segunda-feira, 1 de julho de 2013

OPINIÃO DO DIA – José de Souza Martins: o plebiscito já foi feito

Propor uma Constituinte neste momento é propor um golpe contra a Constituição, que é boa, abrangente e inovadora. O povo não foi às ruas pedir um golpe de Estado. Foi à rua pedir o cumprimento da lei. Convocar um plebiscito para votar as políticas a serem adotadas em relação aos problemas levantados agora pelas multidões pode ser um sinal de fraqueza e insegurança. O plebiscito já foi feito, nas ruas.

José de Souza Martins, sociólogo, professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, in “Revolta do vintém”, Aliás / O Estado de S. Paulo, 30/6/2013

Manchetes dos jornais de hoje

O GLOBO
Olé!
Na crise, Dilma convoca ministério
Governo tem máquina cara e pesada
Rio cresce bem mais que o país

FOLHA DE S. PAULO
Popularidade de Alckmin cai; 40% rejeitam Haddad
A seleção voltou
Cerimônia de encerramento tem protesto no gramado
Importação de médicos divide opiniões no país
Dilma vai cobrar agenda positiva de ministros

O ESTADO DE S. PAULO
Após pesquisa, base endurece com Dilma e faz cobranças
Dono da festa e campeão
Para cumprir meta fiscal, governo mexe no BDNES

VALOR ECONÔMICO
Desvalorização de commodities ameaça balança
Lula descarta disputar Presidência
Estádios do Brasil são os mais caros

BRASIL ECONÔMICO
Corrupção começa na eleição'

ESTADO DE MINAS
Longo caminho pela frente

O TEMPO (MG)
Protestos deixam rodovias fechadas na Grande BH neste domingo
Reforma política entra na pauta à força

CORREIO BRAZILIENSE
Merenda dos estudantes é guloseima, diz IBGE
Pau e pedra

GAZETA DO POVO (PR)
O campeão voltou
Protestos mexem no jogo político eleitoral de 2014
Governo estuda PPP para duplicar rodovias
Tarifa de ônibus a R$ 2,70 entra em vigor hoje
Meta de geração de empregos está em risco
Um ano depois, egípcios voltam à Praça Tahrir
Por trás dos protestos

ZERO HORA (RS)
Dilma convoca ministros para evitar paralisia

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Manifestações do lado de fora do Maracanã

O que pensa a mídia - editoriais dos jornais de hoje

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Após pesquisa, base endurece com Dilma e faz cobranças

Diante do recuo da popularidade e da intenção de voto na presidente, governistass admitem votar contra medidas defendidas pelo Planalto no Congresso e devem recusar, entre outros, o projeto que inibe a criação de mais partidos. Aliados também cobram trocas na articulação política e no Ministério da Fazenda. A presidente Dilma Rousseff, que esteve fechada ontem em conversas com assessores e oito ministros, comanda hoje uma reunião de seu Ministério. Segundo o titular das Comunicações, o encontro se destina a "colocar todos os ministros a par das resoluções do governo, dos encaminhamentos e também fazer recomendações de como conduzir" as medidas de resposta às manifestações de protesto das últimas semanas.

Após Dilma cair nas pesquisas, base endurece relação e cobra mudanças

A queda da popularidade e das intenções de voto na presidente Dilma Rousseff, em pesquisas após as manifestações de rua, apontam para uma mudança na correlação de forças do governo federal com os aliados no Congresso Nacional. Em vez de meros carimbadores de propostas do Executivo, governistas já admitem que a "cartilha da presidente" não será rezada cegamente pelo Legislativo. Ainda que reservadamente, aliados também cobram trocas na articulação política e na equipe econômica.

Manifestações e pesquisas também mexeram com a rotina de Dilma. Hoje, a presidente faz uma rara reunião ministerial para "colocar todos os ministros a par das resoluções do governo, dos encaminhamentos e também fazer recomendações de como conduzi-los", disse o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que se reuniu ontem com Dilma e outros sete colegas de Esplanada. A reunião, segundo Bernardo, é para "não deixar os projetos pararem, todos saberem de que forma estão sendo encaminhadas as reivindicações e. também garantir que não haja paralisia ou retrocesso dos programas sociais".

Se no Executivo o momento parece ser de freio de arrumação, as quedas de 27 pontos na avaliação positiva de Dilma e de 21 pontos de intenção de voto na presidente captada pelo Datafolha levou aliados a afirmar que são contrários a propostas de interesse do Planalto no Legislativo. Defendem, também, mudanças na equipe econômica e na articulação política, caso essa última não seja fortalecida.

"Muda a relação do Congresso com a presidente, ela vai ter que dialogar mais para aprovar os projetos propostos, inclusive vai ter que abrir um canal com a oposição", adverte o deputado Lúcio Vieira Lima, cacique do PMDB baiano, "A pesquisa foi um desastre. Agora vamos ter que remar tudo de novo. Vai ser uma eleição dura, acabou a brincadeira. Jogaram uma eleição fora em 30 dias, vai ter que recompor o governo. A Dilma vai ter que, realmente, ter um governo de coalizão, senão vai ficar sozinha", disse um senador líder de partido aliado.

Ministros* Surpreso com a dimensão da queda, o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), defende que o governo tenha. um interlocutor nos moldes de José Dirceu e Antonio Palocci, que chefiaram a Casa Civil.

"Com isso facilitaria muitas coisas", disse Nogueira. Perguntado se defendia a saída das ministras das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e da Casa Civil, Gleisi Hoflman, o senador respondeu: "Ou (devem) sair ou ganhar autoridade, porque quem faz o ministro é a própria presidente". Outro senador próximo a Dilma defende reservadamente: "A Ideli e a Gleisi vão precisar sair".

A pressão pela troca da equipe econômica também cresce entre aliados. Persiste a preocupação com a inflação, que não foi debelada. "O Guido Mantega não tem como se manter, porque ele não inspira mais confiança", disse outro líder dabase aliada, referindo-se ao ministro da Fazenda.

Projeto» No Congresso, a primeira vítima da "cartilha da presidente" será o projeto que inibe criação de partidos. Patrocinada pelo Palácio do Planalto, a proposta prejudicaria a eventual candidatura da ex-ministra Marina Silva. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não deve colocar mais o projeto em pauta. "Se aprovar agora, é casuísmo, ainda mais no momento em que a Marina está bem nas pesquisas", afirmou o líder do PMDB no Senado, Eunícío Oliveira (CE) , outrora defensor da aprovação do texto.

Também acuados pelas manifestações, os parlamentares começaram a aprovar um "pacote positivo" de medidas, algumas das quais sem combinar com o governo. Entre as propostas, está a que estabelece o repasse de recursos do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), atualmente retidos pela União, para Estados e municípios.

O líder do PT no Senado, Wellington Dias, afirmou que ainda não é possível prever mudanças na relação de aliados do Congresso frente ao novo cenário de popularidade da presidente. Para o petista, entretanto, já existia uma tensão no ar. "Antes das mobilizações, já havia uma alteração na relação de quem era base e oposição. O tensionamento já existia", destacou.

O ex-presidente Lula elogiou os protestos no Brasil ontem em encontro sobre segurança alimentar na Etiópia

Em pleno domingo, ministros reunidos no Alvorada

Com as "vozes das ruas" cada vez mais insatisfeitas com o governo federal, a presidente Dilma Rousseff optou por ficar em Brasília e reunir-se com ministros e assessores ontem em vez de acompanhar a vitória do Brasil sobre a Espanha na Copa das Confederações, no Rio. Ela havia sido vaiada durante a abertura do evento, em 15 de junho. Aloizio Mercadante (Educação), Alexandre Padilha (Saúde) e Paulo Bernardo (Comunicação) foram alguns dos convocados para a reunião no Palácio da Alvorada.

Presidente tem pior desempenho entre jovens

Após três semanas de manifestações, pesquisa Datafolha mostra que a presidente Dilma Rousseff perdeu intenção de voto e não venceria mais as eleições presidenciais de 2014 no 1° turno. Segundo dados divulgados ontem pelo jornal Folha de S.Paulo, Dilma tem o seu pior desempenho entre os mais jovens, justamente a faixa etária mais presente nos protestos que tomaram as ruas das principais cidades do País.

Na média, a presidente tem entre 29% ou 30% das intenções de votos nos cenários pesquisados para a eleição do ano que vem. Mas, entre os eleitores de 16 a 24 anos, esse porcentual cai para 27.

No quadro mais provável para a sucessão, que inclui Marina Silva (sem partido), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB), a petista tinha 51% das intenções de voto nos dias 6 e 7 deste mês, e agora tem 30%. Ela ainda lidera, mas teria que disputar o 2º turno com Marina, que passou de 16% para 23%.

Quem também cresceu nessa pesquisa foi o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, que nega a intenção de ser candidato. Há três semanas, tinha 8% das intenções de voto. Agora subiu para 15%.

Outra má notícia para a presidente é que a imagem do seu antecessor Luiz Inácio Lula da Silva não foi tão afetada com os protestos. No cenário com Marina, Aécio e Campos, o ex-presidente alcança 46% das intenções de voto. Na pesquisa anterior, ele tinha 55%.

Números do Datafolha divulgados sábado mostram ainda que, no mesmo período, a popularidade da presidente Dilma caiu de 57% para 30%.

Fonte: O Estado de S. Paulo

‘É preciso mesmo ir para as ruas’, afirma arcebispo

Dom Cláudio Hummes diz que internet "permite ao povo se antoconvocar, sem a necessidade de líderes"

O homem que desafiou o regime militar e abriu as portas das igrejas do ABC para os trabalhadores em greve no fim cios anos 1970 e início dos anos 1980 - quando era bispo de Santo André d. Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo, defendeu as manifestações que tomaram as ruas do Pais, "Aqueles que não se sentem ouvidos precisam mesmo ir para as ruas", disse, "O que estamos presenciando é uma forma de realidade muito bonita."

Hummes falou sobre os protestos na noite de sábado, no auditório do Colégio São Bento, no centro de São Paulo, para uma platéia de católicos. A palestra foi organizada pelo movimento Comunhão e Libertação, “A internet, as redes sociais facultam ao povo a possibilidade de se autoconvocar, sem a necessidade de líderes ou de sindicatos", comentou o cardeal “Por isso são manifestações por natureza sem líderes fortes e permanentes:" Hummes afirmou que é preciso “aprender a lidar” com esses eventos. “Nem os sindicatos nem o governo estão sabendo lidar com isso"", pontuou, citando a pesquisa do Datafolha, que mostrou queda da popularidade da presidente Dilma Rousseff (PT), de 57% para 30% como prova de que as autoridades não estão sabendo responder corretamente os clamores dos manifestantes. “Isso é eficaz, A sociedade conseguiu se expressar e está obtendo muitas vitórias. É muito bom", disse.

Ele condenou, entretanto, a violência e o vandalismo nas manifestações, “É um custo social. Sempre tem quem aproveite a oportunidade. E a polícia, a segurança pública tem de aprendera lida r com isso também .Enfim, é uma escola: com o tempo, todos vão aprendendo a lidar com esse fenômeno novo, que veio para ficar e para somar com a democracia”, a firmou.

“O Estado não pode pretender que a sociedade esteja a serviço dele. O Estado é que esta r serviço de um povo" O cardeal também disse que a “revolução” contida nos Evangelhos “não contradiz esse tipo de fenômeno”. “A mensagem de Cristo tem tudo a ver com essa reivindicação do povo. Por isso temos de estar presentes .Na rua a gente evangeliza de fator"

Papa. Ao Estado, Hummes comentou sobre as impressões que o Papa Francisco vem tendo das manifestações. Ele não teme que elas atrapalhem a visita que o pontífice fará ao Brasil entre 22 e 28 de julho,para a Jornada Mundial da Juventude. "é difícil prever alguma coisa. Mas não esperamos que algo aconteça porque as reivindicações nào têm a ver com a visita do papa. Têm a ver com o nosso governo. Por isso supomos que não haverá grandes problemas.”

Fonte: O Estado de S. Paulo

Praça de guerra fora do Maracanã

Enquanto torcedores assistiam à final da Copa das Confederações, manifestantes entraram em confronto com policiais militares

João Valadares, Pedro Venâncio e Diego Abreu

Rio de Janeiro e Brasília — Se dentro de campo, o Brasil conquistou a Copa das Confederações com uma vitória incontestável sobre a Espanha, do lado de fora do Maracanã, um conflito entre policiais e manifestantes deu a tônica de mais um dia conturbado no país. O protesto foi iniciado à tarde de maneira pacífica, mas, no começo da noite, transformou os arredores do estádio em uma verdadeira praça de guerra. Bombas foram lançadas por policiais em resposta a pedras e garrafas arremessadas. Houve tiros com balas de borracha, pessoas feridas e desespero entre moradores e comerciantes, que tiveram que fechar as portas cedo.

Os manifestantes saíram pacificamente da Praça Saens Peña, no bairro da Tijuca, a um quilômetro do Maracanã, em direção ao estádio. Ao longo do caminho, o protesto foi ganhando adesões. Na linha de frente, homens encapuzados vestiam roupas pretas. Por volta das 18h, o grupo chegou ao cruzamento da Rua São Francisco Xavier com a Avenida Maracanã, onde a polícia montou três linhas de isolamento — com homens da Polícia Militar (PM), da Força Nacional e da tropa de choque — para impedir que os ativistas se misturassem aos torcedores.

A manifestação, que até então seguia pacífica, ganhou contornos de guerra por volta das 18h30, quando parte dos mais de 5 mil manifestantes começaram a jogar garrafas de plástico e pedras em direção aos policiais. A reação da polícia foi imediata. De forma truculenta, os PMs avançaram com força máxima em direção à multidão. Lançaram bombas de gás lacrimogêneo, de efeito moral e sprays de pimenta, além de dispararem tiros com balas de borracha. O caveirão — veículo blindado da tropa de choque da PM — foi ao encontro dos manifestantes, com rifles mirados para as pessoas.

No momento mais tenso do conflito, que durou cerca de uma hora, os manifestantes não recuaram e começaram a disparar fogos de artifício e pedras contra os policiais. O cenário era caótico. Homens encapuzados tentaram fazer barricadas com fogo para impedir o avanço dos policiais. Tudo aconteceu entre dois postos de gasolina. Ignorando os riscos de explosão, policiais continuaram a jogar bombas, e os manifestantes, fogos.

Os jornalistas que faziam a cobertura do protesto ficaram encurralados em dos postos de combustível. Aos gritos, um policial ameaçou os profissionais. “Quem ficar aqui vai morrer!”, repetia o PM. De outro lado, pessoas passavam mal. Uma mulher com o filho no colo chorava muito.

Com as mãos para o alto, um policial do comando da tropa de choque pediu para os manifestantes destacarem um negociador, mas não houve trégua. O grupo se dispersou somente por volta das 19h30, por efeito das bombas que deixaram as pessoas sem conseguir respirar nem enxergar.

Ao fim da partida, o clima era pacífico nas ruas que cercam o Maracanã. Um conflito isolado ocorreu na Rua Moraes e Silva, onde três bombas explodiram. Entre os manifestantes, a maioria protestava contra a realização da Copa do Mundo e contra a concessão do Maracanã para a iniciativa privada. Havia algumas pessoas com bandeiras do PSTU e do PCdoB, que não foram ameaçadas, como ocorreu em atos anteriores.

A polícia apreendeu 17 coquetéis molotov, sete deles com um único manifestante. Em uma rede social, o major Ivan Blaz, relações públicas da PM, afirmou que a corporação tentou negociar, mas em vão. “Não houve possibilidade de negociação, eles se recusam a negociar”, enfatizou. Cerca de 10 mil homens das polícias participaram da operação. Segundo a PM, pelo menos oito pessoas ficaram feridas.

Dentro do estádio, torcedores relataram ter sentido irritação nos olhos, provocada pelo uso de bombas de gás lacrimogêneo na área externa do Maracanã. Por volta dos 30 minutos do primeiro tempo, o público começou a reclamar de incômodo nos olhos. “Já estávamos sentindo algo estranho na arquibancada. Quando fui ao bar do estádio, mais próximo da área externa, meu olho ardeu muito, queimou”, relatou o advogado André Pinheiro, 34 anos.

Outros protestos

Embora o Rio tenha sido o palco do maior protesto do fim de semana, manifestantes também foram às ruas em São Paulo, em Salvador e em Brasília. Na capital paulista, um grupo de 50 pessoas seguiu com bandeiras e faixas em direção a um telão instalado no Vale do Anhangabaú, no Centro, para cobrar investimentos nas áreas de saúde, educação, moradia, trabalho e transporte. Durante a partida entre Brasil e Espanha, os manifestantes pararam para assistir ao jogo.

Em Salvador, onde ocorreu ontem a disputa do terceiro lugar entre Itália e Uruguai, 200 manifestantes foram protestar em frente ao Hotel Bahia, onde estava hospedada a delegação da Fifa. O clima chegou a esquentar quando o grupo se aproximou da barreira policial. Um homem jogou fogos de artifício na polícia, que não reagiu. O ato ocorreu sem maiores incidentes.

Colaborou Amanda Almeida

Linha do tempo

• 6 e 7 de junho — Convocados pelas redes sociais pelo Movimento Passe Livre, 5 mil manifestantes se mobilizam em São Paulo contra o aumento de
• R$ 0,20 nas tarifas de ônibus e metrô. Começam os confrontos com a polícia paulista, que reage com truculência à passagem dos manifestantes.
• 11 a 14 — Atos de protesto acontecem no Rio de Janeiro e em São Paulo. Os confrontos com a polícia se intensificam.
• 15 e 16 — Primeiro protesto em Brasília, nas proximidade do Estádio Mané Garrincha , com 2 mil manifestantes, marca a abertura da Copa das Confederações. A presidente Dilma Rousseff (foto) é vaiada três vezes pela torcida que aguarda o jogo entre Brasil e Japão. No dia seguinte, o Rio de Janeiro também se torna palco de uma mobilização, nos arredores do Estádio do Macaranã, onde Itália e México se enfrentaram.
• 17 — Quase 300 mil pessoas em mais de 20 cidades ocupam as ruas para protestar, com uma extensa pauta
• de reivindicações.
• 18 e 19 — Moradores de mais de 30 cidades engrossam a onda de protestos. Em São Paulo, a ação é marcada pela tentativa frustrada dos manifestantes de invadir a sede da prefeitura (foto). Há confrontos com a polícia. Começam as depredações. No dia seguinte, mais de 130 mil pessoas em 31 cidades dão prosseguimento às manifestações. Em Belo Horizonte, lojas passam a ser saqueadas nos protestos que
• ocorrem na cidade.
• 20 — Mais de 1 milhão de pessoas em cerca de 100 cidades saem às ruas. A noite fica marcada pela ação de baderneiros que tentam depredar o Palácio do Itamaraty, em Brasília. Os manifestantes jogam até coquetéis molotov nos policiais, que reagem com violência. Prefeitos e governadores anunciam a revogação do aumento
• do preço das passagens.
• 21 — A presidente Dilma Rousseff, em discurso transmitido em cadeia de rádio e tevê, se pronuncia publicamente pela primeira vez sobre a onda de protestos. Ela afirma que vai dialogar com os manifestantes e promete avançar nas demandas da população. O dia é marcado por mais de 150 mil pessoas nas ruas de 80 cidades.
• 24 — A presidente recebe representantes do Movimento Passe Livre e, depois, prefeitos e governadores. Ela anuncia um plebiscito e uma constituinte exclusiva para a reforma política. Os protestos continuam, com mais de 30 mil pessoas, em mais de 50 cidades.
• 25 – Deputados arquivam a PEC 37, que proibiria o Ministério Público de conduzir investigações criminais. Também aprovam a destinação de 75% dos royalties do petróleo para educação e de 25% para saúde. Nas ruas, bandeiras de partidos e de sindicatos são hostilizadas. Em Brasília, a manifestação é menor, mas
• marcada pelos confrontos entre manifestantes e policiais.
• 26 — O STF manda prender o deputado rondoniense Natan
• Donadon (ex-PMDB) por corrupção.
• 27 — Estandartes de partidos e
• de ONGs começam a ser vistos
• no protestos.
• 28 e 29 — Donadon se entrega à PF na sexta. Protestos continuam no país.

Semana será intensa

A presidente Dilma Rousseff passou o fim de semana reunida com os ministros mais próximos. Para evitar vaias, ela preferiu não assistir à final da Copa das Confederações no Maracanã, ontem, no Rio de Janeiro. Mas acompanhou o jogo e, após a vitória do Brasil, parabenizou a Seleção Brasileira (leia mais no SuperEsportes). No domingo, Dilma ficou no Palácio da Alvorada preparando o terreno para a reunião ministerial que convocou para hoje, ocasião em que tratará de soluções para contornar a crise que atinge o governo, cuja avaliação positiva caiu 27 pontos percentuais nas últimas semanas.

Estiveram com Dilma os ministros da Educação, Aloizio Mercadante; da Saúde, Alexandre Padilha; da Justiça, José Eduardo Cardozo; das Comunicações, Paulo Bernardo; do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel; e da Secretaria de Comunicação Social, Helena Chagas. Dilma tratou com os ministros de assuntos como os itens do plebiscito sobre a reforma política que serão sugeridos em mensagem a ser enviada para o Congresso amanhã.

O Legislativo começa a semana em ritmo acelerado. Além de dar andamento ao plebiscito, os parlamentares terão agenda intensa. Os deputados vão apreciar o projeto, já aprovado pelo Senado, que transforma a corrupção em crime hediondo. Já o Senado quer aprovar a proposta que destina os royalties do petróleo para a saúde e para a educação, e a matéria que institui o passe livre estudantil. (DA e AC)

Agenda

Executivo
A presidente Dilma Rousseff se reúne hoje com ministros para tratar de assuntos como o momento econômico do país. Na reunião, Dilma ouvirá os ministros sobre a onda de manifestações que invadiu as ruas do Brasil e deve acertar os últimos detalhes do texto que pretende enviar amanhã para o Congresso Nacional propondo a realização de um plebiscito sobre a reforma política.

Legislativo
Na Câmara, os deputados devem votar nesta semana o projeto que torna a corrupção crime hediondo. O texto foi aprovado pelo Senado na semana passada. Também deve entrar em pauta — com a tendência de ser rejeitada — a proposta que permite a chamada “cura gay” em consultórios de psicologia. Já o Senado encerra a votação do projeto que destina os royalties do petróleo para as áreas de saúde e educação.

Judiciário
O Supremo Tribunal Federal (STF) realiza hoje a sessão de encerramento do semestre do Judiciário. Ao fim, o presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, deve fazer um balanço sobre os principais julgamentos realizados pelo tribunal nesta primeira metade do ano. Mesmo diante da crise pela qual o país atravessa, Barbosa confirmou que os recursos apresentados pelos réus do mensalão serão apreciados em agosto.

Fonte: Correio Braziliense

Na crise, Dilma convoca ministério

A presidente Dilma marcou para hoje reunião ministerial e quer mostrar que o governa não está paralisado. Entre os aliados, cresce a percepção de um “volta Lula" para 2014

Dilma convoca ministros

Em meio à crise, governo quer mostrar que não está parado nem mexerá em programas sociais

O BRASIL NAS RUAS

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff pretende reforçar, na reunião ministerial que presidirá hoje, a partir das 16h, o compromisso de seu governo com responsabilidade fiscal e programas sociais. A mensagem que deverá passar aos ministros é que o governo está atento aos apelos das ruas, trabalha para atender às novas reivindicações, mas sem se descuidar do equilíbrio fiscal e das conquistas asseguradas na área social. A reunião ministerial marca o momento mais delicado da gestão da presidente Dilma, cuja popularidade está caindo. Há crise na economia e protestos nas ruas por mais e melhores serviços públicos.

O compromisso com o equilíbrio das contas públicas foi enfatizado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista publicada ontem no GLOBO. Ele afirmou que haverá cortes nos gastos de custeio para compensar despesas adicionais que surgiram em função de novas demandas e não descartou aumento de impostos, se necessário.

Dilma deverá fazer uma recomendação expressa para que os programas sociais não sejam descontinuados em decorrência das novas demandas. A ideia é mostrar que o governo não está parado por causa da crise e os programas sociais continuam funcionando a todo vapor.

- Precisamos ter olhos e atenção às novas reinvidicações das ruas, olhando a questão fiscal e os programas já existentes. As conquistas que a população mais pobre teve nos últimos anos serão preservadas. Não haverá retrocesso - garantiu o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, resumindo o recado inicial da presidente Dilma em uma reunião realizada ontem, antes da final da Copa das Confederações, jogo ao qual ela não foi.

Bernardo participou da reunião, no Palácio do Alvorada, junto com os ministros Gilberto Carvalho (Secretaria Geral da Presidência), Ideli Salvatti (Relações Institucionais), Eleonora Menicucci (Políticas para as Mulheres), Luiza Bairros (Promoção da Igualdade Racial) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior). O assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, também esteve com a presidente na residência oficial.

Dilma pretende detalhar no encontro de hoje com seus auxiliares as iniciativas anunciadas por ela segunda-feira passada em resposta às manifestações e protestos das ruas. Elas fazem parte do que chamou de cinco "pactos pelo Brasil": responsabilidade fiscal, reforma política e combate à corrupção, Saúde, Educação e transporte coletivo.

Outro tema que deve ser objeto de um detalhamento maior da presidente na reunião de hoje é a possibilidade de convocação de um plebiscito para tratar da reforma política. Ela consultou, semana passada, o Tribunal Superior Eleitoral e pretende enviar mensagem com a proposta, ainda esta semana, ao Congresso. Se aprovada, o Congresso publicará um decreto legislativo e dará início ao processo de consulta popular. Dilma ainda não divulgou as perguntas que deverão ser feitas à população. Ontem, ela recebeu o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para tratar do plebiscito. O governo ficou satisfeito com o resultado da pesquisa Datafolha que indicou que 68% dos brasileiros são favoráveis à consulta popular.

Dilma também comentou na reunião no Alvorada a queda em sua popularidade em decorrência dos protestos das últimas semanas. Segundo um interlocutor, ela demonstrou tranquilidade:

- Não foram manifestações apenas contra o governo federal. Houve muitos avanços, mas ainda há muitos problemas. São mobilizações pela ampliação de direitos. São legítimas e reforçam a democracia.

Governo tem máquina cara e pesada

Para fazer funcionar os seus 39 ministérios, o governo federal gasta por ano R$ 192,8 bilhões só com pessoal. Depois dos protestos, até partidos aliados já defendem cortes

No foco dos protestos, máquina administrativa federal consome R$ 611 bilhões por ano

Cargos comissionados no governo chegaram a 22.417, um recorde desde 1997, quando começou a série histórica

BRASÍLIA e RIO - É como se um paquiderme tentasse voar ou correr e seu peso o impedisse de avançar. Assim é o governo federal e sua gigantesca máquina administrativa. Nos últimos anos, com crescimento econômico fraco, o consumo dessa máquina é cada vez maior. Por conta disso, os manifestantes entoam nas ruas coros que cobram eficiência, e, agora, até mesmo quem pega carona nessa estrutura, como os partidos aliados, já defende o corte na carne. Especialistas avaliam que a União gasta muito e mal, e defendem uma reforma administrativa que reduza gastos, aumente a eficiência da gestão e enxugue o número de ministérios. Os números impressionam. A máquina administrativa do governo federal utiliza a mão de obra de 984.330 servidores para fazer seus 39 ministérios funcionarem - eram 24, no final do governo Fernando Henrique Cardoso; e 35, no último ano da gestão Lula. Hoje, o custo anual chega a R$ 192,8 bilhões só com o gasto de pessoal.

Somando o custeio de todas as pastas do Executivo - sem considerar investimentos -, o valor é astronômico: R$ 611.053.640.813. Somente secretarias vinculadas diretamente à Presidência da República são 14 - a mais recente, a da Micro e Pequena Empresa, foi criada para dar lugar ao aliado PSD, que nomeou o vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos, crítico contumaz do PT.

Na discussão emergencial que surgiu depois que as manifestações mostraram força nas ruas, o governo fez várias sugestões, ainda objetos de discussão. O PMDB, que ficou irritado por não ter sido consultado, embora tenha Michel Temer na Vice-Presidência, andou espalhando que uma das boas medidas seria a reforma administrativa, cortando, inclusive, nos ministérios do partido.

Professor da Escola de Economia e Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Fernando Holanda Barbosa disse que o governo federal deveria pensar em fazer a reforma em até três anos:

- A reforma administrativa deveria cortar metade destes ministérios. Não faz sentido ter os vários que temos aqui. Ela começaria dando exemplo de que estas pastas não deveriam ser usadas para a troca de apoios - sugeriu o professor.

Enxugar a estrutura ministerial também é uma medida apontada por Ruy Quintans, professor de Finanças, Economia e Gestão do Ibmec:

- Os Estados Unidos governam o mundo com cerca de 15 ministérios. A gente tem 39. Será que precisamos de tantos?

Boletim Estatístico de Pessoal, feito pelo Ministério do Planejamento, mostra que o número de pessoas que tinham, em janeiro, cargo comissionado na administração direta, autarquias e fundações do Poder Executivo federal bateu recorde. Chegou a 22.417, o maior desde 1997, quando teve início a série histórica.

Fonte: O Globo

‘Epidemia’ de manifestações tem quase 1 protesto por hora e atinge 353 cidades

Movimento ganhou força depois do dia 17, ao monopolizar o noticiário das grandes redes de TV, e auge foi no dia 20, em 150 cidades

Bruno Paes Manso e Rodrigo Burgarelli

SÃO PAULO - No dia 6 de junho, os jornais de São Paulo ainda repercutiam mortes violentas em tentativas de assalto quando uma primeira manifestação de 150 jovens, aparentemente despretensiosa, aconteceu no centro da cidade, na hora do rush, rumo à Avenida Paulista. Era o primeiro protesto do Movimento Passe Livre (MPL), que nos dias seguintes atrairia os holofotes da imprensa e se espalharia como "epidemia" pelo Brasil, contagiando rapidamente a população de diferentes cidades.

Até quinta-feira, a população saiu às ruas com cartazes para protestar em pelo menos 353 municípios, conforme levantamento feito pelo Estado em eventos no Facebook e em menções na imprensa regional. Ao todo, houve pelo menos 490 protestos em três semanas (mais de 22 por dia). Já a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), em pesquisa feita nas prefeituras, identificou protestos em 438 cidades.

O papel das redes sociais (Twitter e Facebook) foi decisivo para a articulação dos discursos e para divulgar hora e local dos protestos. Mas a epidemia só ganhou força depois do dia 17, ao monopolizar o noticiário das grandes redes de televisão. "Fazendo um paralelo com o casamento, esses eventos não têm causa única. O casal não termina porque a toalha foi deixada em cima da cama. Essa toalha pode ser a gota d’água de brigas antigas. O mesmo ocorreu nos protestos, que explodiram por uma longa história de crises enfrentadas em silêncio", diz o professor de comunicação digital Luli Radfahrer (ECA-USP).

Avanço. Em São Paulo, os primeiros três protestos aconteceram em um intervalo de seis dias e não ultrapassaram os 10 mil manifestantes. Mesmo assim, já eram a principal história dos jornais. No dia 13 de junho, outras dez cidades aderiram - capitais ou cidades médias, como Natal, Porto Alegre, Rio, Santos e Sorocaba. No dia 17, quando São Paulo parou, com 200 mil pessoas nas ruas, já eram 21 protestando.

O auge foi no dia 20, quando 150 municípios tiveram protestos. Pelo menos 1 milhão de brasileiros foram às passeatas, segundo dados das Polícias Militares de 75 cidades. Desde Belém, no Pará, até Santana do Livramento, na fronteira com o Uruguai. A menor cidade a se rebelar foi Figueirão (MS), que tem 2,9 mil habitantes.

O mote do transporte público foi o mais popular principalmente nas cidades que têm rede de ônibus. Mas os protestos também ganharam conotações regionais, especialmente nas cidades menores. Picos (PI), por exemplo, atraiu manifestantes contra os pistoleiros. Coxim (MS) protestou contra os buracos nas ruas e pediu a saída do secretário de obras. "Foi uma revolta típica da pós-modernidade, aparentemente sem causa. Do ponto de vista político, contudo, a multiplicidade de causas tornou os protestos mais fortes justamente porque permite várias interpretações dos que vão se manifestar", diz o psicanalista Jorge Forbes.

Forbes enxerga, no entanto, um ponto em comum nas demandas. "Trata-se de uma sociedade civil renovada, mais informada e educada, que continua tendo de lidar com as instituições do século passado, anacrônicas, que não atendem mais os anseios da população."

Difícil leitura. Mesmo para aqueles que acompanham a história do movimento, a epidemia de protestos surpreendeu. O filósofo Pablo Ortellado, coautor do livro Estamos Vencendo! (Conrad), sobre os movimentos autonomistas no Brasil, ainda se esforça para entender o que aconteceu. "A resistência e a desobediência civil já eram discutidas desde Seattle, em 1999, nos movimentos antiglobalização. A novidade foi o Passe Livre, que passou a ter uma pauta clara, com um grupo de referência para negociar. O governo foi acuado pelas passeatas e mudou sua decisão." As manifestações continuaram em menor quantidade depois da redução das tarifas, apesar de muitos protestos contra a Copa das Confederação

Para especialistas, atos podem continuar

Diante da"epidemia" de protestos, as autoridades foram surpreendidas e tentaram administrar "antibióticos" para acalmar a febre popular. A resistência durou até o dia 19. O prefeito Fernando Haddad (PT), que de manhã havia dito que baixar a tarifa era medida "populista", recebeu telefonema de seu colega carioca, Eduardo Paes, dizendo que iria ceder. Haddad e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) reduziram o valor da passagem de ônibus e metrô, medida que rendeu um efeito dominó e provocou a redução em outras 15 cidades. Itajubá, em Minas, por exemplo, mudou o valor de R$ 2,95 para R$ 2,50.

A presidente Dilma Rousseff também precisou se mexer e anunciou a intenção de convocar um plebiscito para promover a reforma política, entre outras medidas. A professora e pesquisadora de mídia digital Giselle Beiguelman (FAU-USP) vê a atitude dos políticos com ceticismo. "Parece que eles tentaram colocarum "curativo" para solucionar um problema muito mais grave", diz. Ela acredita que o resultado pode ser o inverso do esperado, já que as manifestações mostraram a força das ruas. Quando um problema surgir, os protestos, que se mostraram como uma solução vitoriosa, devem se repetir. "Há uma crise na democracia representativa. A internet aumentou a quantidade de informação e hoje as pessoas estão de olho nas ações governamentais. Os protestos devem continuar enquanto não forem feitas reformas profundas."

Energia. Os analistas lembram que as reivindicações atuais são diferentes das ocorridas, por exemplo, em 1984, quando se pedia as "Diretas-Já", e em 1992, quando os caras-pintadas gritaram pelo "Fora Collor". "A impressão da atitude dos políticos, com essas medidas pontuais, foi de uma mãe tentando dar "cala boca" nos filhos", diz o professor Luli Radfahrer. Ele acredita que é o momento de se aproveitar a energia do movimento para criar mecanismos de transparência digital e de participação na fiscalização e decisões políticas. /B.P.M eR.B.

Fonte: O Estado de S. Paulo, 30/6/2013

Perplexidade petista com a crise nas ruas

Tendo estado sempre à frente de manifestações, Lula e o PT buscam entender o que acontece em todo o país

José Casado, Tatiana Farah, Maria Lima e Luiza Damé

RIO, BRASÍLIA e SÃO PAULO - Eles chegaram de forma inesperada. Aos gritos, repetiam em coro ritmado: "Xi, fedeu/ O povo apareceu/ Xi, fedeu/ O povo apareceu..."

Em minutos a portaria do edifício número 1.400 da Avenida Prestes Maia, em São Bernardo do Campo (SP), foi cercada por manifestantes. No centro das vaias e xingamentos estava o morador da cobertura: Luiz Inácio Lula da Silva.

Aquela noite de quarta-feira, 19 de junho, se tornou inesquecível na cidade onde Lula escreveu uma página espetacular da mobilidade social brasileira - ali, o ex-sindicalista liderou as greves que abalaram a ditadura militar, criou o Partido dos Trabalhadores e se elegeu presidente da República.

Desde 1969, quando um irmão comunista o inscreveu na chapa da diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos, como suplente, Lula sempre esteve no comando de protestos nas ruas. Nunca fora alvo de multidão rebelada, muito menos de jovens e jamais na porta de sua casa - ainda mais sob um notável silêncio da vizinhança. Seu principal aliado político na cidade, o prefeito Luiz Marinho, descansava em Paris.

A cena sugeria uma inflexão: aqueles jovens manifestantes tratavam Lula como personagem da galeria de políticos tradicionais.

No rio, Militantes do PT vão às ruas

Na noite seguinte, militantes do PT avançavam com camisetas e bandeiras vermelhas, atendendo a apelo do presidente do partido Rui Falcão, pelo centro do Rio, a 440 quilômetros de São Bernardo. Perto do ponto de concentração de passeatas, na altura da Igreja da Candelária, foram recebidos com vaias, secundadas por um coral: "Sem partido/ Sem partido..." Socorridos por uma pequena tropa embandeirada de outras organizações partidárias (PSTU, PCB e PCdoB), recuaram gritando: "Sem fascismo/ Sem fascismo..."

A presidente Dilma Rousseff amargara idêntico constrangimento quatro dias antes, em Brasília, na cerimônia de abertura da Copa das Confederações. O presidente da Fifa tentou socorrê-la: "Onde está o respeito, onde está o fair play ?", cobrou Joseph Blatter ao microfone. A vaia-resposta foi mais forte.

Desde então, partido e governo oscilam entre surpresa e perplexidade. Depois de 33 anos marcando o compasso da política brasileira, o PT de Lula e Dilma encontrou no espelho da rebeldia das ruas múltiplas evidências da própria crise. Para a maioria dos petistas sobra mais dúvidas do que certezas sobre o rumo. Lula se comporta como uma exceção.

- O que o senhor acha? - quis saber o integrante de um grupo alinhado ao PT, em conversa com o ex-presidente na semana passada.

Na sala do Instituto Lula, em São Paulo, contavam-se duas dezenas de pessoas, quase todos militantes de organizações como Central Única de Trabalhadores, União Nacional de Estudantes, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, União da Juventude Socialista, Movimento Hip Hop-SP, Levante Popular da Juventude e Coletivo Fora do Eixo, entre outros.

Eles se entrelaçam com outros 40 grupos, em torno de uma pauta comum conhecida como Jornada Nacional de Luta. Têm um canal direto com a Presidência da República, via Secretaria-Geral que abriga o Conselho Nacional da Juventude. Com 60 integrantes (20 do governo), esse conselho é presidido desde maio por Alessandro Melchior, de 26 anos, dirigente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais.

Lula dá a senha para a "luta"

Até aquela altura da reunião, Lula é quem fazia perguntas. Quis detalhes das passeatas, do perfil básico dos manifestantes, e ouviu "tem de tudo", com qualificativos como "pobre", "rico", "estudante", "gay", "nazista", "maconheiro". Mas chegara sua vez de falar:

- Já vi muita coisa assim - disse, segundo relatos de quem esteve na plateia. - Isso é coisa da direita. Querem desestabilizar. Acabar com nossas conquistas, com programas sociais, com ministérios criados para as minorias&

Acrescentou: - Eu acho que, possivelmente, seja a hora de vocês, a juventude, os trabalhadores, irem para a rua, não deixar a direita tomar conta e pedir para aprofundar as mudanças.

Era o seu segundo movimento em 24 horas. No dia anterior, convocara a presidente Dilma Rousseff e o prefeito Fernando Haddad para discutir a redução da tarifa de ônibus em São Paulo, em acordo com o PSDB do governo paulista Geraldo Alckmin.
Agora dava a senha para "a luta" - o que na prática pode significar um aumento da estridência nas ruas, com o objetivo de pressionar o governo a se posicionar em torno de uma "pauta" mais à esquerda em relação às propostas dos adversários eleitorais. No PT e no Palácio do Planalto há quem discorde, por enxergar nessa tática eleitoral o risco de enfraquecimento do governo.

Há, também, quem veja autoengano na interpretação de que a mobilização nas ruas é coisa "da direita".

- Recomendo ao meu partido: ouça o que diz a juventude do PT - disse o deputado Vicentinho (SP), presidente da CUT de 1996 a 2000: - Esse movimento de agora é muito justo, respeitoso, novo, criativo, sem panfleto e sem carro de som. Não tem nada a ver com direita, ou golpe. É o jeito deles. Se quisermos participar, tem que ser sem provocação e disputa, sem bandeiras e sem partidos. Nas reuniões em que estive a constatação foi: "Puxa vida, somos o PT, nós que sonhamos isso tudo, nós que puxamos o movimento das ruas e agora somos excluídos?" Foi muito duro. Mas temos que respeitar e interpretar esse recado como a vontade dos jovens.

Marco Aurélio Garcia, assessor internacional da Presidência da República, decidiu escrever a respeito, contou ao GLOBO num e-mail:

- Vivi, como estudante, o Maio-68 na França, movimento de gigantescas proporções, que surgiu aparentemente "do nada". Entre o estopim (a repressão a um grupo de estudantes da Faculdade de Nanterre) e o rumo que os acontecimentos tomaram (a maior greve geral dos tempos contemporâneos) parecia haver um abismo. São esses abismos que têm de ser entendidos.

O Brasil mudou, como as mobilizações atuais demonstram - comentou. - O país só pode ir para frente, não para atrás. Este é o movimento do "quero mais". Engana-se quem o interpreta como um "quero voltar atrás". É um movimento que exige qualidade no gasto público. Nada mais avesso à agenda privatista e antiestado das oposições.

De toda forma, antes de Lula embarcar para África, na sexta-feira, estava quase pronto um calendário de agitação e propaganda, pontuado por greves na primeira quinzena de julho. Predominava o entendimento de que "o partido não pode ter uma postura de covardia política", na síntese feita pelo deputado Ricardo Berzoini (SP), ex-presidente da organização.

Trabalhava-se com urgência, também, na ampliação do arsenal de vigilância e guerrilha digital do PT, da Presidência e de governos como o do Rio Grande do Sul, que lidera uma das frações em disputa pelo controle do partido. No foco, agora, estão as redes sociais - meio mais usado para mobilizar milhões nas últimas semanas, à margem de organizações como o PT, habituadas a trios elétricos, bandeiras vermelhas e ônibus e sanduíche grátis.

Cuidar só do meio não basta, é preciso rever a mensagem, ponderaram alguns deputados em reunião da bancada parlamentar petista, quarta-feira passada em um anexo do Congresso.

- Precisamos atualizar nosso ideário - argumentou o líder da bancada na Câmara José Guimarães (CE). - Só defender o legado não é suficiente para responder às reivindicações.

José Fritsch, ex-ministro da Pesca e presidente do do PT de Santa Catarina, foi além:

- Se o governo faz um mutirão para a Copa, se tem dinheiro para a Copa, pode fazer uma mutirão para essas questões sociais. Esse é o sentimento nas ruas: se tem dinheiro para a Copa, tem que ter para um grande mutirão na Saúde e na Educação.

Recursos não usados em várias áreas

Os atos de contrição em reuniões petistas, nas últimas duas semanas, quase sempre desemborcaram nos entraves provocados pela rarefeita funcionalidade da burocracia governamental, que o próprio PT instalou e comanda há uma década em Brasília. E isso pode ser comprovado pelos dados oficiais sobre investimentos sociais realizados nos últimos dez anos.

Na Saúde, por exemplo, de cada R$ 100 de investimento previsto, o governo só conseguiu gastar R$ 39 - deixou de realizar 61% do orçamento setorial aprovado pelo Congresso, de acordo com levantamento feito pela ONG Contas Abertas a pedido do GLOBO.

O quadro se repete em Saneamento, onde de cada R$ 100 previstos só foram gastos R$ 49 - isto é, sobraram 51% dos recursos em caixa.

Em Transportes, investiu-se um pouco mais, R$ 61 de cada R$ 100 previstos, com sobra de 40% sem uso.

Na Educação registrou-se a melhor média: R$ 60,5 de cada R$ 100 que estavam separados no Orçamento para investimento na área. Restaram 39,5% sem utilização.

No conjunto, os gastos sociais cresceram na década petista, o que pode ser comprovado em análises recentes de instituições independentes, como a ONU que demonstra uma duplicação dos investimentos em Saúde e avanço expressivo em Educação como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), nos últimos dez anos. O problema é que essa expansão não foi suficiente e não teve muita qualidade, como indica a insatisfação nas ruas. É certo que o país poderia ter investido muito mais e melhor, como revelam os dados oficiais, se nessa década os projetos prioritários e respectivos orçamentos aprovados tivessem sido plenamente executados.

A perplexidade petista com a própria crise, espelhada nas ruas, tem outras razões de origem, segundo diferentes parlamentares. Uma delas foi a prioridade à máquina eleitoral, para hegemonia nas urnas e no poder - o que levou ao mensalão e, agora, à concentração de energia no plebiscito sobre reforma política. O PT é o eficiente nas eleições. Nesses dez anos fracassou em realizar o governo funcional que sempre propôs. Não significa que chegou ao fim da história.

Fonte: O Globo, 30/6/2013

Longo caminho pela frente

Além de passagens mais baratas, usuários de ônibus cobram pontualidade e conforto no transporte

Reduzir 10 ou 20 centavos nas tarifas de coletivos não diminui a insatisfação de quem usa o serviço, como deixam claro os estudantes que ocuparam a Câmara de Belo Horizonte . Enquanto aguardam audiência com o prefeito Marcio Lacerda, reclamam dos atrasos, da limitação da frota e da precariedade dos veículos, conforme relatos feitos ao Estado de Minas, que acompanha, dia e noite, os manifestantes.

Para especialistas, falta regularidade no serviço, que deveria ser mais bem fiscalizado e tratado como prioridade pelos governos. Em Montes Claros, no Norte do estado, a prefeitura até baixou o preço da passagem em resposta aos protestos, mas as queixas continuam. Em Divinópolis, no Centro-Oeste, se chove, o coletivo não passa em alguns locais. E mesmo num domingo ensolarado é melhor desistir do ônibus.

Não é só pelos centavos...

Tudo começou com um protesto por diminuição na passagem de ônibus em São Paulo, reajustada pelo governo municipal em R$ 0,20 (de R$ 3 para R$ 3,20). As manifestações se replicaram pelas capitais e pelo interior do país. Prefeitos trataram rapidamente de diminuir o valor pago no transporte público, o que não arrefeceu todos os protestos, principalmente em Belo Horizonte, onde a ocupação da Câmara Municipal, desde sábado, lembra que a batalha está longe do fim. Porém, para além da questão financeira, ficou o debate sobre a qualidade do serviço prestado ao trabalhador, estudante, idoso, de qualquer classe social. Seja na Grande BH, seja em Divinópolis, na Região Centro-Oeste do estado, ou em Montes Claros, no Norte de Minas, os usuários exigem que os ônibus sejam mais pontuais, tenham mais conforto e, claro, sejam mais baratos.

O presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Ailton Brasiliense, avalia que o preço é alto demais para a qualidade oferecida nas cidades. E critica, afirmando que o problema é histórico e esbarra na falta de prioridade dos governos à mobilidade coletiva. "As cidades não têm corredores de ônibus, não têm semáforos coordenados, Belo Horizonte mesmo foi planejada para o limite da Contorno e os prefeitos deixaram o crescimento solto. Hoje, a distância entre o emprego e a moradia é muito longa e isso encarece o custo do transporte", afirmou. Mas ele ressalta que as prefeituras precisam fiscalizar os contratos com as empresas e cobrar melhorias para os usuários.

Entre a cobrança que não vem e os resultados que demoram, tem gente que passa quase cinco horas por dia, de segunda a sexta-feira, à espera ou dentro de um transporte público precário. É a vida que leva Izabelle Karine Martins Moreira, de 19, moradora do Bairro Santa Cruz, em Vespasiano, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. De casa até o trabalho, no Bairro de Lourdes, na Região Centro-Sul da capital, é longo o caminho, até mesmo para quatro lotações. E caro: são R$ 3,45 mais R$ 2,80, por trajeto. Ida e volta somam R$ 12,50 por dia. Com 1,77m, Izabelle reclama do espaço entre as cadeiras. Quando consegue assento, enfrenta dificuldade para se ajeitar. "As pernas precisam ficar apertadas, de lado", diz.

Para a engenheira de transportes Sabina Augusta Kauark Leite, não falta só conforto: falta regularidade ao sistema. A reclamação, segundo ela, é a que ouve com mais frequência entre os usuários. "Às vezes a pessoa está no ponto há 20 minutos esperando, mas não é que a linha esteja deficiente, e sim porque o ônibus ficou parado no congestionamento. Pode até ser que algumas linhas estejam incompletas, mas o trânsito atrapalha a manutenção dessa ordem", explicou. A gestão pública, segundo ela, precisa ter mecanismo para analisar a qualidade do serviço prestado e essa avaliação deve valer para manter ou não a concessão do serviço. "Pode haver locais em que a empresa não está operando bem, mas, se o poder público não acompanhar, nunca vai saber para cobrar do operador do sistema."

Em pesquisa feita pela Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), 65% dos entrevistados disseram considerar a passagem de ônibus/micro-ônibus muito cara, sendo que 64% da totalidade usa o serviço. O estudo foi feito em 255 municípios brasileiros, todos com mais de 100 mil habitantes, e os entrevistados têm 15 anos ou mais, entre eles muitos chefes de família. A maioria, 62%, aponta como principal problema das cidades a violência, seguida de saúde (41%), desemprego (38%) e, em quarto lugar, o transporte (20%). A educação aparece com 14%.

Em relação à gratuidade, a engenheira Sabina Augusta defende o benefício para quem tem renda mais baixa, ao contrário de alguns integrantes dos movimentos sociais, que falam em catraca livre para todos os usuários. A Pesquisa de Mobilidade da População Urbana, da NTU, mostra, por exemplo, que quem recebe mais de cinco salários mínimos compromete apenas 4,2% da renda com transporte coletivo, enquanto quem tem ganha até um salário tem impacto de 53% sobre a renda. "Na hipótese de o governo bancar o transporte para a população, lembrando que para isso deixará de investir com outros itens de igual importância, qual é a razão para que essas pessoas da faixa de renda maior tenham gratuidade?", questiona a especialista.

Ela ainda analisa que aqueles que recebem de 3 a 5 salários mínimos comprometem menos de 8% de sua renda com transporte coletivo, como mostra a pesquisa, mas, para os trabalhadores com carteira assinada, o empregador banca 6% e o restante sai do rendimento. "Restam então aqueles que não recebem o benefício do vale-transporte. Para esses e também para quem ganha menos de 3 salários mínimos, deveria haver uma política pública para subsidiar o transporte", defende.

Fonte: Estado de Minas

Reunião de oposição e Dilma não deve ocorrer

Agora PSDB diz não ver sentido em encontro, anunciado semana passada

BRASÍLIA - Anunciada semana passada, a reunião que a presidente Dilma Rousseff faria com parlamentares da oposição hoje não deverá ocorrer, nem ser agendada para breve. O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), disse ontem que não houve sequer convite por parte do Palácio do Planalto e, mesmo que a oposição fosse chamada, não faria sentido encontrar-se com Dilma neste momento.

- Reunião para quê? É algo que perdeu o sentido, tornou-se inócuo, inoportuno. Dissemos que estaríamos dispostos a discutir a pauta que está nas ruas: Transporte, Saúde, Educação, serviços públicos. Mas a presidente não tocou nesses assuntos. E agora quer uma reunião para nos comunicar quais perguntas pretende fazer no plebiscito (sobre reforma política) - disse Sampaio.

Na mesma linha, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) afirmou que é contrário a uma reunião a portas fechadas com Dilma:

- É uma manobra diversionista, uma encenação que não produziria nada neste momento. Não vejo razão para a oposição ir a esse encontro, a menos que fosse uma audiência pública transmitida ao vivo para todo o país. A presidente já se antecipou e propôs um plebiscito apressado, inconsequente - declarou Dias.

O presidente nacional do DEM, senador Agripino Maia (RN), disse que não recebeu convite nenhum de Dilma nem de qualquer ministro:

- Reputo como uma brincadeira da imprensa, não tem nenhuma reunião agendada - ironizou.

Agripino afirmou estar disposto a comparecer a uma reunião com a presidente, mas para discutir outros temas, como recursos para a Saúde e redução do número de ministérios.

O Palácio do Planalto chegou a divulgar que preparava uma reunião entre Dilma e líderes da oposição, que ocorreria inicialmente na sexta-feira e teria sido transferida para hoje. Interlocutores da presidente explicaram que o encontro faria parte de uma rodada de reuniões que ela tem feito para ouvir políticos e entidades sociais sobre os cinco "pactos pelo Brasil" propostos na última segunda-feira.

Assessores no Planalto afirmaram que a oposição havia pedido para que a reunião ocorresse depois do fim de semana, para chegarem à Presidência com uma posição afinada. Por fim, passaram a dizer que a oposição tem dificultado o agendamento. O encontro ainda não foi descartado oficialmente pelo Planalto. Fontes da Presidência dizem, no entanto, que a última coisa que Dilma quer neste momento é ouvir a oposição.

Fonte: O Globo

Entrevista Gilmar Mendes - Reforma política feita por plebiscito é difícil e temerária

Propor constituinte foi erro grave, diz ministro do STF

Gilmar Mendes afirma que presidente Dilma deveria ter ouvido outros poderes e que plebiscito para reforma política é temerário

Fernando Rodrigues

BRASÍLIA - A reforma política feita por meio de um plebiscito é temerária e de "difícil exequibilidade", diz o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. Para ele, a presidente Dilma Rousseff deveria ter ouvido mais os chefes dos outros Poderes e líderes políticos antes de lançar a ideia.

"Acredito até que isso evitasse alguns equívocos na própria abordagem das propostas", afirma Gilmar em entrevista à Folha e ao UOL, empresa controlada pelo Grupo Folha, que edita a Folha.

"Tenho dúvida sobre que perguntas serão dirigidas à população. Por exemplo: vai se adotar o sistema alemão misto distrital e proporcional? A população saberá distinguir?", indaga.

Para ele, a proposta de convocar uma constituinte exclusiva foi um "erro rotundo" e "extremamente grave".

Segundo o ministro, alguns itens da reforma política podem ser tratados por meio de lei, sem alteração da Constituição. Sobre como o Poder Judiciário deve responder aos protestos de rua, Mendes cita o caso da prisão do deputado federal Natan Donadon (ex-PMDB-RO), decretada na semana passada pelo STF.

Leia a seguir, trechos da entrevista do ministro concedida na quinta-feira.

Folha/UOL - O STF e o Poder Judiciário também são alvos dos protestos de rua?

*Gilmar Mendes - Todo poder constituído está tendo a atenção chamada por causa dos protestos.
No Judiciário, temos uma grande falha no sistema de justiça criminal: a toda hora noticiamos que um evento como o do Carandiru foi julgado 20 anos depois. A resposta pode se dar no plano jurisprudencial.

Como assim?

Podemos tanto dizer que a partir do segundo grau já pode ocorrer a prisão se o juiz e o tribunal assim avaliarem.

Sem emenda constitucional?

Não é necessário fazer uma emenda. Ontem [quarta-feira passada], nós tivemos o caso de um deputado de Rondônia [Natan Donandon, ex-PMDB, condenado em 2010 a 13 anos de prisão] já nos segundos embargos de declaração.

O Supremo poderia ter mandado prender antes?

É um aprendizado. No futuro, teremos que expedir logo a ordem de prisão e não esperar embargos de declaração.

No caso do mensalão, qual é o prazo para terminar o caso?

Tenho a expectativa de que encaminhemos esse assunto agora no segundo semestre. Muitos colegas estão imbuídos desse propósito.

Há ainda embargos infringentes. O STF deve aceitá-los?

Temos que discutir essa questão. Sou crítico dessa possibilidade. Vamos examinar os argumentos. O Poder Executivo fez propostas por causa das manifestações de rua. 

O Poder Judiciário deveria ter sido ouvido?

Considerando a complexidade das propostas, todos os setores que têm responsabilidade institucional teriam que ser ouvidos previamente. Acredito até que isso evitasse alguns equívocos na própria abordagem das propostas.

Quais equívocos?

Já na apresentação havia quase que impulsos. Por exemplo, no que diz respeito ao combate à corrupção. "Ah, transformar em crime hediondo..." Em que isso resulta? No que diz respeito ao tema do processo constituinte, como foi chamado, a partir de um plebiscito, esse erro é rotundo, extremamente grave.

A presidente já recuou sobre uma constituinte...

Até porque ela não pode. O Congresso não pode. O Supremo não pode. Não há espaço para isso. Mas esse erro poderia ter sido evitado.

Por que a presidente fez isso?

Não tenho condições de avaliar. Certamente atribuiu gravidade aos movimentos e foi aconselhada a dar uma resposta. Mas, para problemas complexos, às vezes, há soluções simples... E erradas. E esse foi o caso.

E o plebiscito para fazer a reforma política?

Tenho dúvida sobre que perguntas serão dirigidas à população, que terá de decidir sobre temas que têm perfil bastante técnico. Por exemplo: vai se adotar no Brasil o sistema alemão misto distrital e proporcional? A população saberá distinguir? Quando essa resposta vier, o Congresso vai executar como?

O plebiscito é temerário?

Parece que sim. É de difícil exequibilidade. Nós estamos vivendo um momento muito peculiar. Descuidamos de questões importantes na esfera administrativa e corremos para eventualmente dar atenção a temas que até agora não foram tratados.

Como assim?

A questão da reforma política sempre esteve na agenda. Mas os próprios governos tiveram muita dificuldade de gerenciá-la. Neste momento de crise, talvez fosse o caso de ter chamado o presidente da Câmara, do Senado, do Supremo, do Tribunal Superior Eleitoral, as lideranças partidárias para dizer: nós precisamos priorizar a reforma política.

O que achou dos cinco pactos sugeridos pela presidente?

A iniciativa política é importante. É importante que haja a discussão. Hoje, estamos atrasados no pacto federativo. Se olharmos 1988 e agora, vemos o quê? A União concentrando recursos. Os Estados e os municípios estão muito mais débeis.

Quem deve liderar o processo sobre o pacto federativo?

O Senado e os governadores. Mas temos impasses. Sobre o FPE [Fundo de Participação dos Estados], guerra fiscal, royalties do petróleo. Três temas que estão ligados à questão federativa. E o governo federal não contribui para o desate.

O governo federal fica omisso?

Fica omisso. Veja que os Estados estão no Supremo Tribunal Federal impugnando a lei que fixou o piso salarial para os professores, dizendo que eles não têm condições de pagar. Há algo de patológico nesse modelo.

Esse problema tem a ver com o Palácio do Planalto?

Nessa questão dos professores talvez tenha havido um certo voluntarismo por parte do Executivo para aprovar um piso salarial. Acabou-se produzindo uma distorção. Faltou gradação, faltou medida política. E faltou político nessa história. O que prova que quando o Executivo se engaja, ele aprova. Tem sido a rotina. Por isso, falar que o Congresso está em débito também tem de ser visto "cum grano salis" [com certa reserva]. Muitas vezes, essa omissão decorre da falta de articulação por parte do próprio Executivo, que tem hoje o mais amplo apoio que já se formou nesses últimos anos.

O Poder Executivo teria de...

...Arbitrar essas relações com competência, com método, com racionalidade.

Joaquim Barbosa [presidente do STF] defendeu candidaturas avulsas. O sr. é a favor dessa medida?

Não devemos enfraquecer os partidos políticos. Devemos fortalecer os partidos, a sua democracia interna e evitar que grupos oligárquicos tomem conta deles. Os partidos políticos continuam a ser mediadores dessa relação entre o indivíduo e o Estado.

Em 2006, o STF declarou inconstitucional a cláusula de desempenho. Seria possível introduzir esse conceito por meio de lei ou é necessário mudar a Constituição?

Pode ser por lei. Temos um problema nesse modelo proporcional com coligação. Tanto que uma das discussões óbvias seria simplesmente suprimir a possibilidade de coligação. Com isso, haveria enxugamento das siglas partidárias no âmbito do Congresso Nacional.

A reforma política deve ser ampla ou gradual?

Nós estamos tentando consertar o avião em pleno voo. Os atores estão participando da vida política. Fazendo os seus cálculos: qual é o sistema eleitoral mais adequado para a minha agremiação, para o meu partido? Na experiência constitucional de outros países, essas reformas são feitas de forma gradual, com modelo de transição, de implementação deferida no tempo. É preciso que nós levemos isso em conta. Quando se diz "ah, agora nós vamos reformar o mundo de uma vez por todas", a gente já começa a errar.

Fonte: Folha de S. Paulo

Dilma convoca ministros para evitar paralisia

Dilma tenta evitar paralisia

A presidente Dilma Rousseff vai comandar uma reunião ministerial hoje para cobrar ações em resposta às manifestações que se disseminaram pelo país nas últimas semanas. No Congresso, porém, ela terá de enfrentar o descontentamento de aliados.

Pelo menos oito ministros foram recebidos ontem pela presidente no Palácio da Alvorada para conversar. Ela deixou de ir à final da Copa das Confederações para tratar da reação do governo e dos detalhes do plebiscito sobre a reforma política.

Em Brasília, a rotina de protestos se manteve. A Marcha das Crianças foi organizada por pais em defesa de melhorias sociais, do combate à corrupção e de mais ação das autoridades.

Ao sair do Alvorada, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, afirmou que a intenção de Dilma é repassar aos auxiliares "resoluções" e "encaminhamentos":

– E, também, fazer recomendações de como se conduzir (as ações do governo). Quer dizer, não deixar os projetos pararem, todos saberem de que forma estão sendo encaminhadas as reivindicações, e também garantir que não haja paralisia ou retrocesso dos programas sociais que estamos tocando.

Paulo Bernardo disse ainda que a presidente terá nova rodada de conversas sobre o plebiscito. Siglas de oposição serão convidadas para dialogar, além de empresários. Os partidos governistas já avalizaram a proposta na semana passada, mas PSDB, DEM e PPS, adversários do Planalto, criticam a iniciativa.

Paulo Bernardo afirmou que a mensagem sobre o plebiscito será enviada ao Congresso nesta semana e está em processo de elaboração, a cargo do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e do vice-presidente Michel Temer.

– Achamos importante ouvir a população sobre um tema que não tem avançado por divergências, por dificuldades na área política – disse o ministro.

No Congresso, porém, a queda na popularidade presidencial apontada pelo Datafolha (veja na página ao lado) refletiu no humor de aliados, que agora pedem mudanças na economia e na articulação política.

– Muda a relação do Congresso com a presidente. Ela vai ter que dialogar mais para aprovar os projetos propostos, inclusive vai ter de abrir um canal com a oposição – disse o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

Presidente do PP, o senador Ciro Nogueira (PI) afirmou que o governo precisa ter um interlocutor nos moldes de José Dirceu e Antonio Palocci, que já chefiaram a Casa Civil:

– Isso facilitaria muitas coisas.

Perguntado se defendia a saída das ministras das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e da Casa Civil, Gleisi Hoffman, ele respondeu:

– Ou sair ou ganhar autoridade, porque quem faz o ministro é a própria presidente.

Correria sem direção

Para a presidente Dilma Rousseff, o pior não é a drástica queda na pesquisa, mas o fato de que a desaprovação ao governo reacendeu um movimento de Volta Lula dentro do PT. O abismo que Dilma mergulhou foi além do esperado e já ameaça sua reeleição.

É muito cedo para um diagnóstico definitivo, mas seu então favoritismo para a eleição se esfarelou. O problema é a insatisfação generalizada manifestada com os protestos nas ruas. Dilma negligenciou. Surfava na onda de alta popularidade e dava de ombros para os sinais que a economia mandava: o repique inflacionário e o crescimento pífio.

Neste vácuo de rejeição à política tradicional, crescem os nomes de Marina Silva (Rede) e do outsider Joaquim Barbosa, principalmente entre os mais jovens. Em vez de promover ajustes para recuperar a economia, o PT se apoia na aprovação à proposta de plebiscito para tratar da reforma política. Diante do embate, até a oposição ganha fôlego.

Não há tempo hábil para uma discussão séria sobre reforma política que possa resultar em mudanças já em 2014. Dilma cometeu um erro básico: deixou de usar a alta aprovação de seu governo para conduzir as reformas. Agora, corre para tentar reverter o descontentamento das ruas. Essa correria sem direção, contudo, pode comprometer de vez o que resta de sua credibilidade junto aos eleitores.

Fonte: Zero Hora (RS)

Classe média - Aécio Neves

Se os partidos brasileiros, sem exceção, saem politicamente abalados do saudável vendaval de passeatas no país, um deles certamente se ressente mais: o PT.

A presença maciça da classe média no movimento de protesto coloca em xeque, com mais ênfase, as contradições do partido.

Pressionado a oferecer respostas ao país, o governo federal improvisou uma constituinte restrita, rapidamente abandonada, e busca, por meio da proposta de um plebiscito de complexa elaboração, aprovar uma agenda que interessa muito mais ao PT do que ao Brasil.

Assim, o governo federal patrocina manobras que visam tirar o foco das legítimas reivindicações apresentadas pela população, oferecendo justamente mais daquilo de que os brasileiros demonstram estar fartos: desrespeito.

No recente evento dos dez anos do PT, a filósofa petista Marilena Chaui afirmou, sob aplausos, que odiava a classe média. E explicou: "A classe média é estupidez. É o que tem de reacionário, conservador, ignorante, petulante, arrogante, terrorista. É uma abominação política, porque ela é fascista, uma abominação ética, porque ela é violenta, e é uma abominação cognitiva, porque ela é ignorante".

O leitor ficou chocado? O vídeo está no YouTube. Juntando-se essa fala raivosa e os protestos nas ruas, a conclusão é inevitável: o PT não gosta da classe média e por ela parece estar sendo correspondido na rejeição.

Os jovens questionam a forma tradicional de fazer política quando gritam: "O povo unido governa sem partido". A grande maioria deles nada tem de fascistas ou reacionários. Estão apenas expressando suas compreensíveis frustrações. Os manifestantes se insurgem contra os aproveitadores que viraram políticos, políticos que se elegeram governantes, governantes que se esbaldaram na corrupção, corrupção que impede a melhoria do transporte, da saúde e da educação. Uma ciranda como no poema de Drummond cujo nome é "Quadrilha", muito a propósito.

Um bom contraponto à intolerância de Marilena Chaui é um texto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de 2011. Nele, foi enfatizada a necessidade de maior diálogo com a classe média: "O caminho não se constrói apenas por partidos políticos, nem se limita ao jogo institucional. Ele brota também da sociedade, de seus blogs, tuítes, redes sociais, da mídia, das organizações da sociedade civil, enfim, é um processo coletivo. Não existe só uma oposição, a da arena institucional; existem vários focos de oposição, nas várias dimensões da sociedade".

Com 82 anos de idade, Fernando Henrique com certeza faria bonito na avenida Paulista, na Rio Branco ou na Afonso Pena dos dias de hoje.

Aécio Neves, senador e presidente do PSDB

Fonte: Folha de S. Paulo

Sobre o plebiscito - Paulo Brossard

Mais uma semana terá decorrido quando for publicado o artigo que começo a escrever, como de costume, na sexta-feira. E o que posso dizer é que pouco se clarificou na matéria iniciada com a vaia ocorrida no Estádio Mané Garrincha com endereço à senhora presidente da República. Ainda bem que se tornou pública a origem da fórmula jogada ao espaço vazio do governo que a endossou.

Sabe o leitor quantas emendas à Constituição de 1988 foram promulgadas sem necessidade de nenhum plebiscito? Sem falar nas seis emendas de revisão, foram 72 as emendas aprovadas e para tanto bastou obedecer à própria Constituição em seu art. 66. Ora, a senhora presidente da República e seu marqueteiro, ao que parece, trouxeram de São Paulo a fórmula sonhadora, deixar de lado a Constituição e recorrer a meios estranhos à tradição nacional, com a "vantagem" de ser até agora imprevista e obviamente mais demorada. Graças ao expediente, a discussão está entre Constituinte e plebiscito e referendum... Mas, da reforma política que todo o mundo diz ser necessária e a ela favorável, não se diz o necessário para sequer situá-la no plano das ideias; o plebiscito tomou conta de tudo ainda que o PIB não cresça, a indústria patine no pior resultado no ano passado, e "Sob críticas, Dilma recua e desiste da Constituinte" – "Sem apoio, Dilma desiste da Constituinte para reforma política" – Esta decisão revela a leviandade com que problema dessa importância é tratado. Cancelada a "Constituinte exclusiva" como se fosse de somenos é mantido o plebiscito inexigido pela Constituição. Destarte, ignorando a Constituição, o plebiscito ocupa o espaço que deveria ser o plenário das questões nacionais a serem debatidas e analisadas, segundo sua importância, atualidade ou necessidade.

Mas chegou o momento de indagar de que laboratório saiu o plebiscito e as demais postulações lançadas pela senhora presidente. Sabe-se que foi depois de ela, acompanhada de seu marqueteiro, ir a São Paulo entrevistar-se com seu protagonista e antecessor. Foi depois que o prefeito de São Paulo anunciara a decisão de não reduzir a tarifa dos transportes coletivos, e para salvar o governo federal revogou a decisão anterior. Como divulgado, não se trata de nenhuma concepção elaborada no calor da crise; mas a tábua redentora resultou de um congresso do PT de 2006 ou 2007, que indicava as medidas agora apontadas como salvadoras e que ficaram postergadas para as calendas gregas, permanecendo dormentes durante seis ou sete anos. Esse dado deve ser apreciado ao lado do recuo da senhora presidente no tocante à Constituinte negociada, "com líderes do Congresso e do Judiciário", (sic) segundo as manchetes das primeiras páginas dos maiores jornais do país.

Mas nesta altura se percebe a armação cavilosa relativa à "corrupção que passará a ser crime hediondo", como leio na manchete de primeira página de Zero Hora da semana finda; o leitor se agradará do alvitre porque a tisna da corrupção é repelente à imensa maioria da população brasileira. É de salientar-se que só agora a senhora presidente ficou a saber de que existe "corrupção" em seu reino? E não me causará surpresa se metade do Código Penal venha a ser de delitos hediondos.

Seria bom parar com essas tolices, antes que as licenças oficiais venham a ser consideradas crime hediondo e, assim, o feiticeiro morrer de seu próprio feitiço.

*Jurista, ministro aposentado do STF

Fonte: Zero Hora (RS)