora, para Brasília, onde está o filho, para dar apoio e ajudar na defesa no processo administrativo aberto pelo Itamaraty.

- Pôr meu filho como bode expiatório seria lamentável! Entendo que a presidente está aborrecida, mas peço que faça uma análise desapaixonada de toda essa questão. Que entenda que nada do que foi feito, foi ou será dito tem como alvo seu governo. Eu e meu filho somos altamente disciplinados. Mas respeitar os limites entre a ética e a hierarquia é uma coisa fundamental - disse o embaixador aposentado.

Ele disse que, ao procrastinar uma solução, as autoridades bolivianas acabaram transformando a generosidade do asilo brasileiro em prisão domiciliar do desafeto de Evo Morales:

- Uma autoridade boliviana das grandes chegou a dizer que o senador podia apodrecer na cadeia. E o asilo na embaixada se transformou numa prisão, gerando uma situação de enorme desgaste físico para ele e todos que com ele conviviam.

Sobre o processo que o filho vai enfrentar, além das implicações políticas e da irritação da presidente, Gilberto Saboia pediu cuidado ao Itamaraty:

- Estou ao lado do meu filho. Nem ele nem eu queremos sair atacando. Temos carinho pelo Itamaraty, e o Brasil democrático é uma conquista. Não temos essa visão incendiária e catastrofista. Meu filho vai se defender, e eu vou defendê-lo também. O Itamaraty precisa tomar cuidado, em consonância com a longa tradição de respeito e defesa de seus funcionários.

Eduardo Saboia recebeu apoio de políticos e integrantes da carreira diplomática. "Há muita gente do seu lado", escreveu no título de extensa carta publicada ontem o ex-porta-voz do Itamaraty e da Presidência diplomata Pedro Luís Rodrigues.

"Não há como não reconhecer que era imoral e insustentável a situação do senador boliviano Roger Pinto Molina. Posteriormente à concessão do asilo, o governo boliviano brandiu uma série de acusações contra o asilado, aparentemente para tentar fazer o Brasil modificar sua decisão", diz Rodrigues, na carta.

A carta e as mensagens de diplomatas, colegas da UnB e parentes, que se multiplicam nos últimos dias, foram postadas na página pessoal de Saboia. Também foram criadas uma petição de apoio da ONG Avaaz e uma página de apoio no Facebook.

Familiares também postaram de mensagens de apoio e agradecimento a orações. O filho de Saboia, André, afirmou: "Pai, não se preocupa, todo mundo está te apoiando e de acordo com sua esplêndida e brava atitude. Deus sabe o que faz! Tudo vai dar certo, sem dúvida alguma. Um grande beijo e um forte abraço, te amo. pai!".

Fonte: O Globo

Dilma entrega obra em projeto que Aécio iniciou

Petista comete gafe em Minas ao chamar Marcio Lacerda de 'prefeito de Porto Alegre'

Paulo Peixoto

BELO HORIZONTE - Acusada pelo senador Aécio Neves (PSDB) de "requentar promessas" nas últimas vezes que esteve em Minas, a presidente Dilma Rousseff voltou ao Estado ontem, desta vez para inaugurar um centro cultural que integra projeto idealizado pelo tucano.

O CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), obra de R$ 37 milhões, compõe um projeto "xodó" de Aécio, que começou a sair do papel em sua primeira gestão como governador de Minas (2003-2006).

O Circuito Cultural Praça da Liberdade possui hoje no seu entorno nove espaços culturais, a maioria museus.

Dilma criticou veladamente Aécio: "Acho interessante falar em nós mineiros', porque a ditadura me tirou de Minas. E aí eu fui acolhida no Rio Grande do Sul. Aqui em Minas tem algumas pessoas que dizem que não sou mineira. Agora, lá no Rio Grande do Sul, também as pessoas que não gostam de mim dizem que eu não sou gaúcha".

Um pouco antes, em cerimônia de 2.600 formandos do Pronatec, ela cometeu uma gafe e chamou o prefeito Marcio Lacerda (PSB) de "prefeito de Porto Alegre". Depois, consertou: "Não é, Márcio Lacerda? Sempre que você quiser fazer alguma coisa em Belo Horizonte tem que saber de onde sai o dinheiro?", disse Dilma.

Fonte: Folha de S. Paulo

Em Belo Horizonte, petista saúda 'prefeito de Porto Alegre'

Marcelo Portela

BELO HORIZONTE - Criticada pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), que a acusa de assumir sua "mineiridade" apenas na campanha eleitoral de 2010, a presidente Dilma Rousseff cometeu ontem uma gafe em evento oficial em Belo Horizonte. Ao cumprimentar as autoridades presentes na formatura de 2,6 mil alunos do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), Dilma trocou a capital mineira, onde nasceu, pela gaúcha, onde iniciou sua atividade político-partidária.

"Queria cumprimentar nosso prefeito de Porto Alegre, Marcelo Lacerda", disse, para visível embaraço do chefe do Executivo de Belo Horizonte, filiado ao PSB. Nos mais de 24 minutos do discurso, a presidente não corrigiu o deslize e apenas ao terminar sua fala deu um abraço em Lacerda.

A origem mineira da presidente já rendeu várias trocas de farpas entre ela e Aécio, que governou Minas por dois mandatos e tem no Estado - segundo maior maior colégio eleitoral do Pais -seu principal reduto político. Em evento na segunda-feira, o senador, provável candidato tucano à Presidência em 2014, criticou Dilma por ela ter feito discurso em São João del-Rei na semana passada de costas para uma estátua do avô e ex-presidente Tancredo Neves. "Essa é uma pátria, a pátria mineira, que valoriza símbolos e gestos. Discursar de costas para Tancredo em Minas é discursar de costas para a democracia, a liberdade."

No segundo compromisso em Belo Horizonte, Dilma fez clara referência à fala do tucano: "Em Minas Gerais há algumas pessoas que dizem que eu não sou mineira", disse na inauguração do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) na capital

"Acho interessante falar em "nós mineiros*, porque a ditadura me tirou de Minas Gerais. E aí eu fui acolhida no Rio Grande do Sul", disse, "Sou essa mistura e essa mistura tem um ponto de partida que é essa Praça da Liberdade. Em todos os sentidos (...) Nós soubemos sempre o valor dessa palavra (liberdade)", completou a presidente, pouco depois de dar um passeio a pé pela praça onde está situado o CCBB, No seu discurso, Dilma não citou Aécio.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Para Campos, sair candidato é 'questão de responsabilidade'

Ricardo Chapola, Guilherme Walimberg

O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), disse ontem, em São Paulo, que candi-datar-se à Presidência da República é uma questão de responsabilidade, "Mais do que disposição, eu tenho responsabilidade", afirmou o governador, ao ser questionado por jornalistas sobre sua eventual candidatura " pelo PSB em 2014.

Campos falou pouco antes de gravar sua participação no Programa do Ratinho, do SBT. Durante a entrevista, ele declarou ao apresentador que "falta traquejo político" à presidente Dilma Rousseff para o cargo e que governar "é gesto de humildade, de construir consenso".

"O partido sabe o tamanho da minha disposição", afirmou durante o programa - que não tem ainda data marcada para ir ao ar. Tanto sabe (o PSB) que me elegeu por duas vezes seguidas, por unanimidade, para a presidência". O governador é, atualmente, presidente do PSB, que faz parte da base aliada ao governo Dilma.

Durante a gravação do quadro, o governador disse que o modo de governar da presidente é percebido por prefeitos e governadores, quando estão com ela. "Falta traquejo político e diálogo (a Dilma), o que é percebido pelos prefeitos e governadores. O governo precisa dialogar mais, ter capacidade de ouvir. Governar é gesto de humildade, de construir consenso".

Campos foi convidado a comentar informações divulgadas no final da semana segundo as quais o PSBjáestámobilizan-do suas bases para trabalhar o seu nome como candidato na disputa presidencial do ano que vem. O governador respondeu que vê "com naturalidade" o trabalho realizado por líderes e pela militância de seu partido em torno da causa.

O governador disse considerar "natural que o partido e a base partidária, na medida em que se aproxima a eleição, comecem a intensificar a ação".

Contatos. Antes de gravar a conversa no SBT, o governador de Pernambuco participou de outras duas agendas em São Paulo - que ele visita pela terceira vez em menos de uma semana. Ontem, ele foi ao Congresso Brasileiro de Avicultura, em São Paulo, e depois viajou até Santos, onde participou de um almoço com portuários. A intensificação de agendas no Estado coincide com a divulgação de pesquisas de popularidade e intenção de voto que mostram que ele está estagnado na região.

Antes que o programa começasse a ser gravado, Ratinho disse que muitos telespectadores mandaram cartas pedindo a presença de Eduardo Campos no quadro. Segundo ele, Campos "é o político mais pedido" de sua lista. "É a novidade, né?", comentou o apresentador. "Ele é o mais pedido. A segunda é a presidente Dilma".

Fonte: O Estado de S. Paulo

Campos diz ter disposição para Presidência

Governador sinaliza intenção de disputar cargo em 2014

Silvia Amorim

SÃO PAULO - Ao término de dois dias de uma agenda típica de pré-candidato em São Paulo, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), acenou ontem, pela primeira vez, ter disposição pessoal para disputar a Presidência da República em 2014. Campos, entretanto, deixou claro que qualquer decisão sobre a próxima disputa eleitoral somente será anunciada pelo PSB no início do ano que vem.

- O partido sabe qual o tamanho da minha disposição. Tanto sabe que me conduziu à presidência (da legenda) por duas vezes. A confiança da base partidária eu sei que há e ela sabe qual é a nossa disposição. Agora, mais do que disposição, tem que ter responsabilidade - afirmou Campos, que encerrou a maratona de compromissos em São Paulo com uma gravação para o "Programa do Ratinho", do SBT, por onde já passaram outros potenciais presidenciáveis, como o senador Aécio Neves (PSDB) e a ex-senadora Marina Silva (sem partido).

O governador também disse ser "natural" a mobilização de diretórios regionais do PSB, que já trabalham para fortalecer o nome dele para uma eventual disputa presidencial em 2014.

- É natural que os partidos e a base partidária comecem, à medida que se aproxima a eleição, a intensificar esse debate. Não é só o PSB que está fazendo isso - afirmou.

Nos dois dias em que esteve em São Paulo, Campos reuniu-se a portas fechadas com empresários e discursou em feiras de negócios. Apesar de o PSB participar da base do governo Dilma Rousseff, ele fez críticas à atual gestão. Em entrevista ao "Programa do Ratinho", ainda sem data confirmada para ser exibida, o governador disse que a presidente não tem "traquejo político" e cobrou "humildade" do governo.

- Acho que muitas vezes a falta de traquejo político e de diálogo é percebida claramente pelos prefeitos e governadores. Acho que o governo precisa dialogar mais e ter mais humildade - criticou.

Fonte: O Globo

Relatora abre mão de processo do Rede

Por Raphael Di Cunto

BRASÍLIA - Escolhida na segunda-feira para relatar o processo de registro do Rede Sustentabilidade no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a ministra Laurita Vaz pediu ontem que o processo seja redistribuído por sorteio para um novo relator. A troca atrasa um pouco mais a criação da legenda, que pretende lançar a ex-senadora Marina Silva como candidata à Presidência em 2014.

Laurita é corregedora-geral da Justiça Eleitoral e foi escolhida relatora por já ter analisado outro requerimento do partido, que pediu à ministra que autuasse as instâncias regionais e cartórios eleitorais que, segundo o Rede, estariam descumprindo os prazos para certificação das assinaturas de apoio à fundação da legenda.

Ao justificar a mudança na relatoria, a ministra disse que não há conexão entre os dois processos e, por isso, não existiria razão para ser nomeada relatora sem participar de sorteio. "A prevalecer tal orientação, ter-se-ia que a mera postulação prévia para que seja determinada a verificação do cumprimento por um único cartório eleitoral do interior do país de prazos previstos na norma de regência da criação de novas siglas partidárias, a desafiar o exercício do poder correcional, geraria, sob a ótica enunciada, a distribuição por dependência do processo de registro da legenda, o que, a toda evidência, traduz grave lesão ao mesmo princípio do juiz natural", afirmou.

O requerimento de reclamação do Rede sobre a demora dos cartórios gerou um mal-estar recente no TSE. Laurita reuniu-se no dia 16 com Marina Silva para ouvir queixas sobre os atrasos na análise das fichas de apoio à legenda. Diante da reclamação, questionou tribunais eleitorais de nove Estados, e ouviu deles que as críticas, na maior parte dos casos, eram improcedentes.

Ministros do TSE têm reclamado nos bastidores da tentativa do Rede de jogar para o Tribunal a culpa se o partido não for registrado a tempo de concorrer nas eleições de 2014 - para isso, a fundação da legenda teria que ser aprovada até 5 de outubro deste ano. Entendem que o partido quer pressioná-los a aceitar o registro mesmo com assinaturas insuficientes - até agora só foram validadas 305 mil das 492 mil necessárias.

Ontem, o Rede soltou nota na qual rechaça as acusações de que teria pedido ao TSE que abrisse exceções: "A #rede não pede favorecimento, mas apenas o cumprimento da legislação eleitoral".

Fonte: Valor Econômico

Rede pede 'inovação' ao TSE, diz advogado

Responsável pelo pedido de registro do partido de Marina Silva defende rito expresso de validação de assinaturas

Especialistas em direito eleitoral consideram medida incomum; corregedora é mantida na relatoria do caso

Ranier Bragon

BRASÍLIA - O ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral Torquato Jardim afirmou ontem que a Rede Sustentabilidade, partido que Marina Silva tenta criar para concorrer ao Planalto, não pode ser vítima de falhas na Justiça Eleitoral.

Jardim é o principal responsável pelo pedido de registro da Rede, entregue anteontem ao TSE. Ele nega que a peça tenha o objetivo de afrouxar as regras eleitorais para criar a Rede a tempo.

A intenção de Marina de concorrer pela Rede só será possível caso a sigla esteja aprovada pelo TSE até o dia 5 de outubro. "Acredito que a sinceridade do projeto da Marina repercutirá na resposta do tribunal", disse Jardim.

Devido ao prazo limite, a Rede ingressou com o pedido no TSE antes de ter o mínimo de assinaturas de apoio (são exigidas 492 mil, mas só há certificação de 304 mil) e a aprovação em ao menos nove tribunais regionais (a Rede só tem uma até agora).

Sob o argumento de que os cartórios eleitorais estão descumprindo o prazo legal de validação das assinaturas, de 15 dias, o partido quer que o TSE obrigue os cartórios a certificar os nomes mesmo que não haja a conferência da veracidade dos dados, apenas por meio da publicação das listas. As assinaturas não questionadas seriam, assim, automaticamente validadas.

Jardim reconhece que a tese, se aceita, representará uma inovação. "Mas é uma inovação que não fere a lei. E há precedentes", diz ele.

Ontem, a assessoria do partido também soltou uma nota negando que esteja pleiteando tratamento privilegiado ou afrouxamento da lei.

Advogados e ministros do TSE ouvidos pela Folha disseram considerar o pedido inusual, por abrir brecha para fraudes: "Isso não tem fundamento. A conferência de assinaturas não é um faz de conta, senão passa apoio de Batman, do Robin Hood", afirma o professor da UnB Tarcísio Vieira de Carvalho Neto.

Torquato Jardim afirma que possíveis irregularidades podem ser investigadas e, caso sejam comprovadas, levem à cassação do registro da Rede.

A ação da Rede foi publicado ontem pelo TSE. O plenário manteve a ministra Laurita Vaz como relatora do processo. Antes, ela havia tentado deixar a relatoria do caso, pediu que a matéria fosse sorteada, mas, por ser a corregedora-geral eleitoral, terá de analisar um pedido de providência apresentado pela Rede, de acordo com a presidente do tribunal, Cármen Lúcia.

Fonte: Folha de S. Paulo

Centrais sindicais atravessam crise de representatividade

Preparando mais uma paralisação geral no dia 30, pulverização do movimento sindical diminui seu poder e sindicatos são utilizados como trampolim político. Sindicalista vê relação como PT ruim para os trabalhadores

André Pires

Pela segunda vez desde que a população brasileira decidiu se mobilizar nas ruas por um país melhor, as centrais sindicais preparam uma paralisação geral para defender uma pauta trabalhista. Depois da pequena repercussão do ato do dia 11 de julho, os sindicalistas querem provocar um impacto maior na sexta-feira, dia 30, com o Dia Nacional de Mobilização e Luta. No entanto, mais uma vez a adesão parece longe do esperado pelos dirigentes. A crise de representatividade pelas instituições sindicais é cada vez mais evidente.

Entre os próprios líderes há divergências de ideias e uma aliança considerada perigosa com partidos políticos. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), há 12 centrais sindicais com registro efetivo, reunindo 7.643 sindicatos filiados. No fim de 2012, mais de 15 mil sindicatos tinham seu registro ativo junto ao MTE. Ou seja, muitos não tem relação com alguma central. Apesar dessa pulverização, o controle fica nas mãos de poucos: a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e a Força Sindical representam 51% dos sindicatos. “Acredito que seria melhor ter uma central só para reunir as pautas trabalhistas, mas a vida não é como a gente quer.

Para superar isso criamos os fóruns das centrais, que buscam uma unidade para grandes atos, como no próximo dia 30”, comenta Wagner Gomes, líder da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil). Dois grandes problemas atingem o movimento sindical, a relação íntima das centrais com partidos políticos, como sempre existiu na história dessas entidades no Brasil, e a criação de sindicatos “fachadas” para abocanhar as verbas sindicais dadas pelo governo.

A primeira crise é evidenciada em todos os encontros das centrais. A CUT, que conta com os líderes ligados ao PT, procura sempre amenizar as críticas ao governo federal, o que irrita as outras centrais, algumas delas ligadas a partidos de extrema esquerda. “O governo do PT levou algumas centrais a deixar de representar os trabalhadores. Elas são muito ligadas ao governo e dependem do financiamento do estado.

Com isso, não colocam o real peso que a reivindicação deveria ter. A central precisa escolher um lado”, critica Zé Maria, presidente da CSP/ Conlutas, que é ligada ao PSTU. A criação de sindicatos tem sido combatida pelo governo com mais normas restritivas. No entanto, os sindicatos continuam sendo um trampolim político para os dirigentes.

Candidaturas de líderes sindicais ganham força a cada eleição. “Eles conseguem a representatividade política pagando uma campanha caríssima. Eles não representam os trabalhadores, mas possuem um poder econômico decisivo para a eleição com a verba sindical”, enfatiza Paulo Baía, cientista político da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Pulverização de centrais

CUT-Central Única dos Trabalhadores: É a maior central sindical e reúne 2.247 sindicatos. O atual presidente é Vagner Freitas. Tem uma relação histórica com o PT e procura amenizar as críticas ao governo Dilma Rousseff.

Força Sindical: Presidida pelo deputado federal Paulo Pereira, a Força Sindical tem uma relação próxima com o PDT, mas recebe o assédio de vários partidos, como o PSB. Reúne 1.676 sindicatos.

NCST-Nova Central Sindical de Trabalhadores: Com 1.078 sindicatos filiados, representa apenas 8,1% dos trabalhadores. É considerada uma central ligada ao poder, apoiando sempre o governo.

UGT- União Geral dos Trabalhadores: Os líderes estão todos ligados ao PSD e o presidente Ricardo Patah prepara sua candidatura.

CTB-Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil: Com 678 sindicatos, não esconde sua relação com o PCdoB, que tem banner em seu site.

CSP/Conlutas: Cresce com o discurso de ser o oposto da CUT e é liderada pelo PSTU, que participou das manifestações.

CGTB-Central Geral dos Trabalhadores do Brasil: Vive uma crise interna de briga entre os dirigentes. Ligada ao PMDB, reúne apenas 282 sindicatos pelo Brasil.

Fonte: Brasil Econômico

Resíduo autoritário - Almir Pazzianotto Pinto

A presidente Dilma pôs em pauta tema que se acha latente há anos: a reforma política. Reformas não nos têm faltado. A última ocorreu em 1988, com a promulgação da "Constituição Coragem", como a denominou o dr. Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte. Antes tivemos as Constituições de 1967,1946, 1937, 1934 e 1891, para não falarmos na de 1824, que dom Pedro I, imperador constitucional, jurou e fez jurar como primeira lei orgânica nacional.

Em 191 anos de vida soberana, o Brasil experimentou sete radicais transformações na estrutura política, além de outras de menor porte, como a mudança do presidencialismo para o parlamentarismo, pela Emenda 4/1961 à Constituição de 1946, e o retomo ao presidencialismo um ano e quatro meses depois, com a Emenda 6/63.

Como parte interessada, proponho que a reforma política se inicie pela Lei 9.096/95, que trata dos partidos, com a extinção do Fundo Partidário. Partidos políticos, como empresas, fundações, associações civis e organizações religiosas, são pessoas jurídicas de direito privado, inconfundíveis com pessoas jurídicas de direito público. Temos 30 registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e um pedido de registro em andamento. O Fundo Partidário é integrado por multas aplicadas pela Justiça Eleitoral, recursos financeiros que lhes forem destinados por lei, doações de pessoas físicas e jurídicas e dotações orçamentárias da União, "em valor nunca inferior, a cada ano, ao número de eleitores inscritos em 31 de dezembro do ano anterior ao da proposta orçamentária, multiplicados por trinta e cinco centavos de real, em valores de 1995" (artigo 38).

A Constituição atual assegura liberdade de fundação, fusão, incorporação e extinção de partidos, princípio do qual se valem políticos oportunistas e carreiristas para criar legendas artificiais mantidas pelo contribuinte.

Não bastasse o inesgotável Fundo Partidário, contam os partidos com acesso gratuito ao rádio e à televisão. Gratuito para eles, não para quem recolhe impostos, eis que as emissoras "terão direito à compensação fiscal pela cedência do horário gratuito previsto nesta , Lei" (artigo 51, parágrafo único, da Lei 9.096/95). Em outras palavras, dinheiro arrecadado pelo governo, por meio, por exemplo, do Imposto de Renda, não reverterá em benefício dos contribuintes, pessoas físicas oujurídicas; mas se destinará à remuneração de horários falsamente gratuitos, para que dirigentes partidários formulem promessas maçantes em que ninguém acredita. Os benefícios legais não cessam aí, pois ainda têm assegurado "o direito à utilização gratuita de escolas públicas ou Casas Legislativas para a realização das suas reuniões ou convenções" (artigo 51).

Diversos partidos são braços políticos de centrais sindicais e organizações religiosas. Centrais alimentadas com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e contribuições pagas, compulsoria-mente, por trabalhadores que se limitam a exercer o direito de não se sindicalizar.

À erradicação do Fundo Partidário e do horário dito gratuito de rádio e televisão exercerá papel saneador. Sobreviverão,,com recursos próprios, unicamente agremiações que atraiam para as respectivas fileiras pessoas dispostas a sustentá-las com mensalidades, doações e serviços.

O fundo é produto do regime militar. Surgiu com a Lei n.° 4.740/1965, sancionada pelo presidente Castelo Branco, foi mantido pela Lei n.° 5.682/1971, do governo Médici, e se conserva na legislação vigente. Partidos fortes, como UDN, PSD, PTB, PDC, PL, PR, arbitrariamente extintos pelo Ato Instituciopaln.0 2/1965, jamais se alimentaram com recursos da União; eram fundados, instalados, mantidos, desenvolviam campanhas, estavam presentes nos Poderes Legislativos e Executivos, federais, estaduais e municipais, graças a dotações voluntárias de filiados e simpatizantes.

A presença de dinheiro público transformou o TSE numa espécie de grande organização contábil, com ramificações estaduais. Além de atividades jurisdicionais, a Justiça Eleitoral encontra-se compelida a exercer tarefas de auditoria, fiscalizando balanços, movimentações e aplicações financeiras, doações, e a manter conta especial no Banco do Brasil, onde serão depositados, mensalmente, os duodécimos devidos aos partidos pelo Tesouro.

Pessoas jurídicas de direito privado, aos partidos não se permite agirem como tal, padecendo restrições que resultam dos vínculos com a União por meio do Fundo Partidário. Os recursos dele provenientes têm destinação fixada pela lei (artigo 44), e se sujeitam à investigação da Justiça Eleitoral.

Quais os relevantes motivos que fazem do contribuinte financiador de campanhas de candidatos a presidente da República, governador de Estado, senador, deputado federal e estadual, prefeito e vereador, escolhidos pelas cúpulas ou autonomeados? Com o dinheiro dos impostos são sustentados partidos cujos representantes se revelam descomprometidos com a verdade, a retidão, a fidelidade e alimentadas campanhas arquitetadas por conhecidos, e bem remunerados, marqueteiros, cuja tarefa consiste em elaborar programas e imagens falsas, que se harmonizem com as esperanças do eleitorado.

Se o governo se sensibiliza pelas mensagens emitidas pelo povo nas ruas, pode começar as reformas revendo a Lei 9.096/95, que dispõe sobre partidos políticos. E na onda das reformas, que tal consultar a população, em plebiscito, sobre se está disposta a alimentar, com os impostos que religiosamente paga, o Fundo Partidário, sustentar o horário eleitoral obrigatório e financiar campanhas eleitorais?

Pergunta simples. Pode ser respondida com sim ou não.

*Advogado, foi Ministro do Trabalho e Presidente do Tribunal Superior do Trabalho

Fonte: O Estado de S. Paulo

Em defesa de Joaquim Barbosa - Marco Antonio Villa

A discussão proposta por Lewandowski era procrastinatória. O presidente do Supremo manteve a dignidade

O ministro Joaquim Barbosa virou a bola da vez. Nas últimas semanas, foi atacado simplesmente por desejar que a ação penal 470 siga o trâmite legal e, finalmente, o processo seja concluído e os sentenciados cumpram as penas.

O principal réu é o "consultor" José Dirceu. Foi condenado a dez anos e dez meses de prisão por formação de quadrilha e corrupção ativa, além do pagamento de multa.

O inquérito 2.245 teve início em julho de 2005 e recebido pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2007: foi a primeira derrota dos mensaleiros. Na sessão de 28 de agosto, Ricardo Lewandowski foi o único voto contrário pelo enquadramento de Dirceu por formação de quadrilha. À noite, de acordo com reportagem publicada por esta Folha, foi visto falando ao telefone, em um restaurante de Brasília, com um certo Marcelo. Estava nervoso.

Disse que "a tendência era para amaciar para o Dirceu". E "que todo mundo votou com a faca no pescoço". Das 112 votações para o recebimento do processo, Barbosa ganhou todas, das quais 96 por unanimidade. As divergências abertas por Lewandowski foram todas derrotadas.

De agosto de 2007 até dezembro de 2011, sob a relatoria de Barbosa foram ouvidas mais de 600 testemunhas, realizadas dezenas de perícias. Todo o processo ficou registrado em 235 volumes, 500 apensos, somando um total de 50.508 páginas. Foi o processo mais complexo da história da Corte. E durante 51 meses da instrução, o governo tentou de todas as formas emparedá-lo. E não conseguiu.

O árduo trabalho do ministro foi sistematicamente atacado. Era uma estratégia para desmoralizar o relator e, por tabela, a ação penal, garantindo a absolvição dos réus, especialmente a do chefe da quadrilha, José Dirceu.

Até a carreira profissional do ministro foi motivo para tentar diminuí-lo. Dizia-se que só teria chegado ao STF porque Lula quis indicar um negro. E que --veja o "racismo cordial"-- ele era um mal-agradecido, pois devia ao presidente ter alcançado posição tão importante.

Com enorme sacrifício pessoal, o ministro concluiu seu trabalho em dezembro de 2011. O processo foi encaminhado para o revisor, Ricardo Lewandowski. Parou na sua mesa. Só andou, seis meses depois, graças ao pito que tomou do então presidente Ayres Britto, que marcou o início do julgamento para 2 de agosto.

Depois de 138 dias, 53 sessões, o processo foi concluído em 17 de dezembro de 2012, tendo o ministro Barbosa acumulado a presidência e a relatoria. Foi um feito histórico a condenação dos 25 réus e dos marginais do poder, na feliz expressão do ministro Celso de Mello. A direção petista foi sentenciada por formação de quadrilha, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.

A justiça foi feita. Mas faltava apreciar os embargos. Recomeçaram os ataques. E foram mais sete meses de uma campanha sistemática de desmoralização do relator. Um dos sentenciados --José Dirceu-- percorreu o Brasil atacando a Suprema Corte com ampla cobertura da imprensa.

No último dia 14, teve início a apreciação dos recursos. A discussão proposta pelo ministro Lewandowski na sessão do dia 15 era absolutamente impertinente e procrastinatória. Como se chama esse procedimento? Chicana. Novamente o coro petista entrou em ação: passou a exigir a retratação do relator. Barbosa recusou. Manteve a dignidade. Chamou a atenção nacional novamente para o processo.

Mas os mensaleiros não desistem. Querem reabrir o processo com o golpe dos embargos infringentes, que foram abolidos pela lei nº 8.038 de 1990. Essa será a batalha decisiva.

Marco Antonio Villa, 58, historiador, é autor de "Mensalão, o Julgamento do Maior Caso de Corrupção da História Política Brasileira" (LeYa)

Fonte: Folha de S. Paulo

A Rede de Marina - Merval Pereira

Não é à toa que a ex-senadora Marina Silva aparece nas pesquisas de opinião como uma possível adversária direta da presidente Dilma na eleição de 2014, podendo chegar ao segundo turno e até vencer. Ao se recusar a prosseguir no jogo partidário que estava montado em 2010, mesmo após ter recebido quase 20 milhões de votos na eleição presidencial, ela estava antevendo este movimento autônomo das ruas que rejeita as formas tradicionais de fazer política que dominam até mesmo o Partido Verde, que ela tentou levar para o caminho original e não conseguiu.

Também não foi um acaso ela chamar seu novo partido de Rede, foi por estar conectada com essa nova onda de movimentos sociais em rede, que o sociólogo Manuel Castells, talvez o maior estudioso desse fenômeno, chama de autocomunicação de massas, "plataforma tecnológica da cultura da autonomia". Em seu novo livro, "Redes de indignação e esperança", lançado no Brasil pela Zahar, Castells diz que, a partir dessa autonomia, as críticas e os sonhos do movimento se estendem à maior parte da sociedade.

Marina não pretende que seu partido domine os movimentos sociais, nem ser a representante desses movimentos no poder. Ela quer tentar mudar a maneira de fazer política em busca de um projeto de país, e não de poder, e para tanto espera refletir na realidade política brasileira os anseios desses movimentos sociais que estão nas ruas.

Ela não acredita que somente com a fisiologia se consiga montar uma base partidária de apoio ao governo e, confrontada com a realidade política do país, fala em uma "imprevisibilidade positiva", a esperar que o novo Congresso a ser eleito em 2014 também reflita os anseios desta nova sociedade que surgiu e mostrou-se nas ruas nos últimos dias.

Sem querer se dar ares de pitonisa, ela diz que já havia aventado a hipótese de que esses movimentos ocorreriam no Brasil, a exemplo do que ocorre no mundo, e está feliz que tenha começado a montar sua Rede bem antes de esses movimentos se materializarem, "porque poderia parecer oportunismo". Mas está se defrontando com a burocracia, com realidades políticas que talvez a impeçam de concretizar seu partido. Ela esclarece que o movimento de apresentar o pedido de inscrição da Rede ao TSE mesmo sem o número mínimo de assinaturas validadas pela Justiça Eleitoral é só um modo de chamar a atenção para as dificuldades burocráticas que vem encontrando, não um pedido de privilégios.

Os organizadores da Rede dizem que vários cartórios estão levando mais de 15 dias, prazo estipulado pela lei, para analisar as assinaturas. E milhares delas são rejeitadas sem explicações oficiais. Há também uma dificuldade para comparar assinaturas com as folhas de votação na última eleição, pois muitos jovens e idosos apoiam o novo partido, mas não votaram. Os cartórios simplesmente estão invalidando essas assinaturas. O Rede quer que essas assinaturas impugnadas sejam divulgadas e, se não houver contestação do eleitor envolvido, sejam aprovadas, como determina a lei.

Marina se recusa a discutir um plano B, pois entende que, como seu novo partido não existe apenas no papel, e não foi criado para ganhar espaço no Ministério do governo atual, mas é fruto da mobilização de cidadãos, o TSE dará a aprovação para o funcionamento.

Castells, na parte do livro sobre as manifestações de junho no Brasil, diz que "Marina é a exceção entre os políticos", está conectada aos novos anseios da população. Para ele, "os movimentos sociais em rede vão continuar a lutar, debater, evoluir e, por fim, a se dissolver em suas atuais condições de existência, como aconteceu com todos os movimentos sociais na História".

Mesmo no caso improvável de se transformarem num ator político, num partido ou em alguma forma nova de agência, deixarão, por isso mesmo, de existir, analisa Castells, para quem "é muito cedo para avaliarmos o resultado final desses movimentos, embora já possamos dizer que regimes mudaram, instituições foram desafiadas, e a crença no capitalismo financeiro global triunfante foi abalada, possivelmente de maneira irreversível, na mente da maioria das pessoas".

Nesse mundo novo que as gerações mais jovens veem como seu, "o que é irreversível no Brasil e no mundo é o empoderamento dos cidadãos, sua autonomia comunicativa e a consciência dos jovens de que tudo o que sabemos do futuro é que eles o farão. Mobilizados". É essa nova forma de atuar na política que Marina persegue.

Fonte: O Globo

Elogio ao arbítrio - Dora Kramer

Ninguém discute a necessidade de mais médicos, mais equipamentos, mais hospitais, mais postos de saúde, mais qualidade, mais tudo no serviço público de atendimento à saúde da população.

Bem como é indiscutível que, em princípio, a ideia de um programa que atraía profissionais para as áreas carentes do País tenha o apoio imediato de quem mais precisa: a maioria. Inadmissível também a reação desaforada de "manifestantes" médicos brasileiros contra os colegas estrangeiros, cuja culpa é nenhuma nesse cartório.

Mais que questionável, porém, é o fato de, no caso dos cubanos, o governo aceitar a submissão de regras restritivas de liberdade (o direito a asilo, à livre circulação pelas cidades) em território nacional, impostas por outro País. Uma ditadura, o único regime, aliás, em que o Estado controla de modo absoluto a vida do cidadão.

Inaceitável, sob qualquer ângulo que se examine a questão, é que haja estrangeiros no Brasil autorizados aviver ao arrepio da nossa Constituição. Nela, está dito que todos são iguais perante a lei. E a lei maior consagra o princípio da liberdade, da garantia aos direitos individuais e coletivos. Entre eles condições iguais de trabalho e remuneração para funções semelhantes.

Hoje a discriminação e a arbitrariedade são aceitas em relação aos médicos cubanos. Amanhã poderá ser aceito o mesmo para profissionais arregimentados para trabalhar em outros setores carentes - por que não mais juizes, mais professores, mais policiais? - que venham de países igualmente autorizados pelo Estado brasileiro a impor suas regras, ainda que colidam com as nossas.

Por essa lógica de que a necessidade tudo justifica, depois de amanhã, se alguém tiver uma brilhante, mas completamente ilegal proposta para resolver as mazelas do Brasil, será merecedor de aplausos pelos fins benéficos não obstante os prejuízos causados pelos meios.

Expiatório. O desfecho do caso do senador Roger Pinto Molina, refugiado na Embaixada brasileira em La Paz há um ano e três meses, transitou pela via torta da quebra de hierarquia, é verdade.

Mas isso só aconteceu porque, de um lado, o governo boliviano recusava-se a cumprir tratado internacional que obriga à concessão de salvo-conduto aos beneficiários de asilo concedido e, de outro, Brasília se mantinha indiferente à situação.

O gesto do diplomata Eduardo Saboia, que assumiu a decisão de trazer o parlamentar ao Brasil embora a história ainda pareça mal contada, resolveu três problemas.

Primeiro, pôs fim à agonia vivida na Embaixada devida, entre outras circunstâncias, ao estado de saúde de Roger Pinto; segundo, ofereceu à presidente Dilma Rousseff um pretexto para afastar o chanceler que há muito não era santo de sua devoção; terceiro, rendeu a Antonio Patriota a transferência para o cargo de embaixador da ONU, muito mais confortável que a fogueira em que se encontrava sentado na Esplanada dos Ministérios.

Demorou. A ex-senadora Marina Silva tem razão quando argumenta que o proj eto de criação da Rede Sustentabilidade não pode "pagar o preço" pela lentidão da Justiça Eleitoral na validação das assinaturas exigidas para criação do partido.

Mas o Tribunal Superior Eleitoral também não está disposto a "pagar o preço" de abrir qualquer exceção à regra legal em decorrência da pressão.

Candidata a presidente pelo PV em 2010, Marina saiu do partido em julho de 2011, decidiu criar uma nova legenda em meados de novembro passado e começou a execução do projeto há seis meses, em fevereiro.

Fonte: O Estado de S. Paulo

O partido de Marina - Fernando Rodrigues

Há, hoje, 30 partidos no Brasil. Nenhum deles requereu o que a ex-senadora Marina Silva pede ao Tribunal Superior Eleitoral. Não que Marina esteja errada. Trata-se apenas de um caminho novo.

Para serem legalizados, os partidos têm de coletar um número de assinaturas equivalente a 0,5% dos votos de deputado federal em todo o país --hoje, quase 500 mil apoios. Em seguida, é preciso validar essas assinaturas em cartórios eleitorais. Por fim, deve ser obtida a homologação do registro em pelo menos nove Estados. Só em seguida dá-se entrada com toda a documentação no TSE.

Houve uma exceção recente. Gilberto Kassab e seu PSD já estavam com as assinaturas validadas e tinham os deferimentos em mais de nove Estados. Por causa da greve do Judiciário à época, o ex-prefeito paulistano não conseguiu entregar o material físico ao TSE no dia do pedido de registro. Mas as assinaturas estavam coletadas, devidamente validadas e foram entregues em seguida, em menos de duas semanas.

No caso de Marina Silva, trata-se de uma situação diversa. As assinaturas ainda não estão validadas. A ex-senadora, por consequência, também não tem a homologação da sua Rede Sustentabilidade em pelo menos nove unidades da Federação.

Marina argumenta que cartórios estão excedendo o prazo de 15 dias estabelecido em lei para validar assinaturas. Dessa forma, quer uma certificação por meio de edital: publicam-se os nomes e, se ninguém reclamar, está tudo certo. É uma possibilidade e uma novidade na formação de agremiações políticas.

A pressa se dá pela proximidade do dia 5 de outubro. Sem o registro da Rede até lá, Marina fica sem sua nova sigla para disputar a eleição em 2014. Se a decisão for favorável à ex-senadora, uma janela de oportunidade se abre. No futuro, grupos diversos poderão pedir na última hora o registro de novos partidos. Como o TSE poderá dizer não?

Fonte: Folha de S. Paulo

Balanceamento e alinhamento - Denise Rothenburg

O episódio da fuga do senador boliviano com a ajuda de autoridades brasileiras volta a afinar as posições entre Aécio Neves e Eduardo Campos. A primeira foi em torno das propostas sobre um novo pacto federativo

A palavra constrangimento definiu o dia de ontem no governo federal e fora dele. Seja na relação entre Itamaraty e Dilma Rousseff e o governo boliviano — por causa da fuga do senador Roger Pinto Molina —, seja entre PT e PMDB. Mas além disso, houve algo que calou fundo a base governista como um todo. O fato de Aécio Neves e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, terem mais ou menos a mesma posição em relação à crise com a Bolívia.

Para você que não leu tudo a respeito até aqui, vale registrar as posições de ontem. O governo brasileiro se mostrou constrangido em relação aos bolivianos e deu uma série de explicações. Embora as declarações da presidente Dilma a respeito do fato tenham sido fortes no sentido de preservar a relação com a Bolívia e servir de contraponto ao embaixador Eduardo Saboia, o envio do ex-ministro Antonio Patriota como futuro representante do Brasil na Organização das Nações Unidas (ONU) foi visto por muitos como “cair para cima”. Patriota vai morar em Nova York, em um posto altamente cobiçado pelos diplomatas e, de quebra, ficará livre da rispidez com que a presidente Dilma muitas vezes trata seus ministros. Ou seja, houve um “balanceamento” da resposta.

Politicamente, entretanto, os petistas ficaram assustados. Não por conta da crise em si, mas pelo quase alinhamento entre as opiniões do senador Aécio Neves (PSDB-MG) e do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do PSB. Os dois pré-candidatos a presidente da República contra Dilma Rousseff defenderam a atitude do embaixador Eduardo Saboia de ajudar o senador Roger Molina a deixar o país. Assim, os dois terminaram por transformar Dilma na posição oposta. Daqui para frente, os petistas vão anotar tim-tim por tim-tim o que dizem os dois adversários. Afinal é assim que hoje muitos deles se referem a Eduardo Campos.

Por falar em Eduardo e Aécio…
Não é a primeira vez que o tucano e o socialista têm posições semelhantes. Eles têm ideias parecidas, por exemplo, no que se refere à necessidade de um novo pacto federativo, com descentralização e valorização dos estados. Se essa identidade de pensamento e empatia continuar nesse ritmo, não dá para descartar um alinhamento entre eles mais à frente.

O PT já percebeu que os dois têm caminhado juntos em várias situações e olha com um certo ar de ciúmes para as conversas do PSB com o PSDB, especialmente, em São Paulo, onde a tendência é Geraldo Alckmin receber os dois em seu palanque pela reeleição ao governo do estado.

Nesse sentido, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), candidato a presidente do PT contra Rui Falcão, não se esquece de repetir que foi um erro o PT deixar de lado partidos como o PSB, o PDT e o PCdoB e priorizar a relação com o PMDB. Ele defende que essa aliança deve ser feita em bases mais republicanas, tirando um pouco o toma-lá-dá-cá. O problema é que o tempo vai passando e não resta outra saída ao PT que não se jogar nos braços dos peemedebistas.

Para que se entenda mais ou menos o que se passa entre PMDB e PT de um lado e PSB, PCdoB e PDT de outro, basta comparar a situação a uma relação conjugal. O PT tinha um casamento bom com os partidos menores. De repente, surge o PMDB com aquele corpão, a ampla base. Os petistas se deixaram envolver. Agora, estão na seguinte situação. O PSB se cansou e foi cuidar da vida. Hoje está repleto de pretendentes. E o PT não tem saída senão dar ao PMDB tudo o que seus líderes desejam. E os petistas estão para lá de incomodados com essa situação.

Enquanto isso, no DEM…
O líder do partido, Ronaldo Caiado (DEM-GO), já declarou apoio a Eduardo Campos e não descarta sequer levar o tema à convenção nacional do partido que for decidir o candidato a presidente da legenda. Afirma que já tem seis estados nessa direção. Ocorre que, hoje, a posição majoritária do Democratas é pró-Aécio. Vale a pena observar como andará o partido de Caiado daqui para frente.

Fonte: Correio Braziliense

É só uma esmolinha para os irmãos Castro - José Neumanne

Como se trata de assunto que interessa e de certa forma pode pôr em risco a vida de milhões de brasileiros pobres, convém esclarecer de vez os pontos obscuros do programa intitulado Mais Médicos, com o qual o governo federal propõe pôr fim às falhas do atendimento de saúde pública no País.

O primeiro ponto a ser esclarecido diz respeito à parte que esses profissionais têm nas deficiências e carências dos hospitais sustentados por dinheiro do contribuinte. As associações de classe e os conselhos que regulam o exercício da profissão, que de fato exige muita perícia e ética, prestariam um bom serviço à categoria se reconhecessem sua parcela de culpa, que é óbvia e grave, particularmente na questão do atendimento precário, na lastimável situação geral. Ao concentrarem todos os seus esforços no combate ao desembarque massivo de colegas vindos do exterior, conselhos e associações dão ao governo - e, sobretudo, ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, evidentemente de olho na colheita de votos na eleição estadual paulista no ano que vem - a oportunosa ensancha de atribuir à categoria mero interesse corporativista.

Profissionais da medicina têm o excelente argumento de tentar fugir de periferias de metrópoles brasileiras por culpa do risco de morte que podem sofrer ao tentar salvar vidas de gente carente nos bairros populares. Mas ele não vale para regiões inóspitas na Amazônia ou no sertão nordestino. Se é possível ao governo garantir o atendimento dos pobres que moram nesses ermos com estrangeiros capacitados a preencher tais lacunas, não fazê-lo por reserva xenófoba de mercado profissional chega a ser um atentado contra o direito de todo brasileiro à cura e à vida.

Só há dois argumentos irrespondíveis a essa tentativa. O primeiro será preencher as vagas com brasileiros, mas, infelizmente, não há mão de obra capacitada disponível para tanto. O outro, assegurar a quem já tem acesso ao atendimento na rede pública um serviço minimamente decente.

O segundo argumento não resolve o problema de quem não tem acesso a consultórios e ambulatórios, inexistentes nos confins do interior deste país continental. Mas ao menos limpa a imagem da categoria, aplicando-lhe uma demão de dignidade ética, regida pelo juramento que reproduz as palavras do grego Hipócrates, renegado na prática comum, particularmente quando o cliente não pode arcar com o pagamento das consultas. Infelizmente, não são incomuns os exemplos de preguiça, arrogância e, às vezes, até intolerância da parte de quem tem por obrigação zelar por um convívio respeitoso e harmonioso com uma clientelajá tão maltratada pelas dificuldades de sua vida.

Pode-se argumentar, e com razão, que os casos de desídia e estupidez na relação médico-paciente, mesmo nos prontos-socorros das regiões mais carentes, não são habituais. Mas, mesmo sendo a frequência inferior aos exemplos de abnegação, convém que as entidades representativas do ofício fiscalizem com menos corporativismo e mais imparcialidade e rigor as exceções, para que estas confirmem a boa regra.

Reconheça-se que a falta dessa prática não justifica a esperteza amoral com que o governo federal - presente até nos pronunciamentos da presidente da República - tenta transferir para os médicos, e apenas para eles, todas as graves mazelas do péssimo atendimento nos hospitais públicos brasileiros. Na rede destes falta muito de tudo: equipamentos, medicamentos e pessoal paramédico preparado para o tranco de um dia a dia pesado. Mas os gestores do Estado - do legislador municipal à chefe do governo federal, sem esquecer as instâncias estaduais - estão a anos-luz do paciente pobre forçado a esperar meses a fio por uma consulta e tempo demais para ser salvo por uma cirurgia. Inculpar apenas quem tem contato direto com o doente é covarde e desumano.

Desde junho, quando as multidões clamaram por hospitais a um governo que construía arenas esportivas de "padrão Fifa", Dilma Rousseff tem ido e voltado, proposto e recuado, em pronunciamentos públicos, providências que se referem exclusivamente à interface pessoal do sistema. A ideia de obrigar recém-formados num curso de seis anos a trabalhar mais dois para o Sistema Único de Saúde (SUS) foi um absurdo exemplo desse viés.

O programa Mais Médicos é outro. Aforma como se importam 4 mil cubanos para atender brasileiros pobres nos ermos incorpora riscos. Não se trata de uma contratação, mas de uma esmolinha para os irmãos Castro, que mandam para o Brasil quem quiserem, recebem os salários de R$ 10 mil por mês para cada um, por intermédio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), e remuneram os enviados com valores incertos e não sabidos. À chegada dos primeiros deles ficamos sabendo que vieram "ajudar", e não "ganhar dinheiro", e que estão "felizes" com isso - mesmo alertados de que não poderão aproveitar para permanecer no Brasil, até porque suas famílias ficaram lá e eles nunca poderão ficar aqui.

Não importa se os cubanos terão remuneração vil num mercado que exige muito, mas paga bem. Importa, sim, que serão encarregados de curar desvalidos sem que tenham certificada sua perícia profissional, o que é exigido por lei. Além disso, a anamnese do queixoso exige o domínio de um idioma comum, que permita ao consultado compreender sua queixa. Cubanos falam um castelhano de difícil entendimento mesmo por outros praticantes do idioma de Miguel de Cervantes. Amazônidas e sertanejos comunicam-se com dificuldade com lusófonos do Sul e do Sudeste do País. Como essa barreira será transposta? Ora, os egressos terão curso de três semanas para dominar o vernáculo. E esse prazo exíguo não é a única temeridade para os pobres que pagarão para consultar médicos sem nenhuma garantia da competência destes.

*Jornalista, escritor e poeta

Fonte: O Estado de S. Paulo

Fora do tom - Míriam Leitão

As declarações da presidente Dilma Rousseff contra os argumentos do ministro conselheiro Eduardo Saboia foram descabidas e contraditórias. Uma chefe de Estado não deveria estar em público debatendo com um funcionário e, pior, ao negar o que ele disse, acabou confirmando. Segundo ela, o governo brasileiro "tentou negociar" (o salvo-conduto) diversas vezes "e não conseguimos".

A Convenção de Caracas determina que se o asilo é concedido por um país, o outro, dentro de um tempo razoável, dá o salvo-conduto. Não é preciso mendigar por isso, considerando normal um prazo longo como 450 dias. Nesse período, o asilado ficou literalmente prisioneiro e comprovou-se a tibieza da diplomacia brasileira.

A presidente Dilma disse que a embaixada do Brasil em La Paz "é bastante confortável" e nisso mostrou uma inesperada insensibilidade para quem viveu o que ela viveu. O senador Roger Pinto Molina não tinha direito de ir e vir, seus aposentos tinham 20 metros quadrados, não tomava banho de sol, não podia dar entrevistas, tinha as visitas controladas. Isso não é nada "confortável". Pior ainda é a espera indefinida. Por quanto tempo mais o Brasil acha que seria razoável esperar por esse salvo-conduto? Se o governo tivesse demonstrado firmeza na negociação, certamente isso já teria sido resolvido da maneira convencional há muito tempo.

O governo brasileiro poderia não ter concedido asilo, se considerasse que Molina não era um perseguido político, e sim um criminoso comum. Dado que concedeu, tinha que lutar para que fosse respeitado o Direito Internacional. Até as ditaduras latino-americanas permitiram que os asilados saíssem das embaixadas para o avião. Mesmo após alguma relutância.

Segundo a presidente - na bronca dada através da imprensa ao funcionário do Itamaraty, o "Brasil não poderia colocar em risco a vida de uma pessoa que estava sob a sua guarda". A dúvida é quem colocou em risco a vida do senador boliviano: foi o diplomata que o tirou de uma situação insustentável ou o Itamaraty com sua indiferença?

O embaixador brasileiro Marcel Biato foi afastado do posto por exigência feita pelo governo boliviano à qual vergonhosamente cedemos; o encarregado de negócios, ministro Eduardo Saboia, veio duas vezes ao Brasil e nunca conseguiu demonstração de interesse dos seus superiores pelo caso. O asilado, em depressão, ameaçava suicídio. E se ele se matasse na embaixada do Brasil? Saboia pode ter livrado o Brasil de um constrangimento internacional.

O caso é revelador de uma política externa equivocada, inaugurada há dez anos, e que não tem relação com a tradição e o passado do Itamaraty. O Brasil sempre se relacionou com seus vizinhos de forma pacífica, mas se fazendo respeitar. E por se fazer respeitar me refiro ao uso adequado dos instrumentos diplomáticos de persuasão. E há um cardápio enorme deles. Nenhum é aceitar desaforos indefinidamente.

Só para ficar no caso da Bolívia, lembremos a desrespeitosa revista ao avião do ministro Celso Amorim e a invasão, com tropas do Exército, das refinarias que a Petrobras tinha na Bolívia. Se quisesse comprar de volta as empresas que havia privatizado, bastaria o governo da Bolívia avisar. Sua proposta seria aceita. O ato de força, com fanfarra política, foi inexplicável. Mas mais espantosa foi a maneira cordata como o Brasil reagiu, sem sequer uma demonstração de desagrado. Ficou autorizado o presidente Evo Morales a impor ao Brasil qualquer humilhação a partir daquela data. E é o que tem feito.

Fonte: O Globo

Uma diplomacia estudantil - Elio Gaspari

O Itamaraty é coisa séria, mas, com suas trapalhadas, o comissariado transformou-o numa usina de desastres

A doutora Dilma tem dois chanceleres, um no Planalto e outro no Itamaraty. Apesar disso, restou ao Brasil uma diplomacia trapalhona, cenográfica e inepta. A desova do senador Roger Pinto no território brasileiro transformou uma conduta inamistosa do governo da Bolívia numa estudantada brasileira. Custou o lugar ao chanceler Antonio Patriota. Ele vai para Nova York, mas o comissário Luís Inácio Adams continua advogado-geral da União. O doutor sustentou que, caso um médico cubano peça asilo territorial no Brasil, será devolvido a Cuba. Agradando o aparelho dos irmãos Castro, ofendeu a história do país e o direito. No ano passado, o Brasil meteu-se noutra estudantada, expulsou o Paraguai do Mercosul e agora corteja seu governo. É uma diplomacia de palavrório e negócios. Patriota foi um detalhe.

A ideia segundo a qual o encarregado de negócios do Brasil em La Paz contrabandeou o senador até a fronteira com o Brasil porque apiedou-se de seu estado emocional é pueril. Se os embaixadores começassem a ser orientados pelos seus sentimentos, seria melhor fechar a Casa. A boa norma determina que um governo dê o salvo-conduto a um asilado em algumas semanas. No exagero, alguns meses. O presidente Evo Morales não quis fazer isso. Direito dele. O político peruano Haya de La Torre ralou cinco anos numa sala da embaixada da Colômbia em Lima. O cardeal Jozsef Mindszenty, outros 15 na embaixada dos Estados Unidos (que não são signatários das convenções de asilo diplomático) na Hungria.

Se alguém pensou que combinou a fuga com Evo Morales, fez papel de bobo e transformou o algoz em vítima. Transferiu o vexame para o diplomata Eduardo Saboia, deixando-o numa posição de franco-atirador. Coisa parecida fez no mundo dos negócios, quando transferiu para o embaixador do Brasil em Cingapura uma transação meio girafa que favorecia os interesses do empresário Eike Batista.

A maneira como a diplomacia de Lula e da doutora lidaram com o instituto do asilo revela desrespeito histórico com um mecanismo que protegeu centenas de brasileiros perseguidos por motivos políticos. Ele ampara gregos e troianos. Em 1964, brasileiros asilaram-se na embaixada boliviana. Anos depois, oficiais golpistas bolivianos asilaram-se na embaixada brasileira e o governo esquerdista do general Juan José Torres deu-lhes salvo-condutos em 37 dias.

Carlos Lacerda asilou-se por alguns dias na embaixada de Cuba e João Goulart pediu asilo territorial ao Uruguai. Em poucos meses, o governo do marechal Castello Branco concedeu salvo-condutos a todos os asilados que estavam em embaixadas estrangeiras. Já o do general Médici, vergonhosamente, fechou as portas de sua representação em Santiago nos dias seguintes ao golpe do general Pinochet e dezenas de brasileiros foram obrigados a buscar a proteção de outras bandeiras. Contudo, nem mesmo Médici deportou estrangeiros para países onde poderiam ser constrangidos. Isso ocorreu durante a gestão do comissário Tarso Genro no Ministério da Justiça, com dois boxeadores cubanos que, posteriormente, voltaram a fugir da ilha.

O direito de asilo é uma linda tradição. Não se deve avacalhá-lo.

Nas próximas quatro quartas-feiras o signatário estará refugiado no ócio.

Fonte: Folha de S. Paulo