terça-feira, 1 de março de 2011

Reflexão do dia – Senador Aloysio Nunes Ferreira

Chegou a conta da gastança do governo Lula e da irresponsabilidade fiscal do governo passado para eleger sua candidata à Presidência. E o povo é quem vai pagar. Se compararmos a violência dos cortes ao orçamento com as declaração da então candidata Dilma, durante a campanha do ano passado, de duas uma: ou ela não sabia da realidade do país ou ajudou a ocultar esse quadro.

Senador Aloysio Nunes Ferreira. A oposição diz que Dilma descumpriu promessas. O Globo, 1/3/2011.

Credibilidade:: Merval Pereira

A confirmação pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que o Tesouro fará um novo aporte de recursos ao BNDES ofuscou o eventual brilho do corte de R$50 bilhões anunciado pelo mesmo governo. O ministro não revelou de quanto será esse aporte, mas no mercado há quem aposte em mais R$55 bilhões.

Um gesto de contenção de gastos renegado pela repetição da manobra contábil que permitirá que a economia volte a ser estimulada com um impulso fiscal de mais de 1% do PIB, manobra que vem tirando a credibilidade das contas públicas.

Todos os agentes econômicos consideram que o governo só recuperará a credibilidade se adotar medidas legais que impeçam esses truques contábeis.

A partir de 2008, com a eclosão da crise financeira internacional, o governo decidiu expandir a economia para combater seus efeitos.

Mas, para evitar que a dívida líquida aumentasse, em vez de capitalizar o BNDES da maneira tradicional, trabalhou por fora do Orçamento.

Um número que passou a ser observado com atenção, mesmo que não afete as estatísticas fiscais, é o da dívida bruta.

O Ministério da Fazenda está usando o que o mercado identifica como "um truque" para repassar recursos aos bancos públicos sem aumentar a dívida líquida, este, sim, um número que o mercado financeiro acompanha, especialmente sua relação com o PIB.

Desde junho de 2008, o volume de crédito do BNDES, que era insignificante para as contas públicas, subiu bastante, ficando em torno de 5% do PIB.

A dívida líquida do setor público, critério mais usado pelo governo e pelo mercado, que representava 61% do PIB em 2002, em janeiro de 2011 caiu para 40.1%.

Já a dívida bruta, antiga metodologia que foi usada até 2007 e que é a mais compatível com a adotada pelo FMI e pela maioria dos países, subiu para 63.9% do PIB.

Países que têm investment grade como o Brasil possuem uma dívida bruta em torno de 40% do PIB, embora os Estados Unidos já tenham chegado aos 80%, devido às medidas que tomou por conta da crise.

São várias as maneiras que o governo encontrou para maquiar as contas públicas. No ano passado, uma manobra fiscal da União na capitalização da Petrobras rendeu R$31,9 bilhões e levou a um superávit primário recorde em setembro, de R$26,1 bilhões. Sem a manobra, haveria déficit de R$5,8 bilhões.

No final do ano a Caixa recolheu R$4 bilhões de imposto por conta de uma briga judicial com a Receita Federal, um prejuízo que no seu próprio balanço não estava previsto porque a Caixa teria ainda um longo caminho a percorrer com recursos judiciais antes de pagar.

E, mesmo que tivesse que pagar ao fim de todos os recursos, poderia descontar do próprio governo, de quem é credora em R$15 bilhões.

As despesas de custeio - gastos do dia a dia do governo -, que sempre são pagas no mesmo ano, foram transferidas de dezembro do ano passado para janeiro, e, por acaso, o que o governo economizou em dezembro foi o que aumentou no custeio em janeiro, indicando que apenas se adiou a despesa para melhorar os números de 2010.

Há dez dias, foi anunciado que a Caixa receberá do Tesouro R$2,2 bilhões em ações da Petrobras e da Eletrobras, o que vai alavancar em cerca de R$30 bilhões sua capacidade de empréstimos, enquanto o BNDES receberá R$6,4 bilhões só em ações da Petrobras, que ampliarão em R$100 bilhões sua capacidade de financiar projetos, tudo sem impactar a dívida líquida do governo.

Outro truque que está sendo utilizado pelo governo é usar a rubrica "restos a pagar", adiando às vezes em anos pagamentos que deveriam ter sido feitos.

Esses pagamentos já chegam a mais de R$120 bilhões. Quando, nos anos 80 do século passado, o então ministro da Fazenda Delfim Neto acertou com o FMI essa contabilidade, os "restos a pagar" nem entravam na contabilidade oficial da dívida porque representavam muito pouco.

Mas hoje esses "restos" ganharam uma dimensão própria e transformaram-se em mais uma distorção das contas públicas.

Houve uma arrecadação recorde em janeiro de impostos que normalmente as empresas só costumam pagar em março, quando divulgam seus balanços.

Há a desconfiança no mercado de que foram empresas estatais pagando imposto antes da hora.

Perdeu-se o referencial, ninguém sabe se esse resultado de janeiro é bom mesmo ou se fruto de mais uma manobra.

Os créditos do Tesouro junto ao BNDES desde 2008 até dezembro de 2010 já ultrapassam R$230 bilhões, tendo chegado ao seu máximo em 2010 com R$107,5 bilhões, ou 2,9% do PIB, quando já não era necessário o governo estimular a economia, que vinha num ritmo de recuperação bom.

Agora então, que é preciso conter o ritmo da economia com cortes do gasto público, fica mais incongruente ainda fazer novo aporte ao BNDES.

FONTE: O GLOBO

Orientação pragmática:: Dora Kramer

Nessa história de janelas de infidelidade, fundação de novos partidos e fusões entre legendas, deflagrada pela decisão do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, de deixar o DEM, salvo lapso de memória apenas uma deputada levantou a questão programática.

Luiza Erundina, do PSB, que já avisou: se Kassab entrar por uma porta ela sai pela outra. Pelo motivo mais simples desse mundo e incluído pelo Supremo Tribunal Federal entre os casos em que a troca é permitida sem sanções: mudança de orientação programática do partido ao qual é filiado o insatisfeito.

O fato de Erundina ser exceção nesse debate cujo fio condutor é exatamente a orientação pragmática dos políticos em potencial mutação diz bastante sobre a política brasileira e as dificuldades de se fazer uma reforma digna desse nome.

Kassab, Guilherme Afif, Raimundo Colombo (governador de Santa Catarina) e mais a plêiade de políticos eleitos pelo DEM são socialistas exatamente desde quando?

A menos que tenham se convertido na mesma pia em que o empresário Paulo Skaf, então presidente da Federação das Indústrias de São Paulo, se batizou socialista para poder disputar o governo de São Paulo em 2010.

Justiça se faça, seguem apenas a prática da total desconexão entre os programas dos partidos, suas ideologias (quando existentes) e o comportamento de seus filiados.

Da Social Democracia o PSDB não guarda resquícios; o PMDB desde o fim da ditadura virou uma confederação com financiamento público de interesses particulares; o PDT de Leonel Brizola desmilinguiu-se ao tornar-se braço parlamentar da Força Sindical; O PTB de trabalhista só guarda o nome; o PT faz qualquer negócio pelo poder.

Mais ou menos ideológico firmou-se o DEM, na tentativa de livrar-se da marca fisiológica do PFL. Recentemente ensaiou afirmar-se como liberal no sentido conservador do termo. Mas, como determinadas teses definidas como de direita remetem à época da ditadura, sucumbiu.

E que não se diga que perdeu espaço por causa do escândalo Arruda, porque nesse quesito outras agremiações deram contribuições mais eloquentes e nem por isso ganharam passaporte para o vinagre.

O problema principal do partido parece ter sido uma combinação de oposição sem trégua ao guia genial dos povos e uma reformulação interna malfeita e com condução ainda pior.

Pois muito bem, e o que tem o PSB para se tornar atrativo de tantos? Ideias, ideais, propostas, plataformas?

Não. Tem um presidente promissor, na figura do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, exibiu expressivo crescimento na última eleição, tem trânsito no governo e na oposição e principalmente proximidade com o Palácio do Planalto.

Tradução: representa excelente oportunidade para quem enfrenta dificuldades eleitorais nos partidos atuais e tem o maior interesse em engordar suas fileiras. Ademais, para quem aposta que Lula voltará em 2014 é uma excelente forma de, sem querer querendo, se associar à monumental máquina de produzir votos.

Já o pensamento, a consistência, a identidade ideológica, a luta de cada partido hoje perdedor para se transformar em vencedor corrigindo os próprios erros, sabe como é: dá muito trabalho sem resultado imediato assegurado.

À francesa. O colega Gabriel Manzano Filho garimpou esta: na França o costume, não a lei, manda que ministros abandonem seus cargos quando perdem eleições.

O argumento é o de que o perdedor possa usar o posto para se vingar dos adversários que o derrotaram.

Exemplo: Alain Juppé tinha sido convidado pelo presidente Nicolas Sarkozy para ser ministro do Meio Ambiente. Tomou posse e 19 dias depois disputou e perdeu a eleição legislativa em Bordeaux.

Resultado: precisou renunciar ao ministério.

Por aqui ocorre exatamente o contrário: ao perdedor, se amigo do poder, há sempre um alto cargo reservado como recompensa pelo pífio desempenho.

Tipo da regra que não precisa de lei. Só de mentalidade referida no espírito público.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Ingleses e inglesas:: Eliane Cantanhêde

Além herdar o mesmo marqueteiro, João Santana, Dilma Rousseff está seguindo no mínimo uma lição do seu antecessor e padrinho: mantém um olho esperto no mercado e outro nos milhões de eleitores miseráveis que ainda habitam esse Brasil tão varonil e que está estreando a primeira mulher na Presidência da sua história.

Ontem, foi a vez de agradar aos tais mercados, ou seja, bancos, investidores e produtores. Foi para eles, às vésperas da reunião do Copom (o comitê definidor dos juros), que Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) ratificaram os cortes inéditos de R$ 50 bilhões. A Bovespa subiu.

As piores tesouradas são, nominalmente, nos ministérios das Cidades (R$ 8,6 bi) e da Defesa (R$ 4,4 bi) e, proporcionalmente, nos do Turismo (R$ 3,1 bi) e dos Esportes (R$ 1.5 bi). As emendas parlamentares foram comidas em 70%.

A tesoura não perdoou o "Minha Casa, Minha Vida", carro-chefe do marketing de Dilma na campanha do ano passado. Serão cortados R$ 5,1 bi -40% do total previsto.

A oposição reage dizendo que os cortes são para pagar a "conta da campanha" de Dilma em 2010. Ou seja, para compensar a gastança de Lula para eleger a sucessora.

Segundo o PSDB, os cortes foram só virtuais, "para inglês ver". E o DEM insiste: nada poderia confirmar tão cabalmente a "farra" fiscal dos últimos anos do governo Lula.

Mas, se Dilma tentou mostrar ontem para os "ingleses" e mercados que é uma moça durona e rigorosa com as contas públicas, ela hoje vai assumir um outro papel: a de "presidenta" boazinha, "mãe dos pobres" -ou melhor, "das pobres".

Preste atenção nas fotos. Em Brasília, delegou aos ministros o pacote de maldades. Na Bahia, é ela, em carne e osso, quem anuncia um saco de bondades e o aumento do Bolsa Família para comemorar o dia da Mulher, 8 de março.

É ou não é o mesmo pacote lulista de popularidade?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Na "República do Relatório":: Raymundo Costa

Incomoda o PT e o governo o noticiário sobre eventuais divergências entre a presidente Dilma Rousseff e seu antecessor no cargo, Luiz Inácio Lula da Silva. Aparentemente, o que acontece é efeito colateral de uma até agora bem sucedida operação de marketing para marcar diferenças de estilo, acentuar as virtudes e criar uma personalidade política para Dilma Rousseff.

Trata-se de uma operação a seis mãos. As mãos da "presidenta", como Dilma prefere ser chamada, e as mãos do ministro Antonio Palocci (Casa Civil), a principal referência do governo nesses dois meses de mandato, e as do jornalista João Santana, marqueteiro da campanha eleitoral de Dilma. Santana, como se sabe, acha que há um lugar vazio a ser ocupado no imaginário político do brasileiro, o da "rainha". Ele quer coroar Dilma Rousseff.

Essa operação foi desencadeada no fim do ano passado, mas ganhou força em janeiro, com a posse do novo governo, e fevereiro, com o reinício dos trabalhos do Congresso.

Assim como ocorreu em janeiro, quando os dois outros Poderes se achavam em recesso, é positivo o balanço do governo Dilma no primeiro mês - fevereiro - de funcionamento pleno também do Congresso e do Judiciário. Nesse período, características da presidente foram ressaltadas pelo marketing e assimiladas, algumas delas mais, outras menos, pela opinião pública.

A primeira é a qualidade de boa gestora, uma executiva atenta a todos os movimentos da administração. Diga-se que o governo Dilma já está sendo chamado, entre os mais próximos, de "República do Relatório". Seja qual for o assunto, a presidente pede um relatório e explicações bem detalhadas.

Em segundo lugar, a imagem da governante destemida: não existe tema espinhoso que a "presidenta" não enfrente. Os exemplos já se multiplicam. Do adiamento da compra de armamentos, especialmente o novo caça da FAB, há mais de dez anos em banho-maria, até o corte de R$ 50 bilhões no Orçamento Geral da União (OGU), anunciado ontem, passando, pela fixação do novo salário mínimo de R$ 545, contra a vontade das centrais sindicais.

Por fim, Dilma "jogou duro" com o Congresso, o que costuma ser motivo do aplauso de onze em cada dez brasileiro. E ainda contou com a colaboração involuntária do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que esperneou até na web a perda das boquinhas que mantinha em Furnas Centrais Elétricas. O PMDB começou o governo falando em seis ministérios; contentou-se com quatro e um Orçamento menor do que controlava no governo do presidente Lula.

Por tudo o que fez com os partidos, pode-se dizer que Dilma saiu-se de maneira excepcional nas primeiras votações de interesse do Palácio do Planalto.

Na Câmara, a contabilidade da Arko Advice, empresa de consultoria de Brasília, registrou o apoio médio de 63,84% dos 373 deputados que integram a base nominal de apoio do governo. No Senado, este percentual foi de 50,46% dos 61 integrantes da coalizão governista. Números, nos dois casos, acima do apoio médio dos aliados nos dois mandatos de Lula.

Esses índices não devem ser entendidos como salvo-conduto para o mandato de Dilma. No início, os governos naturalmente costumam atrair o centro político, não importa sua ideologia (foi assim com Lula e FHC), numa espécie de reconhecimento da soberania popular exercida na eleição. Os governantes aproveitam esse período de lua de mel para apresentar programas, acentuar prioridades e desenhar o perfil do mandatário.

Apesar da média de apoio menor, no primeiro ano de governo os índices de Lula não foram muito diferentes, considerando-se, sobretudo, que o PMDB e outros partidos que agora chegaram ao governo em aliança com o PT não estavam formalmente na coalizão eleitoral de 2002.

Dois exemplos: o texto base da reforma da Previdência Social foi aprovado, em agosto de 2003, com 358 votos, bem acima do quórum constitucional de 308 deputados (mais de 20 petistas se declararam contrários ao projeto, mas 62 deputados da oposição votaram com o governo).

Outro exemplo ocorreu em setembro do mesmo ano, com a votação do projeto de reforma tributária, uma fonte de conflito entre os entes federados, que obteve 378 votos favoráveis. É certo que, depois disso, a reforma voltou ao limbo no qual se encontra há quase duas décadas, mas não deixou de ser uma impressionante manifestação de força de Lula. Ainda assim o Congresso foi a principal fonte de instabilidade do primeiro governo do ex-presidente.

O Congresso entra para valer em ritmo de funcionamento ordinário nos próximos dois ou três meses, período em que as eleições de 2012 também entram no radar dos partidos. A rigor, nenhuma sigla ficou satisfeita com a composição do ministério, do PT ao PCdoB, passando por PMDB e PSB. Mas ninguém se arriscou na empreitada de contestar as escolhas da presidente. O contencioso ainda surdo cresceu ontem com os cortes no OGU, que atingiu mais os ministérios de alguns partidos aliados (PMDB) do que de outros (PT).

A presidente e os congressistas dedicaram-se, até agora, a um reconhecimento mútuo de terreno. Dilma testou sua base de apoio, mas não sem uma ponta de receio em relação à reação que teriam os aliados; os congressistas aceitaram sem mais barulho as decisões da presidente por não saberem qual seria sua reação - eles ainda "calculam" o que Dilma é ou não capaz de fazer. Mas sua fama a precede.

Dizem petistas que erra quem aposta que Dilma vá acentuar ainda mais as diferenças com o ex-presidente da República. Não interessa a ela. O raciocínio é o seguinte: a mídia que hoje aplaude Dilma pode ser a mesma que vai criticá-la amanhã, ao primeiro sinal de dificuldades. Diferentemente das centrais sindicais aliadas e dos movimentos sociais. Estes podem até protestar contra o governo (espera-se por reclamações do corte no orçamento da reforma agrária do MST e movimentos afins). Mas estarão na linha de frente de defesa da presidente, em caso de uma crise política no Congresso.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Empurra que pega:: Wilson Figueiredo

Nos grandes hiatos históricos, como começam a parecer estes cem dias marcados pelo estilo Dilma Rousseff, vem implícita a recomendação de deixar transcorrer o tempo, sem perder de vista como tudo estará depois (no caso, o carnaval). A marchinha de Lamartine Babo adotou o carnaval como referência nacional, pois nele o Brasil, em homenagem a Cabral, dá uma freada de arrumação e só recomeça na data do descobrimento, “dois meses depois do carnaval”. Em seguida, Perí e Ceci se beijaram, ao som do Guarani (de Carlos Gomes), surgiu a feijoada e mais tarde o parati. Fórmula infalível.

O velho princípio que recomenda ficar como está, para ver o que acontece, não deixa de ser o fim de um modo de ver que se repete com pequenas variações. Cansou. Deixar como está é um círculo vicioso que leva de volta ao ponto de partida. Já está demonstrado que melhor não fica. De que adiantaria apelar para a fórmula segundo a qual, por falta de melhor, é deixar como está para ver? Não se verá nada de novo.

Esse velho modo de hesitar padece de vista cansada. Como também não é o caso de Lula se aplicar ao prelúdio da reforma política, com a qual não quis perder tempo quando era presidente. Na condição de ex, não mostra maior interesse, exceto se puder esbanjar presença no noticiário. Ele guarda mágoa de não ter sido considerado previamente e, para não ter de se explicar, espera uma boa oportunidade? Quem sabe uma contra-reforma?

Com o bom conceito que faz do seu período, Lula se põe à disposição das contradições. Claro que, para um ex-presidente, ser exceção entre os antecessores não deixa de destoar. Com as estridências do carnaval, as considerações preliminares a respeito da reforma política ainda não parecem suficientes para garantir sustentabilidade à iniciativa. Pela frente, além do que falta cumprir da cota dos cem dias, acrescentam-se os 40 da Quaresma e a semana santa. Assim, se a iniciativa não arrefecer, será pela interferência presidencial, que paira acima de qualquer suspeita em relação ao antecessor e ao passado.

O bloco da reforma política pondera que, depois do carnaval, será preciso lidar com negociações acumuladas por suspeitas republicanas. Por outro lado, se for para erradicar privilégios que indispõem os eleitores contra políticos em geral, os ameaçados farão corpo mole para começo de conversa. Em último caso, meia dúzia de boatos bem concatenados e encaminhados ao conhecimento público farão o serviço. A contra-reforma entrará em cena. Já constou que o presidente Lula estava de língua passada com as centrais sindicais para enrolar a reforma e intimidar os figurões.

Falta à proposta de reforma política, antes de tudo, participação popular. No entanto, participação popular em dose cavalar mais complica do que simplifica. Trata-se de escolher uma ou outra: reforma ou revolução, e não misturá-las, porque aí excederia o conceito de reforma e não chegaria a ser revolução.

Os porta-vozes da reforma política sabem que a idéia de reforma acumulou com a República uma dívida superior à capacidade de administrá-la. Para desencaminhar a reforma, nada mais indicado do que multiplicar as divergências e deixá-la de molho.

Para começar o novo ciclo, o ex-presidente começaria, discreta e pronominalmente, por personalizar o nome do bloco que se baseia em motor de automóvel que só pega com um bom empurrão: Empurra que pega passaria a Me empurra que pego, no finzinho do Leblon, onde a escultura de Zózimo Barroso do Amaral espera pela pracinha com seu nome. É verdade que Lula injetaria substância popular na reforma política. Mas quem se dispõe a amarrar o guizo no pescoço do gato desconfiado?

FONTE: JORNAL DO BRASIL

Tesoura e Tesouro:: Míriam Leitão

O adiamento da compra dos caças é uma das poucas propostas concretas de redução de despesas no anúncio de ontem. O que houve de contraditório no anúncio foi a informação de que um novo aporte ao BNDES será feito na semana que vem. É tirar lenha da fogueira e colocar outra. Tornou-se perigoso hábito o de anualmente o Tesouro se endividar para transferir dinheiro para o banco em supostos empréstimos.

O BNDES sempre viveu com os seus fundos, como o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), o retorno dos créditos concedidos e as capitalizações do Tesouro. Com o dinheiro que será transferido este ano pelo Tesouro, o banco vai acumular perto de R$300 bilhões de recursos recebidos desta estranha nova fórmula, desde 2008. Se tivesse se limitado ao período mais agudo da crise, em 2009, seria possível entender. Por ter se tornado prática comum, virou orçamento paralelo. O Tesouro finge que empresta e assim os números não entram na contabilidade da dívida líquida, já que supostamente no futuro o banco vai pagar. Isso não é arriscado apenas do ponto de vista fiscal: reduz a transparência, tira a consistência dos indicadores fiscais, concentra a renda e reduz a qualidade da democracia.

O ministro Guido Mantega disse que os subsídios foram cortados da previsão original. Serão R$7 bilhões, dois bilhões a mais do que no ano passado, mas abaixo do previsto. O corte, explicou, é porque serão elevados os juros do BNDES. Ele se referia a um específico programa, o Programa de Sustentação de Investimento, que tem juros ainda mais baixos do que os normais. Todo o subsídio do BNDES deveria estar no orçamento para que a sociedade acompanhe as despesas feitas com o seu, o meu, o nosso dinheiro.

As contas públicas precisam ter transparência porque assim se firma o conceito democrático de que os contribuintes têm o direito de saber de quem o governo recolhe seus impostos e a quem os transfere. Por isso, jornalistas que têm paciência para ficar detalhando cada gasto, entrando nas rubricas, fazendo conta, estudando o orçamentês e transmitindo tudo isso ao público estão, na verdade, fazendo um trabalho de ampliação da democracia. Ontem, vários desses profissionais estavam reclamando da falta de informações durante a entrevista. A ministra Miriam Belchior repetiu inúmeras vezes a expressão "calma, gente", como se estivesse diante de alunos da pré-escola. Alguns deles são profissionais maduros e com mais conhecimento do tema do que muito funcionário recém-chegado no governo, principalmente os recrutados na militância. O ministro Guido Mantega disse que não distribuiria, naquele momento, as cópias dos slides com os dados dos quais falava porque, do contrário, ninguém prestaria atenção nele. Distribuiria depois. Isso é erro de comunicação. Os dados precisam ser divulgados com antecedência para que os jornalistas especializados possam entender, ver as inconsistências, fazer contas, consultar analistas, e depois tirar suas dúvidas com as autoridades que estavam ali para dizer que estão cortando R$50 bilhões do orçamento.

Nem todo corte é bom. Os cortes não são virtuosos por si mesmos. É preciso entender onde mesmo foi cortado, de que forma foram feitos os cálculos, que escolhas fizeram os gestores públicos para entender a consistência ou qualidade dos cortes. Os números não podem ser despejados sobre os jornalistas para que eles os aceitem num ato de fé. É fácil acreditar que vão ser cortadas 50% das verbas de viagens, porque isso depende apenas da ordem de não viajar. Mas como se calcula exatamente o que será reduzido de gasto com o resultado de uma auditoria que ainda não foi feita? Ou como se decide que 10% dos gastos com seguro desemprego serão reduzidos em fraudes que serão encontradas no futuro? O ministro Guido Mantega fez uma suposição interessante: as despesas com seguro-desemprego devem ter fraude porque estão aumentando num período em que caiu o desemprego. É, pode ser fraude. Mas como está havendo, felizmente, mais formalização, há também um potencial maior de pedidos de seguro-desemprego no futuro, porque, como se sabe, só trabalhadores formais têm esse direito.

O ministro Guido Mantega continua com seu contorcionismo para tentar convencer seus interlocutores de três ideias diferentes: de que realmente mudou e agora está convencido de que o controle dos gastos é necessário; de que nunca mudou e sempre foi austero; de que o seu corte de gastos é diferente dos cortes de outros governos porque manterá a economia crescendo no mesmo ritmo. Ele precisa escolher uma versão das três e se concentrar nela para ser convincente para alguém. Desse jeito, sempre confundirá quem o ouve.

Nos últimos anos o governo aumentou muito os gastos públicos e isso se traduz num número que é o mais relevante: ano a ano, nos últimos 16 anos, tem aumentando a carga tributária. O contribuinte está se sentindo asfixiado pelos impostos e já ouve dizer que voltará a CPMF ou algum sucedâneo do imposto do cheque. Falo em 16 anos porque antes disso é difícil confiar nos números; a alta inflação distorcia tudo. Nesse período, houve anos de controle de gastos, como no segundo mandato do governo Fernando Henrique e nos primeiros anos do governo Lula. A crise de 2008 foi usada como pretexto pelo governo para ampliar os gastos sob o argumento de que era preciso mitigar o efeito da recessão vinda de fora. Isso faz sentido. O que não fez sentido foi manter os mesmos estímulos em 2010, quando o país já estava crescendo num ritmo que, ontem, o ministro Guido Mantega disse que não é sustentável.

FONTE: O GLOBO

"Inside Job", documentário imperdível:: Luiz Gonzaga Belluzzo

O sempre instigante Eu& Fim de Semana publicado nas edições de sexta-feira do Valor, ofereceu a seus leitores uma entrevista do economista Lawrence Summers. Summers, entre outras proezas, ficou conhecido por declarações polêmicas. Recomendou o incentivo à deslocalização de indústrias poluidoras para os países da periferia. Reitor de Harvard, Summers decretou a incapacidade da inteligência feminina em lidar com as complexidades das "hard sciences".

Observei Summers no café do pavilhão onde se realizava a reunião do Fórum Mundial Davos, em 1993. Entre um gole de café e outro, Summers iniciou um sermão aos circunstantes sobre políticas econômicas nos países em desenvolvimento. As lições de Summers sucederam uma tertúlia sobre a economia mexicana que, segundo os participantes da mesa, navegava de velas enfunadas rumo à prosperidade. Não faltaram reverências e salamaleques ao então presidente Salinas de Gortari e a seu ministro da Fazenda, Pedro Aspe.

Sentados na plateia, o professor Carlos Antonio Rocca e este locutor que vos fala, entre estarrecidos e irritados, ouvíamos os julgamentos peremptórios que fluiam do debate entre os sabidos da academia e financistas mais sabidos ainda. As opiniões iam da celebração incondicional do modelo mexicano às referências derrisórias ao Brasil. Digo estarrecidos porque, naquele momento, o México apresentava um déficit em transações correntes de 8% do Produto Interno Bruto (PIB), déficit fiscal elevado e a dolarização galopante de sua dívida interna, infestestada de Tesobonos.

Em dezembro de 1994, o México quebrou vítima de uma "parada súbita" e só sobreviveu com o socorro do Tesouro Americano e do Fundo Monetário Internacional (FMI), providência destinada a salvar os bancos de Tio Sam. Summers, então subsecretário do Tesouro de Clinton capitaneou a operação de salvamento.

Não havia como escapar da impressão de que Summers era encarnação mais acabada do personagem de Molière, o "idiot savant", cheio de si, como tantos outros que se abrigam sob o manto hoje prestigioso dos estudos da economia. (Evito a expressão ciência econômica para evitar que o ego já inflado dos sabichões sofra um processo fatal de inchaço e implosão).

Pois Summers é um dos personagens centrais do imperdível documentário "Inside Job" de Charles Ferguson que, na madrugada de ontem, levou o Oscar na sua categoria. O título do filme foi traduzido para o português como "Trabalhos Internos" - é lamentável a falta de imaginação do tradutor, que provavelmente não viu o filme. "Inside Job" é uma expressão idiomática. Um amigo, mais versado do que eu no idioma de Shakespeare, sugeriu "Trabalhos Promíscuos".

O documentário mostra que Summers faturou uma nota preta ao ministrar palestras remuneradas pelos senhores do Universo sobre as maravilhas da desregulamentação financeira. Entre suas idas e vindas ao governo, dedicava-se a assessorar instituições financeiras mediante farta remuneração. Não sei se ele está no rol de 19 economistas investigados no estudo do seu colega Gerald Epstein, da Universidade de Massachusetts Amherst.

O estudo trata do conflito de interesses entre a atividade acadêmica, a ocupação de funções no Estado e as atividades de consultoria, quando os personagens não advertem a opinião pública a respeito de suas ocupações e pertinências. Essa confusão de papéis está gerando um movimento entre os economistas americanos para a adoção de um código de ética.

Não se trata de limitar as atividades profissionais dos economistas, mas sim de tornar claro ao público que as opiniões podem estar viciadas e deformadas pela infiltração de interesses estranhos à independência acadêmica e à função pública.

Enquanto secretário do Tesouro de Clinton, Lawrence Summers trabalhou intensamente para a aprovação no Congresso dos Estados Unidos do Gramm-Leach-Bliley Act. Essa lei derrotou a legislação dos anos 1930, o Glass-Steagal Act, que separava os bancos de depósito, os bancos de investimento, seguradoras e instituições voltadas para o financiamento imobiliário e "fundeadas" na poupança das famílias.

Os mercados financeiros contemporâneos lograram capturar os controles da economia e do Estado, mediante o incrível aumento do seu poder social e político. As transformações ocorridas no sistema financeiro desataram a livre e brutal concorrência no capitalismo da grande empresa e das grandes instituições financeiras.

A expressão grande demais para falir esconde mais do que revela. Nos últimos anos, a securitização e a alavancagem construíram uma teia de relações de débito e crédito entre as grandes instituições espalhadas pelo mundo. Os bancos de investimento e os demais bancos sombra aproximaram-se das funções monetárias dos bancos comerciais, abastecendo seus passivos nos "mercados atacadistas de dinheiro" ("wholesale money markets"), amparados nas aplicações de curto prazo de empresas e famílias. Não por acaso, a dívida intrafinanceira como proporção do PIB americano cresceu mais rapidamente do que o endividamento das famílias e das empresas. Esse fenômeno corresponde ao controle da riqueza social pelas instituições privadas, o que torna impossível a omissão dos bancos centrais quando um elo da cadeia se rompe.

O depoimento mais constrangedor, entre tantos de "Inside Job", é prestado pelo economista Frederick Mishkin. Ex-membro do Federal Reserve, Mishkin não consegue explicar porque às vésperas do colapso dos bancos da Islândia produziu um relatório que assegurava a estabilidade do sistema financeiro do país, mediante o estipêndio de US$ 124 mil.

Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e professor titular do Instituto de Economia da Unicamp.

O que pensa a mídia

Editorial dos principais jornais do Brasil
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446 anos da cidade maravilhosa: Ela é carioca/Tom Jobim

PPS, PV, PSDB e DEM protocolam, nesta terça, ação no STF contra mínimo por decreto

Ação de partidos no STF aponta inconstitucionalidade de projeto

Da Redação

Os partidos que votaram contra a fixação do salário mínimo por decreto (PPS, PV, PSDB e DEM) ingressam, nesta terça-feira, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir que o aumento do piso dos trabalhadores brasileiros seja definido até 2015 pela presidente Dilma Rousseff (PT). A lei foi sancionada sexta-feira pela presidente da República e publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira.

Representantes dos quatro partidos, com suas respectivas assessorias jurídicas, darão coletiva às 14 horas, no plenário 13 do anexo II da Câmara, para explicar detalhes da ação.

Segundo o presidente nacional do PPS, deputado federal Roberto Freire (SP), o objetivo principal dos partidos é defender a Constituição e as prerrogativas do Congresso Nacional de legislar. " Essa não é uma questão de oposição ou governo, direita ou esquerda. Todos que defendem a Constituição estão unidos", afirmou Freire, que quer garantir que o Legislativo e a sociedade organizada debatam anualmente um reajuste maior para os trabalhadores.

O presidente do PPS lembra que o artigo 7º da carta magna é muito claro quando estabelece que o mínimo só por ser "fixado em lei". A ação pode receber ainda o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na semana passada, em reunião com Freire, o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, afirmou que, em tese, a fixação do salário mínimo por decreto é inconstitucional. Alguns ministros do Supremo também já se posicionaram contrários à matéria.

Para o o senador Itamar Franco (PPS-MG), vice-presidente do PPS, a aprovação do projeto que fixa o salário mínimo por decreto é "o primeiro ato institucional do governo Dilma". Durante a votação da matéria no Senado, ele criticou a manobra do governo por ser, na sua opinião, um golpe contra a lei maior do país. "Traidor da Constituição é traidor da Pátria", disse Itamar, ao citar o ex-presidente da Câmara Ulysses Guimarães.

FONTE PORTAL DO PPS

Os cortes de Dilma: Habitação popular perde quase metade das verbas

Programa Minha Casa, Minha Vida é o mais atingido pelo bloqueio

Para cortar R$ 50,087 bilhões no Orçamento deste ano, o governo promete reduzir investimentos, gastos sociais e subsídios do programa de habitação Minha Casa,Minha Vida. Uma das estrelas do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o Minha Casa, Minha Vida terá a verba reduzida de R$ 12,7 bi para R$ 7,6 bi - corte de R$ 5,1 bi, o que equivale à construção de 200 mil casas populares este ano. A equipe econômica reduziu em R$ 15,7 bi despesas obrigatórias, sendo R$ 3,5 bi com pessoal e encargos sociais. Concursos para contratação de pessoal estão suspendos. O ministro Guido Mantega afirmou que os cortes são uma estratégia para manter o crescimento, sem risco de inflação. Para especialistas, mais que reduzir despesas, o governo deu um sinal ao mercado.

Tesoura atinge PAC e área social

Investimentos também serão cortados, ao contrário do que prometia o governo

Regina Alvarez, Cristiane Jungblut e Martha Beck

O corte de R$50,087 bilhões nas despesas do Orçamento vai atingir investimentos, a área social e o programa Minha Casa, Minha Vida, uma das estrelas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O orçamento do Minha Casa, Minha Vida cai de R$12,7 bilhões para R$7,6 bilhões, um corte de R$5,1 bilhões, que equivale à contratação de 200 mil unidades em 2011. Com isso, a meta de 500 mil unidades cai para 300 mil.

A justificativa do governo para os cortes no orçamento do programa Minha Casa, Minha Vida é que a segunda fase do programa, incluída em uma medida provisória, ainda não foi aprovada pelo Congresso e a previsão é que isso aconteça só em abril. Assim, a execução das despesas programadas para o ano foi reestimada.

Para chegar aos R$50 bilhões, a equipe econômica fez malabarismos, revendo para baixo despesas obrigatórias com pessoal, benefícios previdenciários e o seguro-desemprego. Parte dessa economia não está garantida, porque depende do resultado de auditorias e de esforço de fiscalização que ainda não pode ser mensurado.

O governo anunciou redução de R$15,76 bilhões em despesas obrigatórias: R$3,5 bilhões com pessoal e encargos sociais, R$2 bilhões nos benefícios previdenciários, R$3 bilhões no abono e seguro-desemprego e R$8,9 bilhões nas despesas com subsídios e subvenções.

Mantega: adaptação a "novos tempos"

Além disso, foram cortados R$19,4 bilhões em investimentos, incluindo despesas já previstas na proposta de Orçamento encaminhada ao Congresso pelo Executivo e as emendas parlamentares. O corte nos gastos de custeio chega a R$13,3 bilhões, mais os R$5,1 bilhões do Minha Casa, Minha Vida, contabilizados no Orçamento como subsídio e incluídos nas despesas de custeio, segundo informou o Ministério do Planejamento.

No total de cortes foram computados R$18 bilhões de emendas parlamentares - R$14,9 bilhões de investimentos e R$3,1 bilhões de custeio - e mais R$1,6 bilhão em despesas vetadas do Orçamento na sanção da lei orçamentária.

Ao detalhar os cortes, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao lado da ministra do Planejamento, Miriam Belchior, destacou que os cortes não significam mudança na política econômica, mas estratégia para manter o crescimento sustentado, sem risco inflacionário.

- Tem gente falando que estamos fazendo algum corte ortodoxo. Isso não é verdade. A política econômica do governo não mudou e nem teria razão para mudar. Ela é bem sucedida e está levando o país ao desenvolvimento. A política está sendo adaptada aos novos tempos que estamos vivendo - afirmou.

- Estamos conduzindo a economia para um patamar mais sustentável de crescimento que é em torno de 5%. Crescer 7,5% por um período longo pode criar gargalos e, aí sim, teremos um problema inflacionário. Essa consolidação responde a essa estratégia.

O Ministério das Cidades, que abriga o Minha Casa, Minha Vida, foi um dos mais atingidos pelos cortes, com queda de R$8,577 bilhões nas despesas de custeio e investimentos, equivalente a 40,6% da dotação aprovada pelo Congresso.

Proporcionalmente ao tamanho do Orçamento, os ministérios do Turismo e dos Esporte tiveram os maiores cortes. No Turismo, a dotação foi reduzida em 84,3%, passando de R$3,6 bilhões para R$573,4 milhões. No Esporte, os cortes atingiram 64% das despesas de custeio e investimento, que caíram de R$2,4 bilhões para R$853 milhões. Os dois ministérios estão entre os que mais receberam emendas parlamentares.

A secretária de Orçamento do Ministério do Planejamento, Célia Corrêa, explicou que o critério de ajuste levou em consideração a execução orçamentária de 2010, que no caso do Turismo foi de R$800 milhões. No caso do Esporte, a execução histórica está em torno de R$300 milhões, mas o limite de R$853 milhões levou também em conta os investimentos da Copa do Mundo e Olimpíadas.

Na área social, o ministério mais atingido foi o da Educação, com um corte de R$3,1 bilhões nas despesas de custeio e investimentos, equivalente a 11% dessas despesas. Segundo Célia Corrêa, o corte atingiu despesas de custeio e as emendas parlamentares, mas o Programa de Desenvolvimento da Educação (PDE) não será afetado.

Célia Corrêa destacou também que, exceto o programa Minha Casa, Minha vida, nenhuma despesa do PAC foi cortada.

FONTE O GLOBO

Confuso, anúncio gera dúvidas sobre firmeza do governo no combate à inflação

Valdo Cruz

Ao anunciar o detalhamento dos cortes de R$ 50 bilhões no Orçamento, o governo deu uma aula de como perder a guerra das expectativas, fundamental para convencer os agentes econômicos de que manterá a inflação sob controle.

Em entrevista tumultuada ontem, os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) anunciaram medidas de consistência duvidosa, tentaram relativizar a importância dos cortes no combate à inflação e se preocuparam mais em dizer que a política econômica não mudou.

Mais parecia um discurso dirigido ao mundo petista, e não ao mercado, que duvidou de saída da capacidade do governo de executar o corte de R$ 50 bilhões.

Dúvida que se refletiu nas previsões sobre a inflação de 2011, que se mantiveram em alta desde a divulgação dos cortes há 20 dias, contrariando a expectativa inicial do governo de deter o pessimismo na economia.

Em sua fala inicial, Guido Mantega mostrou-se mais preocupado em rebater avaliações de que o governo tomou um caminho ortodoxo na economia."Fica essa confusão, o ministro mudou, o ministro não é mais aquele, fico preocupado com essas coisas."

Seguindo essa trilha, chegou a dizer que o objetivo principal do ajuste fiscal "não é exatamente a inflação", discurso não muito afinado ao que reina no Palácio do Planalto, preocupado em garantir que não deixará o Banco Central sozinho no combate à inflação.

De seu lado, Miriam Belchior se irritou com os insistentes questionamentos dos jornalistas sobre a consistência de cortes por meio de combate a fraudes no seguro-desemprego e ajuste fino nos gastos de pessoal.

"Vou repetir pela terceira vez", afirmando que não anunciava nenhuma "missão impossível".

Faltou os ministros lembrarem que o ajuste fiscal já tem data para ser revisto.

Um corte extra de R$ 2,2 bilhões terá de ser feito por conta do reajuste de 4,5% da tabela do Imposto de Renda na fonte, ainda não previsto no Orçamento deste ano.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Oposição diz que Dilma descumpriu promessas

Para eles, propostas de campanha eram "irreais"; aliados dão voto de confiança e falam em crescimento no próximo ano

Isabel Braga e Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. O avanço dos cortes orçamentários sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com o corte de R$5,1 bilhões nos investimentos destinados ao programa Minha Casa, Minha Vida, provocou críticas duras da oposição no Congresso Nacional. Para os oposicionistas, é mais um prova do "estelionato eleitoral" de Dilma, que prometeu reforçar o programa durante sua campanha presidencial. O corte também pegou de surpresa alguns integrantes da base aliada, mas a maioria dos governistas preferiu dar novo voto de confiança à presidente.

- Dilma descumpre promessas de campanha ao cortar no Minha Casa, Minha Vida. Isso mostra que as promessas feitas durante a campanha eram falsas e irreais. Os cortes afetam áreas essenciais e vitais da administração - disse o líder do DEM na Câmara, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (BA).

Para o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), os cortes não surpreenderam:
- Chegou a conta da gastança do governo Lula e da irresponsabilidade fiscal do governo passado para eleger sua candidata à Presidência. E o povo é quem vai pagar. Se compararmos a violência dos cortes ao orçamento com as declaração da então candidata Dilma, durante a campanha do ano passado, de duas uma: ou ela não sabia da realidade do país ou ajudou a ocultar esse quadro.

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) foi outro que lamentou os cortes no programa Minha Casa, Minha Vida. Na sua opinião, a tesoura do governo mais uma vez vai atingir a população mais necessitada do país.

O senador Paulo Paim (PT-RS) foi um dos governistas que lamentou o enxugamento dos recursos para a área habitacional de baixa renda:

- Não me incomodaria se o corte tivesse atingido as emendas parlamentares, mas que os investimentos do Minha Casa, Minha Vida fossem mantidos.

O deputado Vicentinho (PT-SP) preferiu não polemizar e dar um voto de confiança ao governo Dilma:

- Os cortes deste ano são para preparar o crescimento do país do ano que vem. Temos que crescer com segurança, sem pendências. Torço para que sejam medidas saneadoras, que garantam um crescimento musculoso, em vez de gorduroso.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso evitou críticas fortes ao corte:

- Se não tivesse havido um gasto a mais do que era conveniente, não seria necessário o corte. Qual a extensão? Não sei. Não estou criticando ninguém. Governar é assim mesmo, tem que fazer corte em certos momentos, é difícil - disse, depois de aula no Tribunal Regional Federal, em Brasília, a convite da Escola da Magistratura Federal.

Ele acabou expondo sua divergência em relação às críticas feitas na semana passada pelo ex-governador paulista e candidato derrotado do PSDB à Presidência, José Serra, ao governo Dilma Rousseff. Em entrevista ao GLOBO, Serra chegou a declarar que a presidente marchava para um "estelionato eleitoral".

- As eleições já passaram - disse o ex-presidente.
FONTE: O GLOBO

Grupo "inchado" discute reforma

Colegiado responsável por debater mudanças nas regras políticas será instalado hoje, com 40 deputados. Ideia é ter representantes dos 22 partidos da Casa

Igor Silveira

A comissão especial criada na Câmara para debater a reforma política será instalada hoje, com a tentativa de que a lista de indicações dos 40 membros e dos suplentes esteja completa. A escolha para as vagas de presidente e de relator, no entanto, está definida. José Almeida Lima (PMDB-SE) ficará no comando, enquanto Henrique Fontana (PT-RS) será o responsável pelo relatório final. Por se tratar de uma comissão especial, diferentemente das permanentes, o colegiado não obedece a uma formatação regimental. Assim, a composição de parlamentares levará em conta a configuração da Casa e acordos entre partidos para que nenhuma das 22 legendas com representação na Câmara fique de fora. Agora, de acordo com os deputados, a principal dificuldade é manter a sintonia com a comissão formada no Senado, já que as duas não têm qualquer ponto que interfira no funcionamento dos trabalhos, mesmo tratando do mesmo tema.

A instalação de duas comissões no lugar de uma mista e o número considerado elevado de membros são as principais críticas entre os deputados. Mendes Ribeiro (RS), um dos articuladores do tema no PMDB, lamenta a decisão da divisão entre as duas Casas. “Essa é a mãe de todas as reformas. Teria de ser mista. Então, se a sociedade não fizer uma pressão, como fez na época da Lei da Ficha Limpa, não sai nada”, afirmou, adiantando, ainda, que Marcelo Castro (PI), Mauro Benevides (CE) e Edinho Araújo (SP) serão alguns dos representantes peemedebistas na comissão.

José Almeida Lima, indicação do partido para presidir os trabalhos, ameniza os problemas. De acordo com ele, o número definido de parlamentares era inevitável se a comissão quisesse contemplar siglas menores, e que políticos das duas Casas estarão, constantemente, em contato. “Eu, de fato, fui indicado pelo partido para presidir a comissão e fui comunicado pelo nosso líder, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Tenho a cautela de ainda não falar como presidente, mas, caso seja eleito, para conduzir os 40 integrantes, a primeira palavra será negociação. Sempre em busca de consenso. Claro, se isso for impossível em algum momento, vamos deliberar”, disse o parlamentar.

A oposição também critica as características da comissão. O líder tucano, Duarte Nogueira (SP), porém, concorda com o critério de dar oportunidade a todos os partidos de participarem da discussão e conta que a legenda abriu mão de uma das suplências para que o PMN pudesse indicar alguém. Os deputados Antonio Carlos Mendes Thame (SP), Bruno Araújo (PE), Eduardo Azeredo (MG) e William Dib (SP) foram escolhidos pelo PSDB para compor o grupo. ACM Neto (BA), líder do DEM na Câmara, até o fechamento desta edição, ainda escolhia a última das quatro indicações para o quadro. Ronaldo Caiado (GO), Efraim Filho (PB) e Augusto Coutinho (PE) estavam confirmados. “É muita gente. Só espero que o debate não se perca”, ponderou.

Temas

No Senado, a Comissão da Reforma Política terá a sua segunda reunião hoje. Na anterior, os integrantes — incluindo presidente e relator — foram nomeados. Na pauta do encontro, está o início das discussões dos assuntos prioritários definidos no colegiado, incluindo sistemas eleitorais, voto facultativo, financiamento eleitoral e partidário, fidelidade partidária e data da posse do presidente da República e dos governadores. Presidida pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ), a comissão ainda não tem um relator escolhido.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Declarações de Sader irritam Ana de Hollanda

Indicado para a presidência da Fundação Casa de Rui Barbosa, sociólogo teria dito que ministra é "meio autista"

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA.A ministra Ana de Hollanda reagiu com irritação às críticas do sociólogo Emir Sader, indicado para a presidência da Fundação Casa de Rui Barbosa. Numa reunião com auxiliares ontem, a ministra examinou a possibilidade de cobrar explicações, exigir retratação pública ou até mesmo suspender a nomeação do sociólogo. No início da noite, segundo um de seus assessores, a ministra decidiu esperar um pouco mais para decidir de que forma resolverá o problema. Na semana passada, Sader criticou o comportamento supostamente passivo de Ana de Hollanda diante dos cortes no orçamento do ministério.

"Desde março não se repassou nada aos Pontos de Cultura. Teve uma manifestação em Brasília (contra os cortes). Está estourando na mão da Ana porque ela fica quieta, é meio autista", disse Sader, segundo reportagem publicada domingo pela "Folha de S. Paulo". Sader foi indicado pelo PT para a presidência da Fundação Casa de Rui Barbosa, mas ainda não tomou posse. A fundação é vinculada ao Ministério da Cultura. Antes da escolha de Ana de Hollanda, Sader era cotado para assumir o comando do ministério.

- Ela (a ministra) não gostou. Foi uma coisa absurda, muito pesada (a crítica do sociólogo). Ela vai pedir alguma solução - disse ao GLOBO um auxiliar da ministra.

Ana de Hollanda pretendia resolver a pendência ainda ontem na reunião que teve com o secretário-executivo Vitor Ortiz e o presidente da Funarte, Antonio Grassi. Depois de conversar com outras pessoas do governo, mas de fora do ministério, achou por bem aguardar um pouco mais. Segundo um assessor da ministra, o silêncio nesse momento não significa que a crítica de Sader passará em branco. O sociólogo provocou reação nos meios intelectuais ao anunciar, numa entrevista ao GLOBO, um redirecionamento dos estudos e pesquisas patrocinadas pela fundação.
Para Sader, é importante retomar as grandes discussões sobre o país, que teriam desaparecido com a crescente especialização de intelectuais e acadêmicos brasileiros. A retomada teria como eixo a ideia "o Brasil de todos", similar ao lema do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O sociólogo considera fundamental que a análise das grandes questões tenha como ponto de partida as realizações dos oito anos de governo Lula. Para alguns intelectuais, a proposta poderia resultar num aparelhamento ideológico da Fundação Casa de Rui Barbosa.

Na entrevista à "Folha", Sader também teria desdenhado das críticas de Caetano Veloso às suas supostas "cantilenas" contra a mídia e em defesa de petistas acusados de envolvimento com o mensalão. Segundo Sader, Caetano "é conservador, ziguezagueia e fala qualquer coisa". O ex-ministro Gilberto Gil seria muito mais articulado e coerente que o colega compositor.

Num texto divulgado no blog que mantém na internet, Sader negou que tenha criticado a futura chefe. "As referências, antes de tudo à ministra da Cultura, mas também ao Gil e ao Caetano, apareceram de forma totalmente deturpada", disse Sader.

Segundo ele, "não houve intenção nenhuma de desqualificação, seguir polemizando nesses termos é ser vítima desse tipo de matéria, de que todos já fomos vítimas: dizer que disseram que alguém disse". Procurada pelo GLOBO, a ministra Ana de Hollanda disse, por intermédio da assessoria de imprensa, que não iria se manifestar sobre o caso.

FONTE: O GLOBO

Antônio Maria e a saudade do Recife

O Rio – continuação::João Cabral de Melo Neto

Ou
relação da viagem
que faz o Capibaribe
de sua nascente
à cidade do Recife

As primeiras ilhas

Rasas na altura da água
começam a chegar as ilhas.
Muitas a maré cobre
e horas mais tarde ressuscita
(sempre depois que afloram
outra vez à luz do dia
voltam com chão mais duro
do que o que dantes havia).
Rasas na altura da água
vê-se brotar outras ilhas:
ilhas ainda sem nome,
ilhas ainda não de todo paridas.
Ilha Joana Bezerra,
do Leite, do Retiro, do Maruim:
o touro da maré
a estas já não precisa cobrir.

O outro Recife

Casas de lama negra
há plantadas por essas ilhas
(na enchente da maré
elas navegam como ilhas);
casas de lama negra
daquela cidade anfíbia
que existe por debaixo
do Recife contado em Guias.
Nela deságua a gente
(como no mar deságuam rios)
que de longe desceu
em minha companhia;
nela deságua a gente
de existência imprecisa,
no seu chão de lama
entre água e terra indecisa.