segunda-feira, 31 de maio de 2010

Reflexão do dia – Giorgio Barrata


Como Kafka, no início do século XX, Gramsci viu a “América” como um terreno avançado de contradições e de lutas, de alienações e de utopias.

Como Chaplin, em Tempos modernos, Gramsci viu crescer com o operário das grandes fábricas fordistas “um novo tipo de homem”, que Taylor sonhara reduzido a “gorila amestrado”.

Como Brecht, no entanto, Gramsci sabia — e também o sabiam, ele diz, os industriais americanos — que “um homem é um homem”, ou seja, que, “infelizmente, um homem permanece um homem”: o fato de que não lhe seja dado pensar dentro do trabalho na cadeia produtiva favorece o surgimento, nele, de um “curso de pensamentos pouco conformistas”.

Como Benjamin, Gramsci considerava a taylorização do trabalho intelectual, o ocaso do humanismo, do homo faber, da aura, o conúbio entre arte e tecnologia, como uma nova Atlântida, cujo pensamento laico e socialista se devia criativamente apropriar, projetando — com o comunismo — um grandioso e progressivo processo de unificação do gênero humano.


(Giorgio Barrata, no artigo, “Gramsci, eu o vi assim” no site Gramsci e o Brasil)

Moderno São Paulo e a política nacional:: Luiz Werneck Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Nessa próxima sucessão, salvo mudanças catastróficas no estado atual da disposição das forças políticas do país, teremos mais um presidente extraído das fileiras ou do PSDB ou do PT, mais quatro anos para esse ciclo que se abriu em 1994 e que está destinado a completar duas décadas em 2014. Nenhum outro partido durante esse longo período conseguiu se projetar de modo competitivo a ponto de ameaçar a posição desses dois partidos nas disputas presidenciais, largamente majoritários nos resultados das eleições presidenciais, embora, como se saiba, não contem com força própria de sustentação no Poder Legislativo, dependentes, quando vitoriosos eleitoralmente, de amplas coalizões com outros partidos. Mas, essa ressalva, contudo, não contraria o fato de que ambos se constituam como partidos hegemônicos na estrutura partidária brasileira, e de que sejam reconhecidos como tais pelos demais partidos.

Mas essa hegemonia embute outra, qual seja o papel dominante do Estado de São Paulo na política da Federação. Tanto o PSDB como o PT são "partidos paulistas", nascidos de movimentos sociais que fizeram parte da resistência ao regime militar, o segundo com origem no sindicalismo da região do ABC, sede da moderna indústria metalúrgica, e, o primeiro, como expressão de círculos intelectuais e de políticos nucleados em torno de um diagnóstico comum sobre o que seriam os males do país. Desse tempo originário guardaram marcas que conservaram nos seus primeiros embates eleitorais, é verdade que, hoje, algumas delas bem esmaecidas, quando não relegadas ao plano do que deve ser esquecido. Contudo, a memória da infância nos partidos é como nas pessoas - um partido já formado é prisioneiro, de algum modo, da sua história de fundação.

PT e PSDB, embora procedentes de regiões diversas do social, vão ter em comum a valorização da matriz do interesse e a denúncia do patrimonialismo, e não à toa "Os Donos do Poder", o clássico de Raimundo Faoro, será referência de ambos ao começarem suas trajetórias. Aliás, Faoro foi um dos fundadores do PT e é celebrado como um dos ícones do partido. Precisamente nesse sentido é que podem ser compreendidos como partidos paulistas na medida em que localizam no Estado a raiz do nosso autoritarismo político, das políticas de clientela e de um burocratismo parasitário a impedir a livre movimentação da sociedade civil. No diagnóstico da época, era preciso emancipar os mecanismos da representação política dos da cooptação, traço do nosso DNA herdado da história ibérica. No caso dos sindicatos, preconizava o PT, era preciso romper com a Consolidação da Legislação Trabalhista (CLT), e conduzir suas ações reivindicativas para o sistema da livre negociação com os empresários, cuja força dependeria da sua capacidade de organização e de mobilização dos trabalhadores.

A matriz do interesse, além de moderna, seria libertária, vindo a significar uma ruptura com uma cultura política que afirmaria a primazia do Estado e dos seus fins políticos sobre a sociedade civil. Essas afinidades no ponto de partida não resistiram à exposição às circunstâncias da política. Nascidos no mesmo solo, com vários pontos em comum, essas duas florações da social-democracia brasileira, partindo de São Paulo, igualadas em força aí, mais do que aproximar as suas convergências, se entregam a uma dura luta por território. No plano da disputa nacional, essa luta se tem caracterizado pelo esforço desses partidos em arregimentar aliados que engrossem suas hostes, desequilibrando a disputa em seu favor.

Assim, essas expressões do moderno na política brasileira, que se têm encontrado em tantos pontos na modernização e expansão do capitalismo brasileiro, encaminham o seu antagonismo na disputa pelas forças do atraso político e social. Com isso, os impulsos modernizadores vindos de São Paulo são moderados pelo cálculo político que preside a disputa entre seus grandes partidos - um deles, o PSDB, governando o Estado há vinte anos e pretendente a governá-lo por mais quatro. Para cada qual importa, além das questões inarredáveis de suas agenda, capturar o maior número possível de forças aliadas, indiferentes ao atraso político e social que representam, como no caso, por exemplo, do Maranhão do clã de Sarney, cobiçado pelo PT, ou do PTB de Roberto Jefferson, objeto de desejo do PSDB.

Esses movimentos, meramente instrumentais para os fins da competição eleitoral, contudo, não são ingênuos quanto à própria história desses partidos, que mudam com eles. A surpreendente mudança do PT, que, de ácido crítico da Era Vargas e da tradição republicana em geral, passou a incorporar muito de suas práticas, pode ser explicada, em boa parte, por essa lógica. Assim, no movimento sindical, as forças genuinamente petistas, com um histórico de lutas contra o imposto sindical e o princípio da unicidade sindical, hoje se veem tangidas a participar de uma estrutura sindical que sempre condenaram como lesiva à autonomia dos trabalhadores. A resposta do PSDB, ao incorporar acriticamente o atraso, mimetiza a do PT. Aliás, nesta sucessão, alguém sabe qual o programa, do PSDB para a reforma trabalhista?

O velho sindicalismo, na carona do novo, encontrou sua sobrevida, moderando, quando não interditando em muitos aspectos relevantes, a passagem do moderno. O mesmo vem ocorrendo com os agentes do patrimonialismo das antigas oligarquias regionais, que preservam o seu domínio a partir de suas articulações com o moderno e dessa forma, cindido em dois como está, capitula de dirigir o atraso a fim de transformá-lo para simplesmente se associar a ele.

Luiz Werneck Vianna é professor-pesquisador do Iuperj e ex-presidente da Anpocs

Viagem aos anos de chumbo :: Luiz Sérgio Henriques

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Nunca é fácil voltar aos anos de chumbo ? por definição, um tempo de ferro e fogo, de mulheres e homens "partidos", e aqui a metáfora drummondiana sai da literatura e adquire a cruel realidade de corpos dilacerados e, pior ainda, de "mortos sem sepultura".

Este último tema ? referente àqueles sobre cuja morte ainda desce um véu mais ou menos denso de ignorância e cujos restos ainda não encontraram sequer a mera reparação do enterro decente ? nos remete violentamente a um plano além da política. Chorar e enterrar os próprios mortos está na base da convivência humana, tal como a concebemos. E sobre isso não é possível transigir. Antígona que o diga.

Mas não é fácil voltar. Desde logo, porque também é imperioso outro plano de análise, mais diretamente prático e mundano, que sem cancelar de modo algum aquela dimensão simbólica previamente dada nos remete à realidade rebelde das orientações de valor, das opções e ações políticas feitas por indivíduos de carne e osso em contextos determinados. E neste aspecto a esquerda brasileira, de um modo geral, ainda precisa se debruçar sobre si mesma e examinar ações e personagens que lhe são caros, mas muito provavelmente são limitados e circunscritos, se é que nos movemos ? e queremos nos mover ? no plano contemporâneo da democracia.

Os anos de chumbo marcam também, entre nós, o surgimento do período moderno da política brasileira. De fato, esta política nasce, contraditoriamente, num contexto de modernização autoritária da economia e da sociedade, implementada pelo regime militar. Um autoritarismo que se acentuou, obviamente, a partir de 1968, mas mesmo então nunca configurou uma ordem sem brechas ou fissuras, com arregimentação "total" da sociedade, à moda fascista. Uma ditadura "desenvolvimentista", e não desindustrializante, como em outros casos simultâneos da América Latina, na qual conviveram, na maior parte do tempo, uma precária legalidade constitucional e a realidade, bruta por natureza, dos atos institucionais.

A mudança social impetuosa ? mesmo que dirigida "por cima" ? foi a marca de um País que se tornava cada vez mais complexo e potencialmente insubmisso aos constrangimentos do autoritarismo. Os sinais dessa insubmissão brotavam de muitos lados, alguns insuspeitados. As eleições eram momentos certos de crise de legitimidade, e isso desde os primeiros momentos do regime, como demonstrado cabalmente pela eleição de governadores moderada, mas efetivamente oposicionistas, em 1965, e pela constituição da "frente ampla" de líderes civis deslocados pelo regime militar, inclusive importantes personalidades conservadoras e mesmo da direita política, como o governador Carlos Lacerda.

A sequência de atos institucionais curiosamente não impediu ? e não podia mesmo impedir -a expansão quantitativa do corpo eleitoral em níveis inéditos, resultado evidente do alistamento e do voto obrigatório. Um fato que, por si só, tinha efeito explosivo sobre as possibilidades de autorreprodução do regime e forçava, quase por inércia, os limites e obstáculos impostos à competição eleitoral - salvo nos casos em que, como em 1970, parcela substancial da esquerda denunciou equivocadamente a participação nas eleições e dirigiu sua crítica, muitas vezes duríssima e desqualificadora, contra o "reformismo" e o "eleitoralismo", apostando todas as fichas numa suposta "forma superior de luta". Referimo-nos, evidentemente, à miragem revolucionarista da luta armada, com seus mitos, seu voluntarismo e ? digamos diretamente ? o reforço involuntário proporcionado às estruturas da repressão política e aos setores mais duros do regime, quando menos por estimularem na população, e isso na hipótese melhor, a admiração passiva diante da ação de uns poucos heróis e de vanguardas populares autoproclamadas.

Cabe mencionar que não só o mundo da política aos poucos se reconstituiria, resistindo às cassações, aos exílios e aos breves, mas difíceis, períodos de fechamento do Congresso. Em outro âmbito decisivo das relações de força, o fato é que também os sindicatos, em circunstâncias extremamente adversas, puderam na maioria dos casos seguir existindo nos marcos consentidos de uma ação "assistencial" ? ao menos na aparência. Pois facilmente se constata que quando uma economia industrial se moderniza, mudando toda a composição social, inevitavelmente concentra grandes massas operárias, como no ABC, e aquele assistencialismo inicial, mediante paciente ação dirigente, só pode encorpar-se numa moderna luta por direitos protagonizada por um associativismo autônomo, amparado por advogados, economistas e profissionais de outro tipo, como no exemplo histórico do Dieese.

Acredito ter descrito, sumariamente, um mundo bem estranho ao que podia conceber a esquerda armada daqueles anos, com sua exaltação da violência como "parteira da História" e da substituição do Estado burguês, segundo um leninismo (ou guevarismo) empobrecido, rumo a algo que costumava atender pelo nome - muito incômodo! - de "ditadura do proletariado".

Pode-se dizer que ninguém mais fala em luta armada. Verdade. Pode-se dizer, também, que ninguém defende "ditaduras progressistas", embora, em nuestra América, o pecado more ao lado e nem todos saibam resistir à tentação. Seja como for, resta por fazer um exame rigoroso de velhas categorias, que, desconfio, talvez resistam sob nova aparência. Se isso for verdade ? se a esquerda ainda não tiver esboçado os contornos de uma novíssima trama de conceitos políticos baseada na paz e nos direitos ?, toda volta ao passado de chumbo e toda exigência de reparação correm o risco de se perder em recriminação facciosa ou irrealista, alheia aos valores universais que deveriam constituir uma esquerda democrática.

ENSAÍSTA, É TRADUTOR E UM DOS ORGANIZADORES DAS OBRAS DE ANTONIO GRAMSCI EM PORTUGUÊS (WWW.GRAMSCI.ORG)

Contraventor contumaz :: Paulo Brossard

DEU NO ZERO HORA(RS)

Tenho sob os olhos a primeira página de um dos jornais de maior circulação entre nós e cuja manchete diz tudo em duas linhas, “Lula pela quarta vez é multado pelo TSE”. Em outra folha, leio que a procuradora da República e vice-procuradora-geral eleitoral junto ao Tribunal Superior Eleitoral, Sandra Cureau, chama a atenção para o deslize que se repete e que pode comprometer o registro da candidata oficial, também duas vezes multada pela mais alta Corte eleitoral do país. Para completar o quadro, a corte (aqui a corte é em minúscula) dos amigos do rei se mostra indignada com a independência do Ministério Público e com sua vigilância ainda que discreta. Enfim, meia dúzia de palavras que se interpenetram e não ocultam a gravidade da arrogância cometida. Porque lei alguma permite a quem quer que seja colocar-se acima da lei e, em se tratando do presidente da República, o mau exemplo é ainda mais censurável.

Já vivi alguns anos e testemunhei muitas coisas pouco exemplares, mas nunca vi o presidente da República ser censurado pela Justiça Eleitoral por infração à lei e, indiferente ou desdenhoso, repetir a falta uma, duas, três vezes. Em uma delas chancelou, dizendo que mandaria a multa para os ouvintes. É de convir-se que o presidente nada ganha com essas vulgaridades e muito se afasta das regras do decoro que a liturgia do cargo lhe impõe. Volto a dizer que lei alguma permite ao presidente proceder, no trato com um dos ramos do Judiciário, com essa licenciosidade de contraventor contumaz.

Chama a atenção esse procedimento presidencial, tanto mais quando ele decorre de um ato que lei alguma lhe permitiria praticar, a escolha se sua própria sucessora, por decisão solitária.

A propósito, vou lembrar uma situação, não por prazer, mas com pesar, que se tornou corrente no regime autoritário. O que foi feito agora lembra, com efeito, o que era habitual; os presidentes militares tomaram decisões repugnantes, restando à Arena o privilégio de conformar-se com elas. Ao maior partido do Ocidente, como foi cognominado, cabia chancelar o que o Executivo todo poderoso fazia majestaticamente. Não sei por que, talvez pelo papel que se lhe reservava, “o maior partido do Ocidente” trocou de nome duas vezes, se não estou enganado, parece que levado pela necessidade de desvincular-se dos seus tempos de gloriosa... servidão.

Como à Arena do passado, ao numeroso partido do presidente, a despeito das várias facções que o segmentam, foi reservado o honroso encargo de aprovar a escolha unipessoal do presidente pelo silêncio e desse modo engolir a indicação feita e entregue ao saber dos marqueteiros, do penteado ao estilo das roupas e à linguagem com acentos cesáreos.

Deixando de lado esses aspectos, embora nada irrelevantes, o fato que constrange é ver o presidente assumir a postura de um contraventor da lei, assim acoimado pela mais alta Corte eleitoral do país, já agora sob a advertência do Ministério Público Federal. Terá sido essa estranha febre que levou o presidente da República ao redil finamente democrático de Ahmadinejad ou terá sido nas terras persas que o presidente contraiu a febre islâmica?

Faz mais de século, Rui Barbosa notou que “as ideias políticas germinam e frutificam em utilidades como as sementes no solo, ou produzem nas sociedades fenômenos fatais, como os venenos nos organismos vivos”. E não se esqueça o presidente de que os maus exemplos são ainda piores, porque mais fáceis de serem repetidos.


*Jurista, ministro aposentado do STF

A guerra dos mundos:: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

"As pessoas não querem o pós-Lula, querem que o Lula continue"
(Rubens Figueiredo, cientista político, na Globonews)

Somos campeões mundiais em número de horas destinadas a navegar na internet. O twitter entre nós é um fenômeno, como foi o Orkut. Estudiosos estrangeiros se espantam com o elevado número de comentários postados em sites e blogs daqui. A sociabilidade do brasileiro é real e virtual. A rede, assim, poderá servir para que votemos melhor.

Certo? Não necessariamente. Até desconfio que não. Grande parte das pessoas que escrevem ou comentam o que é postado na rede manifesta seu inconformismo com o comportamento dos tradicionais meios de comunicação - jornais, emissoras de rádio e de televisão. Principalmente em ano eleitoral. É bom lembrar que há eleições a cada dois anos. O inconformismo, assim, seria permanente. E cresce veloz.

Dá-se cada vez mais como verdade absoluta na web que nós, jornalistas, manipulamos os fatos para que sirvam aos interesses mesquinhos e inconfessáveis de nossos patrões - esses, por sua vez, aliados incondicionais de poderosos grupos econômicos que exploram o país e o povo. A crise que atinge os jornais por toda parte é apresentada como sinal irrecusável da falta de confiança popular no seu conteúdo.

Ora, a crise dos jornais tem várias causas. E a verdade, na maioria das vezes, costuma estar no meio. Mas não é disso que quero tratar. Como titular de um blog há seis anos e refém de um computador durante 10 a 12 horas por dia de domingo a domingo, digo sem medo de errar que se reproduzem na web, sobretudo em espaços reservados ao jornalismo, os mesmos defeitos apontados nos veículos convencionais de comunicação.

Vou além: de fato, tais defeitos se agravam ali com frequência. Porque o mais acessado meio de comunicação do planeta é um território sem leis e sem códigos de ética. (O ministro Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal, considera a internet o último refúgio de liberdade do homem.) E também porque o anonimato é permitido. Ah, quantos crimes cruéis não são cometidos a cada segundo na rede devido ao anonimato.

E ouse falar contra o anonimato. Você será acusado de pugnar contra a livre manifestação de pensamento e correrá o risco de se tornar alvo de uma campanha difamatória. Ouse sugerir algum tipo de regulamento que discipline o que pode ser postado. Ou pelo menos o que não deve. Com toda a certeza você será execrado como o mais vil dos inimigos do direito universal ao livre acesso à informação e à opinião.

Fira injustamente a imagem de alguém ou de alguma instituição no jornal, televisão ou rádio. O atingido apelará para a Justiça. E você será julgado. Na internet, não. Porque se você conseguir identificar quem o ofendeu e decidir processá-lo haverá quem se encarregue de clonar a ofensa e de disseminá-la rede a dentro. Para cada anônimo identificado e processado surgirão milhares dispostos a encampar a ofensa.

A internet servirá nas eleições para que candidatos e partidos tentem, legitimamente, atrair apoios e votos por meio de mensagens e debates. Esse será, digamos, o lado sadio do uso da rede. Mas ela servirá também para a sistemática e organizada tentativa de se destruir reputações e espalhar rumores e mentiras. Não duvide: acabará prevalecendo o lado negativo do uso da rede.

Sob a proteção do anonimato ou da falsa identidade, e com a ajuda de militantes voluntários ou pagos, partidos e candidatos já começaram a travar o jogo sujo na internet. Ao cabo do processo eleitoral, seria curioso comparar o grau de veracidade do que foi postado na rede com o grau de veracidade do que foi veiculado por jornais, emissoras de televisão e de rádio. Mais do que curioso: poderia ser educativo.

O que alguns chamam de Partido da Imprensa Golpista tem seu equivalente no Partido da Internet Golpista. A sigla é a mesma - PIG. O mal que podem causar é o mesmo. Com algumas diferenças: um está em declínio, o outro em expansão. Um tem CNPJ, o outro nem CPF.

Quando o vice é útil :: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Começo por onde terminou ontem o mestre Clóvis Rossi, aqui no andar de cima desta página. Com muitas coberturas eleitorais acumuladas, Rossi escreveu sobre a relativa insignificância de candidatos a vice-presidente. Falou a propósito da ansiedade no mundo tucano pela possível entrada do mineiro Aécio Neves na chapa presidencial de José Serra.

Ontem, o próprio Aécio apareceu em entrevista a Adriana Vasconcelos minimizando a ajuda eventual sendo o candidato a vice de Serra: "Isso poderia aumentar em no máximo 5% as intenções de votos em favor de Serra em Minas".

É possível teorizar ao infinito a respeito do tema. Na vida real, as eleições recentes mostram três eventuais utilidades para um vice:

1) tempo de TV: é quando a sigla do vice dá ao titular mais tempo no horário eleitoral. Em 1994 e 1998, essa simbiose ocorreu com Marco Maciel (DEM, ex-PFL) apoiando Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Neste ano, Michel Temer (PMDB) anabolizará a exposição televisiva de Dilma Rousseff (PT);

2) mudança de imagem: em 2002, o vice de Lula foi o empresário José Alencar, então no PL. O petista ganhou mobilidade no establishment. Circulou com conforto pela elite. Não faltou dinheiro na campanha do PT;

3) mais voto: embora seja raro, um vice popular pode ajudar o desempenho do titular nas urnas.

Houve um exemplo claro em 1989. Waldir Pires era o vice da candidatura presidencial de Ulysses Guimarães (1916-1992), cuja votação final ficou em pífios 4,7%, no 7º lugar. Na Bahia deu-se uma história diferente. Waldir renunciou ao governo baiano. Fiel no posto de vice, garantiu naquele Estado a Ulysses 15,7% e a terceira colocação.

Tudo considerado, Aécio Neves pode não desejar ser vice, mas há exemplos históricos mostrando a possibilidade de fazer a diferença. Não parece ser, no momento, o desejo do ex-governador mineiro.

Pé de Bola - Moreira da Silva

Propostas para fazer o Brasil crescer

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Em sabatina hoje, Dilma e Serra apresentam programas

Tecnicamente empatados nas pesquisas eleitorais, os presidenciáveis Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) participam hoje do Exame Fórum – Brasil: a construção da 5ª maior economia do mundo.

Na sabatina, os pré-candidatos terão de mostrar as diferenças que apresentam para convencer os eleitores de que são a melhor opção para o país crescer. Apesar de ambos garantirem que não vão mexer na chamada “santíssima trindade” da economia brasileira – metas fiscal e de inflação, além de câmbio flutuante – especialistas afirmam que falta objetividade nos discursos.

Neste ponto, dizem, Dilma saiu na frente por dar mais clareza às propostas.

– A Dilma falou em Nova York que vai reduzir as metas de inflação, mas gradualmente. O Serra ainda não foi tão claro. Por esse aspecto, ela saiu na frente – avalia o ex-diretor de política monetária do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas.

Segundo o economista, tanto Dilma quanto Serra prometeram que não vão mexer no tripé da economia brasileira, e garantiram que vão promover a reforma tributária no país.

Contudo, diz Thadeu, falta apresentarem meios de cumprir as promessas.

– Os dois são muito competentes e responsáveis, não vão mudar os rumos da economia.

Mas ainda não se conhece que tipo de reforma cada um tem em mente. Qual será o ritmo da política fiscal a ser implementada por cada um? Eles precisam apresentar com mais clareza o ritmo da política tributária que pretendem adotar – disse.

Oportunidades na crise No último dia 20, o economista Márcio Pochmann, presidente do Instituto de Política Econômica Aplicada (Ipea), afirmou que o Brasil deve aproveitar a oportunidade de transição da economia para um desenvolvimento que prioriza a sustentabilidade, a fim de se tornar uma liderança mundial, durante um encontro na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio de Janeiro.

Para o economista Adriano Pires, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Dilma tem a vantagem de ser a candidata de um governo bem avaliado na área econômica.

– Não há dúvidas de que o governo Lula, do qual Dilma fez parte, promoveu a melhora do poder aquisitivo da população mais pobre do país. Mérito do governo, mas também houve ajuda do cenário internacional.

De 2003 a 2008, a economia mundial viveu céu de brigadeiro – ponderou. – A Dilma dá sinais de que terá uma gestão mais populista, ou seja, vai fazer o Estado gastar mais, investir e abrir crédito. A população terá de decidir se considera isso bom para o país.

Segundo Pires, em contraponto a Dilma, José Serra se mostra mais conservador. E acertou ao prometer desonerar o PIS e Confins das obras de saneamento, já que o país precisa investir em infraestrutura.

Estado forte Ex-ministro da Fazenda no governo Itamar Franco, Rubens Ricúpero também acredita que Dilma estará disposta a abrir os cofres públicos para garantir investimentos e linhas de crédito para as camadas mais pobres, enquanto Serra tentaria reduzir essa conta.

– Há uma semelhança grande entre os dois, ambos são desenvolvimentistas e querem investir em infraestrutura. A diferença está na disposição dos gastos de custeio da máquina governamental.

Os pré-candidatos do PT e do PSDB participam em horários distintos do Fórum Exame.

Dilma discursará às 11h; Serra, às 16h. Após participar do evento, a petista deverá cumprir agenda política no Rio de Janeiro.

Os demais candidatos não participam do fórum.

Hoje 'amigas' do Estado, centrais miram na imprensa

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Roberto Almeida

Centrais sindicais e movimentos sociais pretendem, com dois vultosos eventos no início desta semana, aprovar reivindicações para cobrar respostas dos presidenciáveis. Sem um alvo preferencial entre os que postulam o Palácio do Planalto, elegeram como inimigo "o principal partido de direita" no País ? "os conglomerados privados de mídia".

Amanhã, a Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), composta por CUT, UNE, MST e mais 25 entidades, deve, além de desferir golpes contra a imprensa, ratificar um documento-base a ser apresentado a Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV).

Intitulado Projeto Nacional e Popular dos Movimentos Sociais, o texto elogia os "avanços" da gestão petista e classifica a crise do mensalão no governo federal como "tentativa de golpe contra Lula em 2005".

Ao todo, são cinco eixos temáticos para expor 58 propostas. "Muito mais há para ser feito", avisa o texto da CMS. "Defendemos mudanças na política econômica com redução dos juros e do elevado superávit primário, para que o País transite para um novo Projeto Nacional de Desenvolvimento." Há, ainda, críticas à reforma agrária.

Criada em 1997 sob outra alcunha ? chamava-se Fórum Nacional de Luta por Terra, Trabalho e Cidadania ?, a entidade passou por uma reformulação assim que Lula foi eleito, em 2002. Com a chegada petista ao governo, substituiu a meta de "derrubar" o então presidente Fernando Henrique Cardoso por "manter a pauta dos movimentos sociais no debate". "Somos questionadores", define o representante da CUT para a CMS, Antonio Carlos Spis.

A entidade espera 2 mil representantes para ratificar o documento na quadra do Sindicato dos Bancários, em São Paulo. O evento antecede a Assembleia da Conferência Nacional da Classe Trabalhadora, marcada para amanhã no Estádio do Pacaembu.

Lá, cinco centrais - CUT, Força Sindical, NCST, CGTB e CTB -, esperam 30 mil delegados em uma versão atualizada da Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), que em 1981 uniu sindicalistas em torno da redemocratização do País.

As cinco centrais, hoje beneficiadas pelo imposto sindical, que usaram para alugar o estádio, devem aprovar a Agenda da Classe Trabalhadora, que também será apresentada aos presidenciáveis. Em pauta, a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais e o fim do fator previdenciário.

País não está pronto para a nova classe média, diz Bolívar

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

É preciso "evitar o oba-oba", afirma doutor em ciência política e diretor de instituto de estudos econômicos

Entraves do país são infraestrutura, mão de obra especializada e educação, diz autor de "A Nova Classe Média"

Uirá Machado

SÃO PAULO- O Brasil não está pronto para a nova classe média.

Tampouco esse segmento populacional está devidamente preparado para suas recentes conquistas em termos de mobilidade social.

As afirmações são de Bolívar Lamounier, doutor em ciência política pela Universidade da Califórnia e primeiro diretor-presidente do Ipesp (Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos de São Paulo).

Em parceria com Amaury de Souza, ele acaba de lançar o livro "A Nova Classe Média" (Campus-Elsevier).

Na entrevista abaixo, ele discute a sustentabilidade da nova classe média e diz ser preciso "evitar o oba-oba".

Folha - Quais são as principais características dessa nova classe média?

Bolívar Lamounier - Estamos falando de algo em torno de 80 milhões de pessoas, um agregado social imensamente heterogêneo. É um megaprocesso de mobilidade social. É o conjunto da classe C ascendendo a condições e aspirações mais altas de consumo . Em razão disso, as famílias que a integram tornam-se mais "ambiciosas". Têm mais interesse em aumentar sua renda, querem um nível educacional mais alto para si e para seus filhos, manifestam desejo de obter um bom emprego ou de se estabelecer por conta própria etc.

Essa nova classe média é "sustentável"?

No nível macro, a sustentabilidade depende do crescimento econômico a taxas elevadas -e ambientalmente compatíveis. Hoje, no Brasil, há um clima de exagerado otimismo, mas é preciso cautela para não cantarmos vitória antes do tempo. Por outro lado, o que chamamos de ascensão da classe C se confunde em larga medida com a expansão do mercado interno e a redução das desigualdades de renda, condições que tendem a tornar o processo inteiro mais sustentável, quer dizer, menos suscetível a crises. O nível micro refere-se à geração da renda pelas famílias, à educação, ao empreendedorismo etc. Por exemplo, existem milhões de pessoas "empreendedoras", mas muitas não estão preparadas para isso. Do outro lado, a política pública mais dificulta que ajuda: carga tributária elevada, complicações burocráticas etc.

O Brasil está pronto, do ponto de vista estrutural, para essa nova classe média?

O avanço realizado nas últimas duas décadas é muito grande, mas eu não diria que está pronto. Basta atentar para a infraestrutura, obviamente incapaz de sustentar taxas elevadas de crescimento, a mão de obra especializada -que já começa a faltar- e a educação, de modo geral muito ruim.

E a nova classe média está preparada?

É preciso evitar o oba-oba. O aumento do consumo é salutar e as pessoas têm atualmente aspirações altas. Além de adquirirem mais escolaridade, os indivíduos precisam investir mais em si mesmos, ou seja, em sua própria produtividade, seja para conseguir empregos estáveis e de boa qualidade, seja para se tornarem empreendedores.


Frase
"Há no Brasil um clima de exagerado otimismo, mas é preciso cautela para não cantar vitória antes do tempo"

Bolívar Lamounier
cientista político

Jarbas adota o estilo de Serra e poupa Lula

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Pré-candidato do PMDB a governador assume a mesma postura paz e amor do presidenciável tucano com relação ao petista. Mas afia o discurso quando se trata de atacar Eduardo Campos

Gilvan Oliveira

O senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), principal pré-candidato da oposição a governador, decidiu seguir à risca a receita do presidenciável José Serra (PSDB): adotou a postura paz e amor em relação ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). No último sábado, durante feijoada oferecida em sua homenagem pelo deputado federal José Mendonça (DEM), em Belo Jardim (Agreste), Jarbas evitou ataques ao presidente, e até o elogiou. O peemedebista negou fazer oposição pessoal a Lula e disse que as críticas em sua atuação parlamentar são dirigidas às falhas do governo.

Não sou contra ninguém. Sou oposição. O que o governo faz de errado, faz pela metade, de trapalhada. Tomo minha posição de oposição. Os aloprados do PT, por exemplo, nós denunciamos. Lula foi um bom presidente? Foi. Encontrou as coisas arrumadas e foi um bom presidente. Ajudou Pernambuco? Ajudou. Mas ele não é candidato, comentou. Jarbas, porém, desferiu críticas ao governo Eduardo Campos (PSB), adiantando que a atitude paz e amor será dispensada só a Lula.

O senador também seguiu a diretriz adotada por José Serra de confrontar o currículo do tucano com o da candidata do PT a presidente, a ex-ministra Dilma Rousseff. Por diversas vezes, ele mencionou que Lula não disputa a eleição, e enfatizou que o País deve eleger um presidente preparado, referindo-se à trajetória de Serra que já exerceu os cargos de governador de São Paulo, prefeito da capital paulista, ministro, senador e deputado em comparação à de Dilma, que foi apenas ministra. Lula está terminando seu mandato. Temos que eleger um presidente preparado, advertiu.

Mas em relação ao governo estadual, o peemedebista foi bem crítico, adiantando em parte a linha de discurso afiado que imprimirá quando a campanha começar. Jarbas qualificou a gestão Eduardo como uma peça de publicidade, que não realizou tanto quanto divulga. Apontou o que seriam falhas em áreas onde o governo assegura que vem obtendo êxitos: segurança, educação e saúde - neste último ponto, ele criticou a construção de três novos hospitais.

Se em um ano tivemos 3.800 mortos e no ano seguinte, 3.600, você não pode estar se vangloriando. As TVs mostram a violência diuturna nas ruas. Quando a publicidade não cola com a realidade, então é um desastre, avaliou. Jarbas também se referiu à insatisfação dos professores com o governo como ponto fraco na educação. E considerou a construção dos hospitais como desnecessária. Pernambuco tem a segunda maior rede nacional de hospitais (estaduais). Quem tem a rede que temos não pode estar criando novos hospitais, gerando novas despesas, se não faz modernização, atualização e adequação dos que já existem, afirmou.

Candidato de Uribe surpreende na Colômbia

DEU EM O GLOBO

O candidato do presidente Álvaro Uribe surpreendeu ontem ao conseguir ampla vitória sobre a oposição no primeiro turno das eleições presidenciais na Colômbia. Contrariando as últimas pesquisas, divulgadas uma semana antes com os dois candidatos em empate técnico, o ex-ministro Juan Manuel Santos obteve 46,6% dos votos, contra 21,5% do ex-prefeito de Bogotá Antanas Mockus. Por pouco, Santos não foi eleito presidente ontem. Eles se enfrentarão agora no segundo turno, no dia 20 de junho. Santos, segundo analistas, deve herdar os votos do terceiro colocado, Germán Vargas Lleras, que obteve 10% ontem. No interior do país, combates entre as Farc e o Exército deixaram cinco mortos.

Surpresa nas urnas na Colômbia

Santos contraria pesquisas e leva o dobro de votos de Mockus, mas não escapa do 2º turno

Mariana Timóteo da Costa

Contrariando todas as pesquisas de opinião anteriores ao pleito, o candidato governista Juan Manuel Santos venceu com ampla margem de diferença o primeiro turno das eleições presidenciais, realizadas ontem na Colômbia. Santos, que aparecia em todas as consultas empatado tecnicamente com o candidato do Partido Verde, Antanas Mockus, obteve 46,6% dos votos, contra 21,5% de Mockus. Por pouco a votação não leva o candidato do Partido da U ao que, na manhã de domingo, ao votar, ele dizia acreditar: que venceria o pleito ainda no primeiro turno. Como não obteve votação superior aos 50% de votos, necessária para se eleger presidente ontem mesmo, Santos enfrentará Mockus no segundo turno em 20 de junho.

Votos do 3º colocado iriam para Santos

Mas com uma série de vantagens: além dos quase sete milhões de votos que recebeu no primeiro turno - mais do que o dobro de Mockus - Santos deve, de acordo com analistas, herdar quase todos os eleitores do terceiro colocado na disputa, o direitista Germán Vargas Lleras, do Cambio Radical.

Lleras foi outra surpresa desta eleição: obteve mais de 10% dos votos, com propostas de campanha muito semelhantes às de Santos. A noite na sede do Partido da U foi de festa.

Cerca de 500 partidários de Mockus também se reuniram na sede do Partido Verde. Apesar de decepcionados, comemoram a possibilidade de seu candidato fazer mais três semanas de campanha.

- Foi a eleição mais pacífica dos últimos 30 anos na Colômbia - elogiou Adelina Cobo, presidente do Conselho Nacional Eleitoral, em referência à ausência de denúncias expressivas de fraude, bem como maiores episódios de violência.

Oitenta e cinco observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA) também fiscalizaram as eleições, além de centenas de outros enviados por outros países, a maioria da União Europeia (UE). Mais uma surpresa: o comparecimento dos colombianos às urnas. Se antes o prognóstico era que até 65% dos 30 milhões de eleitores votariam devido à forte mobilização que as campanhas obtiveram nas ruas, apenas a metade votou. O voto na Colômbia é facultativo, e a abstenção em eleições costuma ser alta, o que continuou.

Ao votar por volta das 10h (meio-dia em Brasília) numa escola de um bairro nobre de Bogotá, Santos se disse confiante de que ganharia a eleição e, "espero que no primeiro turno". Rodeado por partidários, o candidato pediu que as pessoas votassem "contra o terrorismo, o pessimismo e a insegurança". Ainda prometeu dar continuidade às políticas contra a violência do presidente Álvaro Uribe, melhorar a economia e recuperar a "boa relação" com os vizinhos Venezuela e Equador.

- Ele é muito bem preparado e o único que tem conhecimento para liderar a Colômbia. Além disso, promete fazer um governo de conciliação e sem corrupção - elogiou Elvira de Schrader, de 64 anos, que foi ver de perto Santos votar.

Antanas Mockus votou pouco depois das 8h no horário local, na Cidade Universitária de Bogotá. Ele se disse confiante, e elogiou a democracia colombiana, que estava "pela primeira vez não votando contra, e sim a favor". Diversos analistas culparam a votação menos expressiva de Mockus ao fato de seu desempenho ter sido fraco nos debates realizados nas TVs na semana que antecedeu à eleição.

- Santos ganhou de Mockus em todos os últimos debates - lembrou a cientista política Laura Gil.

Pesquisas não refletiram debates

Pela lei eleitoral colombiana, a divulgação das pesquisas de opinião estava proibida desde o domingo anterior; então, as pesquisas não refletiram o desempenho dos debates. Mockus foi criticado ao longo da semana por não ter explicitado devidamente suas propostas de governo, e ainda por propor medidas impopulares para estimular a economia, como aumentar os impostos.

O esquerdista Gustavo Petro, do Polo Democrático Alternativo, superou a conservadora Noemí Sanín, e ficou com o quatro lugar. Sanín aparecia como a terceira colocada nas pesquisas, à frente de Pardo e Vargas Lleras. Sua campanha e a de Rafael Pardo, do Partido Liberal, o sexto colocado, foram consideradas os maiores fracassos desta eleição, já que seus dois partidos formam, respectivamente, a segunda e a terceira maior bancada do Congresso.

Cepal defende aumento da carga tributária

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Lu Aiko Otta
BRASÍLIA – A Comissão Econômica para América Latina e Caribe das Nações Unidas (Cepal) defende a elevação da carga tributária para garantir crescimento e distribuição de renda na região. Essa é a proposta central do documento "A hora da igualdade - brechas por fechar, caminhos por abrir", lançado ontem.

A sugestão de elevar impostos não se aplica ao Brasil, segundo explicou o secretário executivo adjunto da Cepal, Antônio Prado. A carga tributária no País é de 35,8%, segundo o dado mais recente da Receita Federal, referente a 2008. Embora num nível considerado adequado, a tributação brasileira sofre de outro problema. Ela recai de forma mais pesada sobre as pessoas de menor renda e as políticas sociais não são eficientes para contrabalançar esse problema.

Na média da América Latina e Caribe, porém, a carga é mais baixa: 18%. É um volume de arrecadação, segundo a Cepal, insuficiente para que os governos criem políticas que deem condições de a região crescer tanto quanto poderia.

Para a comissão, o maior problema a ser atacado é a falta de incentivos à inovação, que faz a economia da região ser pouco produtiva se comparada aos Estados Unidos e à Europa. É para financiar esse tipo de política que a Cepal defende mais tributação. Os recursos extras seriam usados também para fortalecer programas sociais. "São políticas de Estado de longo prazo, que não dependem de governo, por isso defendemos a construção de um pacto com a sociedade", disse o economista.

Segundo Prado, a América Latina e o Caribe alcançaram, nos seis anos anteriores à crise, um feito inédito: cresceram e distribuíram renda. A pobreza caiu de 44% da população para 33%, o mais baixo nível da história. Mas, com a crise, cerca de 9 milhões de pessoas que haviam deixado a faixa mais baixa de renda voltaram a ela.

O documento da Cepal relaciona o crescimento econômico oscilante dos últimos anos ao humor dos fluxos de capital. E defende que haja mais controle no entra e sai de recursos especulativos. Cita como exemplo o Brasil, que em outubro de 2009 começou a taxar em 2% o dinheiro estrangeiro destinado à compra de ações e títulos. Outra recomendação é aplicar o sistema de metas de inflação com parcimônia, ou seja, não buscar baixar a inflação de forma drástica em período curto de tempo.

"O Brasil está bem", disse Prado, ao explicar que nem todas as sugestões se aplicam ao País. "Não será preciso fazer nada heroico para ir bem nos próximos anos." Do ponto de vista das contas públicas, por exemplo, o Brasil é considerado o mais sólido da região.

O QUE PENSA A MÍDIA

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As Quatro estações, Vivaldi, Karajan, Anne-Sophie Mutter

Gargalhada:: Cecília Meireles


Homem vulgar! Homem de coração mesquinho!
Eu te quero ensinar a arte sublime de rir.
Dobra essa orelha grosseira, e escuta
o ritmo e o som da minha gargalhada:

Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah!

Não vês?
É preciso jogar por escadas de mármores baixelas de ouro.
Rebentar colares, partir espelhos, quebrar cristais,
vergar a lâmina das espadas e despedaçar estátuas,
destruir as lâmpadas, abater cúpulas,
e atirar para longe os pandeiros e as liras...

O riso magnífico é um trecho dessa música desvairada.

Mas é preciso ter baixelas de ouro,
compreendes?
— e colares, e espelhos, e espadas e estátuas.
E as lâmpadas, Deus do céu!
E os pandeiros ágeis e as liras sonoras e trêmulas...

Escuta bem:

Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah!

Só de três lugares nasceu até hoje essa música heróica:
do céu que venta,
do mar que dança,
e de mim.

domingo, 30 de maio de 2010

Reflexão do dia – Karl Marx


Imediatamente antes e depois do momento em que Copérnico fez sua grande descoberta do verdadeiro sistema solar, descobriu-se ao mesmo tempo a lei da gravitação do Estado: percebeu-se que seu centro de gravidade estava nele mesmo (...) Maquiavel e Campanella primeiro , depois Spinoza, Hobbes, Hugo Grotius, e até Rousseau, Fichete, Hegel se puseram a considerar o Estado com olhos humanos e a expor suas leis naturais, não segundo a teologia, mas segundo a razão e a experiência.



(Karl Marx, Euvres, III: Philosopbie, p. 207-208 – citado Miguel Abensour no livro “A democracia contra o Estado”, p. 41- Editora UFMG, 1998)

Os caminhos do poder:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Para vencer a eleição presidencial, é preciso “discurso e máquina”. A definição é do cientista político Cesar Romero Jacob, professor da PUC do Rio, que está lançando pelas editoras PUC e Vozes o livro “A geografia do voto nas eleições presidenciais do Brasil: 19892006”, um estudo, com uma equipe de pesquisadores brasileiros e franceses, sobre as últimas cinco eleições presidenciais brasileiras e os caminhos que os partidos percorreram para chegar ao poder.

O pragmatismo que tomou conta historicamente da campanha eleitoral para presidente fará, segundo ele, com que tanto Dilma Rousseff, do PT, quanto José Serra, do PSDB, tenham que fazer alianças com políticos mal vistos pela opinião pública.

Até o momento, lembra Romero Jacob, as máquinas partidárias que atuam sobre as “estruturas de poder” existentes — as oligarquias nos grotões, os pastores pentecostais, os políticos populistas na periferia e a classe média urbana escolarizada — não estão em campo, mas fazendo os acordos políticos nos bastidores.

E são acordos que não envolvem ideologia, mas capacidade de ação partidária.

Somente em julho, após “os acordos feitos, dinheiro em caixa, marqueteiros contratados”, é que as máquinas entrarão em ação.

Mas Romero Jacob salienta que trabalhar essas estruturas de poder não é o suficiente para eleger um presidente da República.

“Ter um cabo eleitoral lá no grotão é importante. Em 1994, Fernando Henrique teve 95% dos votos em Mamonas, na divisa de Minas com a Bahia. Mas há os fatores políticos fundamentais, como a conjuntura econômica atual, a popularidade do Lula, que são pontos fortes para a candidatura da Dilma Rousseff”, analisa.

Mas ele também destaca como fraqueza a falta de experiência de disputa eleitoral de Dilma.

Romero Jacob compara o que está acontecendo com a candidata oficial ao que aconteceu com Lula em 2002: “Com Lula houve um ‘reposicionamento de marca’, saiu o operário radical de macacão e entrou o Lulinha Paz e Amor. A Dilma está tendo a imagem reconstruída ao vivo e a cores, física e politicamente.

O que vai prevalecer na percepção do grande público?”, pergunta.

Ao contrário, o candidato tucano José Serra tem a força da experiência política e administrativa, mas tem uma fraqueza de discurso.

Romero Jacob explica: “Ele tentou em 2002 ser o candidato da ‘continuidade sem continuísmo’, uma mensagem ambígua. Hoje, ele continua ambíguo, uma espécie de oposição sem oposicionismo”.

Para Romero Jacob, o candidato do PSDB está testando “o pós-Lula ou o anti-Lula”.

A disputa tende a ser muito acirrada entre os dois, o que provocaria uma redução de votos da senadora Marina Silva, do Partido Verde.

A polarização entre PT e PSDB nas eleições presidenciais a partir de 1994 leva o cientista político Romero Jacob a não acreditar na viabilidade de uma terceira via eleitoral.

Seus estudos demonstram que não há nada em comum entre os terceiros colocados nas cinco eleições presidenciais.

Em 1989 foi Brizola, com 16% — com votos basicamente no Rio e Rio Grande do Sul; em 1994, Enéas, com 7% dos votos.

Segundo os mapas, os votos em Enéas foram conseguidos principalmente na periferia metropolitana, um voto que Romero Jacob define como “de protesto das viúvas do Collor”, parte do eleitorado que, depois de 29 anos sem eleição, teve a decepção com um presidente destituído pelo impeachment e acusado de corrupção.

Um eleitorado de escolaridade mais baixa que encontrou em Enéas a maneira de demonstrar sua insatisfação.

Em 1998, o terceiro colocado foi Ciro Gomes, com 12%; em 2002, foi Garotinho, que é outro fenômeno, ligado aos evangélicos. Em 2006, a senadora Heloisa Helena, representando “as viúvas do Lula”, segundo Romero Jacob. Um eleitorado petista que descobriu que a Carta ao Povo Brasileiro de Lula em 2002 era para valer, e se decepcionou com isso.

Na eleição deste ano, Romero Jacob acha que a senadora Marina Silva, candidata do Partido Verde à sucessão de Lula, corre o risco de reduzir seu eleitorado devido à polarização.

Para ele, a causa ambiental sensibiliza principalmente a classe média urbana escolarizada: “Consumo consciente é para quem já foi incorporado ao mercado de consumo. As classes C, D e E querem mais é consumir, não estão preocupados com os efeitos no meio ambiente”.

Mesmo se Marina, que é evangélica, se transformasse na opção eleitoral desse segmento, Romero Jacob acha que a rejeição a um candidato marcado por essa definição é muito alta.

O livro de Romero Jacob demonstra, com análises da chamada “geografia eleitoral” dos candidatos, que tanto Collor quanto Fernando Henrique e Lula venceram com estratégias semelhantes, e que Lula passou a atuar nos mesmos territórios eleitorais que Fernando Henrique depois de ter perdido três eleições em que colocou a ideologia à frente do pragmatismo.

A mudança do arco de alianças do PT em 2002, que era sempre com PDT, PCdoB, PSB e foi se ampliar para receber o PL com a chegada de José Alencar para compor a chapa como vice de Lula, refletiuse imediatamente na sua “geografia eleitoral”.

A votação de Lula caiu no Rio Grande do Sul, porque Brizola apoiou Ciro Gomes, e no Rio de Janeiro, por causa de Garotinho. Mas cresceu no Tocantins, no oeste da Bahia, no Maranhão, revelando as negociações com setores das oligarquias.

Segundo Romero Jacob, esses números não refletem um crescimento do PT, mas a adesão das oligarquias a Lula. Em 2006, Lula e Alckmin fazem uma campanha pragmática.

A geografia eleitoral de Lula sofre outra mudança. Já se vê a influência dos programas assistencialistas como o Bolsa Família, com o aumento da votação do petista no Nordeste e na Amazônia.

Aos trancos e barrancos:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Não importa quem é quem, fato é que brigam como cão e gato. Andam mais juntos do que nunca, pois firmaram uma aliança e já na campanha eleitoral estão fadados à convivência estreita na mesma chapa de candidatos.

Uma relação cuja falta de sintonia se dá pela própria natureza do par, PT e PMDB, gente de origem, jeito, pensamento, grupos, completamente diferentes.

De repente se veem na contingência de construir uma aliança imensa no País todo, estado por estado, para sustentar a candidatura presidencial de Dilma Rousseff.

Em alguns deu certo, na maioria mais ou menos. Em três mais visivelmente complicados - Pará, Maranhão e Minas Gerais - os acordos podem até vir a ser fechados no final, mas a animosidade reinante entre as partes não indica harmonia adiante.

Por muito menos o PT não conseguiu se adaptar em 1998 à aliança com Leonel Brizola e, diga-se, vice-versa.

Das atuais complicações em tela, a mais importante politicamente para a aliança nacional é a de Minas. Em tese estaria tudo acertado: chapa única com o candidato do PMDB para governador (Hélio Costa), o petista vencedor das prévias do partido Fernando Pimentel em uma das vagas ao Senado e o lugar de vice provavelmente para alguém também do PT.

Tudo pronto para ser oficialmente anunciado no próximo dia 6 de junho.

Eis que senão quando vem um petista do alto comando e diz: nada disso. O partido quer a cabeça da chapa, espera que Hélio Costa desista, seja candidato ao Senado porque, embora esteja na frente nas pesquisas, quando Aécio Neves entrar de fato na campanha estadual em favor do candidato Antonio Anastasia, os índices de Costa se desfazem.

São "inconsistentes". Fernando Pimentel, prefeito de Belo Horizonte até 2008 com 80% de aprovação, teria muito mais identificação com o mineiro que o peemedebista, cuja vida política é feita em Brasília como senador e ministro das Comunicações.

De mais a mais, o PT gostaria de adiar o anúncio oficial para depois de fechada a aliança nacional de apoio do PMDB a Dilma.

Ah, para quê?

Hélio Costa esperou 24 horas e partiu para o rebate começando pelo essencial: "Sou pré-candidato ao governo de Minas, a ponte de retorno ao Senado já não existe para mim e ponto final".

E um acréscimo: "Boatos petistas não me tiram a determinação".

Quais boatos? "É todo dia, toda hora, em todo lugar espalham que não vou ser mais candidato. Nosso pessoal discute isso nas reuniões, eles podem fazer o jogo político, mas não precisam esticar tanto a corda porque isso lá na frente compromete a relação."

Hélio Costa ainda prefere acreditar que as lideranças do PT estejam fazendo jogo de cena para acalmar a militância e não parecer que entregaram o ouro de bandeja com facilidade. "É gênero, porque a briga entre eles é muito séria."

Agora, ele também acha que nem por isso era necessário desqualificar sua posição nas pesquisas ("na última apareço com 52%") dizendo que seus votos são inconsistentes.

"Por quatro vezes tive votações de 3,5 milhões de votos. Quero saber quem é o petista que teve isso." Falta de aproximação cotidiana com o eleitorado?

"Conheço 750 dos 853 municípios de Minas e visito todas as semanas o estado. O Fernando Pimentel saiu da prefeitura de Belo Horizonte há dois anos."

Quanto à data do anúncio do apoio ao nome dele para disputar o governo em chapa única, continua seguro: "Será em 6 de junho." Antes da convenção nacional do PMDB marcada para o dia 12, onde os delegados mineiros têm 16% dos votos. "Para aonde Minas for irá o resultado da convenção."

Não obstante a contundência, Hélio Costa não investe em briga, aposta na aliança. Inclusive porque tem consciência: "Só ganhamos se estivermos juntos, PT e PMDB".

No detalhe, a análise é a seguinte: "No Sul está complicado, São Paulo é caso perdido. É fundamental ganhar em Minas onde Dilma está empatada com Serra e Aécio ainda não entrou na campanha. Em Minas há um partido dificílimo de ser enfrentado: o PL, Palácio da Liberdade". (Sede do governo, atualmente ocupado pelo vice de Aécio, candidato à sucessão).

Democracia sem olhar para trás:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Passou sem ser percebido, talvez à moda mineira, um dado digno da maior consideração às vésperas de se desencadear a campanha presidencial. Não é segredo, e muito menos coisa desprezível, que os dois candidatos à frente nas pesquisas de opinião pública são oriundos da esquerda, na qual se formaram e dela se afastaram o suficiente para não comprometerem a taxa democrática de cada um. É de se supor que Dilma Roussseff e José Serra, em duas gerações de equivalente iniciação política através de períodos históricos com características opostas um sob a Constituição de 1946, outro sob o AI-5 tenham se identificado com a militância política de esquerda e apresentem saldo suficiente em favor da democracia.

A pequena e ocasional convergência entre José Serra e Dilma Rousseff se deve menos à evolução política para a esquerda do que ao esgotamento do exaurido padrão brasileiro de fazer política à moda tradicional, para não dizer pior. Apenas para salvar aparências, a diferença entre os candidatos em cena se reduz ao mínimo. Ganhe quem ganhar, essa diferença custa barato. A questão se situa praticamente na economia, e no que for acessório. Por último, conviria realçar a contribuição histórica do presidente Lula, cuja carta aos brasileiros lhe abriu crédito na classe média, colocada mais embaixo na escala social, e lhe valeu a eleição e a reeleição. A burguesia leu tudo nas entrelinhas, nas quais não está escrito mas subentendido. Nada, porém, com a esquerda, da qual quer distância. A fórmula clássica é eleger-se pela esquerda e governar pela direita. Não falha. Lula já está longe.

A exposição das candidaturas José Serra e Dilma Rousseff deve ter em vista mais cuidado para os dois não perderem a esquiva confiança da classe média, que emergiu do anonimato na onda da democracia que fala por si mesma e pela eleição direta. Chega de citações entre aspas retiradas da teoria e não perfilhadas pela realidade. A sucessão presidencial tem dialeto próprio, e fala por si mesma a circunstância de serem José Serra (pelo PSDB) e Dilma Rousseff (pelo PT) candidatos de mais alta cotação nas pesquisas. Trata-se do Brasil pós-Lula, queira ou não o presidente. Dissipou-se o velho medo de que a esquerda venha cobrar mais do que se dispõe nossa vã democracia a pagar.

Dilma e Serra estão, portanto, dispensados de demonstrar e se desculpar por terem tido iniciação política pela esquerda. A diferença (que não é pequena) entre eles se deve a circunstâncias políticas anteriores às respectivas candidaturas e a condições históricas adversas, pois em 1968 a geração que queria se inserir (vá lá) no processo se recusou a aceitar que a solução tivesse de ser política, e apostou o que não tinha em projetos revolucionários. Ao contrário, a geração já adulta dos jovens que haviam apostado na Constituição de 1946 estava preparada para a prova de paciência política, e se dispôs a desgastar o poder autoritário com paciência, coerência e resignação até a apoteótica derrota do regime e seu candidato na eleição indireta. José Serra aprendeu política com a esquerda que apostou na arte do possível. Na etapa seguinte, a geração de Dilma Rousseff viu no AI-5 a oportunidade de ir mais longe do que ter como prêmio de consolação uma Constituição burguesa. Ficou pelo caminho. De volta do exílio, Serra se apresentou e participou de um jogo que também será eterno enquanto durar.

Depois de cumpridos quatro mandatos de presidentes pelo voto direto, o Brasil se considerou em condições de eleger Lula. E o fez. Nada aconteceu que justificasse o temor tradicional. Os dois candidatos que marcam passo nas pesquisas devem ter aprendido que é perfeitamente possível conciliar esquerda e democracia mediante o uso de ferramentas legais. Cumpre-lhes demonstrar com atos que é contraproducente o medo da democracia. Pelo menos enquanto a vida política brasileira não se distanciar de um ponto, ainda não localizado, em que as imperfeições ponham em risco a estabilidade política. A impressão é que o país acelerou suas possibilidades, e aquele que olhar para trás corre o risco de virar estátua de sal.

O vice, o inútil tão querido:: Clóvis Rossi

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - No tempo em que fazia um programa de humor, não um "talk-show", Jô Soares costumava ironizar a figura do vice (qualquer vice): dizia que vice não virava nome de rua, vice não ganhava estátua em praça pública.

É verdade. Vice, a rigor, só é importante quando morre ou é destituído o titular. Que o digam José Sarney e Itamar Franco.

Vice nem aparecia na cédula eleitoral, que, aliás, nem existe mais. Da desimportância do vice, como fator de atração do eleitor, dá prova José Alencar.

Alguém aí acha que Alencar trouxe um voto, unzinho que fosse, para Luiz Inácio Lula da Silva?

Só foi chamado porque Lula queria um empresário para acalmar os que ainda o consideravam um perigoso comunista. Hoje, é verdade, Alencar teria votos, não por sua ação como vice, mas por sua brava luta contra o câncer.

Por tudo isso, me diverte o esforço despendido pelo tucanato para emplacar Aécio Neves como vice de Serra. A menos que a cacicada do PSDB tenha informações privilegiadas sobre a saúde de Serra e, por isso, ache prudente ter Aécio como o futuro presidente e não como o futuro vice.

Será que alguém acredita que algum eleitor, unzinho que seja, raciocina assim: Ah, vou votar no Serra porque o vice dele é o Aécio?

Pode acontecer -e até acontece muito- que o eleitor pense: Quem é o candidato do Aécio? É o Serra. Ah, então voto nele.

Mas, aí, independe da posição que Aécio ocupe no xadrez eleitoral tucano. Depende da convicção e do empenho com que diga que seu candidato é Serra. Ponto.

É o que faz Lula com Dilma. Por isso, ela, virgem em disputas eleitorais, já empatou com Serra, por mais que seu vice, muito provavelmente, venha a ser Michel Temer, que não chega a empolgar multidões -acho até que não empolga nem a ele próprio.

Ilusión | Ilusão - Julieta Venegas | Marisa Monte

Reportagens mostram a voz viva dos eleitores: Alberto Almeida

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Quem mora na cidade de São Paulo ou mesmo no Estado de São Paulo tem uma noção limitada de como pensa o eleitor médio brasileiro. Podemos ir além de São Paulo. As pessoas de classe média e alta das grandes cidades brasileiras não entendem, muitas vezes, por que o governo Lula tem uma aprovação tão elevada e por que Lula é tão querido.

A série de artigos do Estado, tão bem redigidos pelo jornalista Lourival Sant"Anna, mostra com bastante clareza e realidade o que é captado de maneira fria pelos números das pesquisas quantitativas. Lula é querido sim, mas não em abstrato. As pessoas que gostam de Lula pensam desta maneira porque associam ao seu governo a melhoria de suas vidas.

Lula não é um deus, um ídolo, ou alguém cuja popularidade seja inquebrantável. Aliás, a popularidade do presidente não cairá, como não diminuiu no passado, por causa de críticas ou ataques de quem lhe opõe. É preciso um fato político real, como uma profunda crise econômica ou um aumento agudo da inflação para que a popularidade de Lula caia. Ao que tudo indica isso não acontecerá mais.

O que o Estado mostra, ao ir ouvir diretamente o eleitor, é que essa elevada popularidade tem a ver com ter sido possível comprar um carro, reformar a casa, conseguir um emprego melhor. Aqueles que apoiam Lula, e que por isso têm a tendência de votar na sua candidata, estão ao lado do presidente por causa de uma questão geral, ampla, assim formulada pelos eleitores: "A minha vida melhorou com Lula". Esse "melhorou" se aplica às condições financeiras, ao consumo.

Não há um motivo específico para ficar ao lado de Lula, algo como: "Aprovo ele porque esta obra denominada desta ou daquela maneira me beneficiou." Ou ainda, "estou ao lado de Lula porque ele apresentou na Câmara, e conseguiu que fosse aprovado, um determinado projeto de lei". Na aprovação de Lula predomina uma justificativa geral e faltam motivações específicas.

O sinal se inverte quando lemos os depoimentos dos eleitores que pretendem votar nos candidatos de oposição. O motivo para votar em Serra ou Marina é sempre alguma coisa que o governo Lula ou fez errado ou deixou de fazer. Os eleitores são muito específicos quando mencionam coisas erradas que foram realizadas. Para eles, neste caso, é preciso votar em outro candidato que não o apoiado por Lula para que uma lei particular seja abolida ou introduzida.

O recado da população captado pelo Estado é também uma sugestão para a campanha de Serra e Marina. A sugestão de que ambos busquem um discurso mais geral e mais amplo. Vale recordar aqui dois estilos de campanha nas primárias norte-americanas, o Obama do discurso geral e a Hillary do discurso específico.

A mesma pergunta feita a Hillary e a Obama recebia duas respostas inteiramente diferentes. Hillary apresentava quinze medidas que iriam resolver o problema endereçado pela pergunta; dentro de cada medida ela explicava como e por que seria feito daquela forma. Obama se limitava a responder indicando o rumo que seguiria. Algo como "todos os americanos terão acesso a tratamento de saúde digno".

Obama venceu Hillary na indicação do Partido Democrata por diversas razões, mas essa diferença no discurso de ambos não pode ser menosprezada. O eleitor capta e retém muito menos informações do que as pessoas que gostam de política e a acompanham. Por isso, o argumento geral tende a ser mais efetivo do que questões detalhadas e específicas.

Outro aspecto muito relevante do especial do Estado se refere ao que realmente mobiliza o eleitor. As discussões são cristalinas: o eleitor, de qualquer escolaridade, só se preocupa com o seu próprio umbigo. O eleitor, no momento de escolha de seu candidato, é mesquinho e egoísta. Ele quer saber como os candidatos podem melhorar a sua vida. Eles querem que os candidatos falem para ele de seus problemas e como serão resolvidos.

Eis aí mais um recado para as campanhas de 2010. Temas como Banco Central não dizem nada para o eleitor, em particular se comparado com um tema sobre o qual a atuação do Banco Central tem grande impacto: a inflação. Temas como reforma tributária, carga fiscal e sua linguagem incompreensível, crise fiscal ou a partilha de impostos entre municípios, Estados e União não dizem respeito em nada ao interesse do eleitor. O eleitor quer saber e está disposto a votar em quem vai reduzir os impostos dos alimentos, passagens aéreas e automóveis. O Estado premiou seus leitores e as campanhas de 2010 com este especial que para nós, pesquisadores, é uma verdadeira pesquisa qualitativa.


É SOCIÓLOGO E AUTOR, ENTRE OUTROS LIVROS, DE "A CABEÇA DO BRASILEIRO"

Eleitor de Dilma vê Serra como o mais experiente

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Maioria do eleitorado da petista acha tucano mais preparado, diz Datafolha

No levantamento com os eleitores, ex-ministra é citada como quem mais vai ajudar as mulheres e os pobres

Fernando Rodrigues

BRASÍLIA - José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) estão empatados na disputa pelo Palácio do Planalto, ambos com 37%, mas há uma grande diferença quando se afere sua imagem entre os eleitores.

O tucano é visto como o mais experiente (por 64% dos eleitores), inteligente (42%), realizador (40%) e o mais preparado "para ser presidente, de modo geral" (45%). Os percentuais da petista, nesses mesmos quesitos, são 17%, 23%, 24% e 29%, respectivamente.

Marina Silva (PV) fica num longínquo terceiro lugar, com 5% a apontando como a mais experiente. Nos outros atributos, ela tem, respectivamente, 10%, 7% e 6%.

Os dados são de pesquisa Datafolha de 20 e 21 de maio, com 2.660 eleitores em todo o país. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

Quando se faz um cruzamento entre os dados da pesquisa, descobre-se que 51% dos eleitores que declaram votos em Dilma acham Serra o mais experiente.

Para Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha, o desempenho do tucano se deve, em parte, ao fato de ele ser ainda o mais conhecido. Enquanto 34% dizem "conhecê-lo bem", só 15% dizem o mesmo sobre a petista. Para Marina, a taxa é 10%.

O Datafolha pesquisou 24 atributos de imagem relacionados aos candidatos. Em 14 deles, Serra ficou à frente de Dilma. A petista só teve desempenho nitidamente melhor em dois itens: é vista como a que mais ajudará os pobres e as mulheres.

Para 37%, Dilma será a que "mais defenderá os pobres", contra 21% dos que enxergam esse atributo em Serra. Marina Silva tem 18%.

Na outra ponta, Serra lidera com 45% quando a pergunta é sobre "quem defenderá os mais ricos". Cerca de um terço dos próprios eleitores do tucano também compartilham dessa opinião -29% apontam o próprio Serra nesse quesito.

Para 15%, Dilma ajudará os abastados. Só 3% põem Marina nessa categoria.

A petista lidera com 45% como a que "mais defenderá os interesses das mulheres". Nesse item, Serra tem 14%, e Marina fica com 22%.

Dilma é a única entre os três principais candidatos a ter menos votos do eleitorado feminino (33%) do que entre homens (42%).

PF avaliza visão de Serra sobre Bolívia

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Itamaraty enviou relatório à Câmara que revela crescimento na produção de cocaína sob a gestão de Morales

Aumento é resultado de política que combate o tráfico, mas valoriza a produção da folha de coca, afirma ministério

Josias de Souza

BRASÍLIA - Documentos oficiais produzidos pelo governo durante a gestão do presidente Lula reforçam a acusação de José Serra (PSDB) contra o governo da Bolívia.O pré-candidato acusou o governo boliviano, na última quarta-feira, de ser "cúmplice" dos traficantes que enviam cocaína para o Brasil. Em reação, a rival petista Dilma Rousseff disse que Serra "demoniza" a Bolívia.

Dados colecionados pelo governo, porém, avalizam a versão do tucano.

Sob condição de anonimato, uma autoridade da Divisão de Controle de Produtos Químicos da Polícia Federal falou à Folha que, segundo relatórios oficiais da PF, 80% da cocaína distribuída no país vem da Bolívia -a maior parte na forma de "pasta". O refino é feito no Brasil.

Para a PF, a evolução do tráfico revela que há "leniência" do país vizinho. Serra usara uma expressão análoga: "corpo mole".

A PF atribui o fenômeno a aspectos culturais, pois o cultivo da folha de coca é legal na Bolívia. O produto é usado de rituais indígenas à produção de medicamentos. Seu excedente abastece o tráfico.

ITAMARATY

Num documento endereçado à Comissão de Relações Exteriores da Câmara, em 2007, o Itamaraty disse que, "entre 2005 e 2006, a área de produção de folha de coca na Bolívia cresceu de 24.400 para 27.500 hectares".

Também informa que, sob o governo de Evo Morales, adotou-se tanto uma política de combate ao narcotráfico quanto de "valorização" da folha de coca.

Segundo o Itamaraty, uma delegação de brasileiros e chilenos foi à Bolívia, em junho de 2007, para reunião com autoridades locais. "Sem resultado", diz o texto.

Sob Lula, realizou-se um esforço para reativar, sem sucesso, as comissões mistas antidrogas Brasil-Bolívia.

Em setembro de 2008, o Itamaraty enviou à Câmara uma atualização do relatório assinado pelo chanceler Celso Amorim. No tópico sobre drogas, ele afirma que a ONU "divulgou relatório que indica aumento na produção de coca na Bolívia pelo quinto ano consecutivo".

Em outubro de 2008, Morales expulsou da Bolívia cerca de 20 agentes do departamento antidrogas dos EUA que ajudavam no combate ao tráfico. O pretexto foi a acusação de que a DEA (agência americana antidrogas) realizava espionagem.

A Bolívia firmaria, dois meses depois, um acordo com o Brasil, segundo o qual a PF passaria a atuar na Bolívia no combate ao tráfico de cocaína e armas. Diz a PF que o acordo esbarra até hoje em entraves financeiros. La Paz deseja que Brasília arque com os custos.

Serra mira política externa:: João Bosco Rabello

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Aparentemente desconectada da campanha eleitoral, pela natureza do tema (drogas), a crítica do candidato José Serra ao governo boliviano obedece a uma estratégia de contestação da política externa brasileira, questionando sua eficiência e relação custo/benefício para o Brasil.

Para não pôr em risco o princípio de respeito à soberania das nações a abordagem crítica explora a relativização do conceito democrático e dos direitos humanos pelos países que recebem tratamento privilegiado do governo Lula.

Nesse contexto, a Bolívia foi precedida por Venezuela, Cuba e Irã e, no plano estritamente comercial, pela Argentina e China. Em pílulas, Serra vai expondo seu pensamento revisionista para a chancelaria brasileira.

Traz para o debate eleitoral a possibilidade de explorar as contradições do governo Lula, de discurso e prática democráticos no plano interno, mas indiferente aos desmandos em Cuba e Venezuela, tolerante com movimentos como as Farc, à qual ainda reconhece status político, e ingênuo na ação pela paz no Oriente Médio.

A politização do Mercosul e o reconhecimento da China como economia de mercado deram visibilidade ao conflito comercial e produziram a proposta de introduzir no currículo do Itamaraty a especialização em comércio externo, cuja gestão no governo é fragmentada, em ministérios e departamentos.

A serviço de Roriz

Setores do Ministério Público não gostaram do contexto festivo em que Durval Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais do governo Arruda, disparou sua mais recente denúncia, contra o presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ).

Como já depusera sobre o suposto envolvimento de Maia com Arruda, o ato público foi interpretado como um favor a Joaquim Roriz, candidato a um quinto mandato pelo governo do DF, dessa vez pelo PSC.

Pressionado pelas autoridades para delatar Roriz, de cuja administração foi peça-chave, Durval mostra-se cada dia mais obediente ao ex-chefe, mesmo ameaçado de perder a contrapartida pela delação premiada, que é a redução de pena. Roriz está empenhado em tirar de seu caminho o DEM, seu concorrente ao governo local e também a parceiro numa possível aliança com o PSDB.

Vice a toda prova

A abertura de temporada no PSDB pela escolha do vice de José Serra, desmente todas as tentativas do partido de negar a espera excessiva pelo ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves, apesar de todas as suas reafirmações de que concorreria ao Senado. De qualquer forma, o não definitivo de Aécio empresta objetividade ao Plano B dos tucanos, que pode ser o senador Marco Maciel, titular do cargo nos dois governos de Fernando Henrique. Ele volta a ganhar força por aglutinar o DEM em torno de seu nome, mas são mencionados ainda o ex-presidente do partido, Pimenta da Veiga e a senadora Kátia Abreu (DEM-TO).

PMDB de Minas ameaça votar contra Dilma

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Novo impasse na negociação preocupa o Planalto; PT quer Pimentel candidato ao governo, mas partido de Temer exige a vaga para Costa

Vera Rosa

BRASÍLIA - A insistência do PT em emplacar a candidatura do ex-prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, ao governo mineiro abriu nova crise com o PMDB. Em represália, uma ala do partido ameaça votar contra a aliança com Dilma Rousseff para a Presidência.

Dirigentes do PMDB avisaram o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que a parceria com Dilma corre risco se os petistas não apoiarem o senador Hélio Costa na disputa ao Palácio da Liberdade.

"Lamentavelmente, companheiros do PT estão usando uma política rasteira contra mim", desabafou Costa. "Mas não adianta o PT fazer pressão e guerra de guerrilha no grito porque isso não me abala."

Ex-ministro das Comunicações, Costa não escondeu a contrariedade com rumores dando conta de que teria desistido da cadeira hoje ocupada pelo governador Antonio Anastasia (PSDB) para concorrer à reeleição ao Senado. "Se eu quisesse voltar ao Senado, não precisaria fazer esforço", insistiu. "Sou pré-candidato ao governo."

O PMDB de Minas detém 69 dos 804 votos da convenção do partido, marcada para 12 de junho, com o objetivo de homologar a candidatura do presidente da Câmara, Michel Temer (SP), como vice na chapa de Dilma. Temer também comanda o PMDB.

Sozinhos, os mineiros não conseguem desmanchar a aliança, mas podem fazer corpo mole na campanha. Além disso, a insatisfação tem potencial para contaminar grupos, já que os diretórios de São Paulo e Pernambuco são contra o casamento com o PT e apoiam José Serra (PSDB). Detalhe: a convenção do PT é em 13 de junho, 24 horas depois do encontro peemedebista.

"O clima está péssimo e para toda ação há uma reação", alfinetou Wellington Salgado (PMDB-MG), suplente de Costa no Senado. "A insatisfação em Minas tem nome e uma coisa é certa: a bancada do PMDB votará contra a coligação com Dilma se o PT não fechar conosco."

Intervenção. Na quarta-feira, uma reunião de dirigentes estaduais do PT com o presidente do partido, José Eduardo Dutra, em Brasília, escancarou o mal-estar. Petistas se queixaram da pressão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que quer o acordo com o PMDB a qualquer custo, de olho no precioso tempo de TV da sigla na propaganda eleitoral. O grupo chegou a dizer a Dutra que o casamento com o PMDB só sairá em Minas e no Maranhão se houver intervenção nas seções regionais.

Desde que Dilma começou a crescer nas pesquisas de intenção de voto - ganhando fôlego em Minas, o segundo colégio eleitoral do País, depois de São Paulo -, o PT mineiro voltou a bater o pé pela candidatura de Pimentel. Um dos principais coordenadores da campanha de Dilma, o ex-prefeito venceu a prévia realizada no início do mês contra o ex-ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias.

Apesar de Pimentel ter conquistado o direito de representar o partido na corrida ao Palácio da Liberdade, o PMDB dava como certo que ele seria candidato ao Senado, deixando a vaga ao governo para Costa. Na prática, esse cenário pode até se tornar realidade - com o anúncio da composição da chapa no próximo dia 6, conforme prometido -, mas não sem trauma. Motivo: discípulos do ex-prefeito não querem desistir da briga pela cadeira de Anastasia, afilhado do tucano Aécio Neves.

"Estamos muito animados e convictos de que o melhor candidato para ganhar do PSDB o governo mineiro é mesmo Pimentel", afirmou o deputado federal Reginaldo Lopes, presidente do PT de Minas. "Vamos convencer o PMDB e os demais partidos da base aliada de que a candidatura do Pimentel também é melhor para Dilma, porque ele tem votos de amplos setores."

Embora Costa esteja na dianteira em todas as pesquisas, petistas o comparam nos bastidores a um "cavalo paraguaio": bom de largada, mas ruim de chegada. Sem querer jogar mais combustível na crise, Pimentel assegurou que o acordo com o PMDB será cumprido, com palanque único para Dilma.

Articulador político do Planalto, Padilha evitou espichar a polêmica e disse não acreditar que o PMDB vote contra a dobradinha com o PT. "A melhor forma de conquistarmos o governo de Minas e o Senado é em aliança com o PMDB", resumiu.

Para complicar ainda mais o cenário, os seguidores de Patrus conseguiram empurrar o encontro do PT mineiro para 19 e 20 de junho. Foi uma estratégia para lavar as mãos e obrigar o Diretório Nacional do PT - que se reúne antes, em 11 de junho - a arcar com o desgaste da "intervenção branca" em Minas. Adversários de Pimentel também desejam que ele pague a fatura política por eventual renúncia.

Aliados comemoram Aécio ''só em Minas''

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Para tucanos que trabalham para eleição de Anastasia, candidatura do ex-governador ao Senado evitará "nacionalização" de campanha no Estado

Eduardo Kattah Embora já esperada, a rejeição de Aécio Neves aos apelos e pressões para que aceitasse integrar como vice na chapa presidencial tucana, encabeçada por José Serra, foi recebida com alívio e euforia entre os principais aliados do ex-governador no PSDB-MG.

"A expectativa é que ele conduza a campanha com mais força, porque vai se dedicar só aqui", afirmou o secretário de Governo, Danilo de Castro. "Havia muito medo, um certo receio do PSDB mineiro que a candidatura dele a vice o afastasse daqui. Foi uma atitude que ele tomou com convicção e que teve o apoio do grupo todo."

Durante as férias de Aécio na Europa, o governador Antonio Anastasia ficou estacionado nas pesquisas de intenção de voto, gerando apreensão entre tucanos e aliados.

Embora de acordo com a última pesquisa Vox Populi Anastasia apareça 28 pontos porcentuais atrás de Hélio Costa (PMDB) e 14 de Fernando Pimentel (PT), pré-candidatos da base aliada, o PSDB-MG destaca que o governador tem enorme potencial de crescimento, já que é ainda pouco conhecido. O próprio Aécio, num esforço para injetar otimismo, classificou o patamar de seu candidato como "extraordinário".

"A gente está seguro que o Anastasia ainda é conhecido de uma parcela muito pequena da população mineira, apesar de todas as viagens que ele tem feito", destacou o deputado federal Paulo Abi"Ackel (PSDB-MG).

Transferência. Ao mesmo tempo, os tucanos mineiros difundem a versão segundo a qual o ex-governador como vice pouco acrescentaria à candidatura de Serra nas regiões onde o pré-candidato tucano aparece em clara desvantagem, como no Norte e no Nordeste do País.

Aécio deixou o governo mineiro com 73% de aprovação e colocará à prova sua capacidade de transferir votos. Em 2006, no segundo turno, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva obteve em Minas uma vantagem de cerca de 3,2 milhões de votos sobre o então candidato tucano, Geraldo Alckmin.

"Tenho como convicção de que ele como vice talvez não somasse muito e atrapalharia tanto a campanha do Serra quanto a do Anastasia. No dia em que ele deixasse de ser novidade para a mídia, caía no esquecimento. Porque ninguém lembra de vice", comentou Castro.

Lideranças do PSDB-MG admitem que a decisão de Aécio de reafirmar sua candidatura ao Senado evita uma "nacionalização" da campanha em Minas. Os tucanos mineiros acompanham com atenção a briga na qual se envolveram os diretórios estaduais do PT e o PMDB pela indicação do candidato ao governo.

A aposta é que qualquer que seja o candidato, a aliança não marchará unida. Lideranças deixam claro, porém, que se Aécio decidisse rever seus planos e compor a chapa presidencial, a disputa pelo governo de Minas ganharia outra dimensão e uniria todos os aliados.

Aécio: 'Não haverá alguém tão dedicado à vitória'

DEU EM O GLOBO

Aécio diz que desde dezembro decidiu que não seria vice, mas que será o mais empenhado pela eleição de Serra

ENTREVISTA: Aécio Neves

Preterido pelo PSDB na disputa pela vaga de candidato a presidente, o exgovernador Aécio Neves ocupou, nos últimos dias, o posto de um dos principais personagens da campanha tucana rumo ao Planalto. Especialmente depois que o presidenciável José Serra perdeu a dianteira nas pesquisas de intenção de voto, o que desencadeou uma nova ofensiva dentro e fora do PSDB no sentido de convencê-lo a ser o vice da chapa. Mesmo após três semanas de férias no exterior e sob pressão, ele resiste à ideia e afirma, nesta entrevista ao GLOBO, que não será vice de Serra.

Para se justificar, apresenta números de pesquisas do PSDB indicando que sua presença na chapa presidencial tucana garantiria, no máximo, acréscimo de 5% nas intenções de votos em favor de Serra. A seguir, trechos da entrevista, feita na sexta-feira à noite, por telefone.

Adriana Vasconcelos

O GLOBO: O senhor diz que política é destino, e o seu parece que está lhe empurrando para ser vice de Serra. Isso pode ocorrer?

AÉCIO NEVES: No ano passado, apresentei ao meu partido uma alternativa de candidatura presidencial. No momento em que percebi que uma maioria partidária caminhava na direção da candidatura do governador Serra, fiz um gesto em favor da unidade, que foi abdicar desta candidatura. Acima de projetos pessoais deve haver algo, hoje em falta na política, que é uma visão patriótica. Em dezembro anunciei minha candidatura ao Senado. De lá para cá, nada mudou, nem minha convicção de que Serra é o melhor candidato para vencer as eleições, e que como candidato ao Senado tenho mais condições de ajudá-lo.

Não teme ser responsabilizado por uma eventual derrota de Serra?

AÉCIO: De forma alguma. Na vida devemos ter convicções e lutar por elas. Precisamos fortalecer diariamente nossas convicções e resistir às pressões que nos afastam delas. Estou absolutamente seguro de que tomei a melhor decisão, pensando no meu país.

Que fato poderia levar o senhor a mudar de ideia? Há quem diga que o fato de o gover nador Anastasia estar atrás nas pesquisas...

AÉCIO: Quando retornei (das férias), me deparei com uma grande confusão entre opinião e análise. E com três fatos que me eram colocados à frente. O primeiro de que a eleição se definiria em Minas. Qualquer análise pode mostrar que a eleição pode ser definida no Nordeste, que tem 27% do eleitorado. Minas tem 10%. O segundo fato é que a má situação de Anastasia poderia me fazer mudar de opinião. O governador tem 25% de conhecimento e, na pesquisa espontânea, tem os mesmos 5% de intenções de votos de seu adversário. É uma situação extraordinária, e estamos preparados para vencer no primeiro turno. A terceira, de que minha candidatura a vice seria fundamental para eleger Serra. Tenho pesquisas que mostram que isso poderia aumentar em no máximo 5% as intenções de votos em favor de Serra em Minas.

Mas já ajudaria...

AÉCIO: Isso significa meio por cento dos votos nacionais e com risco de desguarnecermos a nossa retaguarda e termos outras perdas, se eu não estiver em Minas. Não haverá no meu partido ou fora dele alguém tão dedicado à vitória de Serra.Temos o melhor candidato e condições para vencer em Minas e no Brasil.

O empate entre Serra e Dilma pesou na sua decisão?

AÉCIO: Minha decisão foi tomada em dezembro, quando Serra tinha uma vantagem expressiva em todas as pesquisas. É preciso haver mais serenidade por parte dos nossos próprios companheiros. Vejo uma ansiedade excessiva.

A subida de Dilma confirma o poder de transferência de votos de Lula?

AÉCIO: Reconheço que o governante bem avaliado tem algum poder de transferência de voto. E servirá, certamente, para o nosso caso em Minas. Mas essa transferência é limitada. Quem define a eleição não são os apoiadores, é o eleitor.

Que outras opções Serra tem para vice?

AÉCIO: É uma questão que tem de ser vista com serenidade. Existem alternativas dentro do partido, como o senador Tasso Jereissati, ou mesmo dentro da coligação. Não é isso que vai mudar o rumo da eleição.

O senhor ainda acredita num distensionamento entre PT e PSDB no futuro?

AÉCIO: Acredito. Acho que vai chegar um momento em que vamos perceber que temos mais identidade do que imaginamos, e que hoje o que nos separa mais profundamente é a disputa pelo poder. Mostramos em Belo Horizonte, quase como um laboratório, que é possível construir um projeto conjunto em favor de uma cidade. Acho que a sociedade brasileira aprovaria a construção de um projeto em que o PT e o PSDB pudessem fazer parte.

Pelo papel que o senhor está tendo nesta eleição, dá para dizer que os mineiros poderão ter um candidato à Presidência em 2014?

AÉCIO: Não projeto o futuro com tanta antecedência. Durante oito anos fomos o governo mais bem avaliado do país. Agora estou engajado em outro projeto. Se eu não tivesse convicção da capacidade de Serra de governar o país, talvez estivesse até hoje na disputa.

O PT e o PMDB estão encomendando pesquisa para definir seu candidato à sucessão mineira. Quem daria mais trabalho para Anastasia: Fernando Pimentel ou Hélio Costa?

AÉCIO: Não posso me intrometer na discussão que está no outro campo. Tenho boa relação com ambos, mas tenho um enorme compromisso com Minas e não tenho a menor dúvida ao afirmar que, para Minas, a melhor alternativa é Antonio Anastasia. Os mineiros saberão fazer a opção. Estou confiante que Anastasia continuará governando pelos próximos quatro anos, qualquer que seja o seu adversário.