sexta-feira, 9 de agosto de 2013

OPINIÃO DO DIA – Marcus Pestana: recado da rua

O grito das ruas foi um puxão de orelhas geral. Foi dado o aviso: parem de pensar em eleições e cuidem da vida da gente”.

Marcus Pestana, presidente do PSDB de Minas e deputado federal, O Globo, 9/8/2013

Investigação de cartel abre guerra entre PT e PSDB

Partidos entram em confronto no Congresso e em SP; objetivo é atacar reeleição de Dilma e Alckmin

A investigação sobre formação de cartel em licitações do metrô, com suspeita de pagamento de propina em administrações tucanas, iniciou uma guerra política entre PT e PSDB, com foco nas eleições de 2014. Os dois partidos se mobilizaram no Congresso e em São Paulo para ataques mútuos, numa tentativa de atingir os projetos de reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e da presidente Dilma Rousseff (PT). Os petistas trabalham para instalar CPIs - na Câmara dos Deputados e na Assembleia paulista. Tucanos tentam jogar o foco em contratos de Estados governados pelo PT e no governo federal, especialmente os firmados com a Siemens para a compra de vagões de metrô. Dirigentes do PSDB tiveram acesso ao acordo de leniência sobre o cartel no Cade e destacaram trechos que supostamente incriminam contratos de gestões petistas. O Cade alega que o escopo das investigações é nacional

Escândalo do cartel do Metrô antecipa guerra de 2014 entre tucanos e petistas

Pedro Venceslau, Ricardo Chapola, João Domingos, Daiene Cardoso

SÃO PAULO, BRASÍLIA - A investigação sobre formação de cartel em licitações do Metrô paulista com suspeita de pagamento de propina a tucanos detonou uma guerra entre o PT e o PSDB com foco nas eleições de 2014. Os dois partidos mobilizaram suas estruturas. no Congresso e em São Paulo para se atacar mutuamente e tentar atingir os projetos de reeleição do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e da presidente Dilma Rousseff (PT).

Enquanto os petistas trabalham para instalar duas CPIs - uma na Câmara dos Deputados e outra na Assembleia Legislativa paulista - com o objetivo de desestabilizar o governo Alckmin, a estratégia do PSDB é nacionalizar a crise e jogar o foco para contratos do metrô feitos em Estados governados pelo PT e com o governo federal, sendo a maioria firmada com a multinacional Siemens.

A Siemens denunciou o esquema de cartéis em sete Estados ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), na forma de um acordo de leniência - a empresa, envolvida em infração à ordem econômica, se compromete a confessar o ilícito e apresentar provas do esquema de corrupção e, em troca, se livra de ação penal

Deputados do PSDB protocolaram ontem um requerimento na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara para ouvir o presidente do Cade, Vinícius Marques de Carvalho, e representantes das empresas que teriam formado o cartel Querem que eles falem se o esquema chegou a governos do PT e de partidos aliados da Bahia, Distrito Federal, Pernambuco e Rio Grande do Sul.

Foco ampliado. Dirigentes do PSDB tiveram isso ao acordo de leniência que está no Cade c se municiaram com trechos do documento que levantam suspeitas sobre contratos feitos sob gestões petistas.

A estratégia foi desenhada no começo da semana pelo núcleo político do Palácio dos Bandeirantes e colocada em campo na quarta-feira (mais informações no texto Bastidores).

Em discurso na Câmara Municipal paulistana, o vereador Floriano Pesaro, líder do PSDB, deu o tom. "A Siemens, que acusa o Governo de São Paulo de conivência com o cartel formada por ela e por outras empresas, também tem contratos com metrôs de outros Estados. E também está sendo investigada fora de São Paulo"., O vereador foi além. "O Ministério Público Federal da Bahia, governada pelo PT, investiga irregularidades cometidas por empresas nas licitações do metrô de Salvador."

"O PT quer usar o episódio como instrumento de perseguição política. Se houver CPI ela terá que ser de abrangência nacional", emendou Carlos Sampaio, líder do PSDB na Câmara.

Carimbo. "Não há dúvidas de que a testa do governador Geraldo Alckmin foi carimbada. Ele já não é mais aquele político impoluto que se apresentava ao eleitor", disse o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), que trabalha na Câmara pela abertura de uma CPI do cartel paulista.

Segundo Zarattini, o PT vai centrar seus esforços em Brasília porque sabe das dificuldades para a abertura de CPIs cm São Paulo. O deputado Paulo Teixeira foi escalado pela liderança do PT na Câmara para reunir as 171 assinaturas necessárias para a instalação da CPI. O deputado estadual Luiz Cláudio Marcolin (PT) conseguiu 26 das 32 assinaturas necessárias para instalar uma CPI, mas os seis nomes restantes teriam de vir da base de Alckmin.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Denúncia de cartel em SP detona guerra entre PT e tucanos

A denúncia de que fornecedoras do metrô em São Paulo montaram um cartel, com a conivência de seguidos governos tucanos, acirrou o clima no Congresso, onde o PT trabalha para criar uma CPI.

O PSDB, por sua vez, pediu que integrantes do Cade, órgão que apura o caso, esclareçam a investigação em audiência pública e se queixou de "vazamento seletivo" de informações.

Caso Siemens: PT pede CPI, e PSDB cobra explicação do Cade

Partidos trocam acusações, e tucanos criticam "vazamento seletivo"

BRASÍLIA - As denúncias de que um cartel montado por multinacionais fornecedoras do metrô de São Paulo teria contado com a participação de políticos do PSDB transformou o Congresso num cenário para embate entre petistas e tucanos. O PT começou a colher assinaturas para abrir uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) que investigue o suposto cartel e o envolvimento de agentes públicos. Já o PSDB pediu uma audiência pública na Comissão de Fiscalização e Controle para ouvir o presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Vinícius Marques de Carvalho, e representantes da Siemens, Alstom, Temoinsa, Bombardier, CAF e Mitsui.

Enquanto as bases dos dois partidos trocam acusações, líderes mais influentes adotavam um tom de moderação. No PT, ministros e líderes partidários defenderam a investigação dos contratos, mas evitam pré-julgamento. E os líderes do PSDB afirmaram que cooperariam com as investigações, mas criticaram um suposto vazamento seletivo das informações. Lembraram que, além de contratos com o governo paulista, a Siemens firmou contratos com a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), órgão vinculado ao Ministério das Cidades.

- O governo de São Paulo quer cooperar com todos os que estão investigando esse cartel para saber quem se beneficiou e qual foi o montante do prejuízo ao estado. Tenho a mais absoluta certeza que não houve envolvimento dos ex-governadores do PSDB. Agora, os vazamentos têm sido seletivos, e o noticiário, bastante parcial. A Siemens falou da existência de cartel em vários contratos, a maior parte deles com a CBTU para os metrôs de Fortaleza, Salvador e Belo Horizonte. Se houve cartel, o estado de São Paulo foi vítima, e quem errou tem que pagar. É diferentemente do caso do mensalão em que os que erraram foram prestigiados pelo partido - disse o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes Ferreira (SP).

Autor do pedido de CPI na Câmara, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), candidato à presidência do seu partido, frisou que a apuração está só começando:

- É grave porque quem denunciou foram as empresas que fizeram o cartel. É inusitado ter uma denúncia dessa natureza. É um momento que requer uma investigação muito profunda de um escândalo de enormes proporções. Não podemos fazer o julgamento antes - disse.

O Ministério Público do Distrito Federal informou ontem que quer ter acesso às provas colhidas no acordo de leniência da Siemens com o Cade. O MP está apurando possíveis irregularidades nos contratos de manutenção do metrô do DF.

A Bombardier informou que repudia o recurso a práticas anticoncorrenciais e que está colaborando com as autoridades. A Siemens afirmou que também coopera integralmente.

A Alstom, também investigada sobre irregularidades nos contratos de manutenção do metrô do DF, disse que a licitação na capital federal respeitou os marcos legais. A empresa reforçou que segue um rígido código de ética. Procurado, o Cade não fez comentários.

Fonte: O Globo

Acordo com Cade não isenta Siemens de punição

Empresa se livra de multa, mas pode ficar até dez anos sem participar de licitações do governo de São Paulo

SÃO PAULO - O acordo da Siemens com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) não impedirá a empresa de responder por formação de cartel e eventuais prejuízos causados à administração pública pela prática-anticoncorrência na aquisição de trens e metrô para o governo de São Paulo. Firmado em maio deste ano, o Acordo de Leniência nº 01/2013 prevê a isenção de multa de 20% sobre o faturamento da área responsável pelos contratos, que poderia vir a ser aplicada pelo Cade. A empresa, porém, ainda poderá ser submetida a ação civil pública, perder o direito de disputar licitações por cinco ou dez anos, e responder a ações por eventuais danos causados em função do cartel - como superfaturamento de contratos - se o crime for confirmado em investigações posteriores.

Investigações internas da Siemens identificaram indícios de realização de cartel em seis obras realizadas pela empresa no Brasil - cinco relacionadas ao metrô de São Paulo e uma à manutenção do metrô do Distrito Federal. Todos os acordos feitos teriam se consumado, com a exceção de acordo em Brasília com a Alstom, que teria sido desfeito às vésperas da licitação, de acordo com a apuração interna da empresa, entregue ao Cade.

O Ministério Público e a própria empresa de metrô do DF solicitaram ao Cade o envio dos documentos.

Denunciante do esquema de cartel, a Siemens vem sendo hostilizada em reuniões de associações de empresas do setor. Em encontros recentes da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), representantes da empresa foram xingados e convidados a deixar as reuniões.

O presidente da Abifer, Vicente Abate, disse não ter presenciado os atos contra os representantes da Siemens:

- Que eu tenha presenciado, não teve nada disso. Nem acho que seja caso de instigar esse comportamento entre as empresas - disse o executivo.

Abate afirmou que as acusações de formação de cartel lhe são "totalmente estranhas". No entanto, ele foi reticente ao falar sobre informações que ainda podem vir à tona, ao ser perguntado sobre a veracidade das denúncias. Ele respondeu:

- Nem que sim, nem que não.

Fonte: O Globo

Serra nega que tenha proposto pacto para empresa alemã

Executivo da Siemens relatou, por e-mail, conversa com o tucano

SÃO PAULO - Após a informação de que o esquema de cartel nos contratos do metrô atingiu o primeiro ano de seu governo - além das administrações também tucanas de Geraldo Alckmin e Mario Covas -, o ex-governador de São Paulo José Serra contestou ontem a informação de que sugerira a um executivo da Siemens um acordo para que uma disputa entre empresas não prejudicasse uma licitação na Companhia de Trens Metropolitanos (CPTM). Segundo o jornal "Folha de S. Paulo" de ontem, que teve acesso a e-mail do funcionário da Siemens, Serra teria avisado a ele que cancelaria a licitação vencida pela CAF (concorrente da Siemens) se a empresa fosse desqualificada.

Segundo o e-mail, Serra "consideraria" outras soluções para evitar atraso na entrega. Uma delas seria um acordo com a CAF, que destinaria à Siemens 30% do contrato. O executivo teria se encontrado com Serra num evento em Amsterdã, na Holanda, em 2008. Em nota, o tucano negou a conversa com o funcionário da Siemens e listou fatos que, para ele, questionam informações contidas no e-mail, que chamou de "absurdas".

Serra disse que, "na data da troca de e-mails dos executivos da Siemens, a licitação já havia sido concluída, e a Siemens já havia recorrido à Justiça e ao Banco Mundial para anular o pleito". Portanto, segundo ele, "não faria sentido propor que a Siemens fizesse acordo com a vencedora CAF".

Alckmin cria grupo com OAB

Segundo Serra, a licitação para a compra dos trens foi conduzida pelo Banco Mundial (Bird), com regras rígidas. "Só o Bird poderia cancelar ou suspender a licitação contestada pela Siemens". Serra disse ainda que "o governo defendeu na Justiça a licitação, contra ação movida pela Siemens" e que a empresa não fez outros contratos com o governo, o que descarta a possibilidade de ela ter sido "compensada pela perda da licitação do metrô".

Em reação às denúncias, o governador Geraldo Alckmin criou um grupo para apurar casos desse tipo. Foram convidados representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da ONG Transparência Brasil e do Instituto Ethos, entre outros. O anúncio da criação do grupo foi a forma que o governo paulista encontrou para dar uma resposta à sociedade, depois que as denúncias vieram à tona, envolvendo funcionários de diferentes escalões. Alckmin teria sido orientado não só pela cúpula do governo, mas também por dirigentes do PSDB, para envolver ao máximo integrantes da sociedade no trabalho de apuração das irregularidades.

Fonte: O Globo

Ministro critica governo: 'Cada vez mais à direita'

Eduardo Bresciani

BRASÍLIA - O ministro do Trabalho, Manoel Dias, participou ontem de evento do seu partido, o PDT, e foz duras críticas ao PT, legenda da presidente Dilma Rousseff, e ao governo do qual faz parte. Aliado próximo do ex-ministro e presidente cio PDT, Carlos Lupi, ele foi alçado ao ministério em março no processo de reabilitação dos partidos defenestrados do governo no processo que ficou conhecido como "faxina" da presidente.

Falando a parlamentares e dirigentes do PDT em um plenário na Câmara dos Deputados, o ministro afirmou que o PT não fez o que se esperava no governo federal. "O PT já foi revolucionário. Ganhou a eleição com um discurso revolucionário. Lula teve a oportunidade de fazer avançar e mudar o modelo econômico, mas não fez", disse.

As críticas estenderam-se ao governo atual. "O governo vai cada vez mais para a direita, assumindo posições de direita. Nós também temos de fazer um mea culpa de que não fizemos nada para levar para a esquerda. A presidente Dilma nunca sofreu as pressões da esquerda, isso por nossa própria incompetência", afirmou.

Concluiu sua análise dizendo não saber se Dilma conseguirá recuperar sua popularidade, mas ressaltou que as interpretações sobre os protestos estão ainda na fase "achismo".

Fonte: O Estado de S. Paulo

Afago à base flexibiliza aplicação de emendas

O esforço da presidente Dilma Rousseff para conter a rebelião entre aliados e amenizar a crise não se restringiu aos encontros com deputados, no início da semana, e com senadores, ontem. Ela tomou o leme da articulação política ao definir a redução no número de envio de medidas provisórias e a retirada do requerimento de urgência para o projeto do Código da Mineração, mas o principal trunfo — e o mais controverso —, no entanto, foi a portaria publicada na última sexta-feira, no Diário Oficial da União, que flexibiliza o empenho de recursos pelo governo federal. A medida, criticada por especialistas, libera o empenho, sem projeto prévio, de contratos firmados pela União com prefeituras. Na prática, a medida facilita a aplicação de recursos previstos por emendas parlamentares.

Na semana passada, o Planalto se comprometeu a liberar R$ 6 bilhões em emendas em três parcelas, de R$ 2 bilhões cada uma. Logo em seguida, foi publicada a Portaria Interministerial n° 274, de 1º de agosto. De acordo com o texto, o empenho, instrumento que cria para o Estado a obrigação de pagamento, poderá ser realizado antes da apresentação da proposta de trabalho. De acordo com a nova norma, para fazer o empenho, é preciso apenas o CNPJ da prefeitura, previamente cadastrado no Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (Sincov). Após a realização da reserva do recurso, será estabelecido um prazo para a apresentação da proposta.

Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, a medida abre brecha para "esterilizar" o recurso, que ficará comprometido e poderá não ser usado. "Isso foi feito na ânsia de liberar as emendas e agradar a base parlamentar. Uma medida com cunho eleitoral, que em nada acrescenta ao ponto de vista do controle e do planejamento público", avalia.

Para um especialista na área, que pediu para não ser identificado, a inovação "parece não se harmonizar" com a atual legislação. Segundo ele, não se pode criar a obrigação de pagamento com base em um mero cadastramento do convênio. Ele destaca que, para a realização de pagamento, é preciso, entre o cumprimento de outras exigências, que já esteja devidamente aprovado o plano de trabalho apresentado pelo órgão. "Afinal, somente após a aprovação do plano de trabalho é que a Administração Pública se certificará do correto e justo valor a ser empenhado", disse.

Normatização
Um técnico orçamentário ouvido pelo Correio, que também pediu anonimato, porém, vê com bons olhos a portaria do governo federal. Na avaliação dele, é importante que se normatize a questão do empenho de recursos. "Hoje, o gestor de um ministério fica inseguro no momento de fazer o empenho se o município que quer o dinheiro, por exemplo, ainda não tiver apresentado um plano de trabalho. Por precaução, a maioria prefere empenhar a verba apenas quando esse plano já é apresentado, para se prevenir de qualquer problema no futuro. Normatizando isso agora, fica mais fácil e menos burocrático, até porque o empenho pode ser cancelado depois, caso as coisas não deem certo", afirma.

O Ministério do Planejamento enviou para as demais pastas um passo a passo sobre como gerar o empenho vinculado ao CNPJ no Siconv. Em nota, a Controladoria-Geral da União explicou que, até o projeto ser apresentado, o convênio ficará sob condição suspensiva. "Se a proposta de trabalho não for apresentada no prazo fixado ou se não for aprovada, o empenho será cancelado", diz trecho da nota. "A portaria não autoriza liberação de recursos antes da aprovação da proposta de trabalho", acrescenta.

"Isso foi feito na ânsia de agradar à base parlamentar. Uma medida com cunho eleitoral, que em nada acrescenta ao ponto de vista do controle e do planejamento público"
Gil Castello Branco, secretário-geral da NG Contas Abertas

Fonte: Correio Braziliense

Tucanos reagem a Dilma

O anúncio da presidente Dilma Rousseff (PT) da liberação de R$ 7,3 bilhões para obras de mobilidade urbana na Região Metropolitana de Belo Horizonte – desde que o governo estadual e a prefeitura da capital apresentem os projetos e a estruturação das obras – foi criticado pelos tucanos mineiros. A direção do partido no estado disse que a presidente está "mal informada", fez várias afirmativas "dissociadas da realidade", "atrasa" a vida do belo-horizontino e tem o "péssimo hábito" de anunciar a mesma obra várias vezes.

"O esforço que a presidente Dilma faz para mostrar intimidade com Minas Gerais é tão artificial que as informações são imprecisas. Não basta ter a certidão de nascimento em Minas, é preciso ter espírito mineiro", afirmou o presidente estadual do PSDB, o deputado federal Marcus Pestana. Para ele, Lacerda e Anastasia são excelentes gestores e as declarações da presidente cobrando projetos é um "jogo de empurra que não constrói nada".

Entre as promessas da petista está a liberação de R$ 2 bilhões para a construção do ramal do metrô ligando o Calafate à região hospitalar e a linha 3, que vai ligar a Savassi ao Belvedere. "O primeiro anúncio feito pela presidente foi em fevereiro de 2011 no lançamento do PAC Mobilidade. Depois ela veio a BH, em setembro de 2011, e anunciou de novo. Nada aconteceu em 2011 e 2012. O convênio somente foi assinado em abril de 2013 com a liberação pelo Ministério das Cidades, através da Caixa, de recursos para o projeto", diz trecho da nota divulgada pela direção do PSDB.

Segundo o governo mineiro, em abril foram iniciados os trabalhos de topografia, que devem terminar em outubro. Já os projetos de engenharia nas três linhas do metrô têm previsão de ficar prontos em abril do ano que vem. "Falta o principal: que é o governo federal assinar o convênio de descentralização do metrô para o estado e para os municípios de Belo Horizonte e Contagem", reclamam os tucanos na nota.

A presidente Dilma previu ainda que entre maio e junho de 2014 serão contratadas as obras para a revitalização do Anel Rodoviário. Outro ponto criticado pela oposição. "Minas está apreensiva com os atrasos do governo federal: as etapas em andamento foram formalizadas com um atraso de pelo menos seis meses. Até agora, as obras que serão tocadas pelo governo de Minas não foram delegadas ao estado pelo governo federal."

Também em nota à imprensa, o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (PSDB), afirmou que a visita de Dilma ao estado mostra "profundo desinteresse" dos governos federais do PT com o estado. "A presidente volta a Minas para anunciar de novo as mesmas promessas, inaugurar um câmpus universitário que já funciona desde o ano passado e tentar transferir para terceiros responsabilidades que são exclusivamente do seu governo."

A petista esteve em Varginha na quarta-feira e visitou instalações de uma unidade da Universidade Federal de Alfenas (Unifal), que começou a funcionar em 2009, mas ganhou sede própria no ano passado. O senador tucano reclamou ainda que outros estados receberão centenas de milhões do governo federal para seus metrôs, enquanto o de Belo Horizonte ainda não saiu do papel, e que a duplicação da BR-381 se transformou "subitamente" em uma obra menor que a prometida.

Burocracia

O governador Antonio Augusto Anastasia (PSDB) afirmou ontem que o estado já iniciou a elaboração dos projetos necessários para a liberação da verba prometida pela presidente e lamentou a "concentração de recursos na esfera federal. O tucano evitou falar em prazos, segundo ele, em razão da "burocracia" do Estado brasileiro.

Fonte: Estado de Minas

Dilma vai ao Congresso para aplacar a crise

Tânia Monteiro

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff montou uma ofensiva para aparar arestas com o Congresso e retomar a agenda "das ruas" para estancar a queda na popularidade. Animada pela redução dos índices de inflação, ela se prontificou a ir ao Senado, na semana que vem? e reaproximar-se da Casa. 0 pretexto é um convite da senadora Ângela Portela (PT-RR) para comemorar os sete anos da Lei Maria da Penha e receber um relatório da comissão que investigou a violência contra mulheres no País.

De acordo com a senadora petista, só resta um aceito de agenda, "mas a presidente confirmou a sua presença". Será mais um gesto de aproximação da presidente com o Congresso, onde muitos parlamentares estão em pé de guerra com o Planalto, prometendo derrubar vetos seus e aumentar os gastos do governo.

Dilma prosseguiu ontem sua maratona de encontros com a base aliada, recebendo oito senadores do PT que com ela falaram por mais de três horas. A presidente já recebeu antes os líderes da base na Câmara, e depois os do Senado,

Além de "atravessar a rua" para uma aproximação com deputados e senadores, Dilma anunciou aos petistas que já iniciou uma agenda de viagens pelo País, para inaugurar obras e mostrar o que o governo está fazendo. "Temos muito o que mostrar", disse a presidente, ao listar as viagens que fará. A presidente teria dito ainda, segundo a senadora, que do reconhecimento da sua gestão será o seu reconhecimento político" - e que, em consequência, "a aprovação de seu governo se elevará".

"A presidente está convencida de que mostrando que as coisas estão acontecendo, as realizações das obras que têm para inaugurar isso o resultado será a sua reeleição", emendou a senadora Ângela Portela. Dilma falou ainda do programa Mais Médicos afirmando que a avaliação da saúde, hoje muito baixa, será revertida à medida que os novos médicos começarem a chegar aos municípios.

A presidente citou também que os últimos números sobre inflação são "animadores", segundo o senador Paulo Paim (PT-RS) e que "esta é a prova de que a inflação está sob controle". O senador Paim informou ainda que a presidente pretende percorrer o País para ter mais contato com a população e para dar visibilidade às obras do governo.

Hoje, às 11 horas, Dilma irá inaugurar o Instituto Federal de Educação Tecnológica, e participará da formatura de 400 alunos do Pronatec. No sábado, às 10 horas, Dilma. estará na cerimônia que dá início às atividades do Aeromóvel, no aeroporto Salgado Filho, uma espécie de metrô aéreo e, em seguida, entregará 40 retroescavadeiras a prefeitos gaúchos.

A presidente aproveitará ainda para dar um empurrãozinho nos futuros candidatos do partido. E o caso do ministro da Saúde, Alexandre Padilha.que deverá ser sacramentado como candidato do PT ao governo de São Paulo, e que estará ao lado de Dilma, na próxima terça-feira, em Ítapira, no interior paulista, para a cerimônia de inauguração de expansão de uma empresa de farmoquímica. Antes, porém na segunda-feira Dilma ira Ribeirão Preto (SP) para inaugurar um trecho do duto do sistema de escoamento de etanol entre a cidade e a refinaria de Palilínia, Esta semana, Dilui a já esteve em Varginha (MG). Na reunião com os senadores petistas, aproveitou para se queixar da nova sistemática de apreciação dos vetos, instituída pelo presidente do Senado, Renan Calhem "Ela demonstrou muita preocupação com isso", declarou a senadora Ângela Portela.

Extraterrestre

Aécio Neves (PSDB ironizou a declaração da presidente Dilma, que disse em Varginha "ter muito respeito" pelo "ET de Varginha". Aécio cobrou "demonstrações de respeito não apenas ao ET de Varginha, mas a todos os mineiros".

Fonte: O Estado de S. Paulo

Preço do pão sobe até 15% ainda este mês

Pressionada pela quebra da safra argentina e outros fatores, saca da farinha de trigo foi de R$ 80 para R$ 120 nos últimos 30 dias, segundo os panificadores

Preço do pão subirá até 15%

Valor do quilo deve passar ainda este mês de R$ 7 para R$ 7,70 a R$ 8,05. Disparada da tonelada do trigo explica reajuste

O consumidor nordestino vai se deparar com novos reajustes no carrinho de compras. Desta vez o vilão é o trigo. A disparada no valor da tonelada do grão vai puxar para cima o preço da farinha de trigo e inflar derivados como pão, massas e biscoitos. Em Pernambuco, o Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria (Sindipão) estima um reajuste entre 10% e 15% no quilo do pãozinho francês ainda ao longo deste mês. Fabricantes de massas e biscoitos também se debruçam sobre as planilhas para calcular os índices de aumento.

"Nos últimos 30 dias, a saca da farinha de trigo saiu de R$ 80 para R$ 120. O setor não tem como manter essa pressão nos custos sem reajustar o preço do pão. E isso é urgente. Precisa ser feito de imediato, ainda este mês", adianta o presidente do Sindipão, José Cosme da Silva. O valor médio do quilo está em R$ 7 e poderá oscilar entre R$ 7,70 e R$ 8,05.

Fatores econômicos influenciaram no aumento do trigo ao longo da safra 2012/2013, com consequências mais severas para o Norte e Nordeste, em função da dependência do produto do Mercosul. A Argentina teve uma quebra de safra de 6 milhões de toneladas por conta de questões climáticas (inverno) e da desistência de alguns produtores de se manter na atividade por questões de viabilidade econômica. Em resumo, a safra argentina encolheu 38,7% sobre 2011/2012. A elevação do dólar (na casa de R$ 2,30) também contribuiu para o trigo chegar mais caro por aqui em reais. O valor da tonelada passou de R$ 494,16 para R$ 892,30.

O presidente da Associação dos Moinhos de Trigo do Norte e Nordeste, Roberto Schneider, explica que a safra não é suficiente para atender à demanda de 11 milhões de toneladas do País e que sempre houve uma dependência de importações, sobretudo no Nordeste. "Sem o grão da Argentina, precisamos importar de países como Estados Unidos e Canadá. Mas a dificuldade é que as importações de trigo de fora do Mercosul são taxadas pelo governo brasileiro em 10% para preservar a competitividade do mercado do Hemisfério Sul", explica

O crescimento da demanda também pressionou a atividade. Numa política de preservar seus estoques, a China começou a comprar trigo norte-americano. O país já adquiriu 8 milhões de toneladas e o volume pode chegar a 15 milhões. Isso significa 70% do saldo dos EUA.

Fonte: Jornal do Commercio (PE)

O PT e sua capacidade de revogar o irrevogável - Roberto Freire

Nunca antes neste país, para usar expressão ao feitio do ex-presidente Lula, um governo se esmerou tanto na arte de anunciar medidas atabalhoadas e desistir delas pouco depois. A pressa de Dilma Rousseff para dar uma resposta às manifestações populares nas ruas brasileiras e minimizar a derrocada de sua popularidade resultou em decisões equivocadas, tomadas sem o mínimo planejamento, das quais se viu obrigada a abrir mão diante da reação negativa da opinião pública.

O clamoroso despreparo e a falta de humildade da presidente da República a fizeram propor, sem realizar uma consulta prévia com juristas e advogados, uma Constituinte exclusiva para a reforma política. Até mesmo auxiliares próximos de Dilma, como o vice-presidente Michel Temer, especialista em Direito Constitucional, não esconderam a surpresa diante de tamanho despautério, já que é consenso nos meios jurídicos que uma nova Constituinte só se justificaria em casos de ruptura institucional no país. Tratou-se, na prática, de uma iniciativa golpista que, se levada adiante, colocaria em risco todo o ordenamento institucional vigente.

Após o retumbante fracasso da proposta, o governo do PT insistiu na convocação de um plebiscito por meio do qual os brasileiros decidiriam os principais pontos da reforma. Mais uma vez, houve forte rejeição à descabida iniciativa, rapidamente sepultada pelos próprios partidos da base aliada no Congresso.

A sucessão de trapalhadas também atingiu a área da saúde. Com muita propaganda e pouco conteúdo, a presidente anunciou a criação do programa Mais Médicos e, com ele, a exigência de que os estudantes de medicina fizessem um estágio de dois anos adicionais no SUS, o que aumentaria a duração do curso de seis para oito anos. Novamente tomada sem que se levasse em consideração a opinião dos próprios médicos ou das universidades, a decisão foi duramente criticada por diversas entidades do setor, o que fez com que o governo suspendesse o equivalente a um serviço civil obrigatório.

As idas e vindas não pararam por aí. O Ministério da Saúde publicou no Diário Oficial uma portaria com novas regras para a cirurgia de pessoas interessadas em mudar de sexo, determinando que o tratamento com hormônios poderia ser iniciado aos 16 anos, e a cirurgia, permitida a partir dos 18. Mas Dilma sucumbiu diante das pressões dos setores mais conservadores de sua base de apoio e recuou de novo.

Completamente desorientado na área econômica, o governo do PT também patinou quando se tratou da ajuda do FMI à endividada Grécia. No fim de julho, o representante brasileiro no órgão, Paulo Nogueira Batista, se absteve na votação que aprovou o suporte financeiro aos gregos, no que foi publicamente desautorizado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, entusiasta do novo pacote.

Sobretudo desde que passou a ser aconselhada pelo atual ministro da Educação, que em 2009, quando senador, subiu à tribuna para revogar sua decisão "irrevogável" de deixar a função de líder do PT na Casa, Dilma colecionou fracassos e viu todas as suas iniciativas ruírem. Nada do que o governo propôs nos últimos meses teve consequência, e os recuos indicam falta de rumo, de firmeza, de capacidade, de diálogo e de habilidade política. A arte petista de revogar o irrevogável leva o país à desmoralização e escancara o desgoverno a que estamos submetidos.

*Roberto Freire, deputado federal por São Paulo e presidente nacional do PPS.

Fonte: Brasil Econômico

'Puxa-estica' - Marina Silva

Com a denominação nada sutil de "Orçamento impositivo", o PMDB se coloca como sócio majoritário da coligação governista e quer tornar obrigatório, por meio de uma PEC, o atendimento das emendas parlamentares individuais ao Orçamento federal.

Na maioria dos casos, o argumento é verdadeiro: as emendas servem à chantagem no jogo do "só voto se liberar, só libero se votar". Mas a solução é falsa: submete o planejamento do país ao "puxa-estica" dos interesses particulares, regionais ou corporativos.

Uma das principais funções do Congresso é aprovar o Orçamento público. É da natureza do processo que sejam apresentadas emendas para alterar a alocação dos recursos. Como fazer com que isso seja parte da regra republicana, e não sua corrosão destrutiva? Boas propostas não faltam, mas ficam sufocadas no jogo de interesses. O deputado Walter Feldman apresentou projeto restringindo o poder das emendas individuais, mas, justamente por isso, não conseguiu de seus colegas as assinaturas necessárias para chegar ao plenário.

Vivi esse dilema dos dois lados, como senadora por um Estado que necessita de recursos federais e como ministra, procurando combinar as emendas parlamentares com os programas do ministério, para que não fossem projetos isolados de qualquer planejamento. A boa vontade e o diálogo podem melhorar as coisas, mas o problema estrutural permanece.

Isso diz respeito tanto ao sistema político quanto ao chamado pacto federativo. O sistema tributário extremamente centralizado coloca os municípios em situação de mendicância, pois recebem menos de 20% do que é arrecadado pelo Estado e vivem nos corredores de Brasília de pires na mão. Esse é o principal insumo da fábrica de emendas parlamentares, que transforma congressistas em vereadores federais.

Há também o faz de conta orçamentário, com as receitas sobrestimadas, para que possam caber todas as demandas de ministérios, Estados, prefeituras, parlamentares, empresas, lobbies de todo tipo. Todos sabem que não será possível realizar todos os gastos, mas o importante é "abrir a janela" para depois negociar. O resultado é a insatisfação de muitos, para a alegria de poucos.

É necessário mudar as regras, mas, antes de pensar em algo impositivo, seria bom tomar uma pouco de Maracugina, para diminuir a ansiedade que antecede o ano eleitoral.

A situação no país não permite irresponsabilidades e o governo deve saber que a permissividade com os recursos públicos, se é objeto de desejo para as próximas eleições, já está na mira das novas gerações. Todo mundo está vendo tudo e, no final, quem sabe não trocaremos o impositivo político pelo imperativo ético de regras que sejam mais compatíveis com esse olhar novo, atento, exigente, comprometido.

Marina Silva, ex-senadora, foi ministra do meio ambiente

Fonte: Folha de S. Paulo

Muitos alarmas para o clima estão soando - Washington Novaes

Mesmo que habituada a ler o noticiário da chamada área ambiental, qualquer pessoa sentirá certo desconforto ao tomar conhecimento do teor do último relatório da Agência Internacional de Energia, divulgado em junho, assim como do conteúdo da discussão a respeito no Camegie Endowment for International Peace, com a presença do economista-chefe da agência, Fatih Birol; do subsecretário de Energia no respectivo departamento norte-americano, Daniel Poleman; do presidente do World Resources Institute, Andrew Steer; e da subsecretária de Política no Departamento de Transporte, Polly Trottenberg. "Se não acharmos solução para o problema das emissões no setor da energia", disse Birol, "a batalha estará perdida", já que elas respondem por dois terços do total. "Este é o tema da nossa geração", segundo Poneman. "Mesmo que limitemos o aquecimento global a 2 graus Celsius, teremos de enfrentar nossa vulnerabilidade, diante dos impactos que já sofremos com os eventos extremos." Birollembrouque,apesardes-se quadro, a agenda internacional na área está perdendo o vigor há três anos. Muitos estudiosos pensam que apenaa com mais eficiência nessa área se chegará a soluções – mas isso não ocorrerá. E o uso de gás de xisto, sozinho, não resolverá todo o problema. Em 2012 as emissões globais aumentaram 14 %, para um novo recorde. No Japão, cresceram 6%. Pequenas reduções na Europa e na índia deveram-se a menor atividade econômica, sem Influenciar a tendência. Talvez o melhor resultado tenha sido na China, embora as emissões ali tenham aumentado 3,8%. Mesmo nos Estados Unidos – pensa ele – o maior uso de gás no lugar de petróleo não se deveu a preocupações com o clima, e sim com o preço. E só temos até 2020 para estabelecermos novos padrões de emissões que nos afastem da atual tendência de aumento da temperatura (que pode chegar, diz ele, a 5,3 graus Celsius).

Curiosamente, Birol acredita que políticas adequadas na área do clima não terão repercussões negativas na economia – embora possa haver ganhadores e perdedores. E não serápre-ciso inventar novas tecnologias, as atuais bastam. Além de permitirem a redução da poluição, diminuirão os problemas da balança de pagamentos com as importações de petróleo. E por esses caminhos se poderá conter o aumento da temperatura em 2 graus – desde que com mais eficiência energética (na iluminação, nos refrigeradores, nas máquinas de lavar, na cozinha), construções mais adequadas. Será indispensável ter motores industriais mais adequados. Transporte eficiente (um terço da demandaglobal por petróleo vem do consumo em caminhões). Também será preciso proibir a instalação de mais usinas a carvão, muito poluentes. Conter as emissões de metano, até mediante substituição das fontes emissoras. E eliminar subsídios para o consumo de combustíveis fósseis, hoje em US$ 0,5 trilhão por ano, US$ 110 por tonelada de dióxido de carbono.

Se essas coisas não forem feitas, teremos mais secas, ondas de calor, mais ciclones, tempestades tropicais – e com repercussões nas infraestruturas de energia, obrigando até as empresas de exploração de petróleo no mar a elevar a altura de suas plataformas, com altos custos, segundo Birol. Outro caminho será o do seqüestro e armazenamento do carbono (nofundodo mar ou da terra) nas fontes emissoras (solução muito questionada pelos geólogos, que temem suas conseqüências).

Para o presidente do World Resources Institute, "estamos perdendo a batalha na área do clima", embora haja soluções; e quanto mais demorem, mais ca- i ro custarão. No ano passado, I US$ 300 bilhões foram investidos na área de energias renováveis - "mas é pouco diante do que precisa ser feito". E é preciso lutar contra a ideia de que isso é muito caro e pode deixar de ser feito. Se não o for, daqui a cinco anos será inevitável criar um imposto sobre qualquer consumo de combustíveis fósseis, pensa Steer.

Polly Trottenberg acredita estar havendo muito progresso na área da eficiência de veículos, reduzindo o consumo de energia. Já estão em vigor nos EUA novos padrões para carros e caminhões leves, há projetos para caminhões pesados: "Podemos reduzir as emissões e baixar os gastos. E o governo norte-americano está trabalhando com as comunidades para melhorar o uso do espaço, o transporte em geral e o ferroviário em especial". Depois "chegará a vez do transporte aéreo", inclusive na redução de emissões.

David Burwell, diretor de Energia e Clima do Instituto Camegie e mediador da discussão, advertiu que "não há lugar para nos escondermos das mudanças climáticas". E os fatos recentes parecem dar-lhe razão.

No Brasil mesmo, com a seca ainda castigando mais de mil municípios, tivemos nas últimas semanas a decretação de estado de atenção ou de emergência em dezenas deles, por causa dobaixo nível de umidade do ar, que em alguns chegou a 12%, com alto risco de incêndios. Inundações graves deixaram mais de mil mortos na índia. O Alasca teve temperatura recorde, 36 graus Celsius.

Tudo chega a um ponto que levou mais de 500 cientistas de 44 países-entre eles, vários Prêmio Nobel e 33 membro da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, além de academias europeias – a advertir (Instituto Carbono Brasil, 29/5) que "os seres humanos estão causando níveis alarmantes de prejuízo ao nosso planeta (...). A qualidade humana devida sofrerá uma degradação substancial até o ano 2050, se continuarmos no caminho atual". Por causa de perturbações climáticas, extinção de espécies, perda de ecossistemas, poluição e padrões de consumo aliados ao crescimento populacional.

Não faltam advertências, portanto, vindas dos especialistas mais qualificados. Mas quando teremos políticas severas e adequadas, especialmente no caso do Brasil, onde se faz de conta que nenhum problema está acontecendo?

Especialmente no caso do Brasil, quando será que teremos políticas severas e adequadas?

Jornalista

Fonte: O Estado de S. Paulo

A Folha prova a lisura da administração paulista – Alberto Goldman

A matéria publicada pela Folha sobre uma licitação de 40 trens para a CPTM é a prova da lisura da administração paulista durante o nosso governo.

As manchetes da primeira página, “Serra sugeriu que Siemens fizesse acordo, diz e-mail” e da quarta página, “Executivo afirma que Serra sugeriu acordo em licitação”, são pura sacanagem. Tentam induzir o leitor a concluir pela existência de irregularidades, mas os textos correspondentes, bastante explicativos, reconhecem e provam exatamente o contrário: a licitação feita em outubro de 2007 foi regular, muito concorrida e frustrou o acordo feito entre a Siemens e a francesa ALSTOM que pretendiam dividir o contrato. A espanhola CAF apresentou o preço 15% inferior à segunda colocada, a Siemens, venceu a licitação e assinou em 2009 o contrato com a CPTM. Executou-o sozinha, sem subcontratar a Siemens ou outras empresas.

Qual a origem da matéria? É um e mail enviado por um executivo da Siemens aos seus superiores em que relata uma conversa que teria tido, durante um congresso na Holanda, com o governador Serra e o secretário Portella, negada por eles. Qual era a questão? A Siemens, segunda colocada, inconformada com o resultado da licitação, além dos recursos administrativos que faria contra a decisão da CPTM em aprovar a primeira colocada, a CAF, ameaçava agir judicialmente, o que atrasaria – como de fato acabou acontecendo – o fornecimento dos trens para a modernização das linhas da CPTM. Qual teria sido a sugestão do governo paulista à Siemens para evitar a ação judicial e o consequente atraso na consecução do negócio? Que ela buscasse um acordo com a CAF, vencedora pelo menor preço, para que ela fosse subcontratada para cumprir parte do contrato, ou pelo fornecimento de uma parcela dos trens, ou pelo fornecimento de parte dos componentes dos mesmos. O preço total a ser pago pela CPTM seria exatamente o mesmo que a licitação determinava e o fornecimento não teria atrasos que prejudicariam a modernização da rede ferroviária.

Isso não aconteceu. A CAF e a Siemens não fizeram o acordo e essa entrou com a ação judicial que não deu em nada, a não ser atrasar em dois anos o fornecimento do equipamento tão necessário para a vida dos usuários da região metropolitana de São Paulo.

Devo dizer que se eu fosse o secretário da área, ou mesmo o governador, não deixaria de acompanhar o desenrolar dos acontecimentos já que estava em jogo algo muito importante para a mobilidade da população mais carente de São Paulo. Mais ainda: teria feito sugestão semelhante, sem abrir mão do resultado da licitação que deu a vitória ao menor preço, para que os serviços não atrasassem. E faria exatamente a ameaça à Siemens de cancelar a licitação se ela conseguisse, na Justiça, a exclusão da primeira colocada. Perfeito. Nada de irregular.

Felizmente a Justiça não deu ganho de causa à Siemens. Mas o atraso de dois anos foi inevitável. Tivesse havido o acordo, ninguém sairia prejudicado, nem o Estado, nem a população.

O jornal sugere, nas manchetes, irregularidades em atos que não seriam irregularidades, ainda que tivessem acontecido, e reconhece, no texto, que o contrato foi finalmente executado conforme a licitação e pelo menor preço. Os títulos da matéria deveriam aplaudir o governo paulista.

Observem que todos os papéis, e-mails, etc., coletados pelo CADE – que segundo ele estão sob sigilo, imaginem – são manipulados pela imprensa que usam das manchetes citadas sem qualquer preocupação ética e, dando de barato que não há interesse político, com o único objetivo de escandalizar e vender o seu produto.

Alberto Goldman , vice-presidente nacional do PSDB, foi governador de S. Paulo

PSDB em xeque - Merval Pereira

De tudo o que tem aparecido até agora com relação às denúncias de formação de cartel nas licitações do metrô paulista, o mais explosivo e menos factível é a acusação de que o então governador José Serra sugeriu um acordo em 2008 entre a Siemens e a CAF espanhola, para que a licitação da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) não atrasasse. Pelo simples fato de que a Siemens entrou na Justiça para tentar anular a concorrência, que a empresa espanhola venceu, e não conseguiu mudar o resultado, ficou de fora dessa compra de 40 novos trens.

Além dessa evidência, o ex-governador afirma ainda que, na data do envio do e-mail do diretor da Siemens Nelson Branco Marchetti, a licitação já havia se encerrado, "com preços tão baixos que quebraram paradigmas nacionais e internacionais", disse Serra, para quem, nessa licitação, o que houve foi o "anticartel".

Isso não quer dizer, porém, que não houve pagamentos de propinas para diretores da CPTM, em diversas etapas da construção do metrô paulista, e há diversas indicações de que tanto a Siemens quanto a francesa Alstom subornaram funcionários paulistas.

Todas as investigações que ocorreram no exterior, especialmente na Suíça, já estão bastante adiantadas; e, com relação à ação da Alstom junto à empresa estatal de energia EPTE, contas bancárias já foram bloqueadas no valor de 7,5 milhões de euros, e diversos funcionários públicos, identificados, além de lobistas com empresas de offshore que teriam sido os intermediários do pagamento de propinas, por meio de uma conta conjunta no Banco Safdié em nome de Jorge Fagali Neto e de José Geraldo Villas Boas.

Fagali é ex-secretário de Transportes Metropolitanos de SP (1994, gestão de Luiz Antônio Fleury Filho) e teve diversos postos na administração federal nos governos do PSDB. Villas Boas é dono de uma das offshores acusadas de lavar dinheiro do esquema. Nesse caso da Alstom no setor de energia, a Polícia Federal indiciou várias pessoas, inclusive o atual vereador tucano Andrea Matarazzo, que era secretário de Energia estadual na época, e trata o caso como sendo um crime do partido político PSDB, como denunciou ontem o jornal "O Estado de S. Paulo": "esquema de pagamento de propina a integrantes do governo do estado de São Paulo e ao PSDB pelo grupo francês Alstom".

Os mesmos personagens estão envolvidos em outras investigações em contratos da Alstom, além do conselheiro do Tribunal de Contas de São Paulo Robson Marinho, homem de confiança do ex-governador Mario Covas. Nas investigações sobre a ação da Siemens, dois ex-diretores da CPTM estão sendo investigados pelo Ministério Público paulista, além de dois "consultores" que teriam recebido depósitos em empresas offshore.

É nas investigações da Polícia Federal e do Ministério Público estadual que as questões criminais deverão ser desvendadas, para que fique esclarecido se as ações de corrupção ocorreram ao longo dos últimos 20 anos de governos do PSDB, se foram ações isoladas ou se correspondem a uma ação política do PSDB para financiar o partido durante esses anos todos de poder estadual.

As evidências estão se avolumando nas revelações feitas nos últimos dias, e dificilmente o partido sairá imune desses episódios, mesmo que o trabalho de investigação tanto do Cade quanto da Polícia Federal tenha se reduzido a São Paulo e Distrito Federal, sem a abrangência que as denúncias da Siemens revelam. Outras cinco capitais - Salvador, Recife, Fortaleza, Porto Alegre e Belo Horizonte - estão na relação de acordos denunciados pela empresa alemã, com a participação da estatal federal Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), mas as investigações não estão sendo feitas.

O PSDB atribui esse direcionamento a um trabalho político do Cade, mas o fato é que as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público deixam poucas dúvidas de que houve corrupção em diversas licitações em empresas públicas paulistas nos últimos governos do PSDB.

Fonte: O Globo

Os ventos - Eliane Cantanhêde

A onda está mudando? Dilma está saindo do sufoco?

É cedo para certezas, mas há forte empenho nessa direção e os ventos, que sempre interferem nas ondas, parecem mais favoráveis a ela.

Desde que sua popularidade começou a cair por causa da economia --e depois despencou, com os protestos--, a presidente não sai da TV, do rádio, dos jornais, da internet, ocupando todos os espaços que a oposição não tem como disputar.

As guerras da presidente parecem bem marqueteiras: são polêmicas e geram reações, mas têm ressonância na maioria da população --ou do eleitorado--, que aprova um plebiscito, a reforma política, os royalties para a educação e a queda de braço com os médicos para que mais municípios sejam atendidos. Boas causas.

Dilma também passou a conversar (dizem que está até aprendendo a ouvir) com o PMDB e os partidos aliados. Essa é sua prioridade, já que o PT vem por gravidade. Sua alternativa é apoiar Dilma ou apoiar Dilma.

Ela até liberou uma bolada para os parlamentares e, como é melhor ceder do que ser derrotada, negocia ajustes no projeto do Orçamento impositivo, pelo qual os deputados e senadores estabelecem suas emendas e o governo tem de cumprir.

Ao mesmo tempo, começa a ser interrompida a sequência, que parecia interminável, de notícias ruins na economia. Em vez de "o pior em duas décadas" e o "mais baixo em tantos anos", há índices mais tranquilizadores. O IPCA (um dos indicadores de inflação) ficou perto de zero em junho, o preço da cesta básica também caiu por todo lado e a produção industrial subiu em 10 das 14 capitais pesquisadas.

Para completar, os protestos das ruas refluíram de um lado e a rede da internet recrudesceu de outro, querendo arrancar o sangue dos tucanos no escândalo da Siemens.

Não se sabe o que acontecerá com os ventos e com Dilma nas próximas pesquisas, mas a mudança de clima na política já dá para sentir.

Fonte: folha de S. Paulo

Sem bala na agulha - Dora Kramer

Visto assim do alto, o adiamento da votação do Orçamento impositivo para a próxima terça-feira pode ter parecido um recuo da Câmara, em atendimento aos apelos da presidente Dilma Rousseff.

Examinada de perto, a decisão confirma a disposição dos deputados de tornar obrigatório o pagamento das emendas parlamentares. Ao tomar o cuidado de cumprir todos os prazos regimentais, o Legislativo evita o risco de que a votação seja contestada na Justiça.

Pelo jeito, a questão está decidida. Tanto na Câmara como no Senado. Se vier a ser revista caso o Executivo recorra ao Supremo Tribunal Federal alegando inconstitucionalidade no mérito, será outra história, mas a derrota política que o Parlamento anda ávido para impor a Dilma estará posta.

Familiarizados com movimentos de pressão esvaziados pela contrapressão do Planalto, poderíamos desconfiar de que daqui até lá o governo faça uso de ferramentas de convencimento - cargos, emendas, cessão de espaços políticos, promessas de apoios eleitorais - e consiga desmontar a bomba.

Difícil, para não dizer impossível. Há vários motivos, mas dois são cruciais. Primeiro: o que era apenas uma promessa de campanha do presidente da Câmara, Henrique Alves, prosperou no ambiente de animosidade com o Planalto e hoje virou uma causa da Casa.

Segunda razão: se lançar mão do fisiologismo deslavado, o governo não tem a menor garantia de que o "gigante" não desperte de novo e volte às ruas dessa vez para protestar contra o uso de métodos considerados condenáveis. Prejuízo já contabilizado pelo Congresso, mas que pode dilapidar mais um pouco o capital de aprovação da presidente.

Mais embaixo. O cancelamento do contrato de repasse do cadastro do Tribunal Superior Eleitoral para a Serasa - empresa privada que reúne dados sobre a situação de crédito dos consumidores - era o mínimo a ser feito.

Conforme as manifestações da presidente e do vice-presidente do TSE, Cármen Lúcia e Marco Aurélio Mello - ambos surpreendidos com a notícia -, trata-se de agressão aos direitos e garantias do cidadão.

Até aí, morreu neves. Resta, no entanto, averiguar a motivação e os detalhes do acerto firmado entre a diretoria administrativa do tribunal, com o aval da corregedoria, e a empresa à revelia dos ministros.

Havendo dolo, e se o ato é inconstitucional parece evidente que houve, indispensável que não fique só o dito pelo não dito e os responsáveis respondam por seus atos, a fim de que se garanta o exercício ao ativismo Judiciário também dentro de casa.

Com jeito vai. A pesquisa do Ibope que mostra 84% de apoio à reforma política com validade já em 2014 nada revela de excepcional. É evidente que as pessoas querem mudanças e que desejem isso o mais rápido possível.

Do mesmo modo todo mundo é a favor da luz elétrica e da água encanada.

O resultado da consulta não significa que o governo deu a resposta certa às manifestações de junho. Nelas, se pedia a prestação de serviços correspondente ao pagamento de impostos e uma conduta mais decente por parte de integrantes do poder público. O Planalto inverteu as prioridades.

O dado mais eloquente da pesquisa está na opinião de 92% dos consultados sobre a forma da reforma: proposta de iniciativa popular. Pelo caminhar do debate no Congresso, os parlamentares continuam só interessados em maquiar a legislação eleitoral.
 
O problema é o tempo. A elaboração do projeto de emenda, a coleta e conferência de assinaturas (um milhão) e a tramitação precisariam estar concluídas em menos de dois meses para valer já na próxima eleição.

Fonte: O Estado de S. Paulo

A bitola paulista - Maria Cristina Fernandes

O metrô de São Paulo foi inaugurado no mesmo ano em que o MDB deu um susto na ditadura. Naquele 1974 o partido quadruplicou a bancada no Senado, dobrou a da Câmara e dominou seis Assembleias Legislativas, aumentando seu poder de fogo na eleição indireta dos respectivos governadores, entre os quais o de São Paulo.

Para não entregar os maiores Estados à oposição veio o Pacote de Abril que acresceu senadores biônicos ao colégio eleitoral formado por Assembleia, Câmara e Senado. Com isso garantiu que a escolha de governadores fosse controlada pela Arena.

Na queda de braço travada com a ditadura militar pelo retorno das eleições diretas para os governos estaduais em 1982, o MDB se aproximaria de lideranças empresariais insatisfeitas com a canoa furada do milagre econômico.

Entre esses empresários estavam os comandantes dos principais grupos envolvidos no primeiro metrô do país, como a Villares, de família homônima, e a Cobrasma, dos Vidigal.

Uma das demandas desses empresários, que viria a ser encampadas pelo MDB, era uma maior proteção à indústria tupiniquim frente ao capital externo, convocado quando a ditadura começou a fazer água.

Quando a primeira linha do metrô de São Paulo foi inaugurada a empresa ainda era comandada pela prefeitura da capital, passando ao controle do Estado apenas em 1979, três anos antes de o PMDB chegar ao Palácio dos Bandeirantes.

Ao longo das últimas três décadas, os pemedebistas e seu primogênito, o PSDB, se revezaram no comando do Estado com fissuras e dissidências que se proliferaram com mais rapidez que os ramais do metrô.

Como o quilômetro de metrô pode custar até 100 vezes o de uma rodovia federal, investimento que, por décadas, foi o único que a subsistir na rubrica de transportes da União, os orçamentos da secretaria paulista rivalizavam com os ministeriais.

Condomínio de poder tem mais fissuras que os ramais do metrô

Nas três décadas desde que o PMDB se instalou no Morumbi o investimento no transporte metropolitano em São Paulo passou de um condomínio monopolista de indústrias nacionais, capitaneado por Mafersa e Cobrasma e subcontratadas como a Hidrobrasileira, para uma estrutura igualmente cartelizada de multinacionais que envolve as gigantes do setor, como Siemens, Alstom, CAF, Bombardier e Mitsui.

Foi na transição desses dois modelos de desenvolvimento, cujo laboratório mais rico foi São Paulo, que o PSDB, nos anos 1990, gestou seus planos de permanecer vinte anos no Planalto.

Foi mais ou menos isso que tentou explicar Claudio Senna Frederico, o ex-secretário de Transportes de Mário Covas quando disse não se lembrar de licitações competitivas no setor.

Engenheiro de produção, que frequenta hospitais do SUS e, aos 70 anos, ainda trabalha pagar suas contas, Frederico foi o único, de uma sucessão de secretários de transportes de governos tucanos, a dar a cara a bater desde que vieram à tona as denúncias de conluio no cartel do metrô.

Quando Covas assumiu, São Paulo, comprometido pelo acordo da dívida, optou pelas concessões, como o resto do Brasil de Fernando Henrique Cardoso. Turbinadas pelos cofres do BNDES, a política de concessões, aos trancos, recuos e barrancos, seria continuada pelos governos petistas.

Por último inventaram as PPPs, parcerias de preço fechado que as teorias da moderna administração pública vendem como o melhor detergente para a perniciosa coleção de aditivos produzida pela gestão estatal de investimentos.

A linha amarela do metrô paulista, que liga o centro ao extremo da zona oeste, foi pioneira no gênero. Em janeiro de 2007, na estreia de José Serra como governador de Estado, contabilizou entre seus maiores feitos o desabamento que matou sete pessoas ao lado da sede da editora Abril. Treze pessoas do metrô e do consórcio que toca a PPP foram denunciadas, mas continuam impunes.

Os transportes sempre foram um bom balcão de negócios para governos de todas as colorações. Basta ver quem os petistas instalaram no ministério. Primeiro o PL e, depois do mensalão, seu sucedâneo, o PR, ambos com notória especialização nos contratos da política.

Os legislativos costumam ser lenientes na fiscalização do setor. Não se faz CPI na Assembleia Legislativa de São Paulo que não seja controlada pelo Palácio dos Bandeirantes, mas na Câmara dos Deputados, transportes tampouco são um tema de predileção da inquirição parlamentar.

Quarenta CPIs foram instaladas na Câmara nos últimos 15 anos. Nenhuma delas para investigar os transportes, pasta que congrega os maiores investimentos do país.

Restam a Controladoria-Geral e o Tribunal de Contas da União, este, sim, muito mais independente do que seu congênere paulista. Relatórios das duas instâncias fiscalizadoras mostraram que o aumento dos investimentos em rodovias e ferrovias no Brasil do PAC reproduz irregularidades ancestrais.

Já em São Paulo o tribunal de contas é casa de pelo menos três conselheiros que, indicados pelo consórcio PMDB/PSDB, tornaram-se alvos de investigação por enriquecimento ilícito em processos de suborno de empresas contratadas pelo governo do Estado, da bitola ao pedágio.

Dois deles já tiveram parte de suas contas bloqueadas, recorreram e continuam conselheiros. O terceiro chegou a ser afastado do cargo mas reconquistou-o semanas antes de ser aposentado com proventos integrais e patrimônio para sustentar dez gerações de desocupados.

Um ex-presidente de metrô arrolado em processo foi absolvido pela justiça paulista por falta de provas. Hoje é dono de fazenda leiteira e se orgulha de proveitosa ordenha, que o deixa na condição de único produtor milionário do Vale do Paraíba.

Esses intermediários ficaram mais ricos do que (quase) todos os governadores a que serviram. Só não ganharam mais do que a outra ponta. As denúncias que agora vêm à tona no Brasil são apenas a franja mais meridional de uma disputa globalizada. Acossados pelas cortes mundo afora por práticas corruptoras os grandes grupos do setor se arvoram em garantir seu naco de mercado no Brasil, um dos poucos cantos, em meio à crise econômica, onde têm conseguido arrancar contratos vantajosos.

Fonte: Valor Econômico

Brasília-DF - Luiz Carlos Azedo

Fogo cruzado
Deve-se a um apelo do vice-presidente Michel Temer o adiamento da votação do orçamento impositivo pela Câmara, na quarta-feira, quando estava tudo pronto para que fosse aprovado em plenário. O pedido acabou atendido pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que agora também está no fogo cruzado entre o Palácio do Planalto e a base do governo.

Temer tornou-se o único interlocutor do governo com o PMDB capaz de convencer não só Henrique Alves como também o líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), que é visto por Dilma como se fosse da oposição. O problema é que o vice-presidente da República começa a ficar desgastado com a bancada de deputados por causa de seu alinhamento com o governo.

Apesar de atuar sistematicamente como bombeiro nas relações do Palácio do Planalto com a bancada peemedebista, Temer continua sendo visto com desconfiança na cozinha de Dilma. Não faltam aqueles que o acusam de jogo duplo, responsabilizando-o pelas estripulias dos correligionários na Câmara.

Jogo pesado
A liberação de emendas parlamentares no decorrer desta semana era o trunfo com que o governo contava para evitar que a base aprovasse o orçamento impositivo. Ocorre que não há isonomia para os valores liberados nem mesmo entre parlamentares da própria base. Ontem, o líder do PT, José Guimarães, fazia ginástica para explicar que as diferenças de valores eram consequência das próprias emendas apresentadas.

Bom acordo
O PT negocia com o PMDB um texto de consenso para aprovação do orçamento impositivo, que leve em conta os programas prioritários do governo para apresentação das emendas, um teto em relação aos valores e o contingenciamento linear da liberação das verbas. Mesmo assim, o Palácio do Planalto é contra a aprovação da proposta, o que os deputados da base consideram um sinal de que o acordo é bom.

Caititu
O ex-governador de São Paulo José Serra nega envolvimento com o escândalo do cartel do metrô paulista, que pode macular as gestões tucanas no estado, desde a administração do ex-governador Mário Covas. O material do Cade relatando a formação de cartel nas obras do metrô em governos tucanos foi fornecido pela multinacional alemã Siemens. Serra garante que a licitação foi limpa, com vitória da empresa que ofereceu o menor preço. Com o pé fora do PSDB, o ex-governador virou comida de onça.

Negreiros
Na abertura do III Congresso Ibero-Americano de Direitos Humanos, o presidente da Embratur, Flávio Dino, lamentou a precarização da saúde pública e privada no Brasil e afirmou que a população vive uma "peregrinação por um direito fundamental". Dino, que perdeu um filho por imperícia médica, comparou os hospitais públicos e particulares do Brasil ao poema Navio negreiro, de Castro Alves.

Pesquisas
O Datafolha conclui hoje mais uma rodada de pesquisas eleitorais. A novidade é a inclusão do nome do ex-governador tucano José Serra na amostra presidencial. Também está sendo avaliada a situação eleitoral dos candidatos a governador de São Paulo.

Anistia
Em agenda oficial em Brasília, o secretário-geral da Anistia Internacional, o indiano Salil Shetty, se reuniu ontem com o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Além de tratar de temas de direitos humanos que estão na pauta do Legislativo, Salil relatou a preocupação da entidade com a permanência do deputado Marco Feliciano (PSC-SP) na presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara.

Saúde de Lula// A assessoria do Hospital Sírio-Libanês anunciou ontem à tarde que o médico Roberto Kalil Filho dará uma entrevista amanhã sobre o estado de saúde do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não adiantou detalhes. A assessoria de Lula disse que ele fará exames de rotina e que os resultados serão divulgados por Kalil para evitar a propagação de boatos.

Turismo
O Ministério do Turismo vai custear planos de turismo e projetos executivos de infraestrutura voltados para o setor. Tem em caixa R$ 16 milhões

Drogas/ Cinco novos integrantes do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad) foram empossados pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. São eles: Alex Canuto e Guilherme Leonardi, da Secretaria Nacional de Segurança Pública; Alex Reinecke, da Secretaria de Direitos Humanos; Daniel Assis, do Ministério da Saúde; e Mário Hesketh, da OAB.

Aeros/ O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), prometeu se empenhar pessoalmente para conseguir uma audiência dos aposentados e pensionistas do Fundo de Pensão Aerus, da antiga Varig, com a presidente Dilma Rousseff.

Cabeça/ A deputada federal Erika Kokay (PT-DF) foi incluída pela última edição do estudo Os cabeças do Congresso, do Departamento Intersindical de Análise Parlamentar (DIAP), no grupo considerado "em ascensão", fruto de sua atuação na coordenação da Frente Parlamentar de Defesa dos Direitos Humanos.

Fonte: Correio Braziliense

Painel - Vera Magalhães

Línguas diferentes
Alexandre Padilha deve evitar ao máximo entrar no clima de lançamento de sua candidatura ao governo de São Paulo que o PT fará hoje em Bauru. Enquanto a cúpula petista incentiva militantes a levar faixas e cartazes com dizeres eleitorais, o ministro repetirá no palanque que sua meta é viabilizar o Mais Médicos, e que é cedo para falar em candidatura. Padilha não discutiu o tema com Dilma Rousseff. A presidente quer que, enquanto estiver no cargo, ele foque a agenda da pasta.

No ar Na véspera do ato no interior paulista, voltou ao Facebook página em defesa da candidatura do ministro da Saúde que o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) havia mandado retirar.

Radar Aécio Neves e Geraldo Alckmin conversaram na segunda-feira sobre as denúncias de formação de cartel no metrô de São Paulo. Disseram que é cedo para calcular o impacto do caso sobre o PSDB e repisaram a tese de que há um vazamento seletivo para atingir só os tucanos.

Pingos... A ex-ministra Nancy Andrighi encaminhou ontem ofício a todos os ministros do Tribunal Superior Eleitoral para rebater acusação de ser a responsável pela decisão que liberou dados dos eleitores para a Serasa. Ela indiretamente culpa a presidente do tribunal, Cármen Lúcia, pelo episódio.

... nos 'is' No texto, Nancy diz que parecer dado por ela, quando na corregedoria-geral, "se limitou a uma estudo quanto à viabilidade legal do pedido'' e que adotá-lo ou não era "atribuição exclusiva da presidência". "Infere-se a existência, no mínimo, de falha de comunicação entre o diretor-geral e a presidente''.

Tô fora Designada para relatar a denúncia do Ministério Público que pede a cassação de Roseana Sarney (PMDB-MA), a ministra do TSE Luciana Lóssio vai alegar suspeição por já ter atuado como advogada da governadora no próprio tribunal.

Estica... O terceiro mês seguido de IPCA baixo animou setores do governo que acham que a alta de juros pode afetar o crescimento da economia. Ministros ligados a Dilma acreditam que, com a inflação em queda, o Banco Central poderá "maneirar" nas próximas reuniões do Copom sobre a taxa de juros.

... e puxa No entendimento desses auxiliares, se o BC mantiver o ritmo de alta de 0,5 ponto percentual nas próximas reuniões, os juros irão contrair ainda mais a economia e afetar o PIB de 2014, ano eleitoral.

Acelerador O ministro Gastão Vieira (Turismo) aproveitou evento ontem para anunciar R$ 19 milhões para cidades históricas para cobrar agilidade de prefeituras na execução de verbas.

Pé no freio Vieira lembrou que sua pasta destinou R$ 53,7 milhões para cidades-sedes Copa do Mundo em junho de 2012 e, até agora, nenhuma obra começou.

Aposentadoria O secretário do Trabalho paulista, Carlos Ortiz (PDT), pediu para deixar a pasta para se dedicar à presidência do Sindicato Nacional dos Aposentados da Força Sindical.

Substituição O partido, no entanto, vai continuar no comando da secretaria do governo Alckmin. O novo secretário é Tadeu Morais, que estava na chefia de gabinete e também é ligado a Paulinho da Força, o principal dirigente pedetista em São Paulo.

Em casa Na reestruturação do Denarc, departamento de investigação do narcotráfico da Polícia Civil paulista, o governo criou uma unidade de contrainteligência que vai se debruçar especificamente sobre o vazamento das operações do grupo.

Tiroteio
"Serra, que sempre cobrou investigações sobre o PT, tem de ser coerente e defender CPI para apurar as acusações aos governos tucanos."
DO PRESIDENTE DO PT-SP, EDINHO SILVA, sobre afirmação de ex-diretor da Siemens de que Serra sugeriu acordo para não anular concorrência da CPTM.

Contraponto
Sem juízo

Durante uma sessão da Comissão de Educação da Câmara, em abril, o deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) se desmanchava em elogios ao ministro Aloizio Mercadante quando ouviu-se na plateia um grito de "glória, glória, aleluia". Os parlamentares se entreolharam e o manifestante completou:

--Eu tenho uma notícia boa! Jesus Cristo vai voltar e todos vocês vão para o céu!

Garotinho brincou:

--Eu cheguei a achar que ele estava dando "aleluia" por eu ter elogiado o governo!

Com Andréia Sadi e Bruno Boghossian

Fonte: Folha de S. Paulo

Panorama Político - Ilimar Franco

O factoide de despedida
Os especialistas da Comissão de Orçamento do Congresso estão chocados com o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. O motivo: o pedido de cassação da governadora Roseana Sarney (PMDB-MA). Os argumentos: nos anos eleitorais há um prazo legal, em junho, para a assinatura de convênios; essa prática é generalizada e, portanto, Gurgel poderia pedir a cassação de uma dezena de chefes de Executivo; a transferência de recursos a municípios pode ser feita até no segundo semestre, desde que o convênio tenha sido assinado no prazo; e a cassação deveria ser pedida na época, e não a 16 meses do fim do mandato, prazo no qual não será concluído o julgamento.

“O grito das ruas foi um puxão de orelhas geral. Foi dado o aviso: parem de pensar em eleições e cuidem da vida da gente” - Marcus Pestana, presidente do PSDB de Minas e deputado federal

Afasta de mim este cálice
Os candidatos a procurador-geral da República, Rodrigo Janot, Ela Wiecko e Deborah Duprat fizeram questão de se distanciar do atual PGR, Roberto Gurgel, na sabatina dos ministros Luís Adams (AGU) e José Eduardo Cardozo (Justiça).

Corpo a corpo
Num dia desses, o governador Sérgio Cabral saiu-se com esta para o presidente do STF, Joaquim Barbosa: "Você não vai se meter nisso!". Desconcertado, Barbosa respondeu, sobre eventual candidatura ao Planalto: "Não vou, não."

Discutindo a relação
A ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) se reuniu, na noite de terça-feira, com os líderes do PSB, Rodrigo Rollemberg e Beto Albuquerque, mais o ministro Fernando Bezerra (Integração). Pediu o apoio dos socialistas nas votações no Congresso e que não deixem que a sucessão contamine a relação histórica do PT e do PSB. O governo quer fidelidade até o fim do governo.

Miss Simpatia
Nas reuniões entre a presidente Dilma e os líderes aliados, foram feitas muitas queixas sobre as dificuldades para eles serem recebidos pelos ministros. A campeã de reclamações foi a ministra Miriam Belchior (Planejamento).

O pidão
O líder do PT no Senado, Wellington Dias (PI), foi alvo do humor da presidente Dilma. Ela relatou que, para obter recursos, quando ela era ministra e ele governador, o petista falava com ela e depois ia ao primeiro, segundo e terceiro escalões.

A gangorra do "já ganhou"
O PSDB está contagiado pelo clima do "já ganhou" que contaminou o PT antes da inflação e dos protestos. Pesquisa tucana diz que rejeição à presidente Dilma é de 45%. A aposta é que ela não se recupere, pois seu governo não tem o que mostrar. Ontem, Dilma disse que caiu pela "insegurança com a volta da inflação". E bancou que a queda em breve dos preços de alimentos vai surpreender e resgatar seu favoritismo.

No mundo da lua
Esta semana, numa churrascaria, o senador Gim Argello (PTB-DF), na foto, para ser simpático com o líder do DEM na Câmara, Ronaldo Caiado, se gabava de ajudar o governador Marconi Perillo (PSDB) nos pleitos junto ao governo Dilma. Foi quando alguém pediu que se calasse. Adversário de Marconi em 2014, Caiado ouviu em silêncio.

Está pronto para ser votado projeto do deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) que define o funk como "forma de manifestação cultural nacional".

Fonte: O Globo

Junho, o mês que não acabou - Debate

Mesa-redonda debate as manifestações que ocupam as ruas do país

Longa jornada junho adentro

Dois meses após inicio das grandes manifestações, debate promovido pelo Valor discute impacto na sociedade brasileira.

Por Maria Cristina Fernandes, Viana de Oliveira, Robinson Borges e Bruno Yutaka Saito | De São Paulo

Dois meses depois que uma série de pequenas passeatas pela revogação do aumento das tarifas do transporte público em São Paulo e outras cidades se transformou em onda gigantesca de manifestações em todo o país, ainda é difícil imaginar como vai ser o impacto na política no Brasil daqui por diante. Mas um desejo irrefreável de maior participação na democracia e ampliação das possibilidades de comunicação emerge das análises expressas em mesa-redonda promovida pelo Valor entre os professores de ciência política José Álvaro Moisés (Universidade de São Paulo) e Jairo Nicolau (Universidade Federal do Rio de Janeiro), o professor de comunicação e jornalista Eugênio Bucci (USP) e Bruno Torturra, cofundador do coletivo Mídia Ninja (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação).

As variáveis ainda em jogo são inúmeras: a atuação da polícia, estopim que deu início à expansão dos protestos, diante da atuação violenta de grupos (como Black Bloc) que atacam símbolos do capitalismo; as novas formas de mídia, diante da imprensa dita tradicional, num embate de formas de atuação; a resposta dos partidos instituídos, diante de uma massa de cidadãos que começa a exigir um papel na decisão política. E a grande dúvida que ainda paira: o que ocorrerá em 2014, ano de Copa do Mundo e processo eleitoral?

Leia a seguir os principais trechos do debate, que ocorreu na tarde de sexta-feira, ao longo de 2h40, na sede do Valor, em São Paulo.

Valor: Em que medidas as manifestações mudam a maneira de fazer política no Brasil?

Eugênio Bucci: Eu queria dar uma ideia ao Zuenir Ventura: que escreva o livro: "Junho, o Mês que Não Acabou". Todo mundo fala das manifestações de junho, mas já é agosto e não acabaram.

Bruno Torturra: Estamos nos apressando em tentar tirar um saldo, mas a história mal começou. E também não começou em junho. O Brasil vem acumulando pequenas manifestações há alguns anos. Há uma tendência de ocupar ruas e tentar criar movimentos horizontalizados. Isso explodiu em junho. É inevitável que o jeito de fazer política seja transformado, mas não me arrisco a dizer como.

Jairo Nicolau: Será que as manifestações não têm um componente que as diferencia do que veio depois? Minha impressão sobre junho está ligada ao volume de pessoas, sobretudo jovens, que não tinham vínculos com a política e foram para a rua. As manifestações podem continuar, podem acabar em outubro, ou não vão acabar nunca. Mas junho teve algo diferente, que não percebo nas manifestações que continuam, mesmo no Rio. Percebo uma diferença no perfil de quem se manifesta e o tipo de ação política das manifestações agora.

José Álvaro Moisés: Esses acontecimentos trouxeram uma variável que estava fora do debate: a cultura política. Os movimentos foram resultado da democracia e ao mesmo tempo reivindicação de mais democracia. Muitos participantes são jovens que nasceram na nova democracia, mas têm um mal-estar com a democracia; não com o regime, mas com o funcionamento das instituições. No desenvolvimento da democracia, escolhas institucionais foram feitas no Brasil sob a égide de concepções muito tradicionais. O modelo de representação vem dos anos 30. Da maneira como vem funcionando, levou ao esvaziamento dos partidos e do parlamento. A percepção disso pelos jovens está levando a uma forma nova de participar.

Nicolau: O movimento não é anticapitalista. Na agenda que apareceu, o que havia de mais antissistêmico era o movimento contra a mídia. Até pelos novos sistemas de comunicação, em que é possível furar a mídia. Cadê a Mídia Ninja dos partidos? A agenda que identifiquei nos cartazes é típica dos partidos social-democratas da década de 70. As pessoas querem justiça social, serviços públicos de qualidade, educação, saúde. Talvez o que furasse essa imagem fosse o tema dos direitos individuais. Mas não tem crítica à democracia, ao capitalismo, não tem frases contra a exploração.

Valor: Como os protestos se refletirão na política tradicional, por exemplo nas eleições de 2014?

Nicolau: Como as forças emergentes vão se comportar eleitoralmente é um enigma. Essa vitalidade não tem passagem na velha ordem. Como essas pessoas que entenderam a relação entre ir para a rua e a passagem de ônibus cair vão se comportar? O Congresso, o presidencialismo de coalizão, tudo vai ser avaliado. Podemos supor que esses jovens que estão pensando em política pela primeira vez não se comportarão homogeneamente e isso não vai ter efeito para ninguém. Mas será surpresa se a eleição do ano que vem gerar um Congresso parecido com o atual.

Torturra: Quem tomou posição mais clara tende a crescer, como a Rede, de Marina Silva. Porque ela se chama rede, vem de uma lógica horizontal, tem um discurso oriundo do ativismo, uma crítica ao funcionamento dos partidos, e está fazendo algo que tende a ganhar espaço: candidaturas autônomas.

Moisés: Mecanismos tradicionais de mediação entre interesses da sociedade e o núcleo decisório do sistema político estão entupidos. Nas minhas pesquisas de confiança nas instituições, desde meados dos anos 80 já tinha insatisfação com partidos e o Congresso, mas não nesse nível. As últimas pesquisas mostram que a desconfiança nos partidos ultrapassa 80%, e no Congresso bate em 79%. A pergunta sobre democracia chama atenção. 30% das pessoas acham que ela pode funcionar sem partidos. É um terço da cidadania. Há 30% também que acham que ela pode funcionar sem o Congresso. A novidade de junho é que pela primeira vez se fez na rua uma conexão entre o mau funcionamento das instituições e o mau funcionamento dos serviços públicos.

Nicolau: Um tema fundamental é a relação dos movimentos com a democracia representativa tradicional. Não é uma relação fácil. Como interpretar a invasão da Câmara Municipal do Rio? Nunca vi cenas assim. Gente pisoteando a mesa. Primeiro, tentaram entrar no Congresso em Brasília e na Câmara do Rio, que foi Câmara Federal até 1960. As duas casas que expressam historicamente o Legislativo do Brasil. Essa onda tem um componente decisivo, que estava adormecido na democracia brasileira: a participação. Mas me preocupa a relação ambígua de alguns segmentos com a democracia representativa. Ano que vem os movimentos vão ter de se posicionar em relação às eleições. Ficarei preocupado se começar uma onda a favor do voto nulo, por exemplo.

Moisés: Há uma imagem de que no Brasil o presidencialismo de coalizão funciona muito bem e garante a governabilidade. Esses acontecimentos levantaram uma dúvida sobre isso. A opinião pública está implicitamente rejeitando um sistema que faz alianças para todo lado.

Valor: Se as manifestações são em parte um rechaço ao presidencialismo de coalizão, como entender o que ocorreu na Espanha, nos EUA, na Turquia?

Moisés: Há um reflexo no tema da mediação entre instituições e sociedade. Um problema na qualidade da democracia. A diferença da democracia para outros regimes é o poder que ela dá aos cidadãos para participar e controlar. Não é que o presidencialismo de coalizão provocou a insatisfação, mas tem conexão com o sentimento de não se sentir representado.

Bucci: Há um denominador comum nesses países. O contingente que se manifestou vem do mundo da vida, não de setores organizados. São atores novos, que não passaram pela escola de teatro político. Há um descompasso entre o ritmo da vida, que trafega na velocidade da luz, e a linguagem da representação. A lógica pela qual construímos a institucionalização da vida política, a confecção de leis, impostos, licitação, ficou lenta demais. A política precisa se modernizar. O apelo é mundial.

Torturra: É preciso falar da fragilidade da sociedade em rede. Ela é ágil para ir à rua, mas sua atenção dura pouco. Ela é tão acelerada que sempre precisa pedir a próxima pauta. O plebiscito caiu, agora é o Amarildo [de Souza, pedreiro desaparecido no Rio depois de convocado para depor na UPP], daqui a duas semanas vai ser o quê? O metrô de São Paulo? Se a sociedade não se responsabilizar, o Estado não precisa ser reformado: é só esperar que a coisa esfrie. Isso reforça o pior sentimento: o cinismo. Dizer que não adianta, o mundo é assim.

Valor: Quando as manifestações começam com Movimento Passe Livre e terminam com Black Bloc, não há risco de desencadear uma reação conservadora?

Bucci: A dicotomia entre vândalos e pacíficos esconde nuanças. Grupos que explodem em violência contam com alguma cobertura. Quando não contam, há uma ruptura, a passeata esvazia. A Polícia Militar em São Paulo deu uma grande contribuição ao crescimento do movimento quando disparou contra todo mundo, fez aquela baixaria, o vandalismo fardado. Naquele dia, editoriais de dois jornais tinham clamado por rigor policial. Ela foi com toda a confiança, fez o que fez, o país não engoliu.

Torturra: A presença do Black Bloc é reação ao sentimento de que o movimento estava sendo tomado por fascistas. Mas isso é uma alucinação. O Black Bloc foi para a rua com o seguinte discurso: "Chega de ver a sede da Fiesp fazendo projeção em verde e amarelo. Chega de classe média alienada querendo determinar o que o protesto é".

Bucci: Um aspecto pouco trabalhado é a linguagem. Foi adotada uma linguagem que tem tudo a ver com manifestações que pipocaram em outros lugares. É algo próprio de um movimento que emerge não da esfera pública organizada, mas do mundo da vida. O mundo da vida é o território onde temos as conversas mais íntimas. Esse mundo não tinha acesso à visibilidade política e passou a ter. A pessoa sai diretamente da mesa de bar, sem passar por nenhuma assembleia, nenhuma convocação, e vai diretamente para a cena pública. Isso é novo.

Moisés: É outra maneira de perceber a política, mas tem enraizamento na experiência democrática brasileira. Por um lado, a democracia abriu possibilidades, por outro tem déficits sérios no funcionamento das instituições que deveriam dar espaço para a realização das escolhas das pessoas.

Bucci: Muita gente fala em despolitização. Não, há politização, só que com signos diferentes. O que é atacado com violência são signos do poder, como os bancos, palácios do poder, concessionárias, vans de empresas de mídia. Essas são vistas, numa face, como representantes do poder. Em outra face, são aqueles que podem mostrar para o mundo o que acontece aqui. Criou-se um vínculo fraterno quando jornalistas foram vítimas da violência policial. Mas os carros da mídia representam o poder. As coisas são signos e as passeatas sabem ler esses signos. Nas passeatas antiglobalização, há alguns anos, atacavam lanchonetes McDonald"s. Não era porque as pessoas detestassem o sanduíche, mas porque era o símbolo de um poder que eles combatiam.

Torturra: O Black Bloc não é um movimento. É uma estética, um código simples de reproduzir. Quando vão para a rua a sociedade identifica: o Black Bloc chegou. É um comportamento emergente. A ausência de liderança, que virou clichê, é ausência de mediação. A ação direta das pessoas, seja alguém de classe média que pintou a cara de verde e amarelo, seja o garoto de periferia que vai quebrar um banco.

Bucci: Algo que me preocupou foi a omissão da PM, em alguns atos quando nem havia mais manifestação, e houve saques que eram pura bandidagem. A polícia não agia, como se esperasse a temperatura subir, para que viesse um clamor por repressão. Esse clamor não veio. Tenho falado no vandalismo fardado, mas de modo geral um capítulo muito negativo foi o papel da PM.

Valor: Depois de tanto clamor por repressão, o que a ausência desse clamor pode significar?

Torturra: É muito significativa. A violência foi dirigida aos bancos. Se fosse uma quebradeira na avenida Paulista inteira, arrebentando bares e comércio, batendo em pessoas, o clamor por repressão viria. Grande parte da sociedade pacata se sente representada. Não está disposta a fazer como o Black Bloc, mas se diz intimamente: "Pode continuar, não quero que a Rota quebre esses meninos".

Moisés: O tema da Polícia Militar é importante. Em uma sociedade complexa, tem de ter polícia, alguém tem de garantir a lei. Mas na democracia, a polícia tem de ser democratizada: o procedimento, a ordem, o mecanismo. A autoridade civil tem de controlar a força militar. Senão, a democracia tem baixa qualidade. Em São Paulo, vi o governo jogar com isso, ora dar ordem de repressão muito forte, depois recuar, depois retomar. Por um lado, é o jogo político. Por outro, é descontrole democrático.

Torturra: Há uma cultura profunda na polícia e na sociedade de que a ordem é um valor em si, mais importante que a justiça, por exemplo. Grande parte da sociedade que está na rua acha o oposto. Que a ordem emana de um mundo um pouco mais justo.

Bucci: A desordem é uma ordem que não nos interessa. No Brasil, as contradições do país, que conduziram à situação que desencadeou nas manifestações de junho, tornaram rotineira uma desordem aviltante na vida de grandes parcelas da população. Não conseguir marcar uma cirurgia, não conseguir pegar ônibus, ser maltratado por policiais, ser desprezado pelo cinismo do poder público. Isso é uma desordem que o hábito ensinou a chamar de ordem. É contra isso que as manifestações se levantam. A própria corrupção também é uma desordem.

Valor: A desordem travestida em ordem remete a um país de desigualdades. A mudança recente da pirâmide social, que não foi acompanhada por melhores serviços públicos, amplificou a rejeição a esse estado de coisas?

Moisés: Mexer na estrutura social tem efeitos em várias dimensões. Nas manifestações, conta muito a entrada de jovens com acesso a educação maior que a dos pais. As pessoas querem mais do sistema.

Torturra: O brasileiro se acostumou à vida instável, a se preocupar com o fim do mês. Exigir cidadania era um luxo. Agora as pessoas respiram mais aliviadas. A classe média se sente com poder. Elas se perguntam: "Cadê a cidadania?". Até mesmo um governo de esquerda as tratou como consumidoras, não cidadãs. Por mais que 40 milhões de pessoas tenham subido, e é uma conquista histórica, a ascensão social não veio acompanhada de afluência democrática.

Valor: A opinião pública flutuou nesse período de um jeito bastante curioso. Primeiro clamou por repressão, depois apoiou, depois ficou sem saber o que pensar.

Torturra: Parte da causa da paranoia sobre a direita capturar o movimento é que a opinião pública não é mais estável. Ela está em rede, tem narrativas múltiplas e uma salada ideológica, não só na sociedade, mas na cabeça de quem está na rua. Tem gente que é anticomunista, mas defende a estatização dos bancos, quer pena de morte, quer saúde pública. A opinião publicada, que sempre teve o monopólio sobre o que é a opinião pública, está sendo constrangida. Na fusão de rede com rua, a salada ideológica se manifesta de milhões de maneiras. As placas tectônicas que estão se mexendo estão longe de parar. O ano que vem vai ser ainda mais intenso, com eleições e a Copa.

Nicolau: No início, houve um componente de ineditismo, a ausência de liderança que ajudou esse plasma a ir para a rua. A rua é um lugar de fazer política, claro. Mas é possível fazer política na rua por muito tempo? É possível criar agendas para manter os jovens na rua? No Rio, os jovens estão na rua porque descobriram um tema: "Fora Cabral". No começo, não ter tema foi importante para a vitalidade do movimento, como no lema de 1968: "Que floresçam flores". Esse ciclo dificilmente se recoloca.

Moisés: As pessoas diziam: "Quero participar, ser ouvido". Não é por acaso que tentaram invadir o Congresso, a Assembleia do Rio, a Prefeitura de São Paulo. São símbolos físicos das instituições. As pessoas estão expressando a percepção de que a participação é importante. Elas querem ocupar esse espaço, e podem. Agora, vão fazer um balanço das respostas do Executivo, do Legislativo, dos partidos. Com a Copa e as eleições, tem grande chance de voltarem as manifestações. Não sei se os partidos vão ser capazes de ouvir. Até onde percebo, não vão ouvir nada.

Bucci: A política é indispensável, mas ela precisa renovar seus procedimentos. Precisa ser capaz de escutar. Por exemplo, o papa. Ele andou no meio das pessoas, ficou no congestionamento. A organização mais conservadora do mundo é o Vaticano, mas o papa vem aqui e é mais horizontal que qualquer deputado, mais aberto ao diálogo que qualquer diretor de ministério. Tem mais abertura para o contato com as pessoas e disse uma palavra que o mundo político no Brasil não entende: diálogo. Como manifestação de rua, o papa Francisco foi uma grande lição.

Moisés: Ele fez uma frase absolutamente precisa: é preciso recuperar a dignidade da política, entendida como uma forma de atuação ética e eficaz no ambiente público, mas também uma forma de caridade. Não foi por acaso. Ele foi informado, percebeu o que se passa no país. A coisa mais interessante da visita do papa é que ele se colocou na posição de quem quer ouvir as pessoas. Num contexto em que ninguém ouve ninguém, isso teve um papel simbólico.

Torturra: Não podemos esquecer o lado emocional. Há algo de psicodrama, terapia coletiva, catarse, nas manifestações. Vem de uma certa carência das pessoas, na falta do espírito público que não seja estatal. As pessoas têm desejo de participação pública no mundo todo, na Turquia, nos Estados Unidos, na Espanha. É uma nova psicologia de massas. Há um caráter emocional represado, uma carência pública de sociedades segmentadas em classes de consumidores.

Bucci: Vou mais longe. As pessoas foram para a rua porque estavam insatisfeitas, mas também porque é um barato. E conecta as pessoas. É um sentimento de pertencimento: não pertencer a nada disso que está aí, mas a essas outras pessoas que se manifestam. É uma integração da sociedade que vem diretamente do mundo da vida, numa era transnacional de protestos

Valor: Uma novidade é o jornalismo cidadão. Mas o jornalismo é caro e muitos dizem que mídia tradicional pode se deixar capturar por interesses econômicos. Como fazer jornalismo cidadão sem ser capturado também?

Torturra: O papel da mídia está subestimado, inclusive na percepção de que é um inimigo e alvo. A crise de linguagem é uma crise narrativa. As pessoas não se sentem traduzidas. Além da violência policial, além dos editoriais, um componente decisivo foi a percepção de que estão mentindo para nós. Não estão respeitando nossa inteligência, nossa cidadania. A mídia independente, da qual sou representante, é um fenômeno de cidadãos conectados. O cidadão que filma e compartilha representa a crise de mediação. Os partidos estão em crise, o Congresso, a mídia, as igrejas. Antes eles tinham o monopólio da mediação. A capacidade de se comunicar diretamente e coletivamente significa que o que era uma conversa de bar, e podia facilmente tornar-se a cultura cínica de que é assim mesmo, mudou.

Bucci: É um discurso que se faz através e para além das massas. Assim como o uso da bandeira nacional, embora seja um símbolo um tanto conservador. As pessoas abraçam a bandeira para dizer o quê? Que o país somos nós, não são vocês. A torcida, na Copa das Confederações, cantava o hino nacional além do protocolo. Vou fazer a confissão de uma coisa brega: eu achava aquilo lindo, eu ficava até mesmo bastante emocionado. Eram pessoas tomando posse do símbolo da nação. Cantamos isso até aonde quisermos. Não são vocês do protocolo que vão dizer quando começa e termina.

Moisés: A linguagem serve para expressar conteúdos. Quando vamos examinar os conteúdos, tem uma reivindicação forte de ser incluído, participar e influir. É uma reivindicação democrática. Não vi ninguém com cartaz contra a democracia. O mundo da vida está presente. A maneira como as pessoas percebem sua vida e como isso tem ligação com a esfera pública. É a constatação de um mal-estar com a democracia existente, não com a democracia ideal. É a reivindicação de mais democracia. Não é pouca coisa, no Brasil de tanta tradição conservadora, tutelar, patrimonialista.

Torturra: O jornalismo cidadão não vai substituir o jornalismo comercial. Ele vem provocá-lo, arejá-lo, causar uma saudável crise de consciência. É uma operação cara, claro, mas precisa ser tão cara? A TV precisa ter o tamanho que tem hoje? Será que não se pode diminuir o custo com equipamentos e tecnologia, para difundir a informação de outra forma? Será preciso gerar tanto lucro para tão pouca gente e pagar tão mal os jornalistas? Será que não podemos criar estruturas um pouco mais democráticas? Ao mesmo tempo, o leitor, o espectador, que já se sente mais com poder, vai ter que se reformular. Vai ter que entender que com esse novo poder de confrontar as narrativas vem a responsabilidade de não ser só um replicador de informação. Precisa checar também. E precisa decidir se está disposto a financiar formas colaborativas de mídia, já que rejeita, por exemplo, a notícia de um jornal que tem anúncios e talvez seja manipulado por causa disso. Mesmo assim, não defendo o fim do modelo vigente. Seria um país pior se os jornais fechassem.

Bucci: O país seria melhor se a imprensa fosse melhor e seria pior se a imprensa fechasse. A imprensa é uma instituição e não se confunde com o conjunto dos meios. Mídia Ninja é imprensa, Valor Econômico é imprensa. A distinção é crucial para entender por que os manifestantes abraçavam jornalistas e agrediam viaturas de imprensa. Há problemas que precisam ser enfrentados. Os jornalistas se sentem descartáveis. Há inclinações partidárias nas redações. Mas quem faz a imprensa são bons jornalistas profissionais. Sem redações independentes, que pagam os custos da reportagem, não temos imprensa livre.

Valor: Um símbolo surgido das manifestações mais recentes é o pedreiro Amarildo. O que se pode esperar do confronto com a arbitrariedade da polícia?

Nicolau: Fiquei bastante surpreso com a força desse movimento. Teve outro episódio em que a polícia invadiu o complexo da Maré, no Rio, e morreram dez pessoas. Isso não foi tão politizado. O que motiva as manifestações no Rio de Janeiro é a política do governador. O caso Amarildo envolve a polícia e a UPP, que é a melhor coisa que o governador pode oferecer com resultados palpáveis para a vida da cidade. Por que o Amarildo? Porque é a polícia atuando à maneira tradicional numa UPP.

Torturra: Há algo no movimento que vem da rede e se funde com a rua. Há coisas que sobem e, por algum motivo, ecoam. São os memes, ninguém sabe por que pegou. Por que a Maré não pegou e o Amarildo pegou? Talvez o nome Amarildo soe melhor, ou veio no dia certo. Alguém fez uma frase, "Onde está Amarildo", quase um slogan. Tem uma coisa publicitária da nossa geração. Quem sabe manipular isso se dá muito bem. A Rocinha se sentiu com poder quando viu manifestantes de classe média pedindo satisfação sobre um morador da favela. Houve uma articulação em rede, muito contato no Facebook. Essas pontes estão se estabelecendo através de signos e códigos.

Valor: A política tradicional tentou responder, primeiramente, com a proposta de reforma política, mas as manifestações não parecem muito animadas com essa perspectiva.

Nicolau: A reforma política não mobiliza as redes e as pessoas porque estamos falando em reformar a velha ordem. Isso não interessa ao jovem. É uma questão sistêmica e inclui o funcionamento do presidencialismo de coalizão, mas essa não é a questão das pessoas. O que apequenou a política nos últimos tempos foram os desmandos. O governo do Rio não caiu em desgraça com a população por causa das políticas públicas. Foi o abuso, o tratamento que deu aos bombeiros, a proximidade com os empresários. A política pública foi testada nas urnas e teve 66% dos votos há dois anos e meio.

Moisés: Quando as pessoas querem pensar em soluções, parte do bloqueio é porque as instituições não oferecem nada. Hoje, o movimento talvez não queira colocar esse tema, mas em algum momento isso virá à tona. Vamos ter de mexer nisso. É uma implicação do movimento. Para criar um quadro com a mínima possibilidade de participação e intervenção das pessoas, é inevitável voltar ao tema: como é a representação?

Bucci: Uma coisa que deixa desconcertados os donos do poder é que os manifestantes não são candidatos a nada. Não querem substituir o poder, eleger deputado, fazer um senador. As pessoas são candidatas a cidadãs. O movimento é candidato a ser tratado com respeito, ele vem enquadrar o poder. O político reage propondo chamar essas pessoas e fazer aliança. Mas eles não querem. Isso desprograma o automatismo do vício político.

Moisés: O tema da reforma política é importante. O sistema eleitoral, financiamento de campanha e o excesso de poder do Executivo sobre o Legislativo, que diminui a importância dos parlamentares e dos partidos. Com a importância diminuída, o político entra em qualquer coisa. A reforma política pode ser a via para dar voz ao mundo da vida. Mas ao fazer isso, ela toca nas instituições. Vamos fazer democracia sem nenhuma instituição? Não somos uma sociedade de 5 mil atenienses na Antiguidade, somos 200 milhões.

Nicolau: Os partidos, instituições que processam demandas e ligam os cidadãos ao governo, envelheceram. Quando ouço meus estudantes falando do sistema representativo e da elite brasileira, parece o tempo da Revolução de 1930. Eles lidam com os signos da velha política como algo que não diz nada da vida. Como compatibilizar uma juventude que opera numa velocidade incrível, com organizações da velha ordem democrática, que operam em outra? Como compatibilizar uma nova ordem de comunicação, de sociabilidade, com instituições criadas com parlamentos de origem medieval e partidos com origem no seculo XIX? No Brasil, esse distanciamento apareceu de maneira cabal. Talvez porque o partido mais bem-sucedido na conexão entre sociedade e política, que foi o PT, também envelheceu.

Torturra: Quando entrevistamos pessoas que repudiavam a bandeira do Partido dos Trabalhadores, não era repúdio à política social. Era contra a aliança com Renan Calheiros e Sarney, o apoio de Marco Feliciano. Tem uma juventude que, quando ouviu falar de política, Lula já era presidente e agia de maneira incoerente com a tradição de luta popular. Na cabeça do jovem que está começando a descobrir política, a bandeira do PT representa hipocrisia. Quando veem as bandeiras, gritam: "Oportunistas!". E os petistas, que foram à rua para defender seu histórico, não a presidenta, respondem: "Fascismo!". Mas a maioria das pessoas com bandeira do Brasil defendia valores que o petista de carteirinha defenderia.

Bucci: Quando gente de camisa vermelha foi atacada, tinha, talvez, alguma semente de fascismo. Mas é preciso lembrar que camisa vermelha, hoje, é símbolo do poder, não da contestação. É uma dessas ironias do Brasil, mas a bandeira vermelha virou chapa branca. Quando as pessoas repudiam a camisa vermelha, não repudiam um partido com histórico de lutas, mas o governo.

Torturra: Um erro do movimento é achar que a ausência de liderança é um valor em si. Precisamos de mais liderança, não menos. Não seria alguém para mandar em todo mundo, mas para representar as vozes. Alguém que vai ser bem mais cobrado que as lideranças analógicas. Também não tem ninguém traduzindo isso culturalmente. Os porta-vozes que faltam na política, capazes de traduzir e atualizar o sistema, também faltam na arte. Algumas pessoas captam esse sentimento. Se não é mais o líder político ou o artista, talvez sejam [Julian] Assange, [Edward] Snowden, [Bradley] Manning.

Bucci: São pessoas que defenderam o direito ao segredo da pessoa humana contra a opacidade do Estado. Exigem o dever de transparência do Estado. Isso é uma palavra de ordem atual e democrática. O Estado tem o dever de ser transparente. E nós temos o direito de ter segredos, individualmente.

Professor doutor da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, Eugênio Bucci escreveu livros como "Sobre Ética e Imprensa" (Companhia das Letras)

Professor titular do departamento de ciência política da Universidade de São Paulo (USP), José Álvaro Moisés estuda teoria democrática e comportamento político

Especialista no estudo de partidos políticos e eleições, Jairo Nicolau é professor de ciência política na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Bruno Torturra, de 34 anos, é cofundador da Mídia Ninja, coletivo de jornalistas que se propõe como alternativa ao "mainstream" ao transmitir protestos pelo Brasil

Fonte: EU & FIM DE SEMANA / Valor Econômico