domingo, 8 de abril de 2012

OPINIÃO DO DIA: Alberto Goldman: Um imoral dirige a Petrobrás

"Alô, alô, Sergio Guerra, meu presidente, o José Eduardo Dutra, ex senador, ex presidente do PT, ex presidente da Petrobrás e agora diretor da mesma, com incontida alegria face os 77% de aprovação de sua patroa, recomenda à oposição: "enfia o dedo e rasga". Entrei no google para saber o que significa e fiquei na mesma ignorância. Só consegui saber onde ele mandou enfiar o dedo. De resto, não entendi por quê e para que.

Não existe no governo uma comissão de ética pública? Solicite à mesma que interprete a recomendação. E quem sabe, peça a demissão do calhorda imoral."

Alberto Goldman, ex-governador de S. Paulo, no Blog, 7/4/2012.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Programas falham e Brasil não atrai médico para áreas pobres
Cachoeira usa parentes para ocultar lucros
Rio +20: ações contra terror e hackers

FOLHA DE S. PAULO
Licitações vão ter regra para 'produtos verdes'
Dilma ignora atritos com os EUA em nova visita a Obama
Petróleo multiplica por cinco o PIB de municípios do Rio
Voto religioso já movimenta duelo eleitoral em SP

O ESTADO DE S. PAULO
Um terço dos ministros ganha salários acima do teto

CORREIO BRAZILIENSE
Dilma testa prestígio em visita aos EUA
Militares espionaram a UnB após a ditadura

ESTADO DE MINAS
Batalha pela liderança
Infância interrompida
Dilma testa força do País ao visitar EUA

ZERO HORA (RS)
Ameaças obrigam juíza gaúcha a pedir proteção
Policial do RS sob investigação
O momento de Dilma nos EUA de Obama

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Resistência de alto risco
Tentativa de chacina leva terror ao Cabo

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

Líder do governo tem a mulher como suplente

Apesar de pregar novas práticas, o peemedebista Eduardo Braga repete estratégia de políticos tradicionais

Fernanda Krakovics

BRASÍLIA. O senador Eduardo Braga (PMDB-AM) assumiu a liderança do governo pregando novas práticas na política e falando em uma nova geração de senadores. Gosta de dizer que "o Senado mudou, e eles (os velhos políticos) precisam entender isso", mas Braga repete uma prática típica de políticos tradicionais: tem como primeira suplente sua mulher, Sandra Backsmann Braga.

Colocar parentes no banco de reserva do mandato é um expediente que já foi lançado por ex-senadores como Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Mão Santa (PMDB-PI).

Na atual legislatura, Edison Lobão (PMDB-MA), licenciado para assumir o Ministério de Minas e Energia, foi substituído por Lobão Filho (PMDB-MA). Já Ivo Cassol (PP-RO) tem o pai, Reditário Cassol (PP-RO), de suplente.

ACM dizia que escolhia o filho, ACM Júnior (DEM-BA), como suplente porque não queria ninguém conspirando para assumir seu mandato nem torcendo para que ele morresse.

Braga diz que esse não é o seu caso. Afirma que escolheu a esposa para a função para evitar briga entre seus aliados pelo posto. E também para que ela não disputasse um cargo eletivo, o que geraria problemas em seu grupo político.

Já o segundo suplente do líder do governo é o empresário Lirio Parisotto, fundador da fabricante de DVDs Videolar. Ele foi apontado, este ano, como o 24 homem mais rico do país pela revista "Forbes", com uma fortuna estimada em US$ 2,1 bilhões. Grande parte desse dinheiro é atribuída, pela "Forbes", à participação de Parisotto no fundo Geração Futuro L Par, que valeria cerca de US$ 1,4 bilhão.

À Justiça Eleitoral, Lirio Parisotto declarou que tinha um patrimônio de R$ 292,5 milhões em 2010. Não existem doações registradas para a campanha que elegeu sua chapa para o Senado.

- O Parisotto é o maior investidor privado do Amazonas. Ele é o maior interessado no polo industrial de Manaus - disse o senador Eduardo Braga, para justificar sua escolha.

FONTE: O GLOBO

Endividamento do consumidor freia economia

Foco do governo é estimular o mercado de trabalho do país

Vivian Oswald e Martha Beck

BRASÍLIA. Para o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, o país já estaria operando em uma rotação mais lenta, pelo fato de o mercado consumidor não ter a mesma capacidade de endividamento. O comprometimento das famílias brasileiras com dívidas contraídas a partir de 2010 e o aumento da inadimplência, segundo ele, impedem que as pessoas tomem novos recursos.

- Daí a importância das medidas. Foi um pacote para o emprego. Um mercado de trabalho aquecido dará ao trabalhador a renda para pagar as suas dívidas e fazer as novas com as quais o governo conta para estimular a economia daqui para frente - avalia Freitas Gomes, ex-diretor do Banco Central (BC).

Por esta razão o foco da equipe econômica agora, como salientou a própria presidente, é atacar a grande diferença entre os juros básicos da economia e aqueles cobrados pelas instituições financeiras do consumidor final - o chamado spread bancário. O governo espera, com a ajuda dos bancos oficiais, forçar as instituições privadas a baixar os seus também. Assim, pretende amarrar a queda recente da Selic com as medidas da semana passada e azeitar a economia.

Com as taxas de inadimplência em níveis elevados, os bancos privados vinham emprestando menos. Nos últimos meses, perderam 1,2 ponto percentual na sua fatia de empréstimos totais, espaço que foi ocupado pelos bancos oficiais, que hoje representam 43,6% do total.

As exportações tampouco devem responder depressa aos estímulos anunciados até agora e continuam sendo uma grande preocupação do governo. A resposta aos financiamentos está condicionada às encomendas recebidas pelos setores. Diante do crescimento menor do que o esperado para a China este ano e a crise na zona do euro, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior trabalha com um resultado para balança muito pior do que o de 2011, ainda que os números dos primeiros três meses reflitam os bons preços das commodities.

Esta seria a razão para não ter divulgado até agora suas projeções para o comércio exterior este ano, segundo fontes do governo. Já se fala em queda de 30% das vendas para a China, hoje maior comprador do país e responsável por 15% das vendas brasileiras no primeiro trimestre.

Segundo o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, as novas medidas são um conjunto de "paliativos":

- A desoneração da folha ajuda, mas representa queda de 1,5% sobre o faturamento. Ainda está longe de compensar a defasagem de 20% do câmbio.

FONTE: O GLOBO

Dilma vai negociar com Obama abertura do mercado americano

Restrições a entrada de suco de laranja e compra de aviões estão na pauta

Eliane Oliveira

BRASÍLIA. A presidente Dilma Rousseff embarca hoje para Washington tendo em mãos uma agenda ofensiva na área comercial. No encontro que terá amanhã com o presidente Barack Obama, Dilma falará de oportunidades de negócios e parceria, mas não deixará de tocar em temas delicados e caros para a balança comercial brasileira. A lista de demandas é variada e envolve, por exemplo, o fim de barreiras ao suco de laranja brasileiro, já condenadas pela Organização Mundial do Comércio (OMC) em uma ação do Brasil contra os Estados Unidos no organismo.

- Há vários pontos específicos dessa pauta bilateral, que passam por carnes, suco de laranja, avião, enfim, há um conjunto de produtos em que nós vislumbramos maior potencial de acesso - disse ao GLOBO a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Tatiana Prazeres.

Crise e G-20 terão destaque nas conversas

Sobre o suco de laranja, Tatiana lembrou que o governo americano nada fez até o momento para ajustar sua legislação de acordo com as normas da OMC.

- Os EUA precisam se manifestar. Se não houver o cumprimento, o Brasil tomará as medidas que julgar necessárias. Seremos firmes na cobrança e na implementação de nossa vitória na OMC - afirmou a secretária.

A expectativa é que Dilma também aborde temas que não estão resolvidos, como a venda de aviões da Embraer para a Força Aérea Americana, cancelada há cerca de um mês após um processo de licitação, e as restrições às vendas de frutas ao mercado americano.

Segundo o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Tovar Nunes, estão previstos acordos nas áreas comercial e de cooperação.

A crise econômica internacional e a coordenação Brasil-EUA no G-20 financeiro (grupo formado pelas 20 maiores economias do mundo) terão destaque na conversa entre os presidentes.

As perspectivas em termos de comércio são as melhores possíveis, na avaliação do governo brasileiro. Com a dinamização da economia americana, que já rendeu ao Brasil uma queda expressiva no seu déficit comercial com aquele país, de US$ 2,32 bilhões no primeiro trimestre de 2011 para US$ 770 milhões nos três primeiros meses deste ano, o mercado americano voltou a ser a vedete mundial. Assim, paralelamente ao encontro entre Dilma e Obama, haverá uma reunião entre dirigentes das maiores empresas dos dois países para o fechamento de negócios e novos investimentos.

- Os Estados Unidos são importantes para o Brasil. As exportações brasileiras para aquele mercado cresceram quase 40% no trimestre. A lista de produtos vai de petróleo a manufaturados - ressaltou Tatiana.

Mesmo mencionando algumas pendências comerciais, em meio a um leque de assuntos - que incluem Irã, Síria, direitos humanos, a reforma das Nações Unidas e a crise financeira internacional -, a presidente Dilma dará o primeiro passo para que esses temas voltem a ser tratados em Brasília, depois de sua visita aos Estados Unidos. No próximo dia 16, está prevista a chegada ao país da secretária de Estado americana, Hillary Clinton, que terá uma série de reuniões com o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Antonio Patriota.

Na visão do governo brasileiro, a reunião entre Dilma e Obama, que ocorrerá pouco mais de um ano depois da visita do presidente americano ao Brasil, é prenúncio de uma parceria importante, que poderá ajudar o país a ganhar mais espaço na agenda internacional. Mesmo porque, a própria Casa Branca já sugeriu que Brasil e Estados Unidos se unam para manter seus mercados e recuperar o que foi perdido durante o avanço econômico e político dos chineses.

Após o encontro, na segunda-feira, com o presidente Barack Obama e, em seguida, com empresários dos dois países, Dilma segue para Boston, na manhã de terça-feira, para se reunir com as duas mulheres que presidem a Universidade de Harvard e o Massachusetts Institute of Technology (MIT). Entre os objetivos, está o de intensificar o intercâmbio Brasil-Estados Unidos por meio de bolsas de estudo.

FONTE: O GLOBO

Um terço dos ministros ganha salários acima do teto

Levantamento feito nos 38 ministérios aponta que um terço dos ministros do atual governo tem salários superiores ao teto de R$ 26.723,15, informa a repórter Eugênia Lopes. Treze ministros ganham jetons por participação em conselhos de empresas. Celso Amorim (Defesa) recebe R$ 46,1 mil mensais brutos, acumulando salário e pró-labore de R$ 19,4 mil pagos pela Itaipu Binacional. Conselheiros da Petrobras e da BR Distribuidora, Guido Mantega (Fazenda) e Míriam Belchior (Planejamento) têm renda bruta de R$ 41,5 mil

Salário de 13 ministros extrapola teto de R$ 26,7 mil

Levantamento feito nos 38 ministérios da presidente Dilma Rousseff revela que um terço dos titulares das pastas engorda os rendimentos com a participação em conselhos de estatais

Eugênia Lopes

Artifício largamente empregado em governos passados para proporcionar uma remuneração de mercado a integrantes do primeiro escalão da Esplanada dos Ministérios, os conselhos de administração e fiscal de estatais e empresas públicas continuam a ser usados para turbinar os salários de ministros de Estado.

Levantamento feito pelo Estado nos 38 ministérios do governo da presidente Dilma Rousseff aponta que um terço dos ministros integra hoje uma elite do funcionalismo com supersalários que ultrapassam o teto salarial de R$ 26.723,15. São 13 ministros que engordam seus rendimentos com jetons por participação em conselhos de empresas.

O campeão é o ministro da Defesa, Celso Amorim, que acumula seu salário com o pró-labore de R$ 19,4 mil pagos pela participação no Conselho de Administração da Itaipu Binacional. São R$ 46,1 mil mensais brutos de remuneração.

A renda do ministro poderia ainda ser maior, se não houvesse o abate teto, mecanismo que impede Amorim de acumular na integralidade seus vencimentos de ministro da Defesa com a aposentadoria do Itamaraty. Diplomata de carreira, Amorim é aposentado do Ministério das Relações Exteriores desde 2007.

No comando da área econômica do governo, os ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, estão empatados na segunda posição do ranking dos mais bem pagos da Esplanada, com renda mensal bruta de R$ 41,5 mil.

Ambos são conselheiros da Petrobrás e da BR Distribuidora, com jetons que alcançam quase R$ 15 mil mensais. Miriam Belchior poderia ganhar ainda mais: como titular da pasta do Planejamento, ela é obrigada a fazer parte do Conselho de Administração do BNDES mas, segundo sua assessoria, abriu mão de receber o pró-labore de R$ 6 mil por essa participação.

O ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) engorda o salário com jetons de dois conselhos: é presidente do Conselho de Administração do BNDES, onde ganha R$ 6 mil mensais brutos, e integra também o BNDESPar, recebendo R$ 5,3 mil.

Braço direito de Dilma, Pimentel usufrui de R$ 38,1 mil por mês de renda. O vencimento do ministro da Ciência e Tecnologia é inferior ao do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, que acumula o salário de ministro com os jetons de duas empresas: BrasilPrev e BrasilCap, chegando a ganhar R$ 38,7 mil mensais.

Conexões

O pagamento de jetons por estatais ou empresas públicas aumenta a renda de mais oito ministros. A maioria deles participa de conselhos que têm relação com as respectivas pastas. É o caso do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que integra dos conselhos da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e da Finep, elevando sua renda mensal bruta para R$ 32,6 mil.

Para tentar pôr um freio nos supersalários, o governo federal decidiu encaminhar projeto de lei complementar que regulamenta o artigo 37 da Constituição. Esse dispositivo estabelece que nenhum servidor público pode ganhar mais que a remuneração de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Ocorre que o artigo não foi regulamentado até hoje, deixando brechas para os megassalários.

"Temos que criar um limite para que os jetons pagos a ministros tenham um teto. Tem muita gente inflando o salário com jetons", defende a senadora Ana Amélia (PP-RS). "Essa acumulação é uma aberração, uma distorção. Afinal, os ministros acabam ganhando além do teto para exercer atividades afins a sua pasta, que são inerentes ao ministério", afirma o líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar (RJ).

O líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA), argumenta que "é correta" a participação de ministros em conselhos de empresas que têm programas e projetos vinculados a suas pastas. "Está errado se, no meio do caminho, desvirtuaram a participação de ministros em conselhos para complementar salário", diz.

Regulamentação

Em fevereiro de 2011, logo após assumir uma cadeira no Senado, a hoje ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, apresentou proposta para acabar com os supersalários no Executivo, Legislativo e Judiciário associada ao projeto que pôs fim aos 14.º e 15.º salários dos parlamentares. Mas a tramitação da proposta que regulamenta o somatório das remunerações do funcionalismo até o teto não prosperou e o texto parado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da Casa.

"É preciso saber quais são as verbas que integram o vencimento bruto e as que têm caráter indenizatório", diz o líder do governo no Congresso, senador José Pimentel (PT-CE), que é relator do projeto na CAE.

O petista detectou erros na proposta elaborada por Gleisi Hoffmann e, daí, a necessidade de o governo enviar um novo projeto sobre o tema. A expectativa é a de que o texto seja encaminhado ao Congresso ainda no primeiro semestre deste ano.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Militares espionaram a UnB após a ditadura

Ex-professores como José Gerardo Grossi (E) foram alvo do SNI: as investigações começaram em 1964 e só terminaram em 1988

Arapongas infiltrados na UnB

Documentos obtidos pelo Correio revelam que, mesmo em tempos de redemocratização, a instituição de ensino superior brasiliense continuou a ser monitorada por espiões do SNI, o serviço secreto do governo. Os informantes acompanhavam as atividades dos professores e preenchiam relatórios detalhados

Renato Alves, Edson Luiz

Os militares não deram sossego a alunos, professores e funcionários da Universidade de Brasília (UnB) nem com o fim da ditadura. Agentes do regime espionaram a comunidade acadêmica pelo menos até 1988, três anos após a redemocratização do país. Documentos sigilosos aos quais o Correio teve acesso comprovam as ações de integrantes do Serviço Nacional de Informações (SNI), o temido órgão que perseguiu, prendeu, torturou e matou milhares de brasileiros. Com os carimbos de "secreto" e "confidencial", as 156 páginas traçam uma radiografia da UnB, na ótica dos informantes do regime de exceção, baseados em seus relatórios elaborados desde a tomada do poder pelos militares. O material revela como a ditadura sufocou a maior universidade da Região Centro-Oeste, com o intuito de eliminar os ideais de Darcy Ribeiro e os opositores do regime totalitário. A instituição de ensino completa 50 anos no próximo dia 21. O golpe militar fez 48 no último dia 31.

"Caixa de ressonância dos ideais de esquerda"

Após o fim da ditadura, o SNI elaborou relatórios regularmente entre 1985 e 1988. Em todos, os agentes demonstram preocupação com a redemocratização da UnB. Qualquer medida para tornar a universidade mais igualitária e aberta era vista como uma ameaça à qualidade do ensino superior e um elemento de "caixa de ressonância dos ideais progressistas de esquerda", conforme destaca um dossiê concluído em 5 de abril de 1988.

Agentes dos órgãos de repressão relatavam o descontentamento com reuniões no câmpus da UnB em que o tema principal era a democracia na universidade. "Nesta linha de ação, em 1987, foi criada uma comissão paritária, formada por professores e alunos, que passou a dirigir o Departamento de História nos assuntos administrativos e acadêmicos", conta, como algo inadmissível, o analista do dossiê de abril de 1988.

Os arapongas descrevem as mudanças ocorridas após o fim da ditadura em cada decanato da UnB. Dão detalhes da vida profissional e política dos professores chefes dos departamentos. E tomam nota de todas as atividades de Cristovam Buarque, o primeiro reitor escolhido por eleição direta após o regime de exceção. Ele assumiu a função em 1985, a contragosto dos militares, que, no fim do governo João Figueiredo — o último ditador no poder —, ainda queriam impor a nomeação do principal cargo da instituição.

Entre os muitos atos de Cristovam, os agentes do SNI destacam negativamente a reincorparação simbólica de 57 professores que se demitiram coletivamente em 1965 (leia Linha do tempo). Numa tentativa de mostrar tal decisão, tomada em março de 1988, como algo prejudicial à universidade, os arapongas destacam o aumento na folha de pagamento da UnB. Mas omitem que, em cinco anos de redemocratização, o número de vagas de graduação aumentou de 210 para 1.035 e o de disciplinas ofertadas passou de 1.549 para 2.089.

Nesse mesmo período, consolidou-se a Associação dos Funcionários e intensificou-se a atuação da Associação dos Docentes da UnB (ADUnB). O movimento estudantil também se organizou, elegendo a diretoria do Diretório Central dos Estudantes (DCE), havia anos sem representante. Para os arapongas, o vazio no DCE se devia "ao desinteresse dos estudantes para com o movimento estudantil", e não por causa da repressão nos tempos de ditadura, que levaram a prisões e a sumiços de universitários.

União Soviética

O hoje senador Cristovam Buarque (PDT-DF), 68 anos, soube da continuidade da espionagem na UnB em tempos de redemocratização após ser procurado pelo Correio. Ele fez questão de ler os dossiês do SNI, até então inéditos. "Se eles faziam isso é porque tinham gente infiltrada em meio a professores, estudantes, servidores. Talvez houvesse um espião bem próximo, como se fosse um colaborador", comentou, sem esconder o espanto.

Três páginas do dossiê sobre a redemocratização da UnB trazem o resumo da ficha de Cristovam Buarque nos arquivos da ditadura. Ele descreve, além da formação escolar e profissional do investigado, as suas atividades políticas desde os tempos em que presidia o Diretório Acadêmico de Engenharia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em 1966. Os agentes destacam que ele se tornou um "subversivo" ao fazer um discurso veemente contra o golpe de 1964.

No campo da sua administração, os espiões do SNI chamam a atenção para um contato do então reitor com a Embaixada da União Soviética, em 1986, para a UnB receber reforços de professores russos de diversos setores de ensino e pesquisa. "A primeira conversa foi reservada. Não que houvesse algo de secreto ou ilegal, mas foi um encontro com pouca gente. Como o pessoal do SNI soube disso?!", questiona Cristovam. Ele ainda dá aulas na universidade brasiliense, nas manhãs de terças-feiras.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Guerrilheiros monitorados no exterior

Governo militar acompanhou os passos de integrantes da esquerda banidos do Brasil na luta armada

Denise Rothenburg, Edson Luiz

Documentos confidenciais do Centro de Informações do Exército (CIE) produzidos há 40 anos mostram que agentes da ditadura infiltrados seguiram os passos de integrantes de movimentos de esquerda asilados em vários países, inclusive em Cuba. Em 3 de abril de 1972, por exemplo, um relatório extenso — chamado Informe Confidencial nº 674-72 e intitulado "Grupo da Ilha" — revela em detalhes o destino dos 40 guerrilheiros banidos do Brasil em troca do embaixador alemão Ehrenfried von Holleben. O diplomata foi sequestrado no Rio de Janeiro, em 11 de junho de 1970, em plena euforia pela Copa do Mundo do México, que acabaria com a conquista do tricampeonato pelo Brasil.

O texto indica que o Exército monitorava, em especial, a Aliança Libertadora Nacional (ALN) e a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), dois grupos que pegaram em armas e fizeram treinamento de guerrilha com o intuito de se preparar para tentar derrubar a ditadura militar instalada em 31 de março de 1964. Na VPR, militou a presidente Dilma Rousseff. Os militares seguiram os brasileiros em Santiago, no Chile; Montevidéu, no Uruguai; Havana, em Cuba; Paris, na França; Argel, na Argélia; e Roma, na Itália.

O relatório em si desmonta a versão oficial das Forças Armadas brasileiras de que não há registros sobre o combate dos militares aos grupos que lutavam contra a ditadura. Do documento emergem figuras de destaque da política nacional brasileira hoje, como o ex-ministro da Casa Civil da Presidência da República José Dirceu, acusado pelo ex-procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza de "chefe da quadrilha do Mensalão"; o ex-ministro das Comunicações no governo Lula Franklin Martins; o escritor, jornalista e ex-deputado Fernando Gabeira; o ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc; e o atual senador por São Paulo Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), entre outros.

O dossiê também exibe detalhes da vida dos guerrilheiros no exterior nunca divulgados na imprensa nacional. "Os 40 elementos banidos chegaram à (sic) Argel na madrugada de 16 de junho de 1970. No aeroporto havia bastante gente, muita imprensa, inclusive europeia, e representantes de organizações revolucionárias de outros países que possuem representação em Argel, além de representantes do governo da Argélia, que teriam a missão de receber e alojar os banidos", afirma.

Idioma


O informe do Ministério do Exército detalha que "os banidos iniciaram uma vida coletiva, em parte composta por costumeiras idas a médicos, dentistas, prática de ginástica, futebol e banhos de mar". E prossegue: "Ao mesmo tempo os elementos de cada organização realizavam discussões de problemas internos em reuniões informais".

Os arapongas do Exército, supostamente infiltrados, contam detalhes da vida dos banidos em Argel. "Para descentralizar a direção e organização dos 40 banidos formou-se uma comissão com os seguintes elementos: Apolônio de Carvalho, Maria do Carmo Brito e Carlos Eduardo Pires Freury. Obedeceu-se para a escolha dessa comissão o critério de representatividade das organizações e as condições de cada um dos integrantes para o desempenho do cargo — entendimento como público e falar língua estrangeira", diz o texto.

Ao relatar essas atividades, os militares dão ênfase à falta de apoio político aos guerrilheiros do Brasil: "O governo da Argélia dispensou aos banidos todas as atenções possíveis no plano pessoal, embora não houvesse dado o apoio político que seria esperado — pelo menos até a ida da maioria dos elementos para Cuba", diz o informe, produzido, segundo um coronel da reserva do Exército que teve participação ativa nos governos militares, por adidos civis e militares lotados nas embaixadas do Brasil no exterior.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Voto religioso já movimenta duelo eleitoral em SP

Candidatos à Prefeitura de São Paulo correm atrás do apoio de setores católicos, em mobilização que testará a influência suprapartidária da igreja neste pleito.

As campanhas do petista Fernando Haddad e do tucano José Serra preocupam-se em deter o alinhamento automático de padres e bispos ao ex-seminarista Gabriel Chalita

Busca por voto de religiosos mobiliza candidatos em SP

Ex-seminarista, Chalita espera apoio de cabos eleitorais da ala carismática

Haddad já se reuniu com setores da igreja; "não sou cristão só nos momentos em que avião balança", diz Serra

Fábio Zambeli

A campanha pela Prefeitura de São Paulo testará o poder de mobilização suprapartidária da Igreja Católica, em uma eleição que colocará à prova sua identificação histórica com a esquerda, evidenciada nas alas progressistas e pastorais sociais.

Petistas e tucanos, que tradicionalmente duelaram pelo apoio da metade do eleitorado paulistano que declara professar a fé católica, tentam agora impedir alinhamento automático de padres e bispos à candidatura de Gabriel Chalita (PMDB) -expoente da Renovação Carismática, corrente conservadora que avança entre os jovens.

Mesmo com as restrições impostas pela arquidiocese quanto ao engajamento direto de clérigos, Chalita, ex-coroinha, ex-seminarista e um dos difusores da comunidade Canção Nova, espera contar com fervoroso exército de cabos eleitorais carismáticos.

São 33 mil militantes ativos distribuídos em 412 grupos de oração na capital.

"Embora não exista ainda deliberação formal, a maioria dos carismáticos tem forte identificação com o Chalita. Neste aspecto, creio que terá esse apoio, sim. As pessoas pedirão voto para ele", afirma Gilberto Lopes, presidente do conselho arquidiocesano da Renovação Carismática em São Paulo.

Chalita cultiva laços estreitos com dois dos padres mais populares do país, de quem espera obter respaldo, ainda que informal: Marcelo Rossi e Fábio de Melo, ambos campeões de audiência.

"É natural que exista uma associação, não só pela minha trajetória na Canção Nova, mas pelos valores em comum", diz o pré-candidato, que usa prédios cedidos por paróquias para reuniões com eleitores na periferia.

Social

É nos extremos da cidade e nas pastorais de rua, de moradia popular e de saúde que PT e PSDB buscam equilibrar o embate pelo voto católico.

O petista Fernando Haddad, cristão ortodoxo, admite ter procurado padres para "garantir um debate dos problemas da cidade".

"Não considero adequado solicitar apoio para líderes religiosos, mas pretendo manter interlocução permanente com setores engajados na luta por justiça social", afirma o ex-ministro da Educação, neto de padre ortodoxo.

Líder nas pesquisas, o católico José Serra (PSDB) é amigo de d. Cláudio Hummes e de d. Paulo Evaristo Arns, cardeais que passaram pela arquidiocese de São Paulo.

O tucano afirma não ter procurado líderes religiosos desde que ingressou na disputa pela prefeitura. Sustenta, contudo, ter adotado medidas à frente de cargos públicos que atestam zelo às causas da igreja.

"Espero que votem em mim. Mas nunca expressaria uma convicção que não tenho ou mentiria sobre questões de fé a fim de obter votos. Não sou cristão só nos momentos em que o avião balança", diz.

Dos sete postulantes à sucessão de Gilberto Kassab (PSD) com melhor desempenho nas pesquisas, quatro se declaram católicos -além de Chalita e Serra, Paulinho da Força (PDT) e Celso Russomanno (PRB).

"Efeito Chalita"

Apesar de reconhecer o potencial mobilizador dos carismáticos, o sociólogo Flávio Pierucci, professor da USP, relativiza o "efeito Chalita".

"O católico é, em regra, muito acomodado ao tomar posição política. Pesa muito a tradição familiar. Não é um eleitorado que se expressa de maneira uniforme em favor de candidaturas", afirma.

Para o padre Júlio Lancelotti, vigário episcopal do Povo de Rua, "a igreja não fará explicitamente nenhum gesto de apoio a candidato".

"Os leigos é que serão estimulados a participar. É até desejável, pois precisamos discutir outro modelo para São Paulo", diz o padre, que participou de evento com Chalita na Sexta da Paixão.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Ideias de Marx seguem forjando novos quadros

Passados 94 anos da Revolução Russa de 1917 e 90 anos da fundação do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Partidão, ideias de Marx continuam na ordem do dia

Ayrton Maciel

Karl Marx vive. São 164 anos após a primeira publicação do Manifesto Comunista, 94 anos da Revolução Russa de 1917, 90 anos de fundação do Partido Comunista Brasileiro (PCB) - em 25 de março - e 22 anos depois da queda do Muro de Berlim, que marca o fim da experiência comunista no leste da Europa, e Marx continua formando novos quadros e instigando a discussão entusiasmada de suas ideias. O sonho da sociedade igualitária resiste e se reproduz em grupos de discussão que reúnem acadêmicos e militantes ideológicos. A crise atual do capitalismo na Europa e nos Estados Unidos - berço e centro financeiro - tem resgatado a releitura sobre as críticas de Marx ao capital e ao sistema e o debate sobre suas propostas para a transformação das relações de produção.

Um desses grupos de discussão, o Grupo de Estudos de Marxiano (Gemarx), nasceu na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Hoje, as discussões continuam – segundas e sextas-feiras – na seccional de Pernambuco da União Brasileira de Escritores (UBE-PE), “Marx em Marx”, as correntes marxistas e o futuro da sociedade humana. Com empolgação de iniciantes, dois professores aposentados, Délio Mendes - sociólogo e cientista político, da UFRPE - e Ivanilde Morais de Gusmão - filósofa, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) - transferem a novas gerações que se iniciam no marxismo as expectativas de um sistema que pretende levar a humanidade a uma vida mais justa, sem exploradores e explorados. “O capital está destruindo o homem do ponto de vista humano”, avalia Délio, um militante histórico do PCB, o Partidão.

Professora de sociologia, antropologia, economia, filosofia e metodologia na área de ciências sociais, na Ufal, Ivanilde Morais revela que o grupo está aberto a todas as pessoas, inclusive leigos que queiram “entender o mundo pela visão e compreensão de Marx”. Intitulando-se uma marxiana, termo que se aplica a quem estuda Marx por Marx (Marx em Marx), ou seja, fora das correntes marxistas (leninistas, trotskistas, stalinistas e outras), a professora é a autora do livro Um Caminho para Marx. “Aqui, discutimos em cima dos textos de Marx a realidade social e o processo histórico de formação da própria sociedade”, diz Ivanilde, uma “estudiosa em Marx”.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Entrevista - Göran Therborn: A esquerda após a crise de 2008

Resumo

Para o sociólogo Göran Therborn, que vem ao Brasil para lançar "Do Marxismo ao Pós-Marxismo?", movimentos como o Occupy e os indignados espanhóis se caracterizam como defensivos, sem virar o jogo político. Aqui, ele analisa economia e política na Europa e nos EUA.

Eleonora de Lucena

A crise financeira não tirou a esquerda da defensiva; a direita derrotou a social-democracia na Europa. Mas a falta de saídas neoliberais deve fazer o pêndulo do ciclo eleitoral mudar de tendência. A avaliação é do sociólogo marxista Göran Therborn, professor emérito aposentado da universidade de Cambridge. Nesta entrevista, concedida por e-mail, Therborn, 70, fala das principais eleições no mundo neste ano, do declínio dos EUA e do individualismo.

Ele estará no Brasil nesta semana para o lançamento de seu livro "Do Marxismo ao Pós-Marxismo?" [trad. Rodrigo Nobile, Boitempo, 160 págs., R$ 39]: na terça (10), fala no Tucarena, em São Paulo; na quarta (11), em Porto Alegre, e na sexta (13) em Belém.

Folha - No seu livro "Do Marxismo ao Pós-Marxismo", de 2008, o sr. diz que a esquerda está na defensiva. Ainda está?

Göran Therborn - No conjunto, sim. O crash financeiro e a aceleração da desigualdade econômica não colocaram a esquerda na ofensiva social em lugar nenhum. Existiram, e ainda existem, alguns movimentos inovadores, como a Democracia Real Ya! e o 15-M, na Espanha, e o Occupy Wall Street. Mas eles não foram capazes de mudar os parâmetros básicos do jogo político nacional. Os grandes protestos na Grécia têm sido claramente lutas defensivas. O movimento estudantil chileno, contra a mercantilização do ensino superior, é uma exceção. Ele foi capaz de se conectar com outras forças sociais e empurrou o arrogante governo Piñera para a defensiva.

Muita coisa mudou de 2008 para 2012: a crise financeira global, a Primavera Árabe. As mudanças o surpreenderam? O seu livro ficou desatualizado por causa delas?

Crises em economias capitalistas não surpreendem um cientista social ou um historiador social, embora prever as datas dos seus surtos seja tão difícil como prever as datas dos verões europeus. Os problemas sociais estavam se acumulando sob as envelhecidas ditaduras e oligarquias árabes, como indico em meu livro. Os incipientes movimentos de protestos foram colocados em um livro que publiquei depois, em dezembro de 2010 - "The World" (ed. Polity). Mas eu não esperava a primavera de revoltas.

É possível dizer que, com essas mudanças, o neoliberalismo está perdendo a hegemonia?

Muitas mudanças estão acontecendo sem uma causa em comum. O crash financeiro do Atlântico Norte não estava conectado com a Primavera Árabe, por exemplo. O crash sacudiu as próprias bases do sistema bancário anglo-saxônico. A crise de 2011 na Eurozona mostrou a capacidade de autodestruição das bolhas de fluxo de capital.

A Primavera Árabe também destacou que a liberalização das economias árabes nada havia conseguido de significativo em relação ao desemprego e às perspectivas sociais dos grandes grupos de jovens. Por enquanto, nenhuma força política está argumentando que a única via para um futuro melhor são mais privatizações e desregulamentações. Por outro lado, nos países mais ricos nenhuma alternativa articulada apareceu.

Alguns pensam que a crise põe a democracia em perigo, como nos anos 1930. O sr. concorda?

A democracia, no seu sentido mais limitado, de eleições livres e competitivas, não está em perigo. O amplo e diversificado estabelecimento do Estado de bem-estar social capitalista significa que os efeitos sociais dos choques econômicos hoje são incomparáveis com a miséria e o desespero criados pela depressão dos anos 1930.

Na Europa Ocidental não há movimentos fascistas com algum significado. O que há são xenófobos, principalmente islamofóbicos. Mas eles não ameaçam a democracia. Na Europa Ocidental, a ameaça à democracia vem da tecnocracia. A crise na Eurozona levou à suspensão de governos democráticos, eleitos, na Grécia e na Itália. Na Europa Oriental a situação é mais incerta.

A social-democracia perdeu credibilidade ao ser parceira do neoliberalismo europeu?

Sim, foi claramente o que aconteceu nas derrotas social-democratas na Grã-Bretanha, na Hungria, em Portugal e na Espanha. Mas, como não há solução liberal, o pêndulo do ciclo eleitoral tende a mudar. A social-democracia alemã está crescendo em pesquisas e nas eleições provinciais, e a vitória do socialista François Hollande na França é ainda uma boa aposta.

Como o sr. analisa as eleições na França, na Grécia e no México?

Hollande está à frente em questões sociais e econômicas. A guerra na Líbia não impulsionou a posição precária de Sarkozy, mas ele agora está ganhando força entre a direita xenófoba. A França é o único grande país capitalista com significativas correntes de extrema esquerda, que ganham entre 10% e 20% dos votos.

A Grécia tem uma esquerda com organização bem mais forte do que a Espanha. Tem chance de se tornar a maior força eleitoral no país. Mas está dividida entre três partidos e outras correntes que não convivem bem entre si. O conservador Nova Democracia pode ganhar por causa da divisão da esquerda. Os social-democratas, que se renderam às pressões da crise, serão os grandes perdedores.

O México tem um habilidoso porta-bandeira da esquerda, López Obrador, que organizou um vasto movimento com raízes nacionais. Mas tem a oposição da mídia e das máquinas do clientelismo. Não é provável que vença.

Qual sua previsão para os EUA?

Obama se revelou um presidente fraco, moderadamente conservador, completamente subserviente aos interesses imperiais dos EUA, o que eu esperava. Está enfrentando uma notável reação da direita. O movimento Tea Party logrou explorar a crise financeira com uma linha de extrema direita, que habilmente deixou de lado questões da crise e da desigualdade econômica. Comparativamente, o movimento Occupy Wall Street é pequeno e pobre. Como as primárias têm demonstrado, o Tea Party e os cristãos fundamentalistas moveram o Partido Republicano de volta para uma era [Barry] Goldwater. Com a incipiente recuperação econômica, é provável que Obama vença, mas certamente não de forma esmagadora como a de Lyndon Johnson em 1964.

Por que o sr. considera a influência dos EUA decadente?

Não considero "decadente", que é um termo moralista, mas em declínio, enfraquecida. O declínio é óbvio. No Egito, os EUA nada puderam fazer para preservar o seu segundo cliente mais caro do mundo (depois de Israel), nem foram capazes de impor um novo regime satélite. Em dezembro, Hugo Chávez lançou uma nova organização latino-americana fora da influência dos EUA, a Celac. Antes de 2000, isso seria impensável.

O declínio da influência norte-americana é acima de tudo geopolítico e ideológico. Suas bases são a ascensão de novos e grandes agentes econômicos (China, Índia, Brasil). Há perda de significado da liderança ideológica dos EUA após o fim da Guerra Fria e a óbvia incapacidade das receitas neoliberais anglo-saxônicas para a nova economia mundial.

A tentativa de substituir a Guerra Fria por uma caçada em grande escala, a guerra ao Terror, nunca foi levada a sério por ninguém fora dos EUA. Cada vez menos pessoas e políticos enxergam os seus interesses como coincidentes com os dos EUA. O risco de ignorar os interesses norte-americanos também diminuiu.

É preciso enfatizar onde não há declínio ou onde ele é muito pequeno. Enquanto a relativa predominância econômica dos EUA decai significativamente, não se deve esquecer que boa parte da vanguarda da economia mundial ainda é norte-americana: Apple, Microsoft, Facebook, Amazon, Boeing. Os EUA ainda são o centro do entretenimento de massa e da pesquisa científica. São a única superpotência militar, e seus gastos militares são mais do que o dobro dos gastos de China, Reino Unido, França, Rússia e Japão juntos.

Como analisa o marxismo hoje?

O marxismo é uma original unidade entre filosofia, análise social e política. Muito dessa unidade foi quebrada. Os políticos comunistas se desvincularam de Marx. Foi decisiva a transformação do capitalismo, com desindustrialização, revolução eletrônica e emergência do capital financeiro.

Tudo isso parou e inverteu a tendência de longo prazo anterior: propriedade coletiva, regulação pública e fortalecimento da classe trabalhadora. A queda da URSS foi um propulsor político, mas, sob uma perspectiva histórica de longo prazo, os impasses do socialismo soviético e da social democracia europeia tiveram as mesmas raízes. O marxismo como identidade coletiva foi seriamente enfraquecido e é improvável que torne a ter a sua força anterior.

Como o sr. analisa a questão do individualismo hoje?

É crucial distinguir entre o individualismo egoísta, fundamentado, do individualismo econômico, do solidário, essencialmente um individualismo existencial. O individualismo egoísta econômico existe no Tea Party. Exemplo. Uma apresentadora de TV protesta contra uma abordagem coletiva para a crise: por que ela deveria pagar a hipoteca do vizinho?

É um individualismo burguês na sua forma extrema, e tanto hoje como historicamente é coabitado com familismo patriarcal. O polo oposto está em movimentos juvenis mais progressistas. É um individualismo existencial, que afirma o direito a um estilo de vida individual, ter cabelo verde, ser bissexual, vegan, punk etc. Mas é capaz de ter empatia com os outros, dando apoio e solidariedade.

FONTE: ILUSTRÍSSIMA/FOLHA DE S. PAULO

Paulinho da Viola - Filosofia /Noel Rosa

Além da Rio+20:: Merval Pereira

Uma reunião em Recife na próxima semana dará início aos preparativos para o Rio Clima - The Rio Climate Challenge (RCC) - o grande evento paralelo da Rio+20 sobre Clima, iniciativa das subcomissões Rio+20 do Congresso.

Grupos facilitadores, não oficiais, provenientes de países grandes emissores e de alguns países de grande vulnerabilidade estarão reunidos paralelamente à Rio+20, em julho, para simular e modelar um esforço comum mais ambicioso, visando um compromisso internacional sobre Clima capaz de atender à demanda da ciência face ao aquecimento global.

Na definição do deputado federal Alfredo Sirkis, presidente da sub-comissão Rio+20, da Comissão de Relações Exteriores e Defesa, será uma espécie de "jogo de paz" com a simulação de uma negociação entre os principais países emissores, alguns dos mais vulneráveis (menos de 20 ao todo), com a participação de atores supranacionais: agências multilaterais, ONGs, multinacionais, capital financeiro, movimento sindical.

O objetivo é chegar a um shelf agreement (acordo simbólico preparatório) em torno do limite de 450 ppm para manter o aquecimento médio do planeta nesse século em 2 graus, seguindo o IPCC, simulando "um cenário factível de mitigação, adaptação e financiamento que mobilize a sociedade, influenciar governos e facilitar futuros avanços tanto no processo da ONU como em ações nacionais ou de grupos de países".

Serão convidados facilitadores dos seguintes países ou grupos: BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China); União Europeia (Alemanha, França, Reino Unido e UE); Umbrela Group (EUA, Canadá, Austrália, Japão Indonésia e Rússia); Liga Árabe + Golfo (Arábia Saudita e Qatar); AOSIS (Granada, Tuvalu, Maldives).

Os grupos de contato dos diferentes países terão três componentes básicos: político, científico e econômico.

Os organizadores pretendem que a formação dessas equipes facilitadoras misture influência política e expertise em modelagem de emissão/mitigação/adaptação e financiamento, temas que serão tópicos principais da simulação de negociações e da métrica.

Um dos principais pontos será a proposta de nova métrica unificada para metas de vários países. Atualmente utilizam-se vários "anos base" (1990, 1995, 2000, etc.), ou a intensidade de carbono por ponto percentual do PIB, dificultando a comparação dos esforços de diversos países.

As delegações serão comandadas por estadistas veteranos ou políticos influentes, diplomatas e quadros técnicos para explorar cenários de metas mais ambiciosas para além do Anexo I de Kyoto e dos NAMAS de Copenhagen/Cancún.

Segundo Sirkis, os quatro ex-presidentes brasileiros serão convidados para participarem do encontro em momentos diferentes.

Essas "delegações" poderão manter contato e entendimentos com seus respectivos governos e, na medida do possível, incluir quadros susceptíveis de jogar um papel futuro nas tomadas de posição nacionais relativas às mudanças climáticas.

Mas não devem representar apenas a visão oficial, para que os trabalhos do Rio Clima não reproduzam os eventuais impasses que possam surgir na negociação oficial.

Ao contrário, a ideia é que, livres das amarras oficiais, as "delegações" ofereçam soluções mais amplas que possam servir de pressão para os governos.

Por isso os organizadores sugerem que, "no componente científico, a prioridade deve ser dada a cientistas, acadêmicos e técnicos de governo que trabalhem com cenários capazes de fornecer aos governos leques de opções. No componente econômico, é recomendável incluir quadros gestores de governos, bancos oficiais e multilaterais e da iniciativa privada".

Além dos grupos de contato por países haverá um supranacional com a participação de organizações multilaterais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, de setores da economia global - setor financeiro, petróleo, carvão, automobilístico, agrobuisness, etc - e de ONGs de atuação internacional.

O evento paralelo à Rio+20 terá uma abertura com show acústico, em recinto fechado, de grandes artistas internacionais, como Andy Summers do The Police, que vai cantar com Gilberto Gil e outros artistas. Terá também a presença de personalidades de primeira linha, como Maurice Strong, que presidiu a Rio-92, e Yvo de Boer, ex-secretário executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.

A ideia, lembra Sirkis, teve por base o famoso Protocolo de Genebra, detalhado acordo de paz Israel-Palestina negociado por duas equipes altamente profissionais lideradas pelo ex-ministro da Justiça de Israel Yossi Beilin e pelo ex-ministro da cultura da OLP Yasser Abed Rabbo.

Embora esse acordo permaneça na prateleira (shelf) à espera de melhores circunstâncias políticas, o processo de negociação continua inspirando movimentos mundo afora.
Os dois principais negociadores do protocolo de Genebra participarão das reuniões tanto de Recife quanto do Rio. A presença deles gera uma pauta paralela interessante, na opinião de Sirkis, "num momento em que só se fala de guerra com o Irã e a questão palestina foi mandada às calendas gregas".

Está sendo organizada uma audiência conjunta das Comissões de Relações Exteriores da Câmara e do Senado com Yossi e Yasser, dedicada à Iniciativa de Genebra, na quinta feira, dia 12, às 14 horas, no Senado.

O projeto é transformar o Rio Clima (RCC na sigla em inglês) num think tank permanente do processo de negociação do Clima, tanto no da ONU quanto em outros bilaterais ou multilaterais.

Segundo Sirkis, um shelf argeement sobre clima vai ser no futuro um instrumento de mobilização da opinião pública internacional ("Sim, é possível") e pressão/apoio sobre os governos tanto no processo da ONU quanto em outros formatos que a negociação do tema venha assumir (G20, "grandes economias", acordos bilaterais, etc.).

Para Sirkis, o Rio Clima fará com que o Rio de Janeiro se mantenha como cidade de referência internacional nas questões ambientais globais, posição conquistada na Rio 92 quando foi assinada a Convenção do Clima.

FONTE: O GLOBO

Corda no pescoço:: Dora Kramer

O senador Pedro Simon ressalva que tem receio de confundir sua posição pessoal com a análise fria da situação, mas na percepção dele desta vez o Senado não tem outra saída.

Ou põe para funcionar o Conselho de Ética e dá prosseguimento ao processo de cassação de Demóstenes Torres por quebra de decoro ou estará irremediavelmente em rota de colisão com a sociedade.

Diferentemente de outras ocasiões em que mandatos aparentemente condenados foram salvos pela força do compadrio, agora não há recuo possível.

"A opinião pública está mobilizada, manifesta-se por todos os meios e não há como ignorar essa pressão", diz ele, cuja avaliação é compartilhada por outros políticos.

Simon faz uma comparação com o clima que levou à aprovação da lei da Ficha Limpa. Se dependesse só da vontade dos partidos e dos políticos estaria até hoje em alguma gaveta da Mesa Diretora ou das comissões. Mas, quando a sociedade pôs a faca no peito do Parlamento, não houve jeito.

"Vivemos, nesse caso, algo semelhante: a completa impossibilidade de tomar outra atitude a não ser seguir adiante porque o Congresso deve isso a si", diz, lembrando que a alta popularidade da presidente Dilma Rousseff deve-se em boa medida à imagem que passa de intransigência em relação aos políticos e à falta de ética na política.

Nesse cenário, o Senado agiria agora menos por deferência à preservação do decoro e mais por uma questão de autodefesa diante da pressão da sociedade e da contraposição estabelecida entre o que é percebido como austeridade da presidente e o que é creditado como licenciosidade do Congresso.

Pela beirada. A demora na nomeação dos integrantes da Comissão da Verdade é atribuída à necessidade de adoção de critério cirúrgico na escolha dos nomes. É um dado, mas não o único e, nessa altura, nem o principal. O atraso parece obedecer a um roteiro estratégico a fim de dar tempo ao tempo na dissipação das reações entre os militares.

A formação de uma comissão da verdade "paralela" na Câmara e as propostas de criação de colegiados semelhantes em diversos estados ajudaria no processo de tornar o levantamento de informações sobre agressões aos direitos humanos durante a ditadura, um fato natural e, sobretudo, consumado.

Pássaros na mão. Loucos pela vaga de vice na chapa de José Serra para a prefeitura de São Paulo, o PSD e o DEM oficialmente dizem que não farão exigências ao PSDB.

Na prática pressionam pesado, cada qual com seus argumentos. O PSD invoca a afinidade com os tucanos, a fidelidade de Gilberto Kassab a Serra e a preferência do candidato pelo nome do ex-secretário municipal de Educação, até o ano passado filiado ao PSDB, Alexandre Schneider.

O DEM fala da possibilidade de apoiar Gabriel Chalita, do PMDB, recorre à proximidade com o governador Geraldo Alckmin e alega que seu tempo de televisão (1min40s) pode fazer diferença.

Se o PSD não ganhar na Justiça direito a espaço próprio no horário eleitoral, o partido será um peso para a coalizão, pois os tucanos teriam de dividir o tempo com os candidatos a vereador de Kassab.

Soma zero. São cinco, dos 23 com representação na Câmara, os partidos – PSDB, PT, PTB, PPS e PP – até agora com deputados de alguma maneira envolvidos com a arte de fazer negócios e influenciar pessoas do sistema Cachoeira.

Da totalidade das legendas, só o PMDB, o PCdoB, o PDT, o PSD e o PSB têm peso entre as que estão por ora fora da cena. Ainda assim compartilham interesses eleitorais e legislativos com os implicados.

Os 13 partidos restantes são residuais e/ou satélites dos médios e grandes. Se nenhum deles decidir jogar os seus ao mar, é só fazer a conta para concluir que uma CPI pode até ser instalada, mas não prospera.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O emergente e a potência: Eliane Cantanhêde

A beligerância verbal e as idiossincrasias entre o Brasil e os EUA esfriaram muito de Lula para Dilma. E os interesses continuam.

O Itamaraty está mais tímido, e Dilma não é tão bom produto de política externa quanto Lula era, mas ela também é altamente popular, tem o trunfo real de ser a primeira presidente brasileira mulher e é quem, de fato, dá a linha da diplomacia brasileira -para os EUA, "uma diplomacia de valores, não só de interesses".

É possível acrescentar: sem uma busca frenética por lideranças que ou são naturais, como na América do Sul, ou prematuras, como nas negociações de paz no Oriente Médio.

Poucas pautas de Dilma são tão ricas e importantes como a que ela leva para Washington. Há desde o "Ciência sem Fronteiras" (intercâmbio de estudantes que os dois lados enaltecem) até inúmeros entreveros comerciais, o foco em energia e as espinhosas questões de Síria e Irã. Os EUA insistem na tática de torniquetes financeiros, econômicos e comerciais, enquanto o Brasil contra-argumenta que isso só piora as coisas.

No caso da Síria, o Brasil tenta se equilibrar entre os EUA e a Rússia e a China -parceiros nos Brics que dão suporte ao regime assassino de Assad-, mas o embaixador Thomas Shannon (EUA) minimiza: "Brasil e EUA pensam quase igual, o vocabulário é que é diferente". (Cá para nós, vocabulário é tudo em diplomacia...)

Mas a questão mais delicada nem é Síria, é Irã. O Brasil teme que a política de sanções chegue a um resultado oposto, empurrando os aiatolás para a guerra. Já os EUA pressionam o Irã para evitar, por tabela, que Israel vá às armas. A ação do Ocidente seguraria os ânimos dos israelenses.

Portanto, o lado mais visível da visita de Dilma aos EUA será a economia, mas o que vai valer mais não será o dito em público, mas o não dito. Ou melhor, o dito entre Dilma e Obama, a portas fechadas, sobre os sólidos interesses bilaterais e as escorregadias questões internacionais.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

No fim da razão:: Míriam Leitão

Na passagem dos 30 anos da invasão das Malvinas se viu a mesma insensatez presente em outros momentos na Argentina. O país pode ter bons argumentos, mas em vez de incendiar o fervor nacionalista deveria ter introduzido mais racionalidade ao tema. Há outros focos de risco: o Banco Central não é mais o guardião da moeda. As barreiras às importações estão criando desabastecimento.

Donde termina la razón, empieza la Argentina. Eles mesmos dizem isso quando irados com o próprio país. Em certos momentos, é inevitável dar razão ao velho ditado. A revista "Economist" publicou uma matéria dizendo que a placa que adornou por 20 anos a entrada do Banco Central argentino teve que ser retirada. Ela trazia escrito que o BC tinha "primária e fundamentalmente a missão de defender o valor da moeda". Mas o Congresso aprovou nova definição institucional e o órgão passou a ter um mandato mais confuso e, oficialmente, perdeu sua independência. Tem que "promover, na extensão das suas habilidades e dentro dos limites das políticas estabelecidas pelo governo nacional, estabilidade monetária, estabilidade financeira, empregos, crescimento econômico e justiça social".

Não são apenas palavras. O Banco Central terá que financiar o governo. Ele terá que transferir ao governo uma quantia igual a 20% das receitas mais 12% de suplemento de dinheiro, usar suas reservas para pagar dívidas do Tesouro e ser mais ativo na oferta de crédito para favorecer indústrias.

A função de um Banco Central é defender a moeda e a estabilidade monetária. Ponto. Banco Central não pode ter missões como emprego, crescimento e justiça social por mais desejáveis que sejam esses objetivos. Ao defender a estabilidade, o BC indiretamente está criando as condições para que as políticas públicas induzam ao crescimento, emprego e justiça social. Mas ele diretamente não pode ter isso como meta. Se o BC for banco de fomento, se emitir moeda para financiar o governo, se malbaratar reservas cambiais, se abandonar sua função principal, o resultado será inflação e crise. Isso a Argentina sabe de viver a tragédia hiperinflacionária dos anos 1980 e 1990. É irracional repetir um erro que custou ao país duas décadas.

A mudança oficial do papel do BC é só o último capítulo da intervenção, que começou quando a presidente Cristina Kirchner demitiu Martín Redrado por seguir a regra de só emitir moeda com lastro e não financiar o governo nem usar as reservas para pagamento de dívida.

O peso tem se desvalorizado diante do dólar, a inflação tem aumentado, apesar de o número oficial ser manipulado após a intervenção no Indec, o instituto oficial de estatísticas. No Brasil, há a excessiva valorização do real. Na Argentina, mesmo com a desvalorização, não houve aumento da capacidade de competir. Tanto que foram criadas barreiras às licenças de importação. Resultado: a indústria argentina está com falta de peças e componentes, e no mercado começa a faltar produtos.

Guillermo Moreno. Esse é o nome do homem que executou tanto a intervenção no Banco Central quanto no Indec, e que controla o número da inflação. Ele é o enviado especial de Cristina Kirchner a todas as missões discutíveis e que aprofundam a opção da Argentina pela insensatez. Moreno ocupa o cargo de secretário de Comércio Interior, mas na prática é uma espécie de primeiro-ministro. E é ele quem enquadra os outros que divergem da presidente. Outro dia, um dos ministros sugeriu numa reunião um caminho alternativo ao que a presidente tinha dito. Recebeu um telefonema de Moreno: "a la presidente no se le discute; se le acata."

O país agora briga com empresas petrolíferas que produzem cada vez menos pelo excesso de intervencionismo. A presidente culpa a YPF pela queda de 32% da produção de petróleo desde o pico em 1998 e de 10% do gás desde 2004. Os produtores culpam o governo. As empresas recebem US$ 42 por barril apesar de o preço internacional ser US$ 120.

O Brasil comete alguns desses erros, mas de forma bem atenuada. Controla o preço que a Petrobras cobra, das distribuidoras, pela gasolina, para com isso influenciar na inflação. Lá, eles manipulam grosseiramente a inflação há cinco anos. Aqui, o governo anuncia algumas medidas protecionistas; lá, eles fecham o país. Aqui, há quem avalie que o Banco Central não é mais tão independente quanto era nos dois últimos governos, mas ele tem cumprido sua missão fundamental de defender a estabilidade monetária. A inflação está em queda. Aqui, o governo faz a escolha de vencedores, uma controversa política dos anos 1970. Na Argentina, Moreno decide quem pode importar o quê.

A Argentina nos conforta. O Brasil comete erros na política econômica, mas não contrata a tragédia como na Argentina. O Brasil adia decisões que seriam mais sensatas, a Argentina refaz o caminho que levou a aflições econômicas.

O erro nas Malvinas foi usar os 30 anos para soprar as brasas de um fogo que já deveria estar morto. Se quer as ilhas, a Argentina poderia começar um trabalho de longo prazo de aproximação com os ilhéus e negociação com Londres. Deve procurar uma saída alternativa. O que tem faltado aos nossos vizinhos é uma boa dose de racionalidade.

FONTE: O GLOBO

Estimular a industrialização:: Amir Khair

As atenções do governo estão voltadas ao processo de desindustrialização em curso no País. Para isso acabou de lançar o segundo pacote de estímulos à indústria, com medidas mais fortes do que o primeiro, o Brasil Maior, lançado em agosto.

Trata-se de um conjunto de medidas de estímulo à competitividade que envolve desonerações fiscais, crédito mais abundante, proteção contra o produto importado, medidas cambiais e preferência nas compras governamentais às empresas sediadas no País.

Conquanto essas medidas estejam no rumo certo, considero que tem alcance limitado, ficando aquém da necessidade para a retomada firme da industrialização no País.

Mas o que falta?

Alguns acham que é necessário fazer reformas, e citam a tributária, a trabalhista e a previdenciária. Outros o câmbio com o real sobrevalorizado e outros as taxas de juros cobradas pelos bancos. Vamos avaliar os argumentos, a posição do governo e apresentar propostas que possam contribuir ao debate.

O pano de fundo é a maior guerra comercial da história, com maior concorrência atingindo as indústrias em todos os países, não só aqui.

1. Reformas. Virou lugar comum falar que são necessárias reformas. Fato é que não são fáceis de serem aprovadas, pois envolvem fortes interesses em disputa no âmbito do Congresso. Foram inúmeras as propostas de reforma tributária, todas desejando simplificar as 27 legislações estaduais sobre o ICMS por uma única legislação federal com cobrança desse imposto no destino, onde o bem é consumido ou usado, ao invés de sê-lo na origem onde é vendido. Essa reforma só poderá ser aprovada se o governo bancar as perdas de arrecadação nas operações interestaduais que poderão ocorrer para oito Estados.

A reforma previdenciária no sistema geral deixou de ser necessária, pois ficou provado que o sistema urbano é e continuará sendo superavitário e o sistema rural, que é deficitário, tende a sê-lo cada vez menos com a redução da população rural. Além disso, nenhum impacto teria essa reforma para a indústria.

A reforma trabalhista, sim, teria o impacto na indústria caso fosse possível flexibilizar as regras no mercado de trabalho, mas dificilmente passa no Congresso dada a forte resistência das centrais sindicais para não permitir a perda de direitos conquistados.
Assim, apostar na solução das reformas não vai resolver, podendo inclusive piorar a situação.

2. Câmbio. É a maior dor de cabeça do governo e da indústria. A valorização do real chegou a tal ponto que é quase impossível competir com o produto estrangeiro. Para se ter uma ideia, no Plano Real, para controlar a inflação, usou-se mega taxa de juro para atrair especuladores externos para valorizar o real. Com isso formou-se a âncora cambial com o real equivalendo a um dólar. Em valores de hoje esse câmbio do Plano Real, considerando a inflação pelo IPCA valeria R$ 2,60 por dólar e pelo IGP-DI, R$ 3,60. O governo, no entanto, entende que o câmbio a R$ 1,80 por dólar está bom para preservar a competitividade industrial e teme que se for acima disso pode disparar processo inflacionário. Não creio.

O principal problema do governo, no entanto, é tentar segurar em R$ 1,80 face à enxurrada de dólares que está entrando no País. São US$ 8,8 trilhões que foram despejados no mercado pelos países desenvolvidos para evitar o colapso do seu sistema bancário desde a crise de 2008. Só parte insignificante desses recursos invadiu o País, mas a pressão continuará para penetrar nossa economia, tirando mais ainda competitividade das nossas empresas. O governo tem como estratégia para manter o câmbio em R$ 1,80, a compra de dólares pelo Banco Central (BC), que emite títulos para enxugar a liquidez advinda com a emissão monetária para efetuar a conversão. Com isso, está enxugando gelo e causando profundo rombo nas finanças do governo. Em 2011 ultrapassou R$ 100 bilhões essa operação. São recursos que poderiam ser usados para uma forte desoneração industrial.

Tenho defendido em artigos que a melhor forma de enfrentar o excesso de moeda externa é emitindo o correspondente em reais, ou seja, ampliando a base monetária. Isso não causará inflação, pois o controlador da inflação é externo ao País nos preços estagnados ou cadentes dos bens e serviços internacionais como decorrência da crise. E isso poderá se estender por vários anos.

Creio que um câmbio mais favorável à competitividade industrial deve ficar acima de R$ 2,00. Não prevejo inflação com essa depreciação, pois os preços dos importados cairão em dólar para tentar penetrar no País, dada a super oferta internacional.

3. Taxa de juro. Na crise de 2008, o presidente Lula determinou aos bancos oficiais a redução das taxas de juros e, apesar da avaliação dos bancos privados de que isso iria prejudicar os lucros e elevar a inadimplência dos bancos oficiais, o que ocorreu foi o contrário.

O governo finalmente adota essa estratégia. Ela visa ampliar o consumo e, com isso fortalecer a indústria, pois a maior parte do crescimento será atendida por ela usando sua capacidade ociosa, sem necessidade de investimento. Com o aumento das vendas, crescem os lucros e a capacidade de expansão com novos investimentos. É o círculo virtuoso do crescimento.

Atendendo determinação da presidente, na quinta feira, o Banco do Brasil reduziu suas taxas de juros e a Caixa deverá fazê-lo na próxima semana. A presidente afirmou que "não há justificativa técnica para o elevado spread bancário no País". De fato, a desculpa apresentada pelos bancos de que o spread é elevado devido à inadimplência elevada é risível, pois a inadimplência é consequência e não causa da taxa de juro. A parte do leão que querem preservar é o elevado ganho no spread.

O governo deve enfrentar essa questão conjugando outras medidas que induzam os bancos a reduzir suas taxas de juros, como, por exemplo, regular o porcentual de depósito compulsório dos bancos no BC de acordo com a taxa de juro praticada.

O caminho para o fortalecimento industrial passa pelo crescimento, que poderá ocorrer com a redução das taxas de juros bancárias e com o câmbio pouco acima de R$ 2,00. Vamos acompanhar.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O teste da facada dos bancos:: Vinícius Torres Freire

Redução de juros no BB e na CEF pode se transformar num teste sobre o nível de concorrência bancária

O Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal prometem grande redução das taxas de juros, como no caso do cheque especial. Esperam assim tirar clientes de instituições privadas. A depender de como a coisa vá funcionar, a promoção pode se tornar um teste da concorrência entre bancos comerciais.

O que está havendo?

1) O governo Dilma entrou em rebuliço quando percebeu que o crescimento econômico seria também baixo no primeiro trimestre;

2) O governo atribui parte do marasmo à alta dos juros para o tomador final, apesar da queda da "taxa básica" (a Selic) desde agosto;

3) O governo deu broncas nos bancos. No caso dos estatais, a bronca já teve consequências. O governo acredita que a "liquidação de juros" nos estatais deva induzir os privados a se mexerem.

A expressão "liquidação de juros" vem devidamente entre aspas porque taxas de juros não são bananas ou geladeiras, que em geral vendem mais quando seus preços caem.

A fim de saber a influência que a "queima geral" de juros no BB e na CEF pode ter no mercado, é preciso em primeiro lugar avaliar o tamanho da promoção e as condições em que serão aceitos os novos clientes do juro baixinho. Se o movimento for pequeno, promoção de marketing apenas, não vai fazer efeito.

Segundo, é preciso lembrar que esse mercado de serviços bancários é muito imperfeito, "falho". As empresas são poucas, a informação para o cliente é ruim etc. Mais importante, neste caso: o custo de mudar de banco não é pequeno (a começar pelo custo da amolação).

Terceiro, os bancos privados podem ter razão em dizer que não vão arriscar fundos, fazer mais empréstimos, porque o mar não está para peixe, a inadimplência está alta, a economia se recupera devagar e tudo isso é risco maior -de perdas, de ameaça à saúde financeira da instituição. Podem querer deixar o prejuízo para os estatais (como muita gente pensou, equivocadamente, que seria o caso na expansão de crédito da banca pública em 2008-09).

Mas pode bem ser também que os bancos estejam confortáveis com um (suposto) baixo nível de concorrência e, assim, enfiem a faca à vontade. A facada não ocorre apenas em taxas de juros. Vide o custo da taxa de administração dos fundos de investimento. Os bancos apenas vão se mexer quando o dinheiro começar a migrar para a poupança. Pode ser que o negócio seja dominado pelo oligopólio da indolência e do conforto da baixa competição.

Nesta semana, os bancos vão pedir ao governo medidas que os ajudem a baixar os juros, que de fato são altos também porque o mercado padece mesmo de inseguranças jurídicas que encarecem o crédito e, bidu, há impostos demais.

Se levarem alguma das reivindicações, podem baixar taxas -mas isso ainda demoraria. Pode ser ainda que a redução de juros viesse com a recuperação da economia e da capacidade de pagamento média dos consumidores, mais adiante.

Assim, no curto prazo, a baixa dos juros dos estatais pode ser um teste. Se a ofensiva dos bancos públicos for relevante e os privados reagirem, dentro de alguns meses (tempo bastante para avaliar inadimplências, rentabilidades e juros), pode ser que tenhamos feito um experimento importante sobre a concorrência bancária no Brasil.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

É o medo da especulação:: Celso Ming

A primeira qualidade de um bom estrategista é identificar a principal ameaça e, em seguida, atacá-la com eficácia. Lutar em várias frentes ao mesmo tempo e com inimigos diferentes quase sempre leva ao fracasso. É o que o governo Dilma parece ignorar.

Seus ministros se espalham, mais ou menos atarantados, e se dedicam a armar artilharias particulares contra inimigos secundários ou até imaginários. Às vezes tudo se resume a uma grande guerra cambial, como a identificada pelo ministro Guido Mantega. A presidente Dilma Rousseff não vê nenhuma guerra a enfrentar, mas um tsunami monetário, espécie de catástrofe provocada pelos grandes bancos centrais.

O ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, por sua vez, revela duas obsessões: atacar a concorrência predatória (chinesa) ao produto brasileiro e neutralizar pretensos estragos provocados pelo capital especulativo.

Contra esse último item propõe operação abrangente e radical: taxar com IOF toda e qualquer venda de moeda estrangeira no mercado interno. Se depois for comprovado que esse capital veio para gerar riquezas e empregos, a proposta é devolver ao investidor os recursos tomados. O importante para o ministro é que toda a entrada de capital seja de longo prazo.

O problema aí é achar que a ameaça se concentra no capital especulativo, perigoso quando uma economia não tem reservas externas – como o Brasil no passado. Hoje, a economia brasileira está defendida por colchão de US$ 365 bilhões.

Ou o capital especulativo opera no curtíssimo prazo ou não é especulativo. É de sua natureza chegar, morder, tirar proveito imediato do que pretende e, em seguida, ir embora. Quando entra no País, o capital especulativo ajuda, sim, a provocar sobrevalorização do real (baixa da cotação do dólar), tão temida pela indústria por lhe tirar competitividade. Mas, ao sair, produz o efeito contrário. Se o fluxo de capitais especulativos é relativamente grande, todos os dias há um entra e sai de moeda estrangeira, cujo efeito líquido sobre o câmbio tende à soma zero – e não uma decorrente valorização constante do real.

Montar uma megaoperação destinada a evitar ou afugentar capitais especulativos é, em primeiro lugar, eleger o inimigo errado. E, em segundo lugar, implica consumir grande quantidade de energia em políticas artificiais.

Em princípio, não haveria nada de especialmente errado em adotar uma política econômica "diferente de tudo o que está aí" – como exigia o PT do Congresso de Olinda, de 2001. Mas é preciso que seja consistente.

A atual política econômica do governo Dilma é reativa. Há apenas dois meses não se importava nem um pouco com o esvaziamento da indústria. De repente, entendeu que virou caso para chamar os bombeiros.

A nova política do governo tende a contra-atacar ameaças esparsas com providências improvisadas. O sujeito ficou ansioso demais? Meta-lhe Lexotan. Ficou sem sono? Aplique-lhe doses fortes de Rivotril. Passou a tossir demais, injete-lhe antibióticos na veia.

Esses são procedimentos que tentam atacar sintomas, não fortalecer o organismo; ao contrário, tendem a criar novos desequilíbrios.

CONFIRA

O investidor voltou a ver com desconfiança os títulos de dívida da Espanha. Passou a exigir rendimentos (yields) ainda mais altos.

Abalo justificável. Esse abalo tem a ver com alto desemprego (de 23,3% em janeiro); incapacidade de derrubar o déficit público de 8,5% do PIB para 5,3%; e vulnerabilidade dos bancos.

Vem mais por aí? Mostra também que a injeção de 1 trilhão de euros no sistema pelo Banco Central Europeu não está revertendo a crise. O que virá agora?

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Hay que reconstruir Italia sobre la base de los valores de posguerra”

Por Alejandro Sehtman

ROMA - Dario Franceschini, actual presidente del bloque de diputados del Partido Democrático, evalúa la era que se abrió con la renuncia de Silvio Berlusconi y analiza el futuro de la Unión Europea.

Dario Franceschini fue secretario del Partido Democrático, nacido en 2007 a partir de la confluencia de la experiencia socialcristiana con la socialdemócrata. Hoy es el presidente del bloque de diputados de esa fuerza, que cuenta con 205 de los 630 diputados italianos. Durante su larga militancia en las distintas expresiones políticas del catolicismo social italiano, Franceschini fue un laborioso promotor de la unidad del polo progresista. Una vez alcanzada, se convirtió en uno de los más fieles custodios de la moderación que garantiza su supervivencia.

Desde su despacho en el Parlamento, Franceschini compartió con Debate su visión sobre la política italiana después de lo que considera una irreversible salida de escena de Berlusconi. También explica por qué el PD decidió apoyar la formación del gobierno de Mario Monti en vez de ir a unas elecciones que lo tenían como favorito y cómo deberían acomodarse las piezas para que el progresismo vuelva al gobierno a pesar de las tensiones en torno a la reforma del mercado de trabajo.

¿Qué significa para el PD el fin del berlusconismo?

Es una victoria del trabajo de la oposición y el cierre definitivo de una época. En otras oportunidades, Berlusconi había perdido, pero no había salido de escena. Ahora es distinto. El país llegó hasta aquí empobrecido, desilusionado. Y ha iniciado la fase de reconstrucción. Lo más grave que ha hecho el berlusconismo no es sólo un conjunto de leyes que violaron los principios constitucionales, sino haber desmotado la idea de vivir en un país en el que las personas respetan las reglas y se sienten parte de una comunidad nacional. El berlusconismo ha sido egoísmo social, una clase social contra otra, el norte contra el sur, los jóvenes contra los ancianos. Desarmó un Estado que, con 150 años, todavía es muy joven. Y siempre es riesgoso disgregar en vez de unir. Esto no lo ha hecho sólo (el Partido Autonomista) Lega Nord, es también el fruto del berlusconismo.

¿Cuál es la tarea, a partir de ese diagnóstico?

El trabajo ahora es cerrar ese ciclo y retomar aquellas cosas que han hecho fuerte a Italia: una comunidad nacional, los valores de la solidaridad, su pertenencia a Europa. El punto no es cambiar las leyes o las opciones económicas, lo que, en parte, ya está ocurriendo con Mario Monti y ocurrirá, más aún, cuando gobernemos nosotros. La cuestión es reconstruir el tejido de un país sobre la base de valores que han hecho fuerte a la Italia en la posguerra. Italia es un país que ha tenido grandes enfrentamientos ideológicos entre la Democracia Cristiana y el Partido Comunista, pero los dirigentes de esos partidos sabían bien que una cosa era el enfrentamiento político y otra los valores compartidos, escritos en la Constitución y luego defendidos conjuntamente. Esto es lo que ha desarmado Berlusconi.

¿Por qué el PD apoya al gobierno de Monti?¿Por qué, luego de la derrota de Berlusconi, no han llevado a cabo las elecciones sino que han sostenido un gobierno técnico?

Ha sido un acto de gran responsabilidad y generosidad del PD. Todos los sondeos de opinión mostraban que, una vez caído Berlusconi, si se hubieran realizado elecciones inmediatamente, el PD habría ganado. Pero ante la situación dramática del país, el spread entre la tasa de interés de la deuda pública italiana y la alemana, la especulación de los mercados sobre los títulos italianos, hubiera sido un acto de inconsciencia llevar al país hacia una larga y dura campaña electoral... Hubiéramos encontrado escombros sobre escombros. En definitiva, hicimos una opción de responsabilidad hacia el país. Si se tiene la fortuna que los intereses del partido y del país coinciden, mejor. Pero cuando los intereses del país y los del partido no coinciden, hay que elegir por los intereses del país.

¿Por qué Monti?

Monti puso su credibilidad a disposición de la salvación de Italia. Y nosotros hemos sostenido en el Parlamento medidas difíciles también para eso. El gobierno de transición continuará hasta las elecciones de 2013. Entonces optaremos, en una competencia normal, entre izquierda y derecha, entre progresistas y conservadores.

¿Dentro de qué límites se desarrolla este apoyo a Monti?

Cada decisión del gobierno de Monti es, necesariamente, el fruto de una mediación. Por razones políticas y numéricas debe ser votada en el Parlamento, tanto por el PD como por el PdL (ndr: Pueblo de la Libertad); es decir, por los dos grandes partidos adversarios. Se busca la síntesis, pero nosotros sabemos bien las cosas que queremos que se hagan y las que no votaríamos. Y si nosotros no las votamos, no son aprobadas.

¿Por ejemplo? ¿Hay contenidos particulares sobre los que piensan ejercer el veto?
Hay temas, sí. Naturalmente, todas las iniciativas que por años Berlusconi trató de llevar adelante, como el cambio del sistema de justicia o la reforma constitucional, se han detenido. Y se ha invertido totalmente la política de lucha contra la evasión fiscal que para nosotros es un gran resultado. Un gobierno que toma como batalla principal la lucha contra la evasión es el opuesto exacto del gobierno anterior. Sobre el mercado de trabajo, es claro que hay fronteras que hemos establecido y que no serán traspasadas.

En lo que respecta al escenario político, el “bipolarismo” ha sido uno de los objetivos declarados de Berlusconi. Si se mira la escena actual nos encontramos con que los polos son, por lo menos, tres.

Hemos trabajado todos para ese bipolarismo. Él para construir la derecha y, nosotros, para construir la izquierda. No hay tres polos. Hay dos grandes partidos que, en las últimas elecciones de 2008, han obtenido el setenta por ciento de los votos. Ahora los sondeos dicen que están en torno al sesenta. Es decir, que hay dos polos. Existe un tercer polo que no es competitivo respecto de la victoria final. Puede entrar en un juego de alianzas, pero existen dos polos de treinta por ciento y uno de diez. El sistema italiano es bipolar. Cualquiera sea la nueva ley electoral seguirá estando basada sobre la alternancia entre el PdL y el PD. Como ocurre en todo el mundo.

Entonces usted no avizora el final del bipolarismo.

Absolutamente, no. El mundo va hacia una simplificación de las posiciones. Esto es, progresistas y conservadores. Luego, en base a cada historia nacional, estos dos campos se convierten en partidos o en coaliciones. La otra fuerza o el tercer polo, deberá decidir con quién aliarse, porque no tiene ninguna posibilidad de ganar las elecciones solo. Espero que decida aliarse con nosotros.

Una especie de balanza parlamentaria, dice usted.

Depende de la ley electoral, pero podría serlo.

¿No quedaría en manos de ese sector la orientación política del país?

Si los electores deciden que ese tercer polo sea el árbitro, será su opción, no de Pier Ferdinando Casini (ndr: presidente de Unión de los Demócratas Cristianos y de Centro), referente de ese espacio. Pero no creo que vaya a ser así. Las condiciones políticas le impondrán al tercer polo su posición. Luego de una legislatura de dura oposición, es difícil que vuelvan a aliarse con el partido de Berlusconi.

Y en lo que respecta a los sectores progresistas que tienen su propia expresión partidaria, como Italia dei Valori (IdV), del ex fiscal del proceso Manos Limpias Antonio Di Pietro?

Es un partido con vencimiento, basado en la popularidad de Di Pietro, que obtiene el siete por ciento de los votos, que nació como un partido anti Berlusconi y que, naturalmente, caducará. Los partidos permanecen si están ligados a grandes ideas, a grandes movimientos. Italia dei Valori nació como fruto del berlusconismo. No estando más Berlusconi, en poco tiempo, se secará.

¿Usted piensa que el PD podría ser la bisagra entre el tercer polo y el resto del espacio progresista del que participan IdV y la SEL (Izquierda, Ecología y Libertad) de Niki Véndola?

No lo excluyo. Depende de la ley electoral, pero no creo que haya nada de extraño si un gran partido progresista tuviera dos aliados más pequeños, uno a la izquierda y el otro al centro.

¿Qué perspectivas tienen del mercado de trabajo y de la política del gobierno de Monti al respecto?

Es imposible imaginar que el futuro del mercado de trabajo sea el de nuestros padres: puesto fijo, garantizado, en la misma ciudad, para toda la vida. Ya no es así. El mundo ha cambiado. Y ni siquiera es la aspiración de los muchachos de hoy que, si pudieran elegir, querrían un trabajo dinámico, poder cambiarlo a lo largo de su vida, cambiar de país, de ciudad. Si pudieran elegir el trabajo ideal, elegirían uno mucho más flexible. Entonces, la cuestión no es obstaculizar cualquier cosa que vaya en la dirección de una mayor flexibilidad, sino oponerse a sus consecuencias negativas. Por ejemplo, el artículo 18 del Estatuto del Trabajador (ndr: dispone la indemnización para los despidos sin justa causa en las empresas de más de veinte empleados) es muy simbólico ya que protege a pocos trabajadores. La cuestión no es quitarle protecciones a quienes ya las tienen, sino extenderlas a quienes no cuentan con ellas. En Italia hay millones de trabajadores que están en pequeñas empresas o tienen contratos precarios sin ninguna garantía. En definitiva, tenemos en mente una izquierda moderna, que hace reformas, que no tiene miedo del cambio. Totalmente distinta de una izquierda conservadora que sí le tiene miedo.

La posición refiere más a la posición del Partido frente al mercado de trabajo que a sus alianzas con los sindicatos.

En los sindicatos hay una discusión abierta sobre el tema del mercado de trabajo. También hay tratativas con el gobierno... Estoy convencido de que se llegará a una mediación. Porque nadie tiene interés en comenzar con meses de huelgas y de conflictos sociales. Según la mediación a la que se llegue, seguramente se disociarán algunos sectores del sindicalismo, pero hay que tener paciencia. El grueso del mundo sindical va a encontrar un acuerdo, incluída CGIL (ndr: Confederación General Italiana del Trabajo), la central de izquierda.

¿Piensa que, a nivel europeo, se debería haber actuado de otro modo frente a la crisis? Esta Europa guiada por dos líderes derechistas como Angela Merkel y Nicolas Sarkozy, ¿sigue siendo una referencia política para el progresismo italiano?

Pienso que Europa es el faro político de Italia. Hay que tener en cuenta los límites que tiene un recorrido tan difícil, del que participan ya veintisiete países y pronto serán más y que, como todo gran proceso histórico, tiene momentos de aceleración y momentos de freno. Ahora estamos constreñidos a avanzar a través de tratados, en vez de poder transferir más poderes a la Unión Europea como tal. Son momentos complicados y difíciles que, en particular, son consecuencia de la ausencia de grandes líderes. Helmut Kohl y François Mitterand hicieron la opción por Europa y no tomaron decisiones sabiendo el impacto que tenían sobre los sondeos de opinión. Pensaron en las próximas generaciones. Tomaron decisiones que hoy no tomaría nadie. Así hace un verdadero líder. Conducir un proceso tan ambicioso sin grandes líderes es realmente un problema.

¿Entonces?

El proceso de integración europea es inexorable, necesario, indispensable, porque en el mundo global el horizonte inevitable es, al menos, una dimensión regional. Europa largó antes, pero todo esto sucederá también en otras regiones. La medida ya no puede ser la del Estado nacional, aunque sea grande, porque para los problemas ya no existen las fronteras. Ni para los mercados, las finanzas, el terrorismo, el medioambiente o la infraestructura. Para que sea considerada grande, una empresa debe tener una dimensión europea. Lo mismo, para los bancos y de las políticas. Sobre este tema o respecto de otros, las opiniones públicas están mucho más adelantadas que los Estados. Sobre todo, la de los jóvenes. A esta altura, para un muchacho, Barcelona, Milán, Berlín o París son intercambiables. Estoy seguro de que la próxima generación se identificará como europea, no sólo como italiana o francesa. Por lo tanto, cuando se habla de “cesión de soberanía” se cae en un error. No se trata de un país que cede soberanía. Se trata de Europa que, finalmente, gana una porción más de soberanía.

De todas maneras, ¿no cree que la Europa contemporánea limita las posibilidades de un país como Italia de competir en el mundo?

Si Italia estuviera hoy fuera del euro sería un país desesperado. Crear el euro ha sido una decisión estratégica y previsora. Pero también ahí nos hemos quedado a mitad de camino, ya que faltó la voluntad política de realizar los pasos sucesivos. Es difícil hacer una política monetaria común y políticas fiscales y económicas distintas. No tiene sentido. Pero como el proceso del euro es irreversible, terminará arrastrando las demás políticas. Nosotros quisiéramos que esto sucediera rápidamente. Pero en los grandes procesos históricos las cosas pueden ser más lentas o más veloces.

¿No hay un déficit democrático en la toma de estas decisiones que luego le son impuestas a los Estados?

Por ahora, las decisiones europeas parecen más el fruto de acuerdos entre Estados que decisiones surgidas de las reglas comunitarias que todavía son frágiles. Pero no dudo de que se irá en la dirección de una mayor democratización. Si se eligiera al presidente de la Comisión Europea junto con las elecciones al Parlamento Europeo, se le daría al presidente electo una fuerza extraordinaria. Pienso que la finalización de este proceso son los Estados Unidos de Europa y, por lo tanto, un Parlamento Europeo que exprese un gobierno europeo. O sea, que se trata de un recorrido absolutamente democrático. Y lograremos verlo completo en poco tiempo.

América Latina, Europa y el neoliberalismo

¿Cómo piensa que puede dialogar su espacio político con los gobiernos populares de la América Latina contemporánea?

En comparación con los otros partidos europeos progresistas, el PD se asemeja un poco más a los grandes partidos progresistas latinoamericanos. En los otros países, tienen una fuerte identidad socialista. El PD no es sólo eso. Hay gente que viene de la tradición socialista, pero es un espacio más amplio. Yo vengo de la experiencia democrático-cristiana y soy la prueba de que el PD es una síntesis de estas dos trayectorias. En Europa estamos hablando con otras fuerzas progresistas porque, en un mundo globalizado como éste, las fuerzas que están del mismo lado deben elaborar reflexiones comunes sobre los grandes temas globales como el comercio, las finanzas, el ambiente o la tasa Tobin. Hace falta tener algo más que el clásico encuentro anual de la vieja internacional socialista, sino vínculos estables.

La ruptura clara con el neoliberalismo que hizo América Latina, ¿no sirve de lección para los progresismos europeos?

Ahí, claramente, la ruptura con el neoliberalismo era necesaria para construir un Estado social. En Europa no. Porque, objetivamente, el sistema del Estado de Bienestar europeo es respetado también cuando gobiernan las derechas. Cuando gobernaron los democristianos alemanes, los populares españoles, o Nicolas Sarkozy, en Francia, no se desarmaron los Estados sociales. Tal vez tomaron decisiones políticas que no compartimos, pero no es lo mismo. Por lo tanto, es difícil hablar de ruptura con el neoliberalismo del modo que se realizó en América Latina.

FONTE: REVISTA DEBATE (ARG), 4/4/2012