quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Reflexão do dia - Margareta Walstrom

Se pensamos na situação do Brasil há 20 ou 30 anos, a situação mais crítica do País era a seca. Hoje vemos que o problema é outro. O que vemos agora é uma acumulação de pequenas e médias enchentes. Todas as autoridades sabem dos riscos. Mas a questão é como conseguir que o governo federal diga claramente que precisamos de um basta. Que diga que o custo disso tudo chegou a um limite. Estimo que esse momento chegou agora. O custo político de ver mais de 800 pessoas morrerem assim talvez balance o governo e transforme o tema em alta prioridade. A causa da morte é a falta de capacidade do Estado. Quando o furacão Katrina atingiu os Estados Unidos, o que se descobriu é que o grande problema era a capacidade do Estado.

WALSTROM, Margareta, especialista da ONU para a prevenção de desastres naturais. O Estado de S. Paulo, 25 janeiro 2011.

AL vira cisne:: Merval Pereira

Há anos em que a América Latina está em baixa no Fórum Econômico de Davos, e outros, como agora, em que o patinho feio vira cisne. Basta ver que ontem a sala onde se realizou um debate sobre a situação da região ficou lotada, com gente de pé. Os anos críticos têm sido mais frequentes, mas certamente há muito tempo não se tem tanta boa vontade com a região, e em especial com o Brasil.

Se considerarmos que houve ano em que sugeriram que fosse retirado o B dos Brics, pois o Brasil não conseguia crescer no mesmo ritmo dos demais emergentes, a percepção hoje é totalmente diferente.

Há, sobretudo, o espanto pelo fato de o país ter conseguido crescer e ao mesmo tempo distribuir renda, o que foi destacado por Moisés Naím, ex-editor da revista "Foreign Policy" e hoje associado-sênior de economia internacional do Instituto Carnegie para a Paz Internacional, numa mesa redonda sobre a América Latina.

Embora a redução da desigualdade tenha sido questionada, já que ela aconteceu entre os salários e não na relação salários-ganhos de capital, Naím destacou que a redução do índice de Gini - que mede a distribuição de renda nas sociedades - mostra que a desigualdade foi realmente reduzida nos últimos anos. A melhoria do índice de Gini havia sido citada por Ricardo Villela Marino, CEO para América Latina do Itaú Unibanco, como um dos muitos sinais de avanço na economia brasileira

Moisés Naím, aliás, destacou outras economias que chamou de "estrelas conhecidas", como o Chile, mas também algumas "surpresas" na região, como a Colômbia, o Peru, o Uruguai, o Panamá e a Costa Rica.

Houve um consenso, resumido por Enrique Iglesias, ex-presidente do BID: nunca a região foi tão democrática quanto hoje, e nunca esteve tão bem situada economicamente, o que faz com que seja previsível uma década de crescimento pela frente.

Sintomaticamente, os problemas existentes, como a alta da inflação e a questão fiscal, foram citados apenas de passagem, ficando claro que não há nenhum temor de que os países da América Latina que aprenderam a lição das crises permanentes anteriores venham a perder o controle fiscal.

Mais uma vez o que foi destacado por todos, mas bem definido por Ricardo Villela Marino, foi que os países da região, mais especificamente o Brasil, precisam cuidar de seus pontos fracos: investimentos em infraestrutura e, sobretudo, em educação.

Mas nem tudo é festa na região. A parte negativa ficou para a Venezuela e os países da chamada Aliança Bolivariana (Alba), como Equador ou Bolívia. Moisés Naím, venezuelano radicado nos Estados Unidos, definiu o socialismo do século XXI de Hugo Chávez como uma "ideologia necrófila" - "Nunca vi gostar tanto de ideias más e mortas", comentou.

Um relato sobre a situação econômica da Venezuela nos dias atuais mostrou um país com a inflação descontrolada, com desemprego crescente e um aumento da pobreza extrema, que já não pode ser solucionada por programas assistencialistas, mesmo porque o governo já não tem condições econômicas de sustentá-los.

O presidente do Panamá, Ricardo Martinelli, presente ao debate como assistente, quis saber quais as chances de a oposição vencer a próxima eleição e disse que a situação da Venezuela provocava nele sentimentos "de satisfação e tristeza".

Satisfação porque, sempre que a crise piora, seu país recebe investimentos de empresários venezuelanos que lá buscam refúgio para si e seus negócios. E tristeza porque esta não é a maneira ideal de melhorar, às custas de problemas de outros.

Soube que há uma chance real de que, na eleição presidencial de 2012, a oposição derrote Chávez, que já está há doze anos no governo e ampliou seus poderes aproveitando-se de uma decisão errada da oposição de não participar das eleições congressuais anos atrás.

Nas recentes eleições, a oposição teve 52% dos votos, mas só elegeu minoria de congressistas devido às regras eleitorais venezuelanas. A questão é saber se a oposição conseguirá se unir em torno de uma candidatura para combater Chávez.

Mas até mesmo a Bolívia recebeu de Iglesias análise de boa vontade. Ele disse que o resultado da eleição do indígena Evo Morales para a Presidência do país foi importante para integrar uma parte da sua cidadania, e que os resultados têm sido melhores do que se poderia esperar.

O que chamou a atenção de Moisés Naím foi o fato de nenhum dos painelistas ter se referido à situação da Argentina, nem para criticar nem para elogiar: "Isto certamente não é um bom sinal", comentou.

O comentário final foi sobre a perspectiva de Dilma Rousseff como presidente do Brasil, na sucessão de Lula. Moisés Naím foi enfático ao afirmar que considera a nova presidente capaz de dar continuidade com sucesso aos programas de governo, mas reafirmou sua crítica à posição brasileira na política externa durante o governo Lula, "que nunca se pronunciou sobre os ataques à democracia que ocorrem na Venezuela. Espero que a presidente Dilma seja capaz de reverter essa situação".

No programa oficial do Fórum Econômico Mundial há uma advertência: até o momento em que esse programa foi para a impressão, todas as pessoas que participam e todas as sessões estavam confirmadas. Mas o desenrolar dos acontecimentos é de tal ordem que pode haver algumas modificações.

Foi o que aconteceu com a fala de abertura do presidente da Rússia, Dmitri Medvedev. No primeiro momento ela foi cancelada, como escrevi ontem, devido aos atentados terroristas no aeroporto de Moscou, para depois ser confirmada, embora a permanência de Medvedev em Davos tenha sido drasticamente encurtada.

Em plena temporada do Oscar, troquei as bolas e chamei na coluna de ontem o primeiro-ministro da Inglaterra, David Cameron, de James Cameron, o diretor de "Avatar".

FONTE: O GLOBO

Um "case" na serra:: Dora Kramer

Engenheiros, geólogos, bombeiros e sobreviventes da catástrofe que atingiu a região serrana do Rio de Janeiro, ainda não conseguiram compreender o que aconteceu exatamente naquela madrugada de 11 para 12 de janeiro, cujas consequências somam mais de 800 mortos, cinco centenas de desaparecidos, prejuízos materiais ainda incalculáveis e a completa alteração geográfica de uma área que alcança sete municípios.

A explicação não cabe toda na expressão "tragédia anunciada", embora uma parte dela esteja mesmo na imprevidência do poder público, no desmatamento, na ocupação desordenada do solo e no tabu que se criou em torno dos atos de remoção de moradias, sinônimo de autoritarismo e remissão de memória ao lacerdismo.

O polêmico governador Carlos Lacerda, que há quase 50 anos tomou decisões que impediram que a hoje nobilíssima área da Lagoa Rodrigo de Freitas se transformasse em um imenso favelão. Quem não gosta do termo nem do conceito, mil perdões, mas a vida é mesmo assim.

Segundo o vice-governador Luiz Fernando Pezão, que há 15 dias se transferiu para Friburgo, a palavra "remoção" voltará a fazer parte do vocabulário oficial, até porque depois do ocorrido o Judiciário e o Ministério Público, empecilhos habituais, tendem a rever suas posições."Agora estão todos conosco", assegura ele.

Os responsáveis pelas equipes de salvamento, de reconstrução e de análise sobre o desastre admitem que não estavam preparados para enfrentar o que aconteceu. Falhou o homem? Falhou e precisa rever seus métodos de atuação, mas a natureza naquela madrugada realmente enlouqueceu.

Quem diz isso não é um místico. É o engenheiro Ícaro Moreno Júnior, presidente da Empresa de Obras Públicas (Emop): "Era impossível prever algo daquela dimensão. Foi como se a natureza decidisse despejar toda sua força de uma vez só."

Entre os dias 11 e 13 choveu 300 milímetros em Friburgo, cidade cujo centro foi arruinado. Segundo os técnicos, eles estavam preparados para enfrentar as consequências de uma chuva de até 180 milímetros que foi o índice ocorrido no município em todo o mês de janeiro de 2010.

O comandante do Corpo de Bombeiros, coronel Pedro Machado, também não nega o despreparo do poder público, principalmente no que tange a sistemas de alarmes e socorro.

Mas não acha que se possam fazer comparações com as enchentes ocorridas na Austrália, onde houve inundações, mas o número de vítimas fatais foi de algo em torno de três dezenas.

"Na Austrália ocorreu uma enchente. Aqui houve enchente, deslizamento, desabamento e inundação, tudo ao mesmo tempo. Eu só conhecia a palavra cataclismo no dicionário. Pela primeira vez vi o que significa", diz o coronel.

Ele tem uma tese baseada nos relatos de sobreviventes: "Uma tempestade de raios atingiu o alto dos morros, quebrou as pedras que, junto com a enxurrada, provocaram os deslizamentos de blocos de cinco, dez toneladas."

Sobrevoando a região dos sete municípios a imagem mais impressionante que se vê é a de uma série de montanhas como que rasgadas em sulcos abertos entre a mata fechada.

"Inexplicavelmente, algumas áreas que seriam de risco não foram atingidas e outras que teoricamente eram seguras foram devastadas", acrescenta o coronel Pedro Machado.

O gabinete de crise montado em Friburgo trabalha basicamente em duas frentes: uma comandada pelo vice-governador visa ao atendimento das vítimas e à revitalização econômica da região, com a instalação de polos de atividade como um grande hospital de referência e a ampliação do campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A outra diz respeito aos estragos físicos. Rios, canais e córregos saíram do curso, estradas desapareceram, pontes sumiram, ruas não existem mais. Quais as exigências dessa nova geografia? Só um diagnóstico preciso, que está sendo feito agora, poderá dizer.

"Não dá ainda para saber quanto tempo levará nem quanto custará", adianta o engenheiro Ícaro Moreno.

Até o último sábado, 10 dias após a tragédia, os 130 geólogos do Brasil todo que se apresentaram como voluntários não tinham uma explicação: sabiam apenas que estavam diante de um "case" a ser minuciosamente estudado.

Porque, como se viu, o impossível acontece.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

No início, tudo são flores:: Eliane Cantanhêde

O discurso do Estado da União feito por Barack Obama deixou o Planalto e o Itamaraty felizes da vida, por alguns motivos.

O primeiro deles é que não é usual o presidente da potência anunciar uma viagem a outro país no seu principal discurso do ano, feito na abertura do Parlamento e voltado para o público interno.

Ao dizer ali que vem em março ao Brasil (num giro que inclui Chile e El Salvador), Obama sinalizou aos congressistas e à opinião pública que o Brasil está no foco. Surpreendeu o próprio governo brasileiro.

Obama também reiterou a prioridade por temas que interessam diretamente ao Brasil, como energia limpa, inovação tecnológica, educação, pacificação interna e boa vontade externa.

Ele fez um esforço evidente para reenergizar a sociedade americana e recuperar o orgulho estremecido, mas mostrando que o mundo não é mais o mesmo. Os EUA têm de competir, mas também de ouvir e prestigiar os emergentes.

A expectativa é que tudo isso paute a agenda de Obama no Brasil, com um item substancioso a mais. Depois de defender a Índia como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU durante uma visita àquele país, a diplomacia espera que ele diga o mesmo sobre o Brasil quando pisar aqui.

Depois, Dilma Rousseff pretende ir a Nova York em setembro, justamente para a abertura da Assembleia Geral da ONU. Não se trata de uma visita bilateral, mas abre a possibilidade de outro bate-papo com Obama, num momento em que Washington e Brasília trocam sinais de paz e amor.

A dúvida é como os dois vão se virar com o tema emergente no cenário de 2011: a revolta popular que começou na Tunísia, chegou ao Egito e está com pinta de se alastrar pelo mundo árabe, ou pela parte dele aliada ao Ocidente -leia-se: aos EUA.

Nesses casos, pesa mais o valor democracia ou o pragmatismo e o apoio dos ditadores?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Nem tão iguais assim:: Cláudio Gonçalves Couto

Tarso Genro é um político de esquerda, ou ao menos supõe ser. Sendo de esquerda, seria de se esperar dele a defesa da igualdade entre os homens - afinal, se há algo que distingue a esquerda da direita, é a defesa da igualdade, mesmo que em sacrifício de outros objetivos, como já nos ensinou Norberto Bobbio, dentre outros. Todavia, não foi isto o que se viu no discurso do novo governador gaúcho por ocasião do debate acerca das aposentadorias especiais para ex-governadores de Estado (objeto, inclusive, de um editorial do Valor nesta semana). No dia 21 de janeiro último, o governador do Rio Grande do Sul defendeu que ex-chefes de governo estadual fazem jus a um "estatuto de classe média". A pergunta que se poderia seguir é: por que ex-governadores, em especial, fazem jus a tal condição, mas outras pessoas não?

A explicação dada por Tarso Genro a isto é que os governadores amparados por tais aposentadorias não precisariam viver de favor, após deixar a função. A nova pergunta que se poderia fazer é: que problema há em ex-governadores viverem de favor?

Não é possível responder a esta segunda pergunta com base no critério humanitário, pois aí retornaríamos ao primeiro questionamento - se ex-governadores fazem jus a um estatuto de classe média para viverem dignamente, todos os demais cidadãos também o fazem. Daí, ou se estende o benefício a todos, ou - caso isto não seja possível - não se concede o mesmo a ninguém, por uma questão de equidade. A não ser que se acredite que ex-governadores são pessoas que merecem um tratamento privilegiado em relação aos demais cidadãos, uma distinção decorrente de seu status pessoal diferenciado em relação à malta composta por todos nós outros.

Ora, mas se Tarso Genro pensa deste modo, reconhecendo que alguns não são tão iguais assim, será ele realmente de esquerda? Ou, se preferirmos não colocar as coisas nestes termos ideológicos que, para alguns, já foram superados: será ele ao menos republicano? Afinal, neste início de mandato o novo chefe do Executivo gaúcho propôs aos demais Poderes um "pacto republicano" para resolver problemas do Estado, sendo que a ideia de república e o discurso baseado no republicanismo costumam povoar suas falas. Mas como defender a "res publica" ao advogar que os dinheiros comuns sirvam para assegurar ganhos privilegiados de alguns?

Aposentadoria privilegiada revela nossa desigualdade

Uma segunda justificativa, baseada na ideia de que os ex-mandatários não podem viver de favor ao deixar o cargo, seria o risco que tal condição ofereceria para a própria coisa pública. Ora, mas se estamos falando de pessoas que deixaram seus cargos e, portanto, não têm mais poder político e administrativo para causar danos aos interesses coletivos, novamente a defesa das aposentadorias (e as pensões, para os dependentes) torna-se pouco plausível.

Invoquei aqui o exemplo de Tarso Genro porque foi ele quem mais se aventurou a encontrar uma justificativa publicamente defensável para este privilégio. Ressalve-se, em seu favor, que não apenas "deu a cara a bater", mas também ponderou a necessidade de mudar a legislação para tornar menos inadequada tal sinecura. Todavia, mesmo com ajustes, continuaríamos a ter uma prebenda, inaceitável numa república de iguais. Outros, como seu conterrâneo Pedro Simon (sempre bradando na tribuna do Senado contra os ataques à coisa pública), ou o ex-governador do Paraná, Álvaro Dias (ácido crítico das imoralidades do governo de seus adversários), sequer tinham argumentos ou fizeram propostas de mudança. Um justificou o pedido da aposentadoria com base nas dificuldades financeiras que vem enfrentando (cidadãos comuns recorrem aos bancos, ou à família), e o outro alegou que desejava fazer caridade (com dinheiro público, bem entendido).

Seria fácil compreender este imbróglio, fosse o mero oportunismo legislativo a causa da aprovação de normas jurídicas que engendram privilégios deste gênero. Há, contudo, algo mais profundo - e pior - que torna possível a existência tão difundida dessas leis (Estados de norte a sul do país as contemplam) e de manifestações públicas de autoridades que procuram justificá-las. É a mesma causa que explica a emissão de passaportes diplomáticos para "pessoas muito importantes" (VIPs), sem que o interesse público possa - de fato - requerê-los. Isto decorre do entendimento difundido em nossa sociedade - e, sobretudo, na classe política - de que os cidadãos não são todos iguais. Acredita-se que alguns merecem tratamento privilegiado em decorrência do cargo que ocupam ou ocuparam (não apenas as aposentadorias, mas também o foro judicial privilegiado), da escolaridade que detêm (a antiga prerrogativa de prisão diferenciada para os detentores de diploma de curso superior), ou de sua ascendência familiar (vejam-se os casos da filha de Hercílio Luz, que ainda recebe uma pensão, ou das tetranetas de Tiradentes, que também desejam pleiteá-la).

Situações como esta fariam sentido se ainda vivêssemos numa sociedade estamental, em que uma nobreza fosse percebida pelas normas sociais vigentes como distinguida e merecedora de tais privilégios. De fato, convivemos com diversas sobrevivências de tal ordem nobiliárquica, ainda que seja difícil defendê-las publicamente sem acrobacias argumentativas como as invocadas por Tarso Genro e tantos outros. Ironicamente, a principal instituição a se insurgir jurídica e politicamente contra essa situação é a Ordem dos Advogados do Brasil, ela mesma uma vezeira defensora de privilégios corporativos para seus membros - ao feitio das corporações de ofício medievais. Isto mostra claramente que o problema da desigualdade no Brasil não diz respeito apenas à iníqua distribuição de renda, mas a diferenças de status social que afetam, inclusive, a apropriação da riqueza em nosso país. É uma desigualdade que está em descompasso com o avanço já bastante considerável das condições de competição política de nossa democracia, enquanto nos países democráticos mais avançados foi por aí que tudo começou.

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Ênfases e silêncios:: Míriam Leitão

O presidente Barack Obama falou da China como competidora na produção de energia limpa. Lembrou da Coreia do Sul como campeã em percentual de universitários. Citou China e Índia pelo esforço de educar as crianças mais cedo e por mais tempo. Falou dos acordos comerciais com vários países. Sobre o Brasil, fez apenas referência à visita que ele fará em março. Os silêncios são eloquentes.

O Brasil sempre soube que não é exemplo em educação. Mas deveria ver com susto o fato de a Índia ser apresentada como exemplo de esforço educacional. Aqui, muitos ainda acham que o Brasil é exemplo em energia limpa pelo etanol e hidrelétricas, mas o país não fez até agora o esforço que poderia fazer em outras fontes de energia, como a solar - cuja maior indústria hoje fica na China, como disse Obama - nem em eólica ou qualquer outra verdadeiramente renovável. O Brasil prefere apostar no lucro que virá do petróleo do pré-sal e em grandes barragens, que vão usar um bem cada vez mais escasso e incerto, a água, no meio da floresta e longe dos centros de consumo. Também não fizemos um grande acordo comercial com os Estados Unidos. Ainda está em tempo de entender que isso não conflita com o esforço das negociações multilaterais.

O índice Dow Jones superou ontem, pela primeira vez em 31 meses, a marca dos 12 mil pontos. A explicação para a alta foi a boa reação ao discurso do presidente Obama. Ele falou em corte de gastos e em retomada do crescimento. A indústria de energia ficou dividida, porque a direção que ele apontou é para longe do combustível fóssil. "Em 2035, 80% da energia americana serão de fontes limpas", disse Obama. Na sua lista de alternativas, ele incluiu "carvão limpo". A tecnologia conhecida pela sigla CCS - captura e estocagem do carbono do carvão - não está dominada, por isso a ideia de que exista um "carvão limpo" é em si muito controversa. Como tem sido defendida pelos republicanos e pelo seu estado, o Illinois, Obama o incluiu no discurso, mas deu ênfase às energias do sol e do vento, como sendo as do futuro, nas quais se deve investir, em vez de dar subsídio para as do passado, como o petróleo. Ontem, restou à indústria fóssil ameaçar. Seus porta-vozes disseram que o corte dos subsídios ao petróleo produzirá desemprego. Obama preferiu fazer ironia, dizendo que as empresas petrolíferas estão indo muito bem, e insistiu para que os parlamentares derrubem os subsídios ao setor.

As ênfases foram eloquentes. Obama falou insistentemente em educação. Apresentou os números que envergonham o país: um em cada quatro americanos não termina o ensino médio; o país está em nono lugar em percentual de estudantes que concluem o ensino superior. Apresentou metas: chegar ao fim da década sendo o primeiro do mundo em percentual de estudantes com curso superior completo, preparar 100 mil novos professores nos campos da ciência e tecnologia, engenharia e matemática. De novo, mostrou um exemplo externo: na Coreia do Sul, os professores são chamados de construtores da nação.

Obama misturou tudo: a educação é o fundamento da economia e do emprego, até porque em 10 anos metade dos novos empregos vão exigir pelo menos o ensino médio. A energia limpa é parte da inovação e da geração futura de empregos. A internet de alta velocidade, que de novo a Coreia do Sul - sempre ela - é exemplo por prover acesso a 95% dos cidadãos, é ferramenta indispensável para um bom ambiente de negócios. Não foram apresentados como compartimentos estanques, mas como parte do projeto.

Admitiu que o governo gasta demais, pediu uma reforma tributária que corte impostos de forma linear para as empresas americanas, em vez do sistema atual, que dá benefícios a setores que têm lobby mais poderoso. Defendeu a redução da regulação e da burocracia criadas pelo Estado e que atrapalham as empresas. Contou que a última grande reforma do governo ocorreu quando a TV ainda era em preto e branco. Lembrou que existem 12 agências governamentais tomando decisões sobre exportação. Brincou com seu exemplo favorito: o salmão de água doce é assunto do Departamento do Interior, o de água salgada é do Departamento do Comércio, e o defumado é um pouco mais complicado. Ou seja, desburocratizar, diminuir o tamanho do Estado, lutar contra privilégios tributários são desafios americanos também. A diferença é que aqui, quem fala isso são as empresas; lá, é o próprio presidente que reconhece o problema.

Tudo é mais fácil falar do que fazer, tanto que ontem as análises nos jornais do mundo todo apontavam contradições entre intenções e gestos. E mais: lembraram que está na hora de Obama parar de prometer e fazer.

Obama assumiu o país na pior crise econômica desde a grande recessão, têm governado com uma taxa de desemprego em torno de 10%, tem um gigante déficit público para resolver que não será digerido apenas com o congelamento dos gastos por cinco anos, como propôs.

Ao iniciar seu discurso no Congresso, ele lembrou a ocupante da cadeira vazia: a deputada pelo Arizona Gabrielle Giffords. Foi aplaudido longamente por todos. Pode ser um sinal de que a polarização da sociedade americana começará a recuar depois da tragédia de Tucson. Seus últimos dois anos de mandato serão mais difíceis na política, porque na Câmara dos Deputados são 242 republicanos contra 193 democratas; no Senado, 51 democratas contra 47 republicanos. Mas há uma chance de serem mais fáceis na economia. O país saiu da recessão, empresas e até bancos voltaram a dar lucro, a bolsa recuperou-se e sua popularidade começou a subir.

FONTE: O GLOBO

Momento Sputnik:: Celso Ming

Em seu pronunciamento de terça-feira sobre o Estado da Nação, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, passou o recibo de que está incomodado com o crescimento dos países emergentes e com a perda de hegemonia americana no mundo. Mas apontou saídas nem sempre compatíveis, como criação de empregos e redução do rombo orçamentário.

Obama evocou até mesmo o espírito da Guerra Fria ao dizer que este é "o momento Sputnik de nossa geração". Para os mais jovens, convém lembrar que essa foi a época em que os Estados Unidos se deram conta de que ficaram ameaçados pelo lançamento do primeiro satélite ao redor da terra em 1957, pela União Soviética. Foi então que o país aceitou o desafio de desenvolver o Projeto Apollo, destinado a tirar o atraso na tecnologia espacial, que garantiu o primeiro pouso do homem na Lua, em 1969. Hoje, as ameaças ao futuro da América não têm conteúdo ideológico e não estão fora dos Estados Unidos. É a tecnologia ultrapassada, é a perda de qualidade na educação e é "a montanha de dívidas".

Obama propõe que os Estados Unidos se reinventem para sobreviver. Lembra que, "em uma só geração, as revoluções tecnológicas transformaram nossa forma de viver, trabalhar e fazer negócios. As indústrias siderúrgicas, que antes necessitavam de mil trabalhadores, agora podem fazer o mesmo trabalho com cem".

Na verdade, o principal desafio é a criação de empregos, cujo sucesso não ficou nem um pouco assegurado a partir das propostas contidas no pronunciamento. Obama propõe aumento de 100% das exportações (hoje de US$ 2 trilhões por ano) em apenas quatro anos, sem indicar os meios para isso, a não ser acordos comerciais com a Colômbia, Panamá, Coreia do Sul e com o bloco da Ásia Pacífico. Parece pouco.

Promete, também, cobertura de internet sem fio de alta velocidade, em cinco anos, a 98% da população, para agilizar os negócios. Se funcionar, tende a tirar emprego. Promete, também, acesso ao trem de alta velocidade a 80% dos americanos em 25 anos e suprimento até 2035 de 80% da energia elétrica dos Estados Unidos a partir de fontes limpas. No seu conjunto, são metas aparentemente ainda mais ambiciosas do que as do Projeto Apollo.

O rombo fiscal dos Estados Unidos assume proporções perigosas. Deve ser superior a US$ 1,5 trilhão neste ano fiscal a terminar em setembro. A dívida do Tesouro americano já é de US$ 13,9 trilhões e deve avançar para US$ 20 trilhões em 2015. Obama, no entanto, sugere o congelamento de despesas públicas federais que implique uma economia de US$ 400 bilhões em dez anos.

Em contrapartida promete aplicações mais inteligentes dos recursos públicos, como redução de subsídios a certos setores (mencionou os de petróleo) e mais investimentos em infraestrutura e em Tecnologia & Desenvolvimento.

Fica para ser comprovado se os Estados Unidos despertarão de sua prostração, mas o alerta foi dado. Para nós, brasileiros, atolados em um sistema de ensino ainda mais atrasado; com uma infraestrutura ainda mais precária; uma Justiça que leva dezenas de anos para resolver pendências simples; um custo Brasil que sangra diariamente a empresa brasileira; e um governo paralisado pelos políticos do toma lá dá cá e pelos lobbies, sobra a percepção de que, a despeito de encabeçarmos a sigla Bric, a conquista do futuro é ainda mais difícil.

CONFIRA

Salto e acomodação

Em 2010, as operações de crédito cresceram 20,5% e foram um dos principais fatores do forte aumento do consumo. O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, avisa que, em 2011, a concessão de crédito "deve-se acomodar". Em janeiro, até dia 12, já caiu 8% sobre as posições de dezembro. Dois são os principais fatores de desaceleração: a alta de juros e as exigências de mais capital por parte dos bancos.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Qual o tamanho do ajuste fiscal que a nova presidente fará de fato?::Jarbas de Holanda

A meta de redução dos juros vai demorar bem mais do que a presidente Dilma Rousseff prometeu logo após a eleição, e até que isso possa viabilizar-se – mesmo em escala bem menor, daqui a uns dois anos – a taxa Selic terá que ser ainda mais ampliada, reforçando a indesejável liderança do Brasil nesse terreno, no campo dos países emergentes. E entre os diversos efeitos negativos dessa liderança inclui-se a piora da crise cambial, decorrente da persistência da supervalorização de nossa moeda (propiciada pela maior atração de dólares e se somando ao enorme custo Brasil com fator adicional restritivo das exportações industriais e de serviços).

Mas, malgrado tais efeitos, a elevação da taxa básica de juros – decidida pelo Banco Central na semana passada e que deverá ser renovada nos próximos encontros do Copom – torna-se imperativa e tem o endosso a própria presidente Dilma. Porque constitui praticamente a única resposta imediata disponível a uma ameaça maior: a do descontrole inflacionário.

A outra e consistente resposta é a de um efetivo controle dos gastos públicos que a presidente tem reiterado que vai promover. Embora em escala bem menor do que aquela que se vai evidenciando como necessária, por causa do aumento de gastos de custeio já contratados pelo governo anterior e das agudas pressões para que sejam aumentados, que se ligam a demandas sindicais e do Judiciário, dependentes de decisões do Legislativo. Por isso, os problemas da economia dominam fortemente as preocupações da nova chefe do governo, consciente pela sua formação técnica de que do enfrentamento e da solução deles dependerão a continuidade do crescimento do PIB (mesmo a uma taxa bem menor que a de 2010, em torno de 4,5%, que é a prevista) e a própria sorte do seu mandato. Enfrentamento para o qual – sabendo-se limitada pela predominância populista do esquema político que a elegeu e em sua base de apoio parlamentar – procura encaminhar mudanças possíveis por meio de legislação ordinária (descartando reformas constitucionais) e da melhoria de padrões de gestão administrativa. Melhoria que pelo menos aponta bons propósitos.

Reportagem da última edição da revista Exame avalia o quadro crítico das contas públicas e a extensão do ajuste fiscal que é preciso fazer, efetivamente e o mais rápido possível. Título e abertura da matéria: “Será para valer?”; “Diante da piora fiscal e da subida da inflação, o governo promete cortar o orçamento. Se for efetivo, além de aliviar a pressão sobre o Banco Central, o ajuste permitirá mais crescimento no futuro – mas, se o aperto não vier...”. Em seguida mostra “a farra fiscal do governo Lula”, no qual “o gasto público da União cresceu sempre acima da variação do PIB” (em 2010, 9,9%, além de 7,6%). E aponta três cenários de um corte de despesas federais. 1º - “O Necessário” – de R$ 60 bilhões, com despesas de 17,8% do PIB, superávit primário de 3,1%, taxa de juro básica de 12,5% e economia com juros da dívida de R$ 22 bilhões. 2º - “O Provável” – de R$40 bilhões, com despesas de 18,3% do PIB, superávit primário de 2,6%, taxa de juro básica de 13% e economia com juros de R$ 15 bilhões. 3º cenário – “O Pior” – Zero de corte, com despesas de 19,3% do PIB, superávit primário de 0,7%, taxa básica de juro de 14% e economia com juros da dívida de 0%. Conclusão sobre esses cenários: “Como em 2010 as despesas do governo fecharam em 18,2% do PIB, somente com o corte de R$60 bilhões haverá efetivamente redução de despesas para 17,8% do PIB e uma elevação menor da taxa Selic”.

Pressão inflacionária – Trechos de artigo do economista José Roberto Mendonça de Barros – “A ameaça inflacionária é maior do que parece” - no Estado de S. Paulo, de domingo último: “Iniciado um novo ano muita gente está revendo sua estrutura de custos e reposicionando produtos com novos preços. Isso é grave porque, ao contrário do período após 2005, inúmeros agentes não veem mais o centro da meta como o normal da inflação, mas sim algo maior. Uma indicação quantitativa deste fato está na expectativa dos agentes de mercado para a inflação de 2011. Esta concentra-se em 5,40%, ao contrário do que ocorre desde 2005, quando a expectativa do início do ano era próxima do centro da meta. Este cenário de inflação só será devidamente enfrentado se a política monetária for complementada por um ajuste fiscal significativo, tal como prometido pelo governo. Só o futuro dirá o que de fato ocorrerá na área do gasto. Acredito ser muito pouco provável a ocorrência de um ajuste de envergadura, por várias razões”. “Encaminhar a inflação para o centro da meta e ancorar as expectativas vão dar muito mais trabalho do que parece”.

Jarbas de Holanda é jornalista

O que pensa a mídia

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Discussão sobre mínimo terá 2ª rodada

Terminou sem avanços a primeira reunião entre o governo Dilma e centrais sindicais para discutir o aumento do mínimo. Foi marcada nova reunião, para 2 de fevereiro. O governo insiste nos R$ 545; as centrais, em R$ 580.

Primeira reunião entre centrais e governo Dilma termina sem avanços

Gilberto Carvalho defendeu acordo de 2007 sobre reajuste do mínimo

Chico de Gois e Luiza Damé

BRASÍLIA. A primeira reunião formal entre o governo Dilma e as centrais sindicais para discutir o aumento do salário mínimo terminou sem avanços. Ficou acertada mais uma reunião, em 2 de fevereiro. O governo continua defendendo um mínimo de R$545, e as centrais não abrem mão de R$580. O aumento de 10% para aposentados não foi discutido. Mas o governo sinalizou com a possibilidade de reajuste de 4,5% na tabela do Imposto de Renda para pessoa física, abaixo dos 6,46% pedidos pelos sindicalistas.

A reunião foi coordenada pelo ministro da Secretaria Geral, Gilberto Carvalho, que defendeu o acordo feito entre o governo Lula e as centrais em 2007, estabelecendo o reajuste do salário mínimo com base na inflação mais a variação do PIB de dois anos antes. Gilberto afirmou que a política de reajuste do governo garantiu ganho real para o mínimo de 62,4% entre dezembro de 2003 e dezembro de 2010:

- Temos honra dessa política. No espírito do acordo de 2007, estamos propondo esse reajuste que leva o mínimo a R$545, entendendo que se trata de um período em que o PIB de 2009 teve queda, mas já sabendo que no ano que vem temos uma previsão, baseada no PIB de 2010, de um importante aumento, que pode chegar a 12%, 13%. Reafirmamos a inconveniência de mexer nesse acordo.

Mas os sindicalistas continuaram defendendo a necessidade de um aumento maior, sob o argumento de que todos foram atingidos pela crise econômica de 2008. E querem uma reunião com Dilma Rousseff.

- O governo apresentou a proposta de continuar a política do salário mínimo, com compromisso de mantê-la até 2015, mas queremos uma excepcionalidade para 2011 - disse o presidente da CUT, Artur Henrique.

- Ninguém de nós esperava que tudo seria resolvido hoje (ontem) - afirmou o presidente da Força Sindical, deputado Paulinho da Força (PDT-SP).

FONTE: O GLOBO

Governo vai propor concessão única para todas as mídias

O governo vai abandonar o debate sobre a proibição da propriedade cruzada nos meios de comunicação por estar convencido de que a tecnologia tornou a discussão obsoleta, informam Cida Damasco, João Bosco Rabello e Ricardo Gandour. O conceito de convergência das mídias, que consolidou o tráfego simultâneo de dados e noticiários em todas as plataformas - da impressa à digital -, pôs na mesa do ministro Paulo Bernardo (Comunicações) um projeto de concessão única. A inversão do processo partiu da constatação de que os veículos de comunicação hoje têm num só portal seus noticiários de jornal, rádio e TV. O conselheiro da Anatel João Resende considera a concessão única “inevitável" para ser discutida e implementada num prazo de cinco anos. Isso imporia, na sua avaliação, uma reforma na própria Anatel, que hoje trata os diferentes meios de comunicação de forma isolada.

Convergência de mídias leva governo a desistir de veto à propriedade cruzada

Diante do avanço tecnológico, novo governo já estuda a possibilidade de concessão única para os veículos de comunicação e altera rumo do debate; conselheiro da Anatel admite que nova visão sobre o assunto imporá mudanças na agência

Cida Damasco, João Bosco Rabello e Ricardo Gandour

O governo vai abandonar o debate sobre a proibição da propriedade cruzada nos meios de comunicação por estar convencido de que o desenvolvimento tecnológico tornou a discussão obsoleta. O conceito de convergência das mídias, que consolidou o tráfego simultâneo de dados e noticiários em todas as plataformas - da impressa à digital -, pôs na mesa do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, um projeto de concessão única. Propriedade cruzada é o domínio, pelo mesmo grupo de comunicação, de concessões para operar diferentes plataformas (TV, rádio, jornal e portais).

A inversão do processo, que estudava a proibição da propriedade cruzada e agora a consolida, partiu da constatação de que os veículos de comunicação hoje têm num só portal seus noticiários de jornal, rádio e televisão, na maioria dos casos funcionando num mesmo ambiente físico e virtual, com aproveitamento de toda produção de conteúdos.

O conselheiro da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), João Resende, considera a concessão única "inevitável" para ser discutida e implementada num prazo de cinco anos. Isso imporia na sua avaliação uma reforma na própria Anatel, que hoje trata os meios de comunicação de forma isolada.

O ministério das Comunicações ainda defende a extensão aos meios de comunicação digital (portais) do limite de 30% de capital estrangeiro que hoje vigora para jornais, rádio e televisão.

A orientação da presidente Dilma Rousseff é priorizar as questões objetivas que pressionam o mercado e trabalhar o projeto de regulamentação da mídia em ritmo que privilegie sua qualidade e consistência. "O projeto vai andar sem pressa e sem contaminação ideológica", disse ao Estado uma fonte do governo.

A mudança de estratégia corresponde à avaliação de que o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi tumultuado por sucessivas tentativas de tornar concretas propostas polêmicas, como o Conselho Federal de Jornalismo, com a pretensão de "orientar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão do jornalista". Trazia ainda a proposta de um novo marco regulatório das comunicações que viabilizasse sanções aos veículos que infringissem as regras do Conselho.

Sutilezas. Também sem açodamento que possa causar danos políticos ao governo, as mudanças incluirão gradativamente o cumprimento da norma constitucional que veda a concessão de emissoras de rádio e TV a parlamentares. Sutilezas na interpretação dessas regras flexibilizaram-nas de tal forma que se tornou comum a figura do parlamentar empresário de comunicação.

O ministro Paulo Bernardo já expôs publicamente sua posição contrária à detenção de outorgas de rádio e TV por parlamentares, mesmo consciente de que as dificuldades são grandes nessa direção. "É mais fácil fazer um impeachment do presidente do que cassar uma concessão", disse o ministro em entrevista ao Estado no último dia 3.

Grande parcela de parlamentares usa "laranjas" como titulares de emissoras de sua propriedade. Bernardo já teria admitido essa fragilidade, mas a alegação do governo é que o ministério se baseia em documentos públicos para conceder a outorga. A visão hoje, no ministério, é que a Polícia Federal e o Ministério Público são instâncias preparadas para investigar se houve má fé no processo de concessão.

Administradas à parte essas questões, o governo abre caminho para ações mais objetivas como deseja a presidente. É nesse contexto que o ministro assinou convênio ontem transferindo à Anatel a tarefa de exercer a fiscalização no campo das telecomunicações no território nacional.

Objeto histórico de disputa entre a agência e o ministério, a fiscalização foi sempre uma ficção porque este último, com só 270 técnicos, não dispõe de quadros suficientes para a demanda. Já a Anatel tem 1,3 mil funcionários especializados. A legislação estabelece que a fiscalização é do ministério, mas pode ser delegada.

Colaborou Karla Mendes

PARA ENTENDER

O marco regulatório das comunicações, em gestação no governo, tratará não só da convergência de mídias mas também da regulamentação dos artigos da Constituição que tratam de produção nacional, regional e independente (220, 221 e 222). A participação de capital estrangeiro nas empresas, previsto no art. 222, é outra vertente - que até já provocou audiências públicas no Congresso, após denúncias de descumprimento do limite de 30% de capital estrangeiro em empresas de comunicação. No cerne da questão, a tarefa de definir se sites e portais se enquadram nessa limitação, já que veiculam conteúdo jornalístico e muitos de seus donos são reconhecidamente estrangeiros.

O governo também prevê a criação de uma agência reguladora para cuidar, a posteriori, do conteúdo veiculado pela mídia, mas ainda não decidiu se dará mais poderes à Anatel ou se criará para isso nova agência, como ocorre em outros países. O governo alega que um novo marco é necessário porque o atual, de 1962, é incompatível com a nova realidade do País.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Orientação de Dilma é menos ideologia e mais Constituição

João Bosco Rabello

O governo está empenhado em obter credibilidade para seu compromisso público pela liberdade de imprensa. Não considera que no período Lula ela esteve realmente ameaçada, mas não quer ministro reverberando teses radicais como o controle de conteúdos.

É o que difere o início do governo Dilma do seu antecessor. Embora tenha avalizado a liberdade de expressão, o ex-presidente Lula permitiu que seu entorno mantivesse acesa a chama da censura. Acenava ao público radical do PT com o controle da informação, mas dizia aos jornalistas que não se preocupassem. Era maior que o partido e isso lhe bastava.

Dilma escolheu o discurso constitucional. Quer viés técnico no debate sobre a regulamentação da mídia e não fixa prazo para a conclusão do projeto. Essa linha tem orientado a ação e o discurso dos ministros Paulo Bernardo, das Comunicações, e Helena Chagas, da Secretaria de Comunicação da presidência da República (Secom) - esta em contato diário com a presidente.

Ambos defendem o fim do debate ideológico, até porque Dilma não tem a liderança de Lula no PT e precisa impor o limite constitucional ao tema de forma clara e pública.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Furnas fez negócios com firma ligada a deputado

Menos de oito meses depois de abrir mão do direito de preferência na compra de ações da empresa Oliveira Trust Servicer, a estatal Furnas Centrais Elétricas pagou R$ 73 milhões a mais pelos mesmos papéis. O negócio, informa CHICO OTAVIO, favoreceu a Companhia Energética Serra da Carioca II, que pertence ao grupo Gallway. Um dos diretores do Gallway na época, em 2008, era Lutero de Castro Cardoso, ex-presidente da Cedae. Outro nome conhecido do grupo, que tem sede em paraísos fiscais, é o do doleiro Lúcio Bolonha Funaro. Os dois são ligados ao deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que indicou o então presidente de Furnas, o ex-prefeito Luiz Paulo Conde. O negócio foi registrado em atas da diretoria da estatal e envolveu a alteração da sociedade montada para construir e explorar a usina de Serra do Facão, em Goiás. Ontem, Furnas alegou que pagou R$ 73 milhões a mais porque a Serra da Carioca fez investimentos na sociedade. A estatal não forneceu, porém, qualquer detalhe sobre a transação.

Os negócios de amigos de Cunha

Furnas pagou R$73 milhões a mais por ações vendidas a empresários ligados ao deputado

Chico Otavio

Após abrir mão do direito de preferência na compra de um lote de ações da empresa Oliveira Trust Servicer, Furnas Centrais Elétricas pagou pelos mesmos papéis, menos de oito meses depois, R$73 milhões acima do valor original. O negócio, ocorrido entre dezembro de 2007 e julho de 2008, favoreceu a Companhia Energética Serra da Carioca II, que pertence ao grupo Gallway. Um dos seus diretores, na época, era o ex-presidente da Cedae e ex-funcionário da Telerj Lutero de Castro Cardoso. Outro nome conhecido no grupo é o do doleiro Lúcio Bolonha Funaro, que se apresenta em negócios como representante da Gallway.

Lutero e Funaro têm ligações com o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a quem é atribuída a indicação do então presidente de Furnas, o ex-prefeito Luiz Paulo Conde , no período da transação. Lutero, também nome indicado por Cunha para a Cedae, chegou a ter bens bloqueados pela Justiça por operações ilegais na companhia de águas em 2007. Já Funaro, ao ser investigado pela CPI dos Correios, teve de explicar os motivos que o levavam a pagar aluguel, condomínio e outras despesas do apartamento ocupado por Eduardo Cunha no flat Blue Tree Tower, em Brasília, em 2003.

Furnas mudou de ideia em 8 meses

O negócio com a Oliveira Trust, registrado em atas de reunião de diretoria obtidas pelo GLOBO, envolveu a alteração da sociedade montada para construir e explorar a usina hidrelétrica de Serra do Facão, em Goiás. A primeira ata, de 4 de dezembro de 2007, registra a renúncia, por Furnas, ao direito de aquisição da participação da Oliveira Trust, que estava previsto no acordo dos acionistas. Já a ata de 9 de janeiro de 2008 informa a compra do lote pela Companhia Energética Serra da Carioca II, do grupo Gallway (cuja origem é o paraíso fiscal das Ilhas Virgens britânicas), por um valor total aportado de R$6,96 milhões.

Quase sete meses depois, em outra reunião de diretoria no dia 29 de julho, a diretoria de Furnas aprova a compra deste mesmo lote - que correspondia a 29,89% do capital da Serra do Facão Participações S/A - por R$80 milhões, uma diferença de mais de R$73 milhões.

A pretexto de evitar o pagamento de custos adicionais decorrentes de correção de valores, a diretoria de Furnas aprova, três semanas depois da realização do negócio com a empresa Serra da Carioca, o "pagamento imediato" da segunda parcela à empresa de Funaro, estimada em R$26 milhões.

Estatal alega que sócio fez aporte

Furnas alegou, em nota à redação, que a diferença entre o valor original e o efetivamente pago pela estatal se deve ao fato de que, neste intervalo (2008), a empresa Serra da Carioca fez um aporte de R$75 milhões na sociedade, "o que justifica integralmente a diferença".

A estatal, contudo, não forneceu qualquer detalhe sobre o suposto aporte feito pela companhia ligada ao doleiro Lúcio Funaro: "O aporte foi feito pela Serra da Carioca à Serra do Facão Participações; portanto, esse registro deve ser solicitado a eles", respondeu Furnas.

Sobre as razões de ter dispensado, em dezembro do ano anterior, a opção de compra das ações, a nota informou que "naquela ocasião era necessário manter o caráter privado da Serra do Facão , o que só seria possível se um investidor privado fosse substituído por outro de mesma natureza".

Para explicar a repentina mudança, meses depois, Furnas alegou que "essa aquisição melhoraria o resultado do negócio para Furnas, considerando-se a alteração de variáveis macroeconômicas no período", como diz a nota.

Furnas negou ter encontrado problemas para obter o financiamento necessário junto ao BNDES - o banco teria resistido a aprová-lo ao constatar a presença da companhia ligada a Lutero e Funaro no negócio: "Foi um processo normal de negociação para concessão de financiamento desse porte", diz.

A estatal também negou conhecer o doleiro ou ter ciência da ligação de representantes ou sócios da Serra da Carioca com o deputado federal Eduardo Cunha.

O negócio envolvendo a hidrelétrica de Serra do Facão está citado em documento elaborado por engenheiros de Furnas, este mês, para denunciar o aparelhamento político da estatal pelo PMDB fluminense. O dossiê, de duas páginas e meia, foi encaminhado pelo deputado estadual licenciado e secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar (PT-RJ), ao ministro da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, Luiz Sérgio.

No trecho sobre o caso, os engenheiros sustentam que "um exemplo da atuação dessa rede de influência gerencial foi o prejuízo para Furnas no processo de engenharia financeira da usina de Serra do Facão". De acordo com os autores, os prejuízos acumulados só nessa operação chegariam a R$100 milhões.

"Ainda que não haja nenhuma prova material, contratações, renovação e não renovação de contratos, liberação de pagamentos, nomeação etc. são feitas, frequentemente e às claras, para atender ao interesse desse ou daquele grupo político. A desfaçatez é amplamente registrada nos corredores da empresa", diz o texto.

Lúcio Funaro é um nome conhecido na crônica política de Brasília. Uma das muitas transações polêmicas em que se envolveu também teve como cenário o setor elétrico. Outra empresa do grupo Gallway, a Centrais Elétricas de Belém (Cebel), captou dinheiro de três fundos de pensão para construir a central hidrelétrica de Apertadinho, em Rondônia. Porém, a barragem erguida pelos construtores se rompeu, inundou a cidade mais próxima e jogou pelo ralo investimentos de mais de R$100 milhões.

Dos três fundos de pensão prejudicados, um chama atenção: a Prece, caixa de previdência dos funcionários da Cedae, que aprovou a sua participação no período em que Lutero de Castro Cardoso estava à frente da companhia.

Em reação ao documento, Eduardo Cunha acusou o PT de estar por trás das denúncias. Ele nega qualquer tipo de ingerência política em Furnas, embora admita que o PMDB indicou diretores da estatal, juntamente com o PT e o PR.

Gallway não está na sede declarada

A Gallway registra um capital, segundo a Junta Comercial de São Paulo (Jucesp), de R$71,8 milhões, divididos em duas companhias, a Gallway Projetos e Energia do Brasil Ltda, aberta em abril de 2007, e a Gallway Projetos e Energia do Brasil S/A, de 2008. O GLOBO tentou localizar as empresas nas sedes apresentadas pelos documentos oficiais da Jucesp e da Receita Federal.

Em um dos endereços, na Avenida 9 de Julho, a empresa que ocupa o lugar é a Cingular Fomento Mercantil, do doleiro Lucio Funaro, envolvido em pelo menos dois escândalos nacionais, a CPMI dos Correios e a Operação Satiagraha. A própria Serra da Carioca II tem como sede o mesmo endereço, mas os funcionários do prédio não a conhecem. No outro endereço atribuído a Gallway, e que consta como sede em seu site, funciona uma empresa sem vínculo com o grupo. Funcionários do prédio informaram ao jornal que a Gallway deixou o endereço há cerca de um ano.

Na portaria, que ficou de recolher as correspondências para entregar aos antigos locatários, constam os nomes de Funaro, Gallway, Enerbrax e Centrais Elétricas de Belém, as duas últimas concessionárias de energia do grupo Gallway. Os funcionários do edifício, um prédio de escritórios em Pinheiros, informaram que a empresa sequer mandou retirar as correspondências guardadas.

Procurado, Lutero Cardoso não atendeu o pedido de uma entrevista feito pelo repórter. Funaro não foi encontrado.

Colaborou: Tatiana Farah

FONTE: O GLOBO

Imóveis do Minha Casa, Minha Vida são revendidos na BA

Apartamentos que não poderiam ser comercializados custam a partir de R$5 mil

Reginaldo Pereira*

FEIRA DE SANTANA (BA). Dois carros Golf e um Renault estacionados nas vagas destinadas aos moradores parecem deslocados no condomínio Conceição Ville, em Feira de Santana, a 108 quilômetros de Salvador, um conjunto habitacional construído com recursos do programa Minha Casa, Minha Vida e destinado a famílias com renda familiar de até três salários mínimos. Mas a permanência dos veículos é explicada quando se conversa com moradores do condomínio, que o ex-presidente Lula inaugurou em julho de 2010.

Pedindo para não ser identificada, uma moradora do conjunto diz que o dono de um dos apartamentos, e de um dos veículos citados, é um advogado:

- Ele aparece aí todo arrumado - confirma outra moradora.

No mesmo bairro, no Residencial Nova Conceição, que foi estrela de um dos programas eleitorais na campanha vitoriosa da presidente Dilma Rousseff, tem acontecido o mesmo, segundo a secretária da Associação de Moradores, Fabiana Ferreira. Ela diz ter ouvido falar da venda de apartamentos por preços que variam entre R$10 mil e R$12 mil. E justifica:

- Tem gente que não se adapta ao lugar ou que precisa de dinheiro e vende.

Como a venda é proibida, a transação se faz por meio de contratos de gaveta, em razão de não ser possível formalizar a transferência de proprietário:

- Quem compra corre o risco - diz Fabiana.

Após as primeiras denúncias, publicadas semana passada pelo "Estado de S.Paulo", a Caixa Econômica Federal (CEF) fez um levantamento no Conjunto Nova Conceição e concluiu que pelo menos 40 dos 440 apartamentos foram repassados a terceiros pelo beneficiários originais. O conjunto foi o primeiro empreendimento do programa federal entregue no país. O superintendente interino da Caixa para a região de Feira de Santana, Gilberto Reis, afirma que os compradores ficarão sem os imóveis, porque eles serão retomados tão logo seja feita a comprovação oficial.

O levantamento feito pelos funcionários da Caixa tomou como base informações fornecidas pelos vizinhos das unidades.

- Vamos, a partir de agora, verificar como proceder juridicamente para anular os contratos - disse o superintendente.

Perderão o imóvel quem comprou e quem vendeu. A mesma verificação será feita nos outros dois condomínios do programa incluídos na faixa de renda de até três salários mínimos: o Conceição Ville, também com 440 unidades, e o São Francisco, com 224 unidades.

Em dezembro de 2010, o vereador Marialvo Barreto (PT) mostrou na Câmara Municipal de Feira de Santana um jornal com oferta de classificados de imóvel, no qual imóvel no bairro Conceição era vendido por R$35 mil de entrada, mais prestações de R$50. Mas os vereadores rejeitaram o requerimento que pedia apuração à Secretaria municipal de Habitação e à gerência da Caixa.

Só depois que as negociações ilegais com imóveis do Nova Conceição foram denunciadas na imprensa, a CEF enviou uma equipe ao condomínio para entrevistar os moradores e fazer um levantamento socioeconômico.

No Conjunto Conceição Ville, próximo a ser pesquisado pela Caixa, a dona de casa Adriana Menezes disse que soube da venda de apartamentos por R$15 mil, R$10 mil e R$5 mil. Já Crispim Almeida, que vive de bicos como carregador e diz que ganha "R$6 em um dia e nada no outro", estima que mais da metade dos moradores originais foi embora do Conceição Ville.

* Da Agência A Tarde

FONTE: O GLOBO

Duarte Nogueira é novo líder tucano na Câmara

Bancada formalizou defesa da permanência de Guerra na presidência do PSDB, cobiçada por Serra

BRASÍLIA. A bancada do PSDB da Câmara impôs ao ex-governador José Serra um duro golpe, na reunião que formalizou ontem a indicação de Duarte Nogueira (PSDB-SP) como novo líder da bancada. Junto com a escolha do novo líder, foi formalizada a defesa pela permanência de Sérgio Guerra (PE), eleito deputado, na presidência da legenda a partir de maio. Assinado por 55 dos 54 deputados tucanos, atuais e novatos, o documento inviabiliza uma articulação de aliados de Serra para que ele ocupasse o cargo.

A decisão da bancada foi estimulada pelo senador eleito Aécio Neves (PSDB-MG) e pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP). Na última semana, tucanos ligados a Serra lideram uma articulação para que ele assuma o comando do partido para facilitar o caminho para uma nova candidatura ao Palácio do Planalto, em 2014.

Sérgio Guerra afirmou que está disposto a permanecer na presidência se for para ajudar o partido. E mostrou impaciência diante do que chamou de "fofoca infernal e mentirosa" que tenta colocar tucanos uns contra os outros. Avisou ainda que a oposição ao governo Dilma Rousseff será feita no Congresso:

- Jamais podemos esperar que os governadores liderem a oposição. Não é algo que se peça a ninguém. Temos que ter clareza disso e deletar essa fofoca infernal e mentirosa. Que crise é essa que estão dizendo? Qualquer coisa, é crise no PSDB!

Enquanto os deputados tucanos articulavam a permanência de Guerra na presidência, os senadores tucanos decidiram bancar a indicação do cearense Tasso Jereissatti para o comando do Instituto Tancredo Neves (ITV), outra iniciativa para neutralizar as articulações de Serra para manter o controle sobre a sigla.

O nome de Serra chegou a ser cotado para a presidência do instituto, mas ele teria rechaçado a ideia e se articulado para ocupar o lugar de Guerra.

PSDB vive risco de novo racha em 2012

Resolução do diretório paulista muda regras para escolha de nomes que definirão candidatos a prefeito e deflagra disputa entre grupos na capital

Julia Duailibi

Recentes movimentações no PSDB para controlar a escolha dos nomes que disputarão as eleições municipais de 2012 criaram as primeiras tensões entre grupos tucanos, a menos de dois anos do pleito.

Resolução aprovada no dia 29 de novembro de 2010 pelo diretório paulista do PSDB alterou "temporariamente" o prazo de filiação partidária, estipulado pelo próprio estatuto da legenda. A nova regra reduziu de 180 para 41 dias o período mínimo de filiação para um quadro da sigla votar e ser votado nas convenções zonais e municipais de 2011.

Assinada pelo presidente do diretório estadual, Mendes Thame, ligado ao ex-governador José Serra, e pelo secretário-geral, César Gontijo - próximo do secretário de Energia, José Aníbal -, a decisão permite que filiados até 31 de janeiro de 2011 possam escolher os nomes que conduzirão a eleição de 2012.

O prazo anterior, pelo estatuto, era setembro de 2010 para as convenções zonais e outubro para as municipais, em cidades acima de 500 mil habitantes.

A iniciativa, da qual a executiva municipal pretende recorrer, deflagrou uma corrida por fichas de filiação pelos grupos interessados em lançar candidatos à Prefeitura de São Paulo. Despertou ainda o temor de que o partido chegue rachado à disputa, como ocorreu em 2008. O grupo que eleger mais diretórios zonais - são 52 na capital - escolherá a nova direção municipal, que definirá o candidato à reeleição de Gilberto Kassab (DEM).

Os grupos aliados ao governador Geraldo Alckmin (PSDB) e a Kassab, que disputam tacitamente a condução do processo eleitoral, começaram a se movimentar após a aprovação da resolução.

Aliados dos pré-candidatos e secretários de Alckmin José Aníbal e Bruno Covas (Meio Ambiente) começaram a buscar filiados. Vereadores tucanos ligados ao prefeito também procuraram obter novas filiações para conseguir, assim, influenciar na eleição dos zonais.

"A intenção foi dar condições para que novas lideranças, principalmente candidatos a prefeitos no interior, possam ingressar com grupos políticos. Não tem nada a ver com a eleição de São Paulo", disse Gontijo. Segundo ele, o diretório estadual acatará hoje pedido do municipal para que a nova regra não seja válida para a capital paulista.

Mudança. O presidente municipal que conduzirá a eleição será eleito em 10 de abril, após a eleição nos zonais, em 13 de março. O atual, José Henrique Reis Lobo, tem bom trânsito entre os aliados de Kassab, Serra e Alckmin, mas tem dito que não tentará a reeleição. Lobo estaria desestimulado, já que o governador, de quem era próximo e a quem apoiou em 2008, não o convidou para integrar o governo.

O deputado Arnaldo Madeira defende a disputa interna para o partido se fortalecer eleitoralmente : "O PSDB precisa sair desse negócio de obter consenso".

Procurados, Lobo e Mendes Thame não se manifestaram.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Bancada tucana ignora Serra e defende Guerra na presidência

Moção assinada por 54 nomes e aclamação de Duarte Nogueira, próximo de Alckmin, como líder isolam ex-governador

Andrea Jubé Vianna

Sequela da disputa entre os tucanos José Serra e Aécio Neves, a bancada do PSDB isolou ainda mais o ex-governador de São Paulo ao aprovar uma moção, subscrita por 54 deputados e suplentes, pela recondução de Sérgio Guerra (PE) à presidência do partido. Serra cogitava pleitear o cargo para manter visibilidade política. Soma-se a isso a aclamação unânime do paulista Duarte Nogueira, ligado ao governador Geraldo Alckmin, para a liderança da bancada.

Os tucanos também elegeram o mineiro Paulo Abi-Ackel, ligado a Aécio, para o cargo de líder da minoria na Câmara. Para completar, Tasso Jereissati (CE), também ligado a Aécio, assumirá um posto na Executiva Nacional tucana, a presidência do Instituto Teotônio Vilela. Caso o mineiro Rodrigo de Castro continue na Secretaria-Geral, serão dois aecistas na cúpula.

Sérgio Guerra afirmou que a escolha da bancada foi autônoma, sem a influência de lideranças "externas" do partido, como governadores e senadores. Na mesma linha, Duarte Nogueira rechaçou a afirmação de que sua eleição reflete a influência de Alckmin na bancada. "A minha indicação por aclamação é um fortalecimento da unidade do partido", afirmou.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Juros médios para pessoa física sobem 4,5 pontos em 2 semanas

Dados do Banco Central mostram que, após pacote do governo para conter o crédito, o juro médio no sistema financeiro subiu de 35% anuais no fim de 2010 para 38% em 12 de janeiro, o mais alto desde abril de 2009, Na média, a taxa para pessoa física passou de 40,6% para 45,1%.

Taxa de juros ao consumidor dispara

Taxa média para pessoas físicas salta 4,5 pontos porcentuais, de 40,6% para 45.1%, em menos de 15 dias, antes mesmo da alta da Selic

Fernando Nakagawa e Fabio Graner

Após o anúncio de medidas para conter o crédito em dezembro e antes mesmo do aumento da taxa Selic na semana passada, famílias e empresas já pagavam muito mais para tomar empréstimo nos bancos. Dados do Banco Central mostram que, depois de uma ligeira alta das taxas em dezembro, o juro médio praticado no sistema financeiro disparou de 35% anuais no fim do ano passado para 38% em 12 de janeiro, o mais alto patamar desde abril de 2009.

Quem mais está sofrendo com o aumento do juro são as pessoas físicas, especialmente nos empréstimos para o consumo - como financiamento de veículo, crediário de loja e crédito pessoal, incluindo o consignado.

Na média, a taxa do crédito às famílias aumentou de 40,6% ao ano em dezembro para 45,1% no último dia 12, uma alta de 4,5 pontos porcentuais, salto raro de ocorrer em menos de 15 dias.

O encarecimento aconteceu porque ações prudenciais tomadas pelo governo em dezembro aumentaram o custo para os bancos operarem financiamentos, especialmente de prazos mais longos. Além disso, a expectativa de que a Selic começaria a subir já começou a elevar a taxa de tomada de recursos pelos bancos, embora esse impacto no resultado ainda seja pequeno, segundo o BC.

No início do mês passado, o governo mudou algumas regras e passou a exigir que bancos mantenham maior volume de recursos retidos no BC, o chamado depósito compulsório. Com isso, cai o volume de dinheiro em circulação e instituições deixam de ganhar dinheiro, já que os valores recolhidos no BC poderiam ser emprestados ou investidos. Além disso, o BC dificultou operações de crédito ao consumo, como financiamento automotivo, com prazos mais elevados.

Spread. Dessa forma, os bancos elevaram a margem cobrada nos empréstimos, conhecida como spread, para preservar sua rentabilidade em um quadro em que terão de ofertar menos empréstimos. Em 12 dias, houve alta de 2,9 pontos no spread, para 26,4 pontos porcentuais ao ano.

"É exatamente o efeito esperado pelo BC, que adotou medidas prudenciais e começou a subir o juro para segurar a demanda e esfriar um pouco a inflação", diz a economista-chefe da Rosenberg & Associados, Thaís Zara. Como resultado, a média diária de concessões de créditos caiu 8% nos 12 primeiros dias do mês.

Ao apresentar os números, o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, indicou que o encarecimento visto nas últimas semanas é apenas o primeiro passo do aperto que o crédito deve sofrer ao longo dos próximos meses. "Ainda vamos ver o impacto restante das medidas prudenciais e a nova decisão de política monetária", afirmou ao lembrar que a taxa Selic subiu em 19 de janeiro, apenas uma semana após o levantamento do BC.

Além de mais caro, os empréstimos tendem a ficar mais curtos. "Hoje, temos prazos bastante dilatados. Mas nas novas concessões já temos observado redução", diz Lopes, ao comentar que esse fenômeno será mais evidente nos próximos meses. "No passado, quando o custo de captação subia, bancos alongavam o prazo da operação para acomodar as prestações ao bolso do cliente. Mas agora há uma trava para os prazos", afirmou, ao lembrar da nova regra que gera custos adicionais aos bancos que tentarem ampliar as parcelas.

Apesar do custo mais elevado para se emprestar dinheiro, a fatia dos créditos para pessoas físicas com atraso nos pagamentos superior a 90 dias está em 5,7%, o menor patamar desde junho de 2001. A inadimplência desse segmento vem caindo desde meados de 2009, mas Lopes acredita que a tendência agora, com a maior restrição ao crédito, é de acomodação em torno desse patamar. "É provável que a inadimplência se estabilize, deixe de cair em prazo relativamente curto. Mas não deve subir."

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

51% das famílias têm dívidas para pagar

Endividamento cresceu ante janeiro de 2010, quando 44% das famílias estavam nessa condição, aponta a Fecomércio-SP

Márcia De Chiara

O paulistano começou este ano mais endividado que no início de 2010. Mais da metade das famílias (51,2%) tem dívidas a pagar neste mês. Em dezembro do ano passado, a fatia de famílias endividadas estava em 45,7% e em janeiro de 2010 era de 44%, revela a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP).

O aumento da parcela de famílias com dívidas reflete, segundo o assessor econômico da entidade, Altamiro Carvalho, o desempenho excepcional das vendas do Natal, feitas especialmente com uso do crédito. Além disso, há despesas obrigatórias de início de ano, como o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), que ampliam os gastos com pagamento de contas.

A pesquisa mostra que, de janeiro de 2010 para janeiro de 2011, houve um aumento de quase 250 mil no número de famílias que assumiram dívidas no período. E a maior parte das famílias endividadas (55%) tem renda de até dez salários mínimos (R$ 5.400).

A maioria das dívidas é no cartão de crédito (70,8%), seguida por carnês (24,7%), crédito pessoal (10,8%), financiamento de carro (9,4%) e cheque especial (6%).

Riscos. Carvalho pondera que, por enquanto, o maior número de famílias endividadas não preocupa. Tanto é que, neste mês, a parcela daquelas com contas em atraso e sem condições de quitar os débitos no curto prazo é praticamente a mesma de janeiro do ano passado - 15% e 6%, respectivamente.

"No momento os números são saudáveis, mas o cenário não é tão tranquilo para frente", diz o economista. O aumento da inflação, que reduz a renda disponível no bolso do consumidor, associado à elevação das taxas de juros, à redução dos prazos do crediário e ao maior rigor na concessão do crédito, são fatores de risco para o aumento da inadimplência, avalia Carvalho.

Ele lembra que o cenário no início de 2010 era oposto ao atual, com juros em queda, prazos de financiamento reduzidos e inflação controlada.

Mas, segundo Carvalho, a variável chave para determinar o comportamento da inadimplência daqui para frente será o comportamento do emprego e da renda. "O emprego e a renda falam mais alto que os juros para a inadimplência", diz o economista.

A pesquisa identificou que entre as famílias com dívidas, 52,6% delas têm de 11% a 50% da sua renda comprometida com pagamento de prestações. E para 17% das famílias endividadas o comprometimento da renda é superior a 50%.

Somente para 23,2% das famílias a parcela da renda empenhada é inferior a 10%. Na média, o comprometimento da renda com negócios já assumidos é hoje de 31%, ligeiramente acima do registrado em janeiro do ano passado e dezembro último, quando esse indicador era de 30%.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Rio de Janeiro: A UPA e a eleição

Secretário estadual de Saúde, Sérgio Côrtes vai hoje a Valença anunciar uma UPA na cidade – que terá, em fevereiro, nova eleição para prefeito. A notícia será dada ao lado do atual prefeito e candidato aliado Paulinho da Farmácia (PPS).

FONTE: O DIA

Jungmann vê posição “arbitrária” do presidente da ALEPE

Deputado federal do PPS entra na polêmica sobre a escolha do líder das oposições na Assembleia Legislativa, atacando o presidente do Poder, que, segundo ele, age como se estivesse numa ditadura

Ed Ruas

O presidente estadual do PPS e deputado federal Raul Jungmann fez, ontem, duras críticas à postura do presidente da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), Guilherme Uchoa (PDT). As declarações foram motivadas, segundo Jungmann, pela posição “arbitrária” do pedetista de se opor à escolha do deputado estadual eleito Daniel Coelho (PV) como líder do bloco de oposição para a próxima legislatura. O pós-comunista defendeu o direito dos parlamentares do bloco sobre a indicação, que não poderia sofrer interferência, nem mesmo do presidente da Casa. “Este gesto de Uchoa é extraordinariamente autoritário. Não cabe jamais, dentro de um regime democrático, uma postura dessa. Isso só aconteceria em uma ditadura”, disparou o parlamentar.

Na visão de Jungmann, a intervenção de Uchoa tem o incentivo do governador Eduardo Campos (PSB), autor da costura do ingresso do PV na aliança governista. “Não cabe ao governo, ao Executivo, indicar quem é ou quem não é da base de oposição. Isso não existe. Há uma questão democrática em jogo”, avaliou. A declaração faz referência à nota divulgada por Uchoa, onde afirma que irá aguardar uma lista enviada pelo Palácio dos partidos integrantes da aliança, além de evocar o regimento da Casa para questionar a escolha de Daniel para o cargo.

De acordo com Jungmann, apenas o partido de Daniel Coelho poderia ter alguma interferência na escolha. Mas alertou que seria lamentável tal conduta. “Apenas o próprio PV pode negar a liderança. Isso se fechar questão e cassar o mandato de Daniel. Espero que não o faça”.

Ao discorrer sobre a polêmica, Jungmann admitiu a parcela de culpa da oposição. Segundo ele, a situação mostra a “debilidade” do bloco que já vem de “uma grande derrota eleitoral”. Ele propôs a busca de uma “solução negociada” para o impasse, que crê ser “fruto das feridas que permanecem abertas”. A afirmação tem base nas rusgas entre DEM e PSDB, iniciadas em 2006, após a escolha de Mendonça Filho (DEM) como candidato ao governo de Pernambuco, em vez de Sérgio Guerra (PSDB).

Uchoa foi procurado pelo JC, mas não deu retorno.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Daniel pede “consulta aos filiados”

Disposto a ser o novo líder da bancada de oposição na Assembleia Legislativa, o deputado estadual Daniel Coelho (PV) chegou a propor, ontem, que o seu partido deveria fazer uma consulta aos filiados para colher a opinião da “maioria dos verdes” e não só da cúpula. Coelho trava uma luta interna com o presidente estadual do PV, Sérgio Xavier, que disputou a eleição ao governo do Estado e – passado o pleito – aderiu ao governo Eduardo Campos (PSB) e é hoje o secretário de Meio Ambiente.

Em entrevista ao radialista Geraldo Freire, na Rádio Jornal, ontem, o deputado destacou que o “colegiado do partido é pequeno”, tem apenas dez pessoas. Foi essa executiva que decidiu, por maioria de voto, que o PV fechasse aliança com Eduardo. “Eles (o grupo de Xavier) têm 6 contra 4. Mas se forem consultar os filiados, vamos ter apoio maciço. Esse colegiado (executiva) não é eleito de forma direta pelos filiados”, alfinetou.

Indagado sobre a sua relação com Sérgio Xavier, Coelho deixou claro que ambos estão afastados. O deputado foi duro com os correligionários ao cobrar coerência. Alegou que não vai recuar do seu pleito de ser o líder da oposição na Assembleia, pois quem deve ficar “incomodado” são os companheiros que mudaram de lado. “O PV era independente durante a campanha e agora é governo. Então isso distancia nossa relação”.

O deputado também falou abertamente do que se comenta no bastidor de que o PV poderia puni-lo pela postura dissidente. “Ele (Sérgio Xavier) tem dito que vai respeitar minha posição, embora tem dito pelos jornais...”. O parlamentar interrompeu o raciocínio e mudou o sujeito da frase. Disse que “alguns integrantes do governo disseram que ele (o dirigente verde) mandaria restringir minha presença na bancada de oposição”.

Ontem, Daniel reuniu-se novamente com o advogado Lêucio Lemos e com a deputada Terezinha Nunes, que também tem atuado junto ao bloco (PSDB/PMN/PV) que quer o verde na liderança. O grupo busca amparo jurídico que valide o pleito junto ao regimento interno da Casa. Enquanto isso, o bloco DEM/PMDB mantém o nome de Tony Gel (DEM) para a liderança.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Demônios da garoa: Saudosa maloca

Catar feijão::João Cabral de Melo Neto

Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.

Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.