domingo, 5 de agosto de 2012

OPINIÃO DO DIA – Roberto Gurgel:o mensalão maculou a República

"A nossa pátria mãe tão distraída/ Sem perceber que era subtraída /Em tenebrosas transações"

Roberto Gurgel, Procurador Geral da República, pouco antes de concluir a explanação, recorreu a uma metáfora, citando um dos versos de "Vai passar", de Chico Buarque e Francis Hime para ilustrar as negociatas batizadas de mensalão.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Tropa de 150 advogados vai tentar salvar os réus
Pleno emprego em 20% das cidades
Clínicas burlam normas da Anvisa

FOLHA DE S. PAULO
Advogados vão explorar contradições de Gurgel
Governo vai leiloar faixa de uso de TVs para banda 4G

O ESTADO DE S. PAULO
Mercosul é 'clube de amigos', diz presidente do Paraguai
Ponto fraco da acusação pode ajudar réus do mensalão
Refinaria lançada por Lula é terreno com mato
Brecha em Cumbica atrai estrangeiros ilegais
Droga de epilepsia é usada em obesidade

CORREIO BRAZILIENSE
O crime da lavanderia

ESTADO DE MINAS
As doenças que assombram os nossos filhos
Brasileiros de olho na Síria
MP aposta em crime de lavagem de dinheiro

ZERO HORA (RS)
Estrangeiros agravam caos nos presídios
Como os réus vão tentar retardar as penas
Por que os investimentos atrasaram
O neto de Trotsky

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Biodiesel, um fracasso anunciado
Avaliação após formatura gera polêmica
Jarbas e Eduardo

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Tropa de 150 advogados vai tentar salvar os réus

Depois de o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, ter afirmado que o mensalão é "o mais escandaloso caso de corrupção do país", a partir de amanhã é a vez dos advogados dos 38 réus darem sua versão. Um batalhão de mais de 150 deles, contratado junto aos 30 maiores escritórios do país, entrará em cena para falar no plenário do STF. Com isso, os ministros passarão oito dias, pelo menos, ouvindo argumentos da defesa. Especialistas advertem que a aplicação de penas mínimas para quatro dos delitos pelos quais os réus são acusados - formação de quadrilha, corrupção, peculato e evasão de divisas - levará à prescrição

Um batalhão na defesa dos mensaleiros

Processo reúne número recorde de advogados num mesmo caso, 150

Maria Lima, Júnia Gama e Fernanda Krakovics

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA Um batalhão de mais de 150 advogados dos 30 maiores escritórios de criminalistas do Brasil entra em cena a partir de amanhã para, numa ação coordenada, tentar livrar seus clientes da condenação no julgamento do mensalão, no Supremo Tribunal Federal. Cada um dos advogados principais de cada réu terá uma hora para sua sustentação oral perante os 11 ministros, o que significa que eles passarão oito dias, pelo menos, defendendo seus clientes e mirando no Ministério Público, que consideram o inimigo comum de todos.

A maior parte do grupo troca figurinhas e não investe em conflito entre eles. Muitos reconhecem que estão trabalhando num julgamento histórico. Dizem ser atípico, por reunir o maior número de advogados já visto num caso.

Na linha de frente estão grandes criminalistas e outros advogados mais modestos - tanto que o preço cobrado varia de R$ 6 milhões a R$ 500 mil, além de dois que trabalham de graça. Mas nenhum deles fala em cifras. É o caso de Luiz Francisco Corrêa Barbosa, advogado do ex-deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB e autor da denúncia do mensalão; e de Márcio Silva, que participou da defesa de petistas no início do processo.

Poucos réus têm apenas um advogado fazendo sua defesa. Normalmente, são grupos de cinco a sete que se dedicam exclusivamente a um único cliente. Esses batalhões acompanharam, além dos réus, os mais de 700 testemunhos de todo o processo país afora.

O mineiro Marcelo Leonardo, responsável pela defesa de Marcos Valério, trabalha com outros sete advogados no caso. Lembrando que os bens de seu cliente estão bloqueados desde 2005, mas evitando falar quanto cobra, ele conta que viajou o Brasil inteiro, do Acre ao Paraná, para acompanhar o depoimento de testemunhas e buscar provas para isentar o réu mais encrencado na Ação Penal 470, o conhecido processo do mensalão.

Ele é um dos que confirmam que o corpo de advogados do mensalão trabalha afinado, mirando derrotar o Ministério Público.

- Nos reunimos sempre para discutir as estratégias porque nosso adversário comum chama-se Ministério Público Federal. Somos todos muito amigos e, se tem um conflito entre a gente, isso é munição para a acusação - disse Marcelo Leonardo.

Todos fazem questão de dizer que participar do caso dá muita visibilidade, por ser um processo atípico, com muita repercussão na mídia.

- Esse é o maior caso de que (o escritório) Luiz Fernando Pacheco já participou. É histórico - diz o advogado do ex-presidente do PT José Genoino, o próprio Pacheco, que também trabalha com outros sete advogados auxiliares.

Pacheco igualmente nega-se a detalhar os "cinco dígitos" que cobra de seu cliente:

- Cobrei uma quantia muito módica porque ele não pode pagar. O PT está ajudando. O Genoino é tão pobre que não tem um gato para puxar pelo rabo.

Márcio Silva, que não é criminalista, atuou na defesa dos ex-deputados petistas Professor Luizinho e Paulo Rocha de graça, no início. Mas depois sublocou os escritórios criminalistas de Piero Paulo Botini , que responde por Luizinho; e de João Gomes, que defende Paulo Rocha.

- Faço isso porque são meus amigos. Isso é relativo. Qualquer advogado criminalista tem interesse em estar neste que é chamado de o processo do século, que tem uma enorme repercussão de mídia. É um processo atípico. Não tenho notícia de um processo envolvendo tantos advogados como este - diz Márcio Silva.

Já Luiz Francisco Corrêa Barbosa, advogado de Roberto Jefferson, afirma não estar cobrando nada do seu cliente, de quem é amigo e colega.

- Ele não tem dinheiro. É meu amigo, meu colega de escritório e companheiro de partido. Ele me pediu para patrociná-lo, e eu aceitei. Quando vejo uma ovelha cercada por dez cachorros, sou advogado da ovelha.

Uma das estrelas dessa constelação de advogados, o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos trabalha apenas com duas secretárias e uma advogada. Prefere, em vez de montar uma grande estrutura, associar-se a escritórios de amigos.

Já Antonio Carlos de Almeida Castro - o Kakay - tem em seu escritório, atuando na defesa do publicitário Duda Mendonça e sua sócia Zilmar Fernandes, um grupo de cinco advogados, além de estagiários.

Em Belo Horizonte, três dos quatro advogados do escritório Hermes V. Guerrero trabalham na defesa de Ramon Hollerbach Cardoso, sócio de Marcos Valério. Guerrero não diz quanto está cobrando, mas afirma que é um valor "razoável" e dá pistas de que a conta deve ser salgada:

- Até porque advogo para o Ramon em três processos, e não um, e vou ter de ficar agora um mês em Brasília. Sou professor da Universidade Federal de Minas, tudo bem que agora está em greve, se não, teria de ficar indo e voltando.

Advogado de Simone Vasconcelos, ex-diretora financeira da SMP&B, uma das agências de Marcos Valério, Leonardo Isaac Yarochewsky ficaria em Brasília este fim de semana concentrado na sustentação oral que fará esta semana.

Os cinco advogados de seu escritório trabalham na causa. A principal linha de defesa é que Simone apenas cumpria ordens de Marcos Valério e não tinha autonomia, embora fosse diretora financeira da agência de publicidade.

- Ela cumpria ordens, e essas ordens, naquele momento, eram aparentemente legais. O dinheiro que foi distribuído a mando de Marcos Valério era de empréstimos feitos no Banco Rural. E ela fazia os pagamentos, sem saber se aquelas pessoas eram deputados, presidentes de partido. Ela agiu sem consciência da ilicitude. Ninguém faz perguntas ao chefe sobre ordens recebidas - afirmou Yarochewsky.

Alguns escritórios de advocacia estão defendendo mais de um réu do mensalão. É o caso do Dias e Carvalho Filho, que tem como clientes Kátia Rabello e Vinícius Samarane, ex-presidente e ex-diretor do Banco Rural; do Ávila de Bessa, com o deputado Valdemar Costa Neto (SP) e o ex-deputado Bispo Rodrigues (PR-RJ); e do Abreu e Silva, que defende Rogério Tolentino, advogado ligado a Marcos Valério, e Geiza Dias, gerente financeira da SMP&B.

Também é o caso de Délio Lins e Silva, que defende Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do então PL (hoje PR), e seu irmão Antônio Lamas, ex-assessor da liderança do PL na Câmara; e de Roberto Pagliuso, que tem como clientes o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto e seu ex-chefe de gabinete José Luiz Alves.

FONTE: O GLOBO

Ponto fraco da acusação pode ajudar réus do mensalão

A contundência da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no julgamento do mensalão não livrou seu trabalho de críticas reservadas de ministros do STF e de autoridades que acompanharam as investigações. Um dos pontos contestados é o fato de a acusação não incluir o ex-ministro José Dirceu na acusação de lavagem de dinheiro. Ele responde por corrupção ativa e formação de quadrilha

Nos bastidores, ministros apontam fragilidade na acusação do mensalão

Segundo autoridades, o ex-ministro José Dirceu poderá ser beneficiado por suposta falha da acusação do Ministério Público Federal ao STF

Felipe Recondo e Fausto Macedo

A contundência da sustentação oral do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que incluiu pedidos de prisão de 36 dos 38 réus do processo do mensalão, não livrou seu trabalho de críticas reservadas de ministros do Supremo Tribunal Federal e de autoridades que acompanharam as investigações do escândalo.

O potencial beneficiário de alegadas falhas no trabalho do Ministério Público Federal é o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, apontado como "mentor intelectual" do que Gurgel chamou de "mais atrevido caso de corrupção e desvio de recursos no Brasil com o objetivo de comprar parlamentares".

A corte está dividida. Alguns ministros do Supremo usarão o que consideram fragilidades da acusação para votar pela absolvição dos principais réus do processo, que começou a ser julgado na quinta-feira, 2. Outros magistrados, mesmo com reprovações à peça acusatória, mostram-se dispostos a condenar os protagonistas do escândalo que abalou o governo Luiz Inácio Lula da Silva em 2005.

Denúncia. "É uma denúncia para a galera", disse uma autoridade que acompanha o caso desde o início. Segundo ela, o erro da acusação foi não ter imputado a Dirceu o crime de lavagem de dinheiro - o ex-ministro responde por corrupção ativa e formação de quadrilha. No início, acrescentou, acreditava-se que tinha sido "bobeada" do Ministério Público Federal, do então procurador-geral Antonio Fernando de Souza, autor da denúncia.

Além de Dirceu, na avaliação de especialistas, deveriam ser denunciados formalmente por lavagem de dinheiro o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares - ambos assinaram empréstimos com o Banco Rural que o Ministério Público afirma serem de fachada, feitos para não serem pagos e o dinheiro, usado no pagamento de compra de votos no Congresso.

"Os que tinham o domínio financeiro do esquema ficaram de fora da lavagem de dinheiro. Formação de quadrilha, apesar de apelo midiático, não leva a nada", disse outra autoridade que acompanha de perto o processo.

Assim como Dirceu, também Genoino e Delúbio respondem por formação de quadrilha e corrupção ativa. Ambos ficaram de fora do enquadramento por lavagem de dinheiro, atribuído aos deputados João Paulo Cunha (PT-SP) e Pedro Henry (PP-MT) e ao ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato.

O crime antecedente à lavagem - requisito obrigatório para caracterizar o crime - foi o desvio de dinheiro público, segundo autoridades que participaram das investigações sobre o esquema. "A lavanderia foi pensada por eles. O PT se viu na necessidade de criar um sistema financeiro. Dirceu precisava de uma estrutura de lavagem de dinheiro. Delúbio tinha domínio, Dirceu tinha domínio, Genoino tinha domínio, eles não tinham que responder por lavagem de dinheiro?", questiona um técnico que assessorou do início ao fim a CPI dos Correios.

Para esse técnico, prender no auge da investigação o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como operador do mensalão, seria o tiro no coração do esquema.

"Ele (Marcos Valério) não resistiria. Havia motivos para a prisão, estava destruindo provas, foi flagrado. Mas a prisão do Marcos Valério não foi decretada", lamenta o técnico.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Advogados vão explorar contradições de Gurgel

Advogados dos réus do mensalão pretendem desconstruir o trabalho da Procuradoria-Geral da República apontando diferenças de conteúdo entre a denúncia do caso, feita em 2007, e as alegações finais, entregues em 2011 por Roberto Gurgel. Nas defesas orais, que começam amanhã, eles devem atacar as contradições e as omissões da Procuradoria durante a investigação

MENSALÃO O JULGAMENTO

Defesa vai explorar recuos e contradições da Procuradoria

Acusação deixou de lado elementos que faziam parte da denúncia original

Para advogados, mudanças ocorridas na fase de instrução do processo enfraquecem acusações contra réus

Rubens Valente, Andreza Matais

BRASÍLIA - Advogados de alguns dos principais réus do mensalão vão explorar nesta semana diferenças entre os dois principais documentos da acusação que constam do processo, com o objetivo de apontar contradições e omissões.

Eles começarão amanhã a expor os argumentos da defesa dos réus no plenário do STF (Supremo Tribunal Federal). Cada acusado terá direito a uma hora para falar.

Os defensores dos réus vão comparar trechos da denúncia, formulada em 2006 pelo então procurador-geral da República Antonio Fernando Souza e acolhida em 2007, e as alegações finais, entregues em 2011 pelo atual ocupante do cargo, Roberto Gurgel.

Os advogados vão enfatizar para o STF elementos que foram incluídos na denúncia e que acabaram sendo descartados após a fase de instrução do processo, em que o STF recolheu provas e tomou centenas de depoimentos.

Quando o Ministério Público apresenta uma denúncia ao Judiciário, aponta indícios de crimes devem ser esclarecidos no processo penal. As alegações finais representam um balanço do que foi possível concluir com o processo.

"A denúncia foi diferente da alegação final. Para caracterizar o tipo penal de meu cliente, mudaram a conversa", diz o advogado do deputado Pedro Henry (PP-MT), José Antonio Duarte Alvares.

Na denúncia, a Procuradoria diz que Henry recebeu dinheiro do mensalão para obter "apoio político do PP" em votações de interesse do governo no Congresso. No final, a argumentação é que Henry foi "cooptado" pela "perspectiva do voto parlamentar".

Ou seja, a primeira peça diz que o PP foi comprado pelo mensalão e a segunda diz que o deputado é que foi subornado, o que pode fazer diferença quando os ministros do STF analisarem sua conduta.

Um dos mais experientes advogados do caso, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, irá na mesma linha. Segundo ele, houve uma mudança importante na acusação contra sua cliente, Ayanna Tenório, ex-executiva do Banco Rural.

Na denúncia original, ela foi associada a 68 operações com indícios de lavagem de dinheiro. "Nas alegações finais, falaram de apenas três operações", observa Mariz.

O advogado Marcelo Leonardo, que defende o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como o operador do mensalão, pretende explorar um recuo da Procuradoria, que pediu a reclassificação das condutas atribuídas a alguns dos réus.

Dez pessoas foram acusadas pela Procuradoria de evasão de divisas, por terem enviado para uma conta nas Bahamas parte dos pagamentos recebidos pelo publicitário Duda Mendonça por serviços prestados ao PT na campanha presidencial de 2002.

"Na denúncia inicial, a acusação era de evasão de divisas", diz Leonardo. "Nas alegações finais, a Procuradoria afimra que pode não ser evasão e pede para condenar por lavagem de dinheiro."

A Procuradoria não apresentou justificativas ao fazer o pedido de reclassificação das condutas, mas disse ao STF que considera as provas existentes no processo suficientes para caracterizar qualquer um dos dois crimes.

Por meio de sua assessoria, a Procuradoria disse que é normal haver diferenças entre as duas peças de acusação, pois indícios apontados na denúncia podem ou não ser confirmados no processo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O inescapável - Fernando Henrique Cardoso

Ao voltar de férias, percorri os jornais: só dá mensalão e Olimpíada. Não é para menos, mas é pouco. Consolou-me haver lido uma matéria de David Brooks sobre a campanha eleitoral em seu país. Basta ler o título, A campanha mais tediosa, para que o leitor se dê conta do baixo-astral que envolveu o comentarista ao seguir os embates entre Barack Obama e Mitt Romney. Isso a despeito de os americanos ainda estarem sufocados pela crise e de haver muito que debater sobre como sair dela e sobre o papel dos Estados Unidos num mundo cheio de incertezas. Mas o cotidiano não se alimenta de decisões históricas...

Como seria bom se pudéssemos apenas nos deliciar com a sensibilidade e a inteligência da crônica de Roberto DaMatta sobre os elos humanos que aparecem na novela Avenida Brasil, não tão diferentes dos que relacionam o antropólogo com seus objetos de estudo. Ela nos dá um banho de vida. Infelizmente, nesta semana não dá para falar apenas das estrelas. A dura realidade é que começou na quinta-feira um julgamento histórico sobre o qual não faltaram palavras sensatas. Uns, como José Nêumanne, mostraram as Falácias e enganos acerca do mensalão de maneira crua e direta. Outros, como Dora Kramer, desvendaram a Falsa dicotomia entre julgamento técnico e julgamento político. Outros ainda, como Elio Gaspari, sem negar que torcer faz parte da alma humana, insistem em que o importante é que os magistrados julguem de maneira compreensível para o povo. Que não nos confundam com o jargão da toga. E há os que abrem o jogo, mostram suas apostas, como o Zuenir Ventura, para logo dizer que tudo é mero palpite, pois não se pode saber o que passa na cabeça dos julgadores.

Por mais que se deseje ser objetivo, tenho tentado, e por mais prudente que se deva ser na antevéspera do julgamento (no momento em que escrevo este artigo), é inegável a sensação de que talvez estejamos no começo de uma nova fase de consolidação das instituições democráticas. Existe também o temor de que ela se perca. É isso que produz ansiedade e faz com que os comentaristas mais perspicazes - incluo neles Merval Pereira -, ao falarem sobre o tema, acabem por deixar transparecer o que gostariam que acontecesse. De minha parte, torço para que não haja impunidade. Calo sobre quem deva ser punido e em que grau, mas não se deve obscurecer o essencial: houve crime.

Embora, portanto, esteja engrossando o número dos obcecados com o mensalão, não posso esconder certa perplexidade diante da despreocupação com que recebemos as notícias sobre a crise internacional, como se, de fato, a teoria da marolinha tivesse substituído o bom senso na economia. Não dá para ignorar que com toda a inundação de dólares a baixo custo feita pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano), a economia do país não reage. Na Europa, por mais que seu Banco Central se diga disposto a cobrir qualquer parada dos especuladores, os mecanismos para tornar efetiva a gabolice estão longe da vista. Resultado: mal-estar social e desemprego crescente. A própria China, bastião da grandeza capitalista mundial, parece mergulhar em taxas decrescentes de crescimento, as quais, se bem que nos deem água na boca (entre 6% e 7%), são insuficientes para atender aos reclamos dos chineses e, mais ainda, para sustentar a maré dos preços elevados das matérias-primas, principalmente minerais.

Tudo indica, portanto, que os efeitos da crise mundial, somados à inércia nas transformações de fundo da economia que marcou o governo Lula, acabaram por levar nossa economia, se não às cordas, ao canto do ringue. O governo atual, não querendo beijar a cruz, embora já ajoelhado diante da realidade, despejou uma série de paliativos de todos conhecida: redução setorial de impostos, créditos de mão beijada para alguns setores beneficiados, expansão dos gastos públicos correntes e, até, desvalorizações da moeda e redução das taxas de juros. Em situações "normais" de crise, o receituário funcionaria. Um pouco de sustentação da demanda, jogando-se nos ombros de Keynes a responsabilidade pela ligeireza de certas medidas, animaria o consumo e daria aos empresários o apetite para investir. Diante, entretanto, da duração e da profundidade da crise atual, é pouco. Serão necessárias medidas verdadeiramente keynesianas que dizem respeito à sustentabilidade dos investimentos, públicos e privados, e ao incremento da produtividade. Desafio duro de roer e que não se pode levar adiante somente com os recursos públicos nas mãos de uma burocracia politizada.

É esse o desafio que o governo Dilma Rousseff tem pela frente. Quem sabe, premido pelas circunstâncias, ele finalmente reconheça, na prática, o que o lulopetismo sempre negou: que as reformas que meu governo iniciou precisam ser apoiadas e retomadas com maior vigor. Nem as estradas, nem os aeroportos e muito menos as fontes de energia darão o salto necessário sem alguma forma de privatização ou de concessão. Elas terão de vir se quisermos de fato crescer mais aceleradamente. Só com estabilidade jurídica, aceleração dos investimentos em infraestrutura e educação, melhor balanceamento energético será possível despertar não apenas, como está na moda dizer-se, o "espírito animal" dos empresários, mas a crença de todos nós no futuro do Brasil.

Ao contribuir para a consolidação da Justiça como um valor, parte essencial da modernização do nosso país, o julgamento do mensalão poderá ser um marco histórico. Basta que seja sereno e justo para injetar mais ânimo em nossa política e para que esta volte a olhar o Brasil com a clareza de que somos um país capaz de andar com as próprias pernas graças à nossa seriedade e aos conhecimentos que desenvolvemos. Só assim deixaremos de flutuar ao sabor das ondas favoráveis às economias primário-exportadoras para podermos dar rumo próprio ao nosso futuro.

Sociólogo; foi presidente da República

FONTE: O GLOBO, O ESTADO DE S. PAULO, ZERO HORA

Magistrados procuram nos autos provas que incriminem Dirceu

Durante sua fala, Gurgel reconheceu a dificuldade para produzi-las; o "autor intelectual", diz, "quase sempre fica na sombra"

Ao menos dois ministros do Supremo procuram na acusação o ato de ofício, a prova que mostre que o ex-ministro da Casa Civil e réu no processo do mensalão José Dirceu estava por trás da compra de parlamentares com o dinheiro obtido pela engenharia que envolvia contratos de publicidade e empréstimos bancários.

Um dos ministros mais antigos do STF ressalta que, para confirmar a prática de corrupção ativa, o Ministério Público deveria ter ouvido o depoimento de um parlamentar contando ter sido procurado pela Casa Civil com a simples promessa de recursos em troca de apoio a projetos de interesse do Executivo. Se não houver prova, disse esse ministro, só restará ao STF absolvê-lo.

Nas quase cinco horas que usou para acusar os réus do mensalão, Gurgel admitiu as dificuldades para produzir provas contra Dirceu. "O autor intelectual, quase sempre, não fala ao telefone, não envia mensagens eletrônicas, não assina documentos, não movimenta dinheiro por suas contas, agindo por intermédio de laranjas e, na maioria dos casos, não se relaciona diretamente com agentes que ocupam níveis secundários da quadrilha." E sustentou as acusações em depoimentos que outro ministro do STF considera inconclusivos.

Um desses depoimentos foi usado por Gurgel na sexta-feira. O empresário Marcos Valério, tido como coordenador operacional do mensalão, disse que Dirceu sabia das operações feitas para financiar os acordos políticos com os líderes partidários e garantiria os empréstimos feitos para o pagamento dos acordos.

Prova cabal. Uma autoridade que acompanha o processo admitiu que no correr das investigações não foi possível encontrar prova cabal que pudesse levar à condenação de Dirceu por corrupção ativa. Disse, porém, que o Ministério Público poderia ter fechado as brechas que podem suscitar dúvidas sobre a culpa de Dirceu se também o tivesse acusado de lavagem de dinheiro. O próprio procurador-geral, avaliou essa autoridade, enfatizou que Dirceu comandava todo o esquema que incluía a montagem de um estratagema para lavar dinheiro.

Gurgel disse, na acusação, que Dirceu tinha conhecimento dos empréstimos tomados pelas empresas de Valério no Banco Rural para financiar acordos políticos firmados durante a campanha de 2002. "José Dirceu comandava de fato o esquema ilícito que resultou no escândalo do mensalão", diz Gurgel. "Sabia da cooptação dos políticos para a composição de base parlamentar de apoio ao governo, sabia que a base estava sendo formada à custa do pagamento de vantagens indevidas e, acima de tudo, de onde vinha o dinheiro que era usado para pagamento aos parlamentares."

Se as provas da corrupção forem julgadas frágeis pelos ministros do STF, Dirceu poderia ainda ser condenado por formação de quadrilha. Mas a pena seria baixa e Dirceu não chegaria a ser preso. / F.M. e F.R.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Especialistas respondem a 10 perguntas sobre o mensalão

Pesquisadores da FGV Rio explicam que a aplicação de pena mínima levaria à prescrição de quatro crimes

Roberto Maltchik

RIO - Além da expectativa pelo veredicto, o julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) suscita uma série de dúvidas sobre o que ocorrerá com os réus após a confirmação dos votos dos 11 ministros. E também alimenta a curiosidade sobre regras essenciais para o funcionamento do plenário ao longo das próximas semanas. Para esclarecer as principais dúvidas, O GLOBO elaborou um questionário que foi submetido ao Centro de Justiça e Sociedade da FGV Direito Rio. A seguir, os constitucionalistas explicam regras básicas, como as chances de paralisação do julgamento; o desfecho previsto em caso de empate; quais crimes podem estar prescritos; em quais situações os réus poderão ser presos; e quando a sentença passa a ser executada, em caso de condenações.

Quanto tempo deve durar o julgamento?

A previsão é que dure entre um e dois meses, caso não haja problemas. As primeiras duas semanas serão provavelmente tomadas pelas sustentações orais. É provável que a tarefa de fixar as penas para cada um dos condenados seja demorada.

Após proferir o voto, os ministros podem alterar sua decisão?

Sim. Enquanto não acabar a votação, os ministros podem mudar o voto. Isso é fruto do debate e da exposição das ideias dos outros ministros. A discussão de teses jurídicas diferentes e a formação de consensos está ligada a essa possibilidade de “diálogo” entre os ministros. Até o final do voto do último ministro, no caso o ministro Ayres Britto, e antes que se proclame o resultado, todos os ministros que já votaram podem alterar seu voto, quantas vezes quiserem.

Existe a tendência de que algum ministro peça vista?

A tendência é que os ministros não peçam vista porque o processo está todo digitalizado, o que significa que todos os ministros têm acesso a ele desde o princípio. Em geral, o pedido de vista ocorre quando o ministro não teve acesso ao processo e precisa ter algum fato esclarecido.

A apresentação de dado novo pode interferir no julgamento?

Pode. Mas, se trazido pela acusação, o julgamento pode ser suspenso para que a defesa possa contrapor o que for alegado. Isso é bastante improvável.

Alguma testemunha pode ser convocada para depor durante o julgamento?

Não. As testemunhas já foram ouvidas e não há previsão para inquirição em plenário. Existe hipótese remota de o Tribunal decidir suspender o julgamento para determinar a reinquirição de uma pessoa. Trata-se de uma situação possível, mas pouco provável.

Os réus podem falar durante a sessão?

Não. Quem se manifesta são os advogados. E eles só podem se manifestar durante o tempo para sustentação oral ou apenas para esclarecer questão de fato, quando os ministros estiverem deliberando.

Quais crimes podem estar prescritos? Em quais circunstâncias estariam prescritos?

Se o STF condenar qualquer dos réus a uma pena de até dois anos, haverá a prescrição em relação a esse crime. Se um mesmo réu for condenado pela prática de dois crimes e a pena dada a cada um dos crimes for de até dois anos, também haverá a prescrição. A prescrição ocorre em relação ao crime e não em relação ao somatório das penas. Assim, caso seja aplicada a pena mínima nos crimes de formação de quadrilha, corrupção (ativa e passiva), peculato e evasão de divisas, já houve prescrição.

Se condenados, o que definirá se os réus serão presos ou não?

De acordo com o Código Penal, as penas de até quatro anos podem ser substituídas por prestação de serviços e, no caso de penas de até oito anos, o réu inicia o cumprimento da pena em regime semiaberto (dorme na cadeia e passa o dia trabalhando). Assim, nesses casos, ainda que haja condenação, pode não haver prisão em regime fechado. A definição do regime de cumprimento de pena, ou de aplicação de pena alternativa, depende dos ministros, que devem decidir com base em uma série de critérios, entre eles, os antecedentes (se o réu é primário, por exemplo).

A execução da sentença é imediata?

O primeiro ponto importante aqui é que, após o julgamento, é preciso haver a publicação da decisão no Diário Oficial para que ela comece a ter efeitos. Após essa publicação, há prazo para embargos de declaração. Apenas após o término do julgamento e publicação dos embargos, a decisão transita em julgado, e a sentença será executada.

Em caso de empate em alguma decisão do STF, qual é o critério de desempate?

Não há previsão expressa do que deve ser feito em um caso como esse. A única coisa certa é que isso será objeto de debate e interpretação por parte de todos os ministros. Vale notar, porém, que, no primeiro julgamento sobre a validade da Lei de Ficha Limpa, em 2011, surgiram interpretações diferentes sobre como proceder neste caso.

FONTE: O GLOBO

Clareza e uso de muitas perguntas marcam tática do procurador-geral - Joaquim Falcão

Gurgel descreve, revela e explica, em grande constraste com votos de alguns ministros do STF

As respostas às questões do procurador serão dadas nesta semana. Se você já tem as suas respostas, sugiro aguardar a defesa. Falta muito


O objetivo do procurador-geral, Roberto Gurgel, é vencer o julgamento. Condenar os réus. Para isso, precisa convencer os ministros. Precisa vencer com os votos dos ministros. E como se consegue isso? Argumentando.

Mas existem milhares de maneiras de argumentar! Qual a que o procurador escolheu? Qual a mais eficiente para seu propósito?

Primeiro, usou da clareza. Todo mundo entendeu o que o procurador falou. Pode-se dele discordar, mas a ele se entende. Ele descreve, revela e explica.

Contraste grande com votos de alguns ministros. O procurador não faz citações eruditas. Apenas citações necessárias. Ousa.

Usa das palavras como instrumento de revelação da verdade e não de ocultação dos fatos. Esse foi seu primeiro passo para convencer.

O segundo foi usar das perguntas, tanto quanto das afirmações. De início, afirmou, reafirmou, confirmou tudo o que dissera antes. E foi além.

Para convencer que houve crime de quadrilha, envolvendo pessoas articuladas, em torno do objetivo comum de ampliar a base política do governo e obter dinheiro para tanto, o procurador perguntou. Perguntou muito.

Por que interesses de bancos são tratados na Casa Civil, em vez de no Banco Central? Por que interesses do PT são tratados na Casa Civil em vez de na sede do PT? Por que interesses estrangeiros são tratados na Casa Civil e não nos órgãos de turismo?

E foi além. Por que os que receberam recursos, sejam públicos, sejam privados, procuraram ocultá-los?

Desde através de fraudes contábeis comprovadas por perícias técnicas, até por uso de terceiros anônimos recebendo dinheiro em nome de outros? Por que órgãos públicos pagam por publicidades que não foram feitas?

Concluiu citando o ilustre penalista Heleno Fragoso, defensor de muitos da esquerda, que lutou pela democracia. "O autor do crime de quadrilha é quem tem o controle do ato criminoso." Não necessariamente quem o executa.

No caso, o ato foi fazer alianças políticas e conseguir o dinheiro necessário. Quem controlou esses acordos?

O procurador não envolveu em momento algum a Presidência. Sobrecarregou José Dirceu. As respostas a tantas perguntas, que não atingem necessariamente todos os réus, vão ser dadas nesta semana. Se você já tem suas respostas, sugiro aguardar a defesa. Falta muito.

Joaquim Falcão é professor de direito constitucional da FGV Direito-Rio.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O escândalo que mudou a cara do PT

Para analistas, partido perdeu com mensalão a bandeira da ética e sobreviveu, depois de 2005, graças à força de Lula e a sua política de alianças

Gabriel Manzano

Já com sete anos completos, vivendo dias de glória na austera sala de sessões do Supremo Tribunal Federal, o mensalão tem papel garantido na história: ele marcou em definitivo a vida de um dos maiores partidos do País, o PT, dividindo-a em um "antes" – os tempos da bandeira ética, quando todos os outros partidos eram "farinha do mesmo saco" – e um "depois", em que o exercício do poder matou o sonho e levou aos conchavos e ao antes desprezado "é dando que se recebe".

Essa é, com pequenas diferenças, a impressão de muitos estudiosos da vida partidária do País. Por exemplo, o historiador Lincoln Secco, autor do livro A História do PT: "O episódio dividiu, sim, a história petista em duas partes, porque derrubou o discurso pela ética na política e retirou de cena os principais quadros históricos do partido", diz o historiador da USP. Como ele, o professor de Ética e Filosofia da Unicamp Roberto Romano considera o episódio crucial na vida do partido, mas não o vê como um acidente: "Ele é o coroamento de um longo processo interno que se desenhava muito antes".

E, do ponto de vista ideológico, um terceiro estudioso do assunto, o psicanalista Tales Ab"Sáber, define o episódio como "a instalação do PT na política de direita brasileira". Ab"Sáber pondera, no entanto, que "os demais partidos, inclusive partícipes do próprio mensalão, não têm nada de melhor a oferecer no manejo da política do País".

A turbulência em que mergulhou o partido, naqueles meados de 2005, justifica tais reações. Mal o deputado Roberto Jefferson fez a denúncia, o então poderoso chefe da Casa Civil, José Dirceu, "saiu rapidinho" do governo, como ele sugeriu. O presidente do PT, José Genoino, foi afastado em seguida. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi duas vezes à TV pedir desculpas ao País e dizer-se traído.

Resistência. A oposição, feliz, achava que o petismo estava acabado e que sua volta ao Planalto, no ano seguinte, era inevitável – tanto que nem se arriscou a pedir o impeachment de Lula, achando melhor "vê-lo sangrar".

Essa visão se desmanchou em poucos meses. O tal "muro divisório" do petismo não alterou os humores do eleitorado como se imaginava. A militância encolheu, mas não entregou os pontos. O partido baqueou, mas, à sombra do prestígio de Lula – que conseguiu manter-se acima da crise – reagiu. Não só faturou as eleições presidenciais de 2006 e 2010 como continuou a dividir com o PMDB as grandes bancadas na Câmara. Em 2006 elegeu 83 deputados. Em 2010, saltou para 88. Mais que as denúncias da oposição e da mídia, o que valia eram reações como a do ator Paulo Betti que, em agosto de 2006, sentenciou: "Não dá pra fazer política sem botar a mão na merda".

O Ibope deu números a esses tempos sombrios do partido. Em março de 2003, antes do estrago aprontado por Jefferson, 33% dos eleitores do País diziam ter simpatia pelo PT. O índice foi caindo devagar, bateu no fundo em fevereiro de 2006, com 21% – mas a sigla ainda liderava esse ranking. Em março de 2010 já emplacava de novo os 33%, que mantém até hoje. "O maior custo eleitoral foi a perda da característica ética. Hoje o PT se iguala aos demais. Mas continua sendo o que tem a maior preferência", conclui a diretora executiva do Ibope, Marcia Cavallari.

O sonho e o poder. O que salvou o partido, avisa Secco, "foi o capital social, que lhe deu forças para se recuperar". Mas é uma recuperação apenas como ocupação de poder – pois, do antigo sonho, da pureza ética, poucos se arriscam a falar. "Esse sonho desapareceu muito antes", alerta Roberto Romano. "Nas eleições de 1989, contra Fernando Collor, era fácil ver nas ruas gente paga para agitar bandeiras do PT. A burocracia já pesava mais que a militância."

Para Romano, as origens do mensalão vêm da primeira infância do PT. Dos três grupos que o formaram ainda nos anos 1970, os "realistas", com Lula e José Dirceu à frente, venceram os católicos e os trotskistas. E Lula, ironiza ele, "aprendeu a fazer política e concessões com o patronato". Em 2002, a Carta aos Brasileiros – garantia dada "ao mercado" de que, se eleito, respeitaria as regras e contratos – "foi a capitulação" dos idealistas ante a lógica da conquista do poder. Naquela ocasião, diz o professor, "deviam ter convocado um congresso e mudado o programa do PT. Aquele não servia mais".

Na sua "fase 2", em que tenta – ainda hoje –reduzir o mensalão a uma campanha da imprensa e das oposições, Ab"Sáber vê o petismo empenhado em produzir "uma alucinação negativa de que (o mensalão) não existiu".

O partido, segundo ele, continuará usufruindo os privilégios típicos dos poderosos. "Mas no dia em que o PT perder o poder, eu temo pelo seu destino. Até lá ele tenta desesperadamente se enraizar nos municípios e no Estado enquanto perde relevância histórica – ou seja, tenta tornar-se um PMDB qualquer."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

'Escândalo derrubou o discurso do partido pela ética na política'

Na visão do historiador Lincoln Secco, o PT sobreviveu ao escândalo do mensalão graças ao "capital social" que soube preservar junto à população.

O mensalão foi um divisor de águas na história política do PT?

O mensalão não foi o maior escândalo político da história do Brasil, mas na história do PT foi a crise mais grave. Divide a história do PT por dois motivos: derrubou o discurso pela ética na política que o PT acalentou por muitos anos; e, principalmente, porque retirou da cena política seus principais quadros dirigentes históricos.

O modo como o partido reagiu foi coerente?

A direção do PT literalmente se escondeu. Poucos dirigentes tiveram coragem de aparecer em público para defender o partido. Muitos foram a programas de TV para salvar a própria pele e acusar seus companheiros. Em 2005, o PT ficou sem direção por várias semanas.

Como entender a "herança" desse episódio, hoje?

Ainda que tenha perdido o monopólio da ética, o partido manteve o da questão social. A inversão de prioridades do governo Lula na área social garantiu a recuperação do PT. Se a sobrevivência do governo foi importante porque evitou um trauma histórico no País, para a direção do partido pode ter sido ruim. Aparentemente, há muitos dirigentes que não aprenderam nada e voltaram à velha rotina política. Mas o PT sempre foi mais do que sua estrutura partidária. Ele representa ainda uma corrente de opinião forte na sociedade brasileira.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O pós-mensalão - Merval Pereira

Não é possível saber de antemão qual o efeito do julgamento do mensalão no eleitorado nas eleições municipais deste ano, mas ele é temido pelo PT e dá esperanças à oposição na campanha eleitoral.

O Palácio do Planalto procura distanciar-se ao máximo do debate que ele suscita, e a presidente Dilma Rousseff já disse a interlocutores que essa é uma dor que o partido tem que sofrer e superar.

Mas não é apenas a oposição que joga suas esperanças num revés petista nesse julgamento. Também alguns partidos aliados não envolvidos nas acusações veem no eventual desgaste petista uma possibilidade de assumirem posições mais destacadas no governo federal.

O julgamento tem o potencial de definir as forças partidárias dentro e fora do PT, realinhando posições políticas e forjando um novo quadro de coalizões, seja qual for o resultado.

Não é à toa que, volta e meia, pessoas ligadas ao PT tentam afastar para longe do partido a palavra mensalão, especialmente em um ano eleitoral.

A tentativa mais alardeada foi a do próprio ex-presidente Lula, que assediou ministros do Supremo Tribunal Federal para convencê-los a adiar o julgamento para depois das eleições.

Tratou do tema diretamente com os ministros Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, com os quais tem relações de amizade, e esbarrou na indignação do ministro Gilmar Mendes, a quem teria ameaçado com denúncias do PT na CPI do Cachoeira para obter sua adesão à tese.

Mendes levou essa tentativa de intimidação ao presidente do Supremo, e confirmou a manobra de Lula para a imprensa.

O PT reclamou também de o STF usar o termo mensalão em seu noticiário sobre o julgamento, que passou a ser tratado oficialmente apenas como "ação penal 470".

Outra tentativa foi a de um grupo de advogados ligados ao PT, que enviou à presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, um pedido para que não permitisse que o julgamento do mensalão fosse usado nos programas eleitorais dos partidos oposicionistas.

Agora, há um movimento para pedir à Justiça que os meios de comunicação sejam impedidos de usar o termo mensalão em seu noticiário, obrigando-os a falar sempre da "ação penal 470" quando se referirem ao julgamento em curso.

Para a presidente Dilma, a condenação do grupo petista que comandou o mensalão significará reforço na sua capacidade de intermediação dentro do partido, hoje dependente do grupo majoritário "Construindo um Novo Brasil", liderado por Dirceu.

Naturalmente, esse grupo sairia enfraquecido na luta partidária, abrindo caminho para os petistas ligados à presidente, que hoje não têm influência decisiva no partido.

A condenação de Dirceu e sua turma levaria, ao mesmo tempo, à reorganização de forças partidárias dentro da base aliada. Partidos que pouco ou nada têm a ver com o mensalão, como o PSB e o PMDB, sairiam fortalecidos no pós-julgamento.

O PMDB tem dois envolvidos, José Borba e Anderson Adauto, que permanecem no partido e são prefeitos de Jandaia do Sul (PR) e Uberaba (MG).

No entanto, não há indícios de que a cúpula partidária estivesse envolvida, pois, na ocasião, apenas uma parte do partido estava no governo. Só depois da crise do mensalão é que o partido entrou oficialmente na base aliada.

Já o PSB não tem nada a ver com as negociações do mensalão, com apenas uma participação indireta na regional do Pará, que teria recebido uma ajuda em dinheiro.

O enfraquecimento do PT pode fazer com que os dois partidos assumam maiores responsabilidades na coalizão governamental.

Se, ao contrário do que esperam a oposição e mesmo alguns partidos aliados, petistas mais graduados forem absolvidos pelo STF, notadamente Dirceu, o PT será afetado em sua linha de ação, sendo previsível que o controle do partido fique explicitamente nas mãos do ex-ministro de Lula, que sairia das sombras para comandá-lo novamente.

Nesse caso, Dirceu teria formidável reinserção na vida partidária, com condições de influir decisivamente nos rumos do governo Dilma, voltando a ser a maior liderança política petista na impossibilidade de Lula retomar suas atividades políticas.

Seria também, provavelmente, a implosão da coalizão partidária que sustenta o governo nos moldes atuais.

FONTE: O GLOBO

O bom embate - Dora Kramer

"Nada autoriza conclusão tão definitiva, mas, se for essa a opção feita pelo ministro Lewandowski é de se perguntar: que mal há?"

Houve quem se assustasse com o atrito entre o ministro relator, Joaquim Barbosa, e o revisor, Ricardo Lewandowski, logo no início do julgamento a respeito de uma questão de ordem apresentada pelo advogado Márcio Thomaz Bastos.

Por que o susto se o assunto foi resolvido no voto mediante embate de ideias?

Provavelmente porque haja entre nós grande resistência em aceitar com naturalidade o exercício contraditório, habitualmente visto como algo condenável. Preferimos sempre a composição à contraposição.

Não por outro motivo, o ofício da oposição visto com reservas. Tido não como algo indispensável à dinâmica democrática, mas como fruto de intenções menores, rebeldia à deriva sustentada em objetivos golpistas de irresponsáveis interessados exclusivamente em inviabilizar o governo em curso.

A divergência inicial do julgamento foi recebida e interpretada como um sinal de que os procedimentos seriam tumultuados pela disposição do ministro revisor de se conduzir como contraponto ao revisor.

Nada autoriza conclusão tão definitiva, mas, se for essa a opção feita pelo ministro Lewandowski é de se perguntar: que mal há?

Os ministros do Supremo não funcionam em sistema de colegiado a não ser na contabilização do resultado em que vence a maioria. De resto, cada qual forma seu voto de acordo com suas convicções e diferentes interpretações dos textos legais.

É justamente no antagonismo que reside a riqueza de uma discussão que, por ser transmitida pela televisão, permite ao cidadão acesso a um conhecimento que normalmente não teria.

Todos os aspectos do processo são explicados à sociedade, esmiuçados à exaustão como ocorreu na primeira sessão.

Quem se interessa mais por conhecer que por simplesmente torcer, teve acesso a informações sobre o significado do instrumento do foro especial de Justiça, o que resultaria em prejuízos ou benefícios do desmembramento do processo e qual a razão de a maioria ter optado por afirmar a competência do STF para julgar a ação conjunta dos réus.

Momentos como aquele são proveitosos e devem se repetir ao longo do julgamento em que o menos relevante é o atraso de dias e até semanas.

Essencial é que o Supremo destrinche o caso à sociedade, que fale ao cidadão e demonstre o valor do bom embate de ideias que tanto faz falta à cidadania no Brasil.

Conjunto da obra. A narrativa do procurador-geral da República em nome da promotoria não constituiu novidade.

Mas o relato feito com começo, meio e fim, em linguagem clara e acessível, recupera e organiza na cabeça do público o fato em julgamento: a ação de um esquema comandando por José Dirceu com o objetivo de cooptar parlamentares para a base de apoio do governo Lula em troca de vantagens financiadas por empréstimos simulados do Banco Rural e desvio de dinheiro do Banco do Brasil.

Para derrubar o exposto pela acusação, a defesa precisará de mais que a justificativa de que a engrenagem descrita por Roberto Gurgel funcionava para suprir o caixa 2 de campanhas eleitorais.

Às favas. O ministro Dias Toffoli não se considera suspeito para julgar antigos companheiros de partido.

O Ministério Público não alegará impedimento para não tumultuar nem atrasar o processo.

Tem-se, com isso, resolvida a questão e desprovidas de sentido as discussões a respeito.

Se Toffoli não vê obstáculo ético e Roberto Gurgel submete a lei a cronogramas, pior para a ética e para a lei.

O dilema agora pertence ao ministro que terá seu voto e os 25 anos que tem pela frente no STF postos em xeque: se votar pela absolvição será objeto da desconfiança de que o fez movido pelo compadrio; se condenar, dirão que decidiu motivado pela necessidade de se afirmar.

De onde o afastamento voluntário sairia mais barato.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

No lucro - Eliane Cantanhêde

O procurador-geral Roberto Gurgel contou uma história com começo, meio e fim, mas recorrendo mais a relatos de testemunhas e menos a provas documentais. Esse vai ser o centro do julgamento.

Na profusão de nomes, valores, datas e fatos, algo aparentemente periférico se destaca: uma conta aritmética. Marcos Valério, o pivô, foi oito vezes ao Banco Central defender interesses do Banco Rural, que "emprestou" R$ 32 milhões para o esquema e foi brindado depois com R$ 1 bilhão na liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco. Negócio da China!

Gurgel explicou em bom e claro português, citando trechos de depoimentos e as páginas em que podem ser encontrados: os empréstimos eram "falsos, fictícios", apenas para encobrir "doações em troca de favores" acertados depois "entre quatro paredes da Presidência".

Ou seja, para que o dinheiro sujo circulasse entre o público e o privado, saísse do Banco do Brasil e de órgãos públicos para caixas de partidos e bolsos de políticos aliados ao Planalto de Lula e Dirceu.

Em resumo, o Banco Rural e o BMG simulavam empréstimos para encobrir a roubalheira e, em troca, ganhavam vantagens altamente compensadoras do governo Lula.

Segundo Gurgel, as notas eram envoltas em faixas com os logotipos do BB ou dos bancos privados e as quantias eram tão grandes que circulavam em caixas-fortes!

Na sua fala, de cinco horas, ele apontou José Dirceu como o "autor intelectual" do esquema e Delúbio Soares e Marcos Valério como "elos" entre o núcleo político e os núcleos operacional e financeiro.

Mas isso já foi amplamente dito, escrito, comentado. O que se quer saber é se, além da eventual pena dos culpados, essas quantias milionárias serão devolvidas aos cofres públicos.

Senão, mesmo com condenações, os envolvidos continuarão no lucro e ficará comprovado: o crime realmente compensa.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

A doutora Dilma detonou o mensalão 2.0 - Elio Gaspari

O golpe financeiro que abasteceria Marcos Valério tentou voltar à tona e morreu com uma canetada

A trama do mensalão tem um aspecto raramente mencionado. Quem entraria com o paganini? O comissariado pedia dinheiro a Delúbio Soares, ele repassava a demanda a Marcos Valério, que, por sua vez, tomava empréstimos nos bancos Rural e BMG. Na sua conta, o PT deve-lhe R$ 100 milhões. Certo mesmo é que ele deve R$ 83 milhões. Tudo bem, mas quem quitaria essas dívidas?

Em outubro de 2003, Delúbio Soares estava no esplendor de sua fama. A essa época, batalhava o encerramento da liquidação do Banco Econômico, fechado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.

Litigando com o Banco Central, Angelo Calmon de Sá, ex-dono do Econômico, sustentava que tinha créditos de R$ 6,3 bilhões, suficientes para quitar seus débitos. O BC sustentava que esses créditos não valiam e seu presidente, Henrique Meirelles, blindou-se, mesmo quando foi pressionado por parlamentares petistas.

Se abrissem o cofre, todas as instituições interessadas poderiam reivindicar até R$ 40 bilhões. Diante de semelhante ervanário, os R$ 100 milhões devidos pelo comissariado seriam gorjeta.

O repórter Fernando Rodrigues revelou que Marcos Valério relembrou a Delúbio seu interesse no caso do Econômico durante um encontro às vésperas de seu depoimento ao Ministério Público. Tipo me-ajuda-senão-eu-falo. Prometeram-lhe apoio, mas deixaram-no na estrada. Ainda bem.

Passou o tempo e, enquanto se discutia o velho escândalo, a manobra reapareceu, mansinha. A ressurreição dos créditos foi contrabandeada na medida provisória 517, também conhecida como "MP Frankenstein", porque nela havia de tudo.

Aprovada pelo Congresso, teve pareceres contrários da advocacia do Banco Central. Os patrocinadores de Marcos Valério mobilizaram-se, jogando pesado, sob a liderança dos controladores do falecido Banco Nacional e o socorro da elite operacional do PMDB. Sinal dos tempos, tentaram dobrar o BC, mas não bateram à porta do Planalto. Em junho de 2011, a doutora Dilma vetou o dispositivo que permitia o arranjo. Ela sabia de tudo, de todos, há tempos.

O episódio perdeu-se nos silêncios que cimentam a unidade de base aliada. Quem dançou não reclamou e quem prevaleceu calou-se.

Se em 2003 o doutor Delúbio Soares tivesse sido avisado de que a manobra do resgate dos bancos quebrados não teria o amparo do Planalto, não teria acontecido o "Mensalão 1.0". Mesmo depois da explosão do escândalo, havia companheiros apertando o Banco Central. Com o veto de Dilma, e com a resistência de alguns servidores do Estado, evitou-se o "Mensalão 2.0".

FONTE: O GLOBO

Grandes negócios, boas confusões - Tereza Cruvinel

Já tem ambições e confusões de bom tamanho na agenda de agosto do governo para a presidente da República se ocupar do que se passa do outro lado da Praça dos Três Poderes, onde o STF seguirá julgando a Ação Penal nº 470, vulgo mensalão. Em sua indiferença calculada pelo assunto, ela não deixou de expressar irritação com as versões de que as medidas que está preparando seriam um diversionismo, havendo a oposição até falado em PAC do mensalão. Como estão sobre a mesa negócios da ordem de R$ 30 bilhões, seria um baita crime de peculato lançar o pacote só para desviar atenções.

A economia brasileira teve o pior desempenho, entre os cinco países do grupo Brics, no primeiro semestre deste ano. Decepcionou aqui e lá fora. Dilma continua popular, como revelou a pesquisa CNT-Opinião, mas precisa salvar o segundo semestre e evitar que a crise chegue forte ao indicador do nível de emprego. A mesma pesquisa, por sinal, informou que 70% dos consultados votariam em Lula em 2014. Seria um sinal comparativo? Sabe-se lá.

Dilma Rousseff está coordenando pessoalmente as novas medidas de alavancagem da economia, agora com foco no investimento. Para a Fiesp ou para José da Silva, um brasileiro, a promessa mais importante é a de redução da tarifa de energia, mas esse não é um presente fácil de se entregar.

Os governadores já andam muito insatisfeitos com um governo que, no dizer deles, vive fazendo cortesia com o chapéu alheio. Com o deles, sobretudo. Quando reduz impostos para estimular a economia, Dilma morde no caixa do Fundo de Participação dos Estados, o FPE, cuja repartição eles já vêm tentando mudar no STF. Já não conseguiram o compartilhamento geral dos royalties do petróleo do pré-sal. E agora, dona Dilma pensa em reduzir o ICMS, imposto estadual, da energia para barater a tarifa. OK, eles são a favor, mas vão exigir compensações, como a reduação dos pagamentos das dívidas dos estados. Todos se mexem, da base governista ou da oposição.

Mas o grande negócio de energia não é esse. É a renovação das concessões das geradoras e transmissoras que vence em 2015. Dilma vai antecipar a decisão sobre esta questão porque os industriais, para investir, precisam saber se haverá energia e quanto ela custará. As estatais, como Furnas, Eletronorte e outras, já amortizaram os investimentos feitos nos últimos 30 anos. Seguindo a política que arquitetou como ministra de Minas e Energia, Dilma quer associar as concessões à oferta da menor tarifa. Se resolvesse leiloar todas as concessões vincendas, o governo levantaria uns R$ 30 bilhões. Mas algumas estatais iriam para o ralo, com funcionários e tudo, se empresas privadas mais competitivas ganhassem os leilões. Tudo indica que ela optará por um modelo misto. Renovará a concessão de algumas das atuais concessionárias, desde que baixem a tarifa, e leiloará a outra metade, adoçando a boca do setor privado, observada sempre a menor tarifa. Essa pode ser uma boa mudança, mas seus efeitos são de médio prazo. Aliás, Dilma decidirá sobre algo que ocorrerá depois de seu mandato. Ou então, em seu segundo mandato. Mas energia é coisa séria demais para ser amarrada ao calendário eleitoral.

PMDB faz seu jogo. A hora é amarga para o PT, mas é doce para o PMDB, que antevê seu fortalecimento como parceiro preferencial do PT para a disputa de 2014. Acham os peemedebistas que essa preliminar Dilma já resolveu com sua entrada forte na eleição de Belo Horizonte, quando chamou o PMDB para a chapa petista e deu um chega para lá em Eduardo Campos e seu PSB. No frigir da apuração, eles acham que terão um prefeito no chamado triângulo das bermudas, com a reeleição de Eduardo Paes no Rio. Que poderão capitalizar a ajuda fundamental em Minas, caso Patrus Ananias vença o candidato do bloco PSB-PDSB, liderado por Aécio Neves. E em São Paulo, acham que Chalita não fará feio. Se Fernando Haddad chegar ao segundo turno, vão apoiá-lo, para o que der e vier, e isso também contará. No mais, podem eleger prefeitos próprios em Cuiabá, em João Pessoa, Boa Vista e outras capitais da periferia nacional. Mas o segundo e mais importante empoderamento virá em fevereiro, com a conquista da presidência das duas Casas do Congresso. Hoje, o PMDB tem quatro ministérios, mas o poder dos ministros é muito relativo. Dilma colocou secretários executivos de sua escolha em todas as pastas peemedebistas. Eles é que conduzem a execução das políticas públicas, que traduzem o verdadeiro exercício do poder no Executivo.

Mão na massa. Dilma sabe que vai ter que se meter na eleição de Belo Horizonte. Afinal, está na conta dela a decisão de lançar a candidatura de Patrus Ananias e de pedir ao PMDB a retirada de seu candidato para apoiar o petista. Foi sua primeira jogada política pessoal, sem assessoria de Lula, e em parceria com o ministro Fernando Pimentel. Por conta do ex-presidente, deixará as disputas de São Paulo e Recife. Mas na cidade em que nasceu, para a vida e a política, vai atuar. E falando mais "uai" do que "tchê".

O trator em ação. No esforço concentrado desta semana, a comissão especial mista da MP do Código Florestal tentará votar os mais de 300 destaques apresentados pelos ruralistas ao relatório nem 8 nem 80 do senador Luiz Henrique. Eles querem 80, indulgência total com os desmatadores. O senador Jorge Viana, relator do projeto que Dilma precisou vetar depois que a Câmara o deformou, parceiro do atual relator, adverte os ambientalistas: se eles continuarem ausentes e emburrados, os ruralistas passarão novamente a patrola. Vale especialmente para sua querida amiga Marina Silva.

"Os governadores já andam muito insatisfeitos com um governo que, no dizer deles, vive fazendo cortesia com o chapéu alheio. Com o deles, sobretudo. "

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

O réu ausente no mensalão - Suely Caldas

No julgamento do mensalão há um ausente no banco dos réus que teria poder de abortar o caso no seu início, mas se omitiu, não cumpriu seu papel e sistematicamente violou a lei entre 2003 e 2005. Trata-se do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), criado em 1998 com a missão específica de identificar transações bancárias suspeitas de lavagem de dinheiro. A legislação obriga os bancos a informarem ao Coaf todas as operações efetuadas em dinheiro vivo - depósitos ou saques - em valores acima de R$ 10 mil. Examinadas as transações, o órgão envia as que julgar suspeitas para o Ministério Público (MP) investigar.

No caso do mensalão, o Coaf escondeu as informações e não as repassou ao MP. Entre julho de 2003 e maio de 2005 as empresas do principal operador do esquema, o publicitário Marcos Valério, realizaram uma centena de saques em dinheiro vivo de valores entre R$ 100 mil e R$ 400 mil, transportados em malas até Brasília e distribuídos a parlamentares que, segundo a acusação, eram indicados pelo ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. Uma única notificação chegou ao MP de São Paulo em 2003. Depois, silêncio completo. E nenhuma ao MP de Minas Gerais, de onde saiu o grosso do dinheiro sacado por Valério na agência do Banco Rural em Belo Horizonte.

Se desde o primeiro momento o Coaf informasse as transações suspeitas de Valério e o MP pedisse abertura de inquérito à Polícia Federal, o mensalão teria sido obstruído no nascedouro. Ou o esquema seria obrigado a buscar outros meios de financiamento. "E por que o Coaf não agiu?", indagou a ex-deputada Denise Frossard em ofício dirigido ao então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, ao qual o Coaf era subordinado. Recebeu em resposta um convite de visita do ministro da Justiça e hoje advogado de um réu no caso Márcio Thomaz Bastos. Ele prometeu à deputada que o fato não se repetiria porque o Coaf passaria por uma competente reforma. Na Fazenda a conversa com a ex-deputada foi interpretada como um recôndito desejo de Bastos de transferir o Coaf para o Ministério da Justiça. Se verdade é, não conseguiu.

O mensalão teve vertentes, filhotes e desdobramentos que não chegaram a ser apurados. O caso Coaf é um deles. Mas se destaca dos demais pelo importante papel que exerce no aparato policial para investigar crimes de lavagem de dinheiro. Como a investigação começa justamente a partir dele, sua omissão tem o poder de encobrir crimes e criminosos. Por isso não podem pairar dúvidas sobre sua atuação. Ele deveria funcionar no modelo de uma agência reguladora, agir com independência, autonomia e distanciado de más influências do poder político. Mas a realidade é outra.

Em 14 anos de existência, seu balanço apresenta resultados positivos, outros negativos. Ao completar dez anos, em março de 2008, o Coaf divulgou em relatório ter rastreado 686 contas bancárias de 748 pessoas ligadas à facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), que movimentaram R$ 63 milhões entre 2005 e 2007. A ação do Coaf permitiu à Justiça bloquear R$ 17,7 milhões dos criminosos. Ponto positivo.

Só que os negativos causam um estrago institucional tão nocivo que superam os positivos e comprometem sua credibilidade. E eles têm ocorrido a partir do uso político do órgão e da influência de quem tem poder para mandar. No caso do mensalão isso ficou flagrante: após a primeira notificação sobre as empresas de Valério, o Coaf emudeceu durante dois anos. Em conversa que tivemos em 2008, o advogado Antonio Gustavo Rodrigues, presidente do Coaf desde 2004, não explicou a omissão ao longo de dois anos e tratou de negar influência política: "Nunca sofri pressão política de algum superior, a não ser a interferência do chefe de gabinete do ministro (Palocci) no caso do caseiro".

Mensalão, violação da conta bancária do caseiro Francenildo Costa, saques em dinheiro de R$ 1,75 milhão feitos por dois aloprados do PT para comprar um dossiê falso contra tucanos. Tudo isso aconteceu, mas o Coaf não viu.

Jornalista, é professora de Comunicação da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Paes e Freixo disputam apoio de artistas e intelectuais no Rio

Líder nas pesquisas, prefeito tem cabos eleitorais como Niemeyer e Ferreira Gullar; socialista é apoiado por Chico Buarque e Caetano

Italo Nogueira

RIO - Distantes nas intenções de voto para a Prefeitura do Rio, Eduardo Paes (PMDB) e Marcelo Freixo (PSOL) travam disputa acirrada pela liderança no apoio de artistas.

Neste primeiro mês de campanha, o comitê de ambos comemoram e se apressam em divulgar cada declaração e foto de apoio pop. Freixo largou na frente, com artistas participando do lançamento de sua candidatura. Paes recupera terreno.

As estratégias para uso da imagem dos artistas são distintas. Enquanto Paes busca consolidar a imagem da cidade como polo de produção cultural, beneficiado pelo do que chama de "bom momento do Rio", Freixo usa os apoiadores para reforçar o que classifica como "aliança com a sociedade civil".

"Apoio de artista agrega credibilidade e respeito ao candidato. Não é decisivo no processo de definição de voto, mas faz parte da construção da imagem do candidato", diz o cientista político Marcus Figueiredo.

Em segundo lugar nas intenções de voto com 10%, segundo o Datafolha, Freixo largou na frente com o apoio do elenco e do diretor de "Tropa de Elite 2", José Padilha. O deputado inspirou a criação de Diogo Fraga, personagem do filme.

O ator Wagner Moura, que interpreta o coronel Nascimento no filme, organiza encontros com artistas em sua casa para Freixo se apresentar. Ele obteve apoio de Caetano Veloso, Ivan Lins e Chico Buarque, que pegou até panfleto para distribuir.

Líder na pesquisa do Datafolha com 54%, Paes recuperou terreno. Iniciou a campanha com nomes populares, como Dudu Nobre e Alcione.

A estratégia, iniciada há duas semanas, é divulgar aos poucos novas adesões. Entraram na lista o arquiteto Oscar Niemeyer, o ator Marco Nanini e o cineasta Cacá Diegues. O último, anunciado ontem, foi o poeta Ferreira Gullar.

"A cultura é uma das características mais fortes do Rio. Quanto maior a diversidade artística, mais integrada é a cidade", disse Paes.

"Para mim é importante ter a mobilização das pessoas que apostam num projeto de cidade. Eles são importantes, assim como os jovens e os servidores", disse Freixo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Paes faz campanha com afilhado político de José Dirceu

Prefeito do Rio participou na manhã deste sábado de uma caminhada no calçadão de Campo Grande, na Zona Oeste

Cássio Bruno

RIO - O prefeito do Rio, Eduardo Paes, candidato à reeleição pelo PMDB, participou, na manhã deste sábado, de uma caminhada no calçadão de Campo Grande, na Zona Oeste. Paes pediu votos ao lado de vários petistas, entre eles o candidato a vereador Marcelo Sereno, afilhado político e assessor de José Dirceu na Casa Civil do governo Lula. Dirceu é um dos 38 réus do mensalão e foi denunciado no processo como "chefe da quadrilha". O senador Lindbergh Farias, a deputada federal Benedita da Silva e o vice na chapa, o vereador Adilson Pires, todos do PT, também participaram da agenda do peemedebista.

Acompanhado por vários candidatos a vereador, Paes conversou com eleitores e, ao entrar numa lanchonete, fez um brinde com caldo-de-cana. O prefeito tem motivos para comemorar. Ele aparece com 49% das intenções de voto na pesquisa Ibope divulgada na última sexta-feira. Marcelo Freixo, candidato do PSOL, está em segundo com 8%. Rodrigo Maia, do DEM, registrou 5%. Otávio Leite, do PSDB, ficou com 3% e, Aspásia Camargo, do PV, com 2%.

- Vejo (o resultado) com muita humildade e alegria. Quero ganhar a eleição. Tenho muito desejo de continuar sendo prefeito do Rio de Janeiro (...) Nunca fiquei emocionado com pesquisa alta e nem abalado com pesquisa baixa durante minha vida - disse Paes, que possui 20% de rejeição do eleitorado carioca, perdendo apenas para Rodrigo Maia, com 26%.

O prefeito comentou a gafe da última sexta-feira e mudou o tom do dia anterior, quando foi flagrado em áudio vazado numa conversa com a presidente da Empresa Olímpica Municipal, Maria Silva Marques Bastos. Ela o questionou sobre o debate na TV Bandeirantes. Paes disse que ficou "com sono" e achou "chatérrimo".

- Foi um encontro democrático. A gente teve a chance de debater as coisas da cidade. Agora, quando se tem muito candidato falando, toma-se muito tempo - declarou Paes. - Você gostou? Não achou chato, não? - perguntou o prefeito, em seguida, ao repórter do GLOBO.

Ao lado de cabos eleitorais, que carregavam bandeiras com sua foto e nome, Marcelo Sereno tentou manter a discrição durante toda a caminhada com Paes, que durou pelo menos uma hora. Ele evitou posar para fotos com o prefeito. Todos os candidatos a vereador que acompanhavam o prefeito foram anunciados em um alto falante, exceto Sereno. O petista distribuiu panfletos intitulado como "Uma trajetória de muitas lutas". No texto, Sereno diz que "participou ativamente do governo Lula como chefe de gabinete da Casa Civil". O candidato a vereador demonstrou irritação com O GLOBO quando foi questionado sobre o julgamento do mensalão, iniciado, na última quinta-feira, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

- Espero que seja um julgamento técnico e que tenha a melhor decisão possível - afirmou Sereno, lembrando que não assistiu ao primeiro dia de julgamento e encerrando a entrevista.

Marcelo Sereno era secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Petróleo em Maricá, na gestão do prefeito Washington Quaquá (PT) até este ano. A indicação para o cargo foi de José Dirceu, deputado federal cassado por causa do mensalão. Sereno se descompatibilizou para disputar as eleições municipais.

Em 2009, Sereno foi arrolado pela Justiça como testemunha do mensalão. À época, ele afirmou que Delúbio Soares (ex-tesoureiro do PT) e Silvio Pereira (ex-secretario-geral do PT), ambos réus do processo, foram "muitas vezes" ao Palácio do Planalto. Sereno contou que recebeu o publicitário Marcos Valério, apontado como operador do esquema, na Casa Civil. Segundo ele, os dois conversaram sobre a participação de Valério em campanha política em Petrópolis, Região Serrana do Rio. O ex-assessor disse ainda que Valério chegou a ser recebido por Dirceu.

FONTE: O GLOBO

Em BH, PSD com Lacerda

Justiça Eleitoral decide manter partido na coligação do prefeito

Alessandra Mello

O juiz eleitoral Rogério Alves Coutinho confirmou ontem a manutenção do PSD na coligação "BH segue em frente" liderada pelo prefeito Márcio Lacerda (PSB), candidato à reeleição em Belo Horizonte. O pedido feito pelo secretário de Estado de Gestão Metropolitana, Alexandre Silveira (PSD), defensor do apoio a Lacerda e ex-secretário geral da legenda na capital. Silveira já havia obtido no dia 16 uma liminar para permanecer na chapa do socialista. Ontem, Coutinho julgou o mérito e decidiu que o PSD deve permanecer na chapa de Lacerda e não na coligação "Frente BH Popular", do candidato do PT, Patrus Ananias.

Por causa de um racha na legenda, o PSD foi inscrito nas duas coligações. O que causou a presença dupla do partido de Kassab, foi a atitude tomada, no dia do registro das candidaturas no TRE-MG, da comissão interventora formada pelos deputados federais Walter Tosta, Diego Andrade e Ademir Camilo e o presidente estadual do PSD, Paulo Simão, que apresentaram um documento determinando a coligação com o PT. A intervenção foi determinada pelo comando nacional da legenda, que no mês passado dissolveu o diretório da capital em represália à decisão da legenda de seguir com Lacerda.

Com a decisão de ontem fica valendo a escolha feita na convenção do PSD da capital, realizada no fim do mês passado, que optou pelo apoio a Lacerda. "Não há notícia no ato de intervenção de qualquer falha, na convenção municipal realizada em Belo Horizonte, que pudesse justificar a atitude tomada pelo presidente do partido. A mudança de um cenário político, no qual teria ocorrido quebra de acordo por parte de outras agremiações, fatos que sequer foram descritos no ato do PSD que determinou a intervenção ou mesmo pela comissão interventora em BH, não permitem a alteração da soberana vontade dos convencionais, sem o devido processo legal, ou seja, com a convocação de outra convenção para tratar especificamente deste assunto", afirma o juiz em sua sentença.

Segundo Coutinho, a decisão foi tomada de forma tão "atabalhoada", que o PSD havia indicado três candidatos a vereador. "E a comissão interventora, sem qualquer fundamentação, se limitou a indicar uma candidata, com evidente prejuízo ao partido".

Patrus confirmado Em outra decisão ontem, o juiz Rogério Coutinho não acolheu o pedido de impugnação da candidatura de Patrus Ananias a prefeito de Belo Horizonte. O pedido havia sido feito pelo PSD. Coutinho e o Ministério Público Eleitoral (MPE) não aceitaram as alegações de que Patrus não teria se desincompatibilizado do cargo de conselheiro da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) no prazo certo para disputar a eleição. Na avaliação do MPE, acompanhada pelo juiz, o candidato nem precisaria ter deixado o cargo, pelo fato de tê-lo exercido em unidade territorial diferente de onde disputa a cadeira de prefeito.

Campanha. Maior participação popular na gestão pública, preservação do conjunto arquitetônico da Pampulha e ampliação no atendimento público da saúde foram as promessas feitas ontem pelas campanhas de Marcio Lacerda e Patrus Ananias – os dois principais candidatos a prefeito de Belo Horizonte nas eleições de outubro. O primeiro dedicou o dia a gravar programas para a televisão e foi representado em ato público pelo candidato a vice, Délio Malheiros (PV), enquanto o petista percorreu o Aglomerado da Serra e participou de encontro católico.

FONTE: ESTADO DE MINAS