sábado, 12 de março de 2011

Reflexão do dia – Roberto Freire

Alimentada por uma fantástica máquina de propaganda, de 2003 a 2010, tendo como mote o bordão "nunca antes na história deste país", usado e abusado por nossos humoristas, o governo Lula alimentou a ilusão de que seria inovador, no que tange às práticas políticas, e modernizador de nossa economia.

Quanto ao primeiro tópico, o que inovou foi a forma desabrida de amealhar apoios, via uso de suborno a parlamentares, no que ficou conhecido como "mensalão".


FREIRE, Roberto. A renda desnudada. Brasil Econômico, 11/3/2011

Sem proteção:: Merval Pereira

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, enviou-me a íntegra do voto em separado que proferiu em 2007 na Comissão de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados para demonstrar que, ao contrário do que se afirma, inclusive eu na coluna de ontem, ele não pode servir de base para evitar uma punição para a deputada federal do PMN do Distrito Federal Jaqueline Roriz. Eleita ano passado, ela aparece em um vídeo de 2006, quando era deputada distrital, recebendo propina no escândalo que derrubou o governo José Roberto Arruda.

Pelo contrário, seu voto, que foi aprovado, pode até fundamentar o procedimento para sua eventual cassação.

Independentemente do fato de que a decisão da Comissão de Ética naquela ocasião evitou que políticos envolvidos no mensalão, e posteriormente reeleitos, fossem alvo do julgamento de seus pares, com base no insólito entendimento de que as urnas anistiam os erros cometidos amplamente divulgados, o adendo proposto pelo então deputado petista José Eduardo Cardozo permitiu que houvesse exceções nessa suposta anistia.

Uma consulta dos líderes de PMDB, PT, PP e PR, que tinham deputados envolvidos no mensalão, sobre a "admissibilidade de instauração de procedimento disciplinar contra parlamentar quando o fundamento da representação tiver por base ato ou procedimento supostamente ocorrido em momento anterior a processo eleitoral que confirma novo mandato" recebeu do relator, deputado Dagoberto, do PDT, um parecer que defendia a tese de que a abertura de processos de cassação de mandatos não poderia ocorrer diante de fatos acontecidos em legislatura anterior. Eventual abertura de processo só poderia ocorrer diante de fatos revelados na legislatura presente.

O então deputado José Eduardo Cardozo também defendeu a tese de que, no momento em que o povo vai às urnas proceder à escolha dos seus futuros representantes, se a sociedade já tiver tido conhecimento pleno dos fatos desabonadores que podem pesar contra o candidato que postula a sua recondução a um novo mandato, e mesmo assim "parcela significativa dos cidadãos o escolhe para ser o seu representante, será descabido, pelo próprio princípio democrático, ignorar incondicionalmente este "julgamento popular direto"".

Mas, num texto de 49 páginas, ele considera que deverá ser aberta exceção para os casos em que "novos elementos de convicção apropriados surjam após a eleição, de modo a poderem sugerir, em tese, que o resultado das urnas não teria sido o mesmo se tivessem sido de anterior conhecimento público".

Na sua sustentação, Cardozo alega que "é possível a abertura de processos de cassação de mandatos por procedimentos incompatíveis com o decoro parlamentar por fatos verificados ao longo do exercício de mandato anterior já extinto, desde que:

a) não tenham sido eles amplamente divulgados para toda a sociedade, de modo que um eleitor médio pudesse deles não ter conhecimento no momento da eleição; b) surjam elementos de convicção supervenientes (fatos ou provas novos), ou seja, verificados ou conhecidos publicamente apenas após as eleições e em condição em que pudessem modificar, em tese, o juízo dos eleitores em relação ao parlamentar acusado.

No caso de sentença criminal condenatória transitada em julgado por fatos praticados ao longo de mandato anterior, mesmo que já conhecidos publicamente esses fatos à época da eleição, Cardozo também admitia que pudesse haver a abertura de processo de cassação, com fundamento no artigo 55, VI, da Constituição Federal.

Diz o voto de Cardozo, textualmente: "Donde ser forçosa a conclusão de que a eleição para um mandato subsequente, por si só considerada, não elimina a possibilidade jurídica da aplicação da sanção política a um parlamentar reeleito, pela prática de ato incompatível com o decoro ao longo do mandato antecedente. A reeleição não pode ser vista como uma anistia política incondicional dada pelas urnas. Caso assim fosse, todo e qualquer ato ilícito ou imoral praticado ao longo de um mandato, mesmo que apenas revelado a posteriori do momento eleitoral, estaria resguardado pelo manto da impunidade política."

Em seu voto em separado, que acabou sendo aprovado como adendo ao voto do relator, o então deputado José Eduardo Cardozo dizia que, "havendo fatos novos, elementos probatórios novos, circunstâncias novas, reveladas a posteriori do momento eleitoral, em condições que, em tese, poderiam alterar o juízo político do eleitor, o Parlamento, por meio de seus representantes, terá total liberdade jurídica para formar a sua convicção política sobre a necessidade de cassação ou não do mandato".

Nesse caso, "o representante estará agindo em nome do povo que o elegeu para apreciar circunstâncias novas, publicamente inexistentes no momento em que se expressou o juízo eleitoral dos cidadãos. Aqui terá legitimidade democrática para fazê-lo. Estará agora agindo legitimamente, no exercício da representação popular, apreciando fatos novos, examinando elementos probatórios novos, formando, em nome daqueles que representa, uma nova convicção política de conveniência e de oportunidade quanto à necessidade de manutenção ou não de um mandato, a partir de uma nova realidade desenhada após as eleições. Agora o princípio democrático não estará ofendido, mas atendido na sua plenitude".

É justamente o caso da deputado federal Jaqueline Roriz, cuja participação no escândalo do mensalão de Brasília só foi revelada agora, depois que fora eleita. O parecer de Eduardo Cardozo, na verdade, é um antídoto contra o "estelionato eleitoral", embora preserve a imunidade de políticos que supostamente foram "anistiados" pelas urnas, em uma interpretação ampliada e algo "esperta" do sentido do voto.

Seria ótimo que um dia o eleitor médio brasileiro tivesse acesso a todas as informações e as entendesse.

FONTE: O GLOBO

Peleguismo em debate:: Fernando Rodrigues

País da boquinha estatal, o Brasil tem um acerto histórico a fazer com a herança getulista. Aqui, goste ou não do seu sindicato, o trabalhador formal está obrigado a contribuir com uma taxa anual -descontada de seu salário de forma compulsória.

Ontem, uma novidade. Numa reunião com sindicalistas, Dilma Rousseff ouviu uma proposta da CUT: acabar com o imposto sindical e criar uma "taxa negocial". Nesse novo modelo, o dinheiro só seria recolhido depois de a contribuição ter sido aprovada em assembleias de trabalhadores.

Não há como saber se a CUT fala para valer, se a proposta vingará nem se Dilma Rousseff vai colocar a mão nessa cumbuca.

Também está claro que a CUT e seus sindicatos filiados serão os maiores beneficiados da mudança. Ligada historicamente ao PT, as fontes de financiamento dessa central são mais azeitadas do que as de agremiações concorrentes.

O fim do imposto sindical seria uma catástrofe para grande parte das centrais. Acostumadas a mamar na verba automática, teriam de disputar o apoio voluntário dos trabalhadores da noite para o dia.

Mesmo com todas essas ressalvas e quase impossibilidades práticas para que seja enterrado o imposto sindical, é bom o tema ter sido abordado numa reunião com a presidente da República.

Hoje, milhões de trabalhadores experimentam um pouco de raiva no dia em que o desconto do imposto sindical surge em seus contracheques. Passa algum tempo, todos se esquecem.

Menos os dirigentes pelegos de boa parte dos sindicatos, viciados no dinheiro fácil.

Ontem, teve sindicalista deslumbrado porque Dilma Rousseff mandou servir suco aos presentes na reunião. Se o Brasil tivesse um modelo trabalhista independente, essa turma não iria mendigar migalhas no Planalto. O fim do imposto sindical é o primeiro passo para um sistema sindical mais digno.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O fóssil corporativista está vivo:: Gaudêncio Torquato

O professor América no Philipe Schmitter, autor de densa pesquisa sobre a democracia brasileira, com a qual embasou sua tese de doutoramento no fim da década de 60, ao passar pelo Brasil, recentemente, deixou no ar incitante indagação: por que o país ainda conserva o “fóssil corporativista”? Referia-se ele ao modelo adotado por Getulio Vargas e inspirado em Mussolini, cujos elementos se apresentam organicamente vivos ainda hoje, bastando olhar para algumas de nossas instituições, que se amarram à frondosa árvore estatal, como centrais sindicais, ou as entidades que vivem de contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, como as que integram o Sistema S, encabeçadas por Sesi, Senai, Sesc e Senac.

O corporativismo brasileiro continua a dar as cartas pela relação de troca que estabelece. Os escudeiros do corporativismo, sejam representações laborais ou empresariais, querem mamar nas tetas do Estado. E este usa o equipamento para manter certo controle sobre elas.

Em pleno século 21, o Brasil ainda não se livrou de um fenômeno que faria sentido nos anos 30, e que foi eliminado em países de costumes parecidos, como o México, onde a democratização esfacelou o modelo corporativista. A surpresa se torna ainda maior quando se observam a variedade de grupos étnicos e religiosos e a diferenciação das economias sub-regionais, características brasileiras que, por si só, dariam margem ao desenvolvimento de sólidas estruturas pluralistas e, consequentemente, ao desmoronamento do corporativismo.
Expliquemos as razões da sobrevida desse fóssil, a partir de rápida interpretação sobre o ethos nacional.

Somos um povo acostumado a viver sob a tutela do Estado. Cada ator social – grupamento, núcleos organizados, setores – imbui-se de pertencimento, a noção de que tem direito a uma cota do patrimônio estatal. O patrimonialismo é o primeiro patrocinador do corporativismo.

A este valor se agrega o cartorialismo, o costume de registrar as conquistas em cartório. Resulta disso a proliferação de leis e decretos. O foro legislativo entope-se com a enxurrada de normas que visam a atacar, defender e preservar posições. O corporativismo, como se vê, se ancora em restrições, concessões, janelinhas de oportunidades e balcões de benefícios.

Quanto mais o país avança na avenida da modernização de processos e práticas da gestão pública, mais amarrado fica à floresta legislativa. Dessa forma, os trens velozes da contemporaneidade correm atrás da carroça protecionista. Esse é o gigantesco paradoxo de nossa democracia funcional. O pluralismo que se enxerga na gama de instituições sociais e políticas, nas organizações não governamentais, nos grupos de interesse, não ganha correspondência no campo do voluntarismo e nas frentes de livre escolha. A miríade de associações, cada qual defendendo reivindicações de nichos, se acostumou ao ofício de articular com os Poderes para baixar decretos, normas, instruções ou leis específicas de cunho protecionista. Tal composição, aliás, condiz com o formato de uma sociedade agrupada em núcleos especializados. A especialização se amplifica com a formação de cadeias e coalizões voltadas para eleger suas representações ao Parlamento.

Impõe-se a pergunta: quem levantará a bandeira dos grupos sociais desorganizados, das massas periféricas? Os partidos? Ora, também começam a agir de maneira corporativa.

As 27 siglas que giram na constelação partidária acabam sendo responsáveis pelo caráter fluido da política. Competitividade maior haveria se tivéssemos apenas cinco ou seis partidos, que, ajustados ao arco ideológico, fariam representação mais adequada às divisões sociais. Sob essa configuração, o conceito de bem comum ganharia força.

FONTE: JORNAL DO BRASIL

Presidentes, PIB e política:: Cesar Maia

A divulgação, por Reinaldo Gonçalves, das taxas de crescimento do PIB por período presidencial provoca a análise. O crescimento econômico atribuído a JK é na verdade um longo ciclo no pós-Guerra. Na segunda metade dos anos 1940, com Dutra, a economia cresceu 7,6%, em média.

Na primeira metade dos anos 1950, com Vargas e até a posse de JK, cresceu 6,7%, em média. Com JK, o crescimento médio foi de 8,1%.

No primeiro ano do governo Jânio Quadros (renunciou em agosto de 1961), cresceu 8,6%.

Portanto, em 16 anos do pós-Guerra, a economia brasileira cresceu, em média, 7,5% ao ano, com pouca variação entre os governos.

Nos períodos de turbulência política, a taxa de crescimento fica muito abaixo. Com Floriano Peixoto (Revolta da Armada), a taxa média de três anos de governo acusou decréscimo de 7,5%. No período Collor, também de três anos, outro decréscimo (-1,3%).

Foram os dois únicos períodos governamentais na República com queda do PIB. Inclua-se como períodos de turbulência os governos Arthur Bernardes (estado de sítio) e João Goulart (até o golpe de 1964), com média de 3,7% e 3,6%, respectivamente.

No período Hermes da Fonseca (revolta dos marinheiros, dos fuzileiros navais, estado de sítio e intervenção em Estados do Nordeste), a taxa média foi de 3,5%. No período de Wenceslau Braz, durante a Primeira Guerra Mundial, a média de crescimento foi de 2,1%. Ao contrário da Segunda Guerra, que impulsionou as exportações, na Primeira Guerra, com o bloqueio continental, o efeito foi contrário.

Os períodos governamentais de ajuste econômico também produziram redução da taxa de crescimento do PIB.

Em primeiro lugar, Campos Salles, que realizou duras medidas exigidas pelo Encilhamento no início da República. A economia cresceu, em média, 3,1%. De certa forma se pode incluir o período FHC como de ajustes econômicos, pelas reformas adotadas e pelas respostas às crises asiática e russa. O crescimento médio foi de 2,3%. No núcleo das crises de 1998-99, foi de 0,4%.

O ajuste econômico durante o governo Castello Branco foi rápido, compensado pela expectativa favorável do empresariado, pelo apoio internacional e pelas medidas que aliviaram as cargas tributária e trabalhista e alinharam preços. Só no ano do ajuste de 1965 houve menor crescimento. No período, a taxa média foi de 4,6%.

O período Figueiredo terminou sendo o desaguadouro da crise do petróleo e da transição política, e a taxa média de crescimento foi de 2,4%. O primeiro governo Lula exigiu ajustes, e a taxa média foi de 3,5%. E no segundo, incluindo o ano de crise de 2009, o crescimento teve a mesma média do período republicano: 4,5%.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Divergências sobre o euro:: Celso Ming

Desta vez, pelo menos as divergências entre os países-membros da área do euro estão no mesmo campo. Já há suficiente compreensão de que não é possível dar solidez à moeda comum sem a construção de uma base fiscal comum, que, por sua vez, depende de um mínimo de unidade política.

A reunião de cúpula dos chefes de Estado do euro ontem realizada em Bruxelas mostrou divergências profundas a superar e um princípio de acordo ainda a ser sacramentado. O centro das discussões leva três nomes que, no fim, significam o mesmo. Está sendo chamado tanto de Pacto pela Competitividade, como de Pacto por Governança Econômica e de Pacto para o Euro.

A crise do euro acontece porque cada um dos 17 países do bloco tem suas próprias leis trabalhistas, seu sistema tributário, seu orçamento. Basta essa enorme diversidade para provocar enormes diferenças nos resultados das contas públicas e no tamanho das dívidas (veja tabela). E essas diferenças são, por si sós, fator de perda de competitividade.

Uma dívida muito maior em relação ao PIB, como as da Grécia e Portugal, implica pagamento de juros muito superiores, o que, por sua vez, é novo fator de aumento de custos fiscais com os juros da dívida.

Mas a crise da Irlanda mostrou que não basta ter finanças públicas relativamente em ordem. É preciso também que o sistema financeiro privado esteja saudável. O rombo nas contas públicas do país aconteceu porque, de um dia para o outro, seu governo teve de salvar os bancos.

Em caso de aumento súbito de custos, um governo pode sempre desvalorizar sua moeda. Esse recurso reduz os salários e baixa em moeda estrangeira os preços dos produtos. No entanto, países que integram uma área de moeda comum não têm essa prerrogativa porque abriram mão da soberania monetária. O que podem fazer é reduzir salários, aposentadorias e benefícios. É o que foi feito na Alemanha, com bons resultados, porque apresenta o melhor superávit comercial do bloco.

A unificação de regras na área do euro atinge gama enorme de assuntos. Vai ser preciso, por exemplo, uniformizar os sistemas tributários. Há países da área do euro que cobram 35% de Imposto de Renda sobre o lucro das empresas e outros que cobram apenas 15%.

As atuais discussões preveem proibição de reajustar salários de acordo com a inflação. Propõem, também, uniformização do limite de idade de aposentadoria aos 67 anos. Os críticos argumentam que seria melhor vincular a idade de aposentadoria à expectativa de vida da população.

Outro ponto que suscita ferozes discussões consiste em descarregar sobre os bancos parte do custo com a inadimplência de dívidas soberanas. Mas, se os bancos tiverem de pagar esse custo, o que fazer no caso em que, em consequência disso, eles também acabarem insolventes?

Falta saber também como exigir que os acordos sejam cumpridos. Os limites de despesa pública e endividamento previstos no Tratado de Maastricht não foram observados, mas não há quem possa impor sanções a essas transgressões.

Onde quer que desemboquem, as atuais negociações têm de prever um mínimo de governança comum. E isso parece conduzir à maior hegemonia da Alemanha e da França dentro do bloco.

CONFIRA

Bagulheira chinesa

No encontro que teve ontem com os sindicalistas, a presidente Dilma Rousseff reconheceu que "o Brasil é exportador de commodities para a China, mas importa muita bagulheira". Pois é justamente essa bagulheira que provoca reações indignadas do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel. Para ele, os produtos importados da China fazem concorrência desleal ao produto industrial brasileiro.

Produto estratégico

O que a presidente Dilma está dizendo é que o produto nobre de exportação são as commodities fornecidas pelo Brasil e que "bagulheira" são os produtos industrializados importados da China. Seria, então, a "bagulheira" chinesa concorrendo com a "bagulheira" produzida no Brasil?

Baixo valor agregado

Essa observação da presidente Dilma tromba com a conclusão de tantos analistas e empresários para os quais o Brasil perde empregos e riqueza por exportar matérias-primas, produtos de baixo valor agregado.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Megaeventos:: Míriam Leitão

O gigantesco terremoto de ontem no Japão e os tsunamis que devastaram uma área do país e ameaçam tantos outros países do Pacífico vão também afetar a economia mundial. O Japão estava começando a se recuperar, agora será de novo engolfada por mais incerteza. Há muito tempo o Japão não puxa a atividade do mundo, mas ainda é o terceiro maior PIB global.

O mundo está vivendo uma sucessão de megaeventos desde 2008. A economia americana levou dois anos para começar a mostrar sinais de recuperação, depois das crises imobiliária e bancária. A economia europeia ainda não se recuperou porque vive agora sob o risco de calote das dívidas públicas. Países produtores de petróleo, ou importantes para a logística do produto, estão sendo sacudidos por movimentos exigindo democracia. Em alguns casos, trazendo novas esperanças, como no Egito. Em outros, infelizmente, mais sofrimento para a população. A Líbia, pela reação do seu ditador, está virando um banho de sangue. A incerteza aumentou nos últimos dias quando na Arábia Saudita o governo reagiu com violência a uma manifestação. Tudo isso produz incertezas e choques na economia mundial.

Nas últimas horas, todos os olhos estiveram voltados para as assustadoras e grandiosas imagens da natureza em fúria. Um terremoto não é fenômeno climático, é geológico. Não é decorrente de emissão de gases de efeito estufa, como alguns dos desastres que temos visto no mundo. Mas as cenas de ontem mostravam refinarias em chamas, o risco rondando quatro centrais nucleares. O país mais preparado do mundo para desastres naturais viu sua população ser dolorosamente atingida, teve que fechar as centrais nucleares, decretar emergência nuclear. No fim do dia, saíram notícias de vazamento. As usinas foram construídas com segurança, mas para um terremoto de 7,5 graus. O de ontem foi além disso, o maior em um século e meio.

Os impactos na produção japonesa são difíceis de serem dimensionados nestas primeiras horas, mas são diretos. A maior siderúrgica do país também foi atingida por outro dos 80 grandes incêndios. A Sony fechou temporariamente seis fábricas. Inúmeras outras suspenderam produção, como a Nissan. A Volvo e a Nestlé foram atingidas. O centro dos eventos foi uma área de produção agrícola e de pesca. As bolsas caíram e os preços dos seguros subiram. O petróleo caiu, mas há risco de os derivados subirem porque o Japão é produtor de derivados. Há vários canais pelos quais essa tragédia humanitária atinge também a economia.

Na agricultura, o Japão é fraco. Falta terra, mas cada pedacinho é aproveitado em produção altamente subsidiada que o faz autosuficiente em arroz, mas importador de 60% dos alimentos que consome. Na pesca, eles são o maior produtor do mundo, fornecendo 15% da oferta global de peixes, com métodos de efeitos danosos para o equilíbrio natural.

O Japão foi o grande milagre econômico do pós-guerra, por apostar em alta qualificação do seu pessoal e produção de alta tecnologia. Cresceu 10% ao ano nos anos 1960; 5% ao ano, nos anos 1970; 4%, nos anos 1980. Daí, entrou numa grave crise provocada pelo estouro de uma bolha imobiliária, contra a qual não reagiu em tempo e nem da forma adequada. De lá para cá, o país tem tido períodos de recuperação logos abortados por alguma grande crise.

Foi assim em 2008. No último quadrimestre de 2010, o país estava começando a mostrar resultados positivos no crescimento. A tragédia das últimas horas deve de novo colocar a economia em compasso de espera. Em 19 de janeiro, o instituto Daiwa de pesquisas disse que uma contração adicional da economia japonesa seria improvável. No seu cenário principal, a economia continuaria com baixa atividade, mas escaparia da recessão, com crescimento de 1%: "Nós vemos cinco causas para otimismo em relação à economia japonesa: sinais do fim do declínio das exportações; melhora nas estimativas de produção; avanço no ajuste do estoque de capital; um piso para a renda domiciliar e para o emprego; aumento dos aluguéis e da ocupação dos imóveis comerciais." A análise coincidia com a de outro centro de estudos e consultoria, o JRI, Japan Research Institute.

Em fevereiro, diante dos últimos dados, a Daiwa reviu para cima suas expectativas de crescimento para o ano. Reafirmou que era improvável uma reversão desse quadro, e disse que sua preocupação era a instabilidade de alguns países desenvolvidos, o risco de bolhas nos emergentes, a especulação com as commodities. Os analistas do instituto olharam todos os fatores de risco, menos o imprevisto que estava abaixo das águas do seu mar. Terremotos são fenômenos complexos e difíceis de prever. E o tsunami que se seguiu veio rápido demais, antes que a população pudesse executar os planos sempre bem ensaiados de evacuação.

Como consequência do baixo crescimento, o Japão vive sob a síndrome das crises políticas. O primeiro-ministro, Naoto Kan, foi o quinto a assumir o cargo em quatro anos e estava sob ataque por acusação de corrupção quando, ontem, a oposição se uniu ao governo na luta contra o flagelo que se abateu sobre o país. Mas a crise que se seguirá a esses trágicos terremoto e tsunami obrigará o governo a gastar mais. E o país tem uma dívida de mais de 200% do PIB e déficit de 10%, indicadores péssimos que só são mantidos graças aos juros baixíssimos que tornam mais fácil pagar o serviço da dívida. A expectativa, com a melhora do quadro econômico, era de que o país fosse começar a fazer ajuste nas contas públicas. De novo, o Japão terá que lidar com a tragédia imprevista.

FONTE: O GLOBO

Uma boa chance::Cristovam Buarque

Com o fim da guerra fria, os presidentes já não são defensores de ideias e posições estratégicas na geopolítica internacional. A globalização apequenou os dirigentes nacionais em agendas locais, sobretudo comerciais. A globalização ainda não produziu os estadistas globais que o mundo precisa. O estadista global precisa perceber a necessidade de ir além do comércio, deixar de ver as fronteiras de seu país como um problema alfandegário e migratório e entender seu papel na arquitetura do futuro mundial.

O presidente Barack Obama e a presidente Dilma Rousseff estão entre os poucos com condições de olhar para o mundo como estadistas globais, e não apenas como líderes de seus países. Ambos têm biografia comprometida com valores e princípios, com bandeiras de luta. Têm ideias e sentimentos dos problemas mundiais. Além disto, como negro e como mulher, cada um deles tem uma gênese biopolítica diferente dos seus antecessores. O que lhes permite sentimentos e posições novas em relação ao futuro.

Por estas razões, a visita do presidente Obama ao Brasil e seu diálogo com a presidente Dilma nos permitem esperar um fato histórico, e não apenas mais um simpático gesto diplomático. De início já se percebe a grandeza de ambos ao lembrarmos que é a primeira vez que um presidente americano vem ao Brasil, antes de o colega brasileiro ir aos EUA.

Mas para ter uma marca histórica, será necessário que os dois presidentes transformem o encontro em uma reunião de cúpula de dois estadistas globais, definindo agenda comum para os problemas do mundo.

A proliferação de armas de destruição em massa e o terrorismo devem estar entre as principais preocupações desta agenda; aspectos comerciais não podem ser esquecidos, mas os problemas mundiais vão além. Os dois presidentes precisam colocar na agenda pelo menos três outros temas: a luta contra a pobreza, lembrando a fala da presidenta Dilma de que "mundo rico é mundo sem pobreza"; a subordinação da economia ao equilíbrio ecológico; e a defesa dos direitos humanos.

Roosevelt e Truman, já no espírito do estadismo da guerra fria, lançaram o Plano Marshall pela reconstrução da Europa; Kennedy, ainda no espírito da guerra fria, lançou o Alimentos para Paz e diversos programas de apoio ao desenvolvimento econômico de cada país subdesenvolvido. Obama e Dilma devem ir muito além, adaptando-se às exigências do mundo global no século XXI. Não mais unilateralmente vindo dos EUA e não mais apenas de desenvolvimento econômico de cada país.

Devem juntos lançar as ideias de um plano social global de luta contra a pobreza, sobretudo por sua superação pela educação, com a adoção mundial de programas como o Bolsa Escola e o apoio à escolaridade com qualidade para todas as crianças do mundo. E apresentar linhas de uma Carta a ser submetida aos chefes de estado e de governo na reunião Rio + 20, em 2012. Dilma e Obama têm manifestado preocupações ambientais, especialmente em busca de fontes alternativas de energia, e poderiam levar em conjunto este discurso para o mundo. Assinar uma aliança atualizando o conceito da autodeterminação dos povos para levar em conta o mundo como um condomínio de países com responsabilidades mútuas: com os direitos humanos; contra o terrorismo; impedindo a proliferação de armas de destruição em massa; e permitindo o uso do avanço técnico a serviço de toda a humanidade.

Dilma e Obama representam países fortes e têm qualidades pessoais para transformar um encontro de dois presidentes em uma reunião de cúpula de dois estadistas globais. O Brasil, os EUA e o mundo, nós de hoje e as gerações futuras esperamos que eles aproveitem a oportunidade que a História, a biografia e o mérito de cada um estão nos oferecendo.

Cristovam Buarque é senador (PDT-DF).

FONTE: O GLOBO

Quando a infâmia compensa:: Clóvis Rossi

José Ignacio Torreblanca, pesquisador do Conselho Europeu de Relações Externas, exumou a Guerra Civil espanhola de 1936-1939 para tratar do caso da Líbia, em artigo para "El País".

Naquela época, a Liga das Nações, precursora da ONU, foi passiva ante um conflito em que "a legalidade e a legitimidade estavam de um lado, e a mera força bruta do outro". Ganhou, se ainda é preciso lembrar, a força bruta, comandada pelo general Francisco Franco, que instalou uma ditadura que durou até sua morte, em 1975.

Conclui Torreblanca: "Tanto a doutrina de não intervenção na Guerra Civil espanhola como o embargo de armas, que prejudicou especialmente o lado republicano, passaram à história da infâmia".

Pois é. O mundo dito civilizado está escrevendo, com sua insuportável inação na Líbia, mais um capítulo para a história da infâmia.

Afinal, em carta conjunta ao presidente do Conselho Europeu, Nicolas Sarkozy e David Cameron dizem que atos cometidos pelo ditador líbio "podem corresponder a crimes contra a humanidade".

E daí? A Europa, os Estados Unidos, as Nações Unidas vão assistir passivamente a mais um desses crimes, como antes em Ruanda, na Bósnia, em tantos outros lugares?

O fato de que agir é realmente uma decisão difícil não basta para atenuar a culpa pela omissão.

No caso da imposição de uma zona de exclusão aérea, que poderia ao menos reduzir a vantagem do tirano, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, lembra, com razão, que idêntica providência não impediu massacres nem no Iraque de Saddam Hussein nem pela Sérvia de Slobodan Milosevic.

Hillary esquece, no entanto, uma diferença talvez essencial: não havia nem no Iraque nem na Bósnia um movimento de libertação que buscasse ejetar os ditadores de plantão. Toda a ação era de forças estrangeiras, ao contrário do que ocorre agora.

Fica a nítida sensação de que ao Ocidente importa um pepino que morram árabes e muçulmanos. Afinal, quando morreram brancos (três) em uma discoteca de Berlim, em 1986, em ataque terrorista orquestrado por Gaddafi, o então presidente Ronald Reagan ordenou o bombardeio da Líbia.

Agora, fica esse festival de retórica, ameaças e reuniões -e ação zero. Se não quer ou não pode atuar por princípios, que o Ocidente ao menos reaja por interesse preventivo.
Como escreve Scott Stewart para o "site" geoestratégico Stratfor, a Líbia pode voltar a ser o ninho de terroristas que era quando do episódio da discoteca, entre outros. "O conflito na Líbia pode fornecer aos "jihadistas" mais espaço para operar do que o que gozaram em muitos anos", diz Stewart.

Reforça Christopher Boucek, pesquisador associado do Programa de Oriente Médio da fundação Carnegie: "Os islamitas libertados por Gaddafi e aqueles que escaparam da prisão durante a rebelião são agora capazes de operar em um ambiente de evaporação do controle do Estado, de abundantes depósitos de pequenas armas e de mal guardados estoques de agentes de guerra química".

O Ocidente vai somar a desídia à infâmia?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Lá Vem o Patto! :: Urbano Patto

Vejo agora as notícias do terremoto e do tsunami no Japão, e não consegui deixar de fazer imediatamente uma comparação com a tragédia na região serrana do Rio de Janeiro com as chuvas de verão, sobre as quais escrevi há algumas semanas atrás, na qual o número de mortos quase chegou a mil.

As notícias que chegam, nesse exato momento em que escrevo, num terremoto de 8,9 graus na Escala Richter e com ondas de 10 metros de altura do tsunami, os mortos e desaparecidos não chegavam a uma centena.

O terremoto não é tão previsível e sazonal como as nossas torrenciais chuvas de verão, porém, o contraste entre o que acontece lá e cá demonstra a surpreendente diferença de como as sociedades se preparam para enfrentar as catástrofes naturais. E, com certeza, essa comparação também serve para avaliar como devem tratar outras questões de interesse coletivo.

Não adianta, especialmente nossos dirigentes e lideranças em geral e autoridades públicas em especial, e nesse particular o ex-presidente Lula foi um das vozes e das personagens mais expressivas, ficarmos nos auto-glorificando, dizendo que falta pouco para chegarmos ao primeiro mundo, que a nossa criatividade supera nossas limitações, que o “jeitinho brasileiro” tem quase o status de uma nova abordagem tecnológica, ou que sob tragédias o povo brasileiro demonstra sua solidariedade e “não desiste nunca”.

Nessas horas, em que as comparações são tristes mas são possíveis, é que vemos a distância que ainda teremos que percorrer para que chamemos o Brasil com sinceridade e orgulho verdadeiro, de nação desenvolvida.

Não será com discursos ou ótimas peças publicitárias e nem somente com dinheiro (ou a promessa dele), que se mudará essa realidade. Há que se gastar tempo, esforço e paciência em planejamento, preparação e qualificação das pessoas e na construção pactuada e legitimada pela sociedade de projetos bem definidos, mensurados e aprazados.

Não dá para viver, ou tomar decisões, em espasmos ou apenas sob fortes tensões.
Depois das enxurradas é que “caiu a ficha” de que havia casas em áreas de risco, mas as pessoas já moravam lá.

Depois da rebelião é que se critica a superlotação das penitenciárias, mas os crimes já foram cometidos e os presos já estavam lá.

Depois da inflação ameaçar disparar é que desandam a fazer cortes nas despesas do governo e limitar o valor da correção do salário-mínimo, mas os gastos exagerados e mal feitos em 2010, ano eleitoral, já estavam lá.

Depois de ver as gravações de pacotes de dinheiro mudando de mãos é que dizem querer combater a corrupção, mas, na Câmara dos Deputados, eleita, com o voto popular, a deputada Roriz, filha de ex-senador e ex-governador ficha suja, já estava lá.

Mas, aqui não tem terremoto...

Urbano Patto, Arquiteto Urbanista e Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional, membro do Conselho de Ética do Partido Popular Socialista -PPS- do Estado de São Paulo. Comentários, sugestões e críticas para urbanopatto@hotmail.com.

FONTE: JORNAL DA CIDADE/ PINDAMONHAGABA/SP

Dilma recebe os sindicalistas, mas nega reivindicações

Apesar de regular participação de trabalhadores em conselho de estatais, presidente ignora apelo por correção maior da tabela do IR

Leonêncio Nossa

Depois de vencer as centrais sindicais na aprovação da proposta do governo de um salário mínimo de R$ 545, a presidente Dilma Rousseff ignorou apelos dos sindicalistas e anunciou ontem que enviará ao Congresso a medida provisória estabelecendo uma correção de 4,5% da tabela do Imposto de Renda.

As centrais pressionavam por um reajuste maior. Dilma aproveitou para informar que estuda novas faixas de contribuição do IR. Para demonstrar que saíam do gabinete de forma "honrosa", o deputado Paulinho Pereira da Silva (PDT-SP), da Força Sindical, e José Lopez Feijóo, da Central Única dos Trabalhadores (CUT), disseram, em entrevista após o encontro com a presidente, que exigiram, em contrapartida, uma política de correção da tabela do IR para os próximos quatro anos, com correções pelo centro da meta da inflação, que neste ano é de 4,5%. "A presidente disse que iria analisar com carinho a nossa proposta," afirmou Paulinho. Essa proposta, porém, já estava nos planos do governo.

Em entrevista à tarde, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, relatou que, no encontro com os sindicalistas, Dilma foi transparente ao afirmar que não havia "nenhuma possibilidade" de o governo fazer uma correção maior da tabela do IR. Na conversa com os jornalistas, ele disse que a proposta de correções anuais até 2014 poderá ser incluída na medida provisória em fase de elaboração para dar o reajuste de 4,5% neste ano. Carvalho ainda informou que o teto de contribuição do IR de 27,5% será mantido.

Dilma Rousseff apenas se comprometeu a orientar Gilberto Carvalho e Guido Mantega, da Fazenda, a receber todos os meses os sindicalistas. Os encontros vão discutir pedidos de reajuste do benefício de aposentados e pensionistas, mudança na jornada de trabalho e maior rigor no quesito acidentes.

Sem ter seus pedidos atendidos, os sindicalistas deixaram o gabinete de Dilma com convites para participarem de um almoço que ela oferecerá ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em Brasília, no próximo sábado. "Tá bom demais", ironizo um ministro.

Para compensar as derrotas dos sindicalistas, Dilma ainda participou de uma solenidade no Planalto de anúncio de uma portaria regulamentando uma lei que estabelece a presença de representantes de funcionários nos conselhos das empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias. A lei foi sancionada em dezembro passado, pelo presidente Lula. A participação de funcionários no comando das empresas era uma antiga reivindicação das centrais.

A presidente reconheceu a dificuldade da indústria nacional em concorrer com os produtos chineses e que é preciso corrigir o desequilíbrio. "O Brasil é exportador de commodities para a China, mas importa muita bagulheira", teria afirmado ela.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Com controle de 26 superintendências, petistas transformam Incra em feudo

Levantamento feito pelo ""Estado"" mostra que PT domina maioria das 30 regionais, cuja reformulação para evitar o loteamento político já é cogitada pelo atual governo; hegemonia ocorre desde o governo Lula, mas PMDB e PTB emplacaram nomes

João Domingos

Embora já exista uma proposta de reforma da estrutura do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que tem por objetivo acabar com o loteamento político dos cargos na autarquia, o governo não cumpre esse objetivo. Levantamento feito pelo Estado apurou que das 30 superintendências 26 estão nas mãos do PT. As quatro restantes estão com um técnico do próprio instituto, um representante da Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), um afilhado do PMDB e outro do PTB.

Entre as 26 superintendências controladas ou por petistas militantes ou por técnicos ligados ao partido, várias foram entregues à Democracia Socialista (DS), tendência interna do PT à qual pertence o ministro do Desenvolvimento Agrário, Afonso Florence. Ele substituiu Guilherme Cassel, da mesma ala, que havia entrado no lugar do gaúcho Miguel Rossetto, outro importante nome da corrente.

Esse setor petista posiciona-se mais à esquerda do que a ala majoritária, a Construindo um Novo Brasil (CNB), à qual pertence o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário é um feudo da DS. Quando a presidente Dilma Rousseff resolveu tirar Cassel, ela convidou em primeiro lugar para dirigir a pasta o senador Walter Pinheiro (BA), mas ele preferiu ficar no Congresso e indicou o nome de Florence. Procurado pelo Estado, Afonso Florence não quis se manifestar.

O domínio que a DS tem do setor agrário do governo é tão grande que pode tirar da presidência do Incra o petista Rolf Hackbart. Ele é ligado à ala da Igreja que atua no campo, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT). A substituição não ocorreu ainda porque a presidente Dilma Rousseff resistiria a ceder tanto espaço à DS num setor tido como problemático, violento e cujas metas de assentamento de trabalhadores rurais não é cumprida, informaram assessores do Palácio do Planalto.

Tradição. O domínio petista no Incra tem sido uma tradição desde a posse de Lula, em 2003. Mas outros partidos aliados vinham conseguindo ocupar algum espaço ali, como o PTB.

O superintendente de Goiás, Rogério Arantes, é sobrinho do líder do partido na Câmara, Jovair Arantes. Como o tio, ele é dentista. Há uma forte pressão do PT para que ele seja substituído. O argumento apresentado ao ministro Florence é que não há nenhuma lógica em ter um dentista no comando do Incra.

No Maranhão, a superintendência era controlada por um consórcio do PTB com o PMDB. Por influência do senador Epitácio Cafeteira (PTB-AM) e do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o Incra maranhense foi tocado durante o governo de Lula por Benedito Terceiro. No início do ano ele acabou preso pela Polícia Federal, durante a Operação Donatário.

De acordo com a PF, Terceiro seria um dos cabeças de uma quadrilha que desviava recursos destinados à construção de casas nos assentamentos. Houve um rombo de R$ 4 milhões em cinco anos. A Controladoria-Geral da União (CGU) calcula que os desvios chegaram a R$ 150 milhões. Para o lugar de Terceiro foi nomeado Luiz Alfredo Soares da Fonseca, técnico sem filiação partidária.

Sarney perdeu Benedito Terceiro no Maranhão, mas garantiu um aliado no Amapá. O Incra acaba de substituir Raimundo Picanço, um nome ligado ao PT, por Américo Távola da Silva, da cota do presidente do Senado. No Mato Grosso do Sul, Waldir Cipriano Neto, ligado ao PMDB, foi substituído por Manuel Furtado Neves, da ala petista. Em outubro, Cipriano Neto foi investigado pela PF sob a acusação de participar de um suposto esquema de compras superfaturadas de terras e vendas ilegais de lotes de assentamentos.

PARA LEMBRAR

Governo cogita mudar perfil do instituto

De acordo com a minuta de uma portaria que circula pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e cujo conteúdo foi revelado pelo Estado, em reportagem publicada quarta-feira, o governo analisa meios para ter maior controle sobre as ações dos superintendentes regionais do Incra. A forma que está sendo proposta é o fortalecimento do Conselho Diretor e a criação de uma Diretoria Geral, com poderes para fiscalizar diretamente os atos e aplicação dos recursos nas superintendências.

Na atual estrutura, os superintendentes agem de forma independente, tanto na definição de planos como na aplicação dos recursos. Um dos motivos que levaram o governo a estudar o assunto são os frequentes escândalos de corrupção nas superintendências.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Disputa envolve centenas de cargos em comissão

Presidente do instituto e superintendentes dispõem de 689 cargos em comissão, isto é, que podem ser ocupados por pessoas da escolha deles

Roldão Arruda

A discussão sobre a ocupação de cargos no Incra vai bem além da chefia das 30 superintendências regionais. No conjunto, o presidente do instituto e os superintendentes dispõem de 689 cargos em comissão, isto é, que podem ser ocupados por pessoas da escolha deles - ou de seus partidos. Segundo informações de assessores da entidade, mais da metade dessas cadeiras já está ocupada por servidores de carreira, chamados para postos de chefia. Mesmo assim sobram pelo menos 340 cadeiras, cujos ocupantes podem ser trocados assim que for nomeado o novo presidente e, na sequência, os superintendentes.

Outro fato a ser notado nessa discussão é que o presidente do Incra, embora seja tecnicamente subordinado ao ministro do Desenvolvimento Agrário, possui mais poder de fogo do que ele. A começar pelo número de funcionários sob seu comando: dispõe de 6 mil, enquanto os do ministro beiram a 250.

No ano passado, dos R$ 6,3 bilhões destinados pelo governo ao ministério, R$ 4,3 bilhões pousaram nos cofres do Incra, a autarquia federal que executa de fato quase todos os programas relacionados à reforma agrária. Só na compra de terras para a instalação de novos assentamentos, Rolf Hackbart, que deve deixar a presidência do Incra na próxima semana, despendeu R$ 934 milhões - quase metade do orçamento administrado pelo ministro, no valor de R$ 1,9 bilhão.

A superioridade do Incra se manifesta também no apoio às famílias assentadas (controla até programas de educação para assentados) e até em áreas onde não administra os recursos. É o caso do Programa Terra Legal, destinado à regularização fundiária na região amazônica: ele é executado pelos funcionários da autarquia, com dinheiro do ministério.

Essa disparidade entre o poder de fogo do subordinado e o do seu superior tem sido uma constante fonte de tensões. Funcionários da autarquia chegam a dizer que o ministério é dispensável. Também se afirma que a atual discussão sobre a necessidade de maior controle sobre as superintendências regionais, que são loteadas entre partidos políticos, destina-se na verdade a subordinar o Incra e transferir para as mãos do ministro a chave de todos os cofres.

As tensões ficaram mais visíveis após a posse de Dilma Rousseff, que gosta de falar em agricultura familiar e Bolsa Família, mas ainda é vista como uma incógnita em relação à reforma agrária - uma das principais razões da existência do Incra. Ela não nada até agora, por exemplo, sobre a necessidade de atualizar o Programa Nacional de Reforma Agrária, que foi uma prioridade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no início do seu governo.

O ministro Afonso Florence, que é ligado à Democracia Socialista, corrente ideológica do PT que domina o ministério desde 2003, vem exibindo por sua vez um discurso cada vez mais alinhado com o da chefe, e, consequentemente, mais distante do pessoal do Incra. Para piorar, ele ainda não reclamou abertamente do corte em seu orçamento para 2011, promovido no bojo do enxugamento geral de despesas, no valor R$ 50,1 bilhões, anunciado recentemente por Dilma.

É nesse cenário que são avaliadas propostas de reestruturação do Incra, para evitar o loteamento político das superintendências regionais e dar mais eficiência à sua administração e à aplicação dos recursos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Fantasma da hiperinflação ainda custa muito caro ao país

Felipe Salto

Em reunião com a presidente, as centrais não tiveram suas demandas atendidas. Provavelmente, o cálculo feito por Dilma considerou a lógica "custos fiscais x custos políticos" prevalecendo, por ora, a questão fiscal.

Foi o caso de não aceitar reajuste de 6,47% (INPC) para aposentados que recebem acima do salário mínimo, no lugar do reajuste concedido de 6,41% no início do ano, quando o índice ainda não havia sido oficialmente divulgado para o ano de 2010.

O custo fiscal da medida é baixo e o ajuste pelo INPC seria a medida correta pela lógica de recomposição de perdas reais. Uma conduta fiscal austera é recomendável à condução da inflação ao centro da meta (4,5% ao ano), sendo o mínimo crucial para isto.

Isso porque ele serve de indexador para vários programas sociais, incluindo o INSS, de modo que qualquer reajuste irresponsável poderia gerar benefícios sociais imediatos, mas também custos elevados. O governo até ouviu os sindicalistas, mas a única ação foi a abertura de uma "mesa de negociações" com o governo, que será permanente.

Também o reajuste da tabela do IR deverá ser mesmo pela meta de inflação, que implicará renúncia de receitas da ordem de R$ 1,6 bilhão, segundo a Fazenda.

Essa é outra medida justificável, pela mesma lógica, e que já deveria estar na conta do governo, mas o custo não é desprezível e afeta Estados e municípios, uma vez que o Imposto de Renda é um dos tributos partilhados entre todos os entes da federação.

A demanda por um reajuste alinhado à inflação passada não foi aceita, mas a presidente sinalizou positivamente com a possibilidade de definir uma regra para os próximos anos fixando a meta de inflação como indexador.

A recomposição de perdas impostas pela inflação ainda é fator importante na elaboração de políticas. Ela remete ao período de hiperinflação, mas é também sinal de que ainda convivemos com inflação elevada e que a sociedade é sensível a este problema.

Esse que só será resolvido com medidas que expandam a oferta e elevem a produtividade dos fatores de produção: infraestrutura e educação. Para este fantasma, não há outro exorcismo.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Réus do mensalão: sigilo quebrado

O Supremo Tribunal Federal determinou a quebra do sigilo fiscal dos 38 réus do processo do mensalão, suposto esquema de corrupção denunciado em 2005 pelo qual parlamentares receberiam dinheiro em troca de apoio político ao governo.

Segundo a assessoria do STF, o ministro Joaquim Barbosa (foto), relator do processo, solicitou à Receita Federal cópia da última declaração do imposto de renda dos denunciados. Na petição ao STF, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, diz que necessita das informações dos acusados de envolvimento no esquema “para que seja estipulada uma multa adequada à capacidade financeira dos réus”.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Almir Rouche - Valores do Passado

A mesma rosa amarela (*) ::Carlos Pena Filho

Você tem quase tudo dela,
o mesmo perfume, a mesma cor,
a mesma rosa amarela,
só não tem o meu amor.
Mas nestes dias de carnaval
para mim, você vai ser ela.
O mesmo perfume, a mesma cor,
a mesma rosa amarela.
Mas não sei o que será
quando chegar a lembrança dela
e de você apenas restar
a mesma rosa amarela,
a mesma rosa amarela.

* "A mesma rosa amarela" foi escrito por Carlos Pena Filho (morto em acidente de carro em 1960, com apenas 31 anos de idade) para o carnaval daquele ano.

Maysa - A Mesma Rosa Amarela/ Carlos Pena Filho