sexta-feira, 14 de novembro de 2008

PPS desmente notícia sobre fusão do partido com o PSDB


A direção nacional do PPS negou, nesta sexta-feira (14), que esteja mantendo qualquer tipo de conversações com o PSDB visando a fusão entre as duas siglas. O partido esclarece que, ao contrário de notícia veiculada pela coluna Panorama Político do jornal O Globo, a aproximação entre as duas legendas tem como objetivo a construção de um projeto para o país, que será apresentado aos brasileiros pelo candidato da oposição à Presidência da República. Informa ainda que esse candidato, na opinião do partido, poderia ser o governador de São Paulo, José Serra, ou o de Minas Gerais, Aécio Neves.

A direção do PPS ressalta ainda que o diálogo com os tucanos não é nenhuma novidade, já que as duas legendas realizam há muito tempo parcerias não só no Congresso, mas na promoção de seminários temáticos para debater os problemas estruturais do país. Exemplo disso foi o Primeiro Colóquio entre Socialistas e Socialdemocratas, realizado em novembro de 2003, no Rio de Janeiro, e que reuniu políticos, militantes e intelectuais do PPS e PSDB.

Outro ponto que desmente a fusão das duas siglas, foi decisão tomada pelo Diretório Nacional do PPS, em sua última reunião, realizada nos dias 30 e 31 de outubro, em Brasília. No encontro ficou definido que o partido trabalharia, em conjunto com o PSDB, para a elaboração de um projeto para o país.

Adão Cândido
Secretaria Nacional de Comunicação do PPS

Em nota, FAP desmente que organiza seminário para debater fusão entre PPS e PSDB

A direção da Fundação Astrojildo Pereira divulgou nota, nesta sexta-feira (14), negando que esteja mantendo qualquer tipo de conversações com Instituto Teotônio Vilela, ligado ao PSDB, visando a fusão do PPS com o partido tucano, como afirmou nota publicada pela coluna Panorama Político do jornal O Globo. Confira abaixo a íntegra da nota.


Nota de Esclarecimento da Fundação Astrojildo Pereira

Fomos surpreendidos com notícia, estampada na coluna Panorama Político (O Globo, 14/11/2008, pg. 2), sob a responsabilidade do jornalista Ilimar Franco, informando que “estão avançados os entendimentos para o PPS se incorporar ao PSDB”, que “as direções do PSDB e do PPS consideram que já existe entre eles uma convergência programática” “por isso, decidiram construir juntos uma proposta de agenda para o país, que será a base do programa de governo de José Serra”, e que “os presidentes do Instituto Teotônio Vilela, deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES), e da Fundação Astrogildo Pereira, Francisco Almeida, estão organizando um grande seminário para o primeiro semestre do ano que vem”. Quanto ao PPS, nota de sua direção nacional, desmentindo esse processo de incorporação, foi divulgada, em seu portal eletrônico.

No tocante à Fundação Astrojildo Pereira, instituída pelo PPS, e da qual sou apenas diretor administrativo (seu presidente é o ator e vereador Stepan Nercessian, que se encontra atualmente de férias, no exterior), temos a informar que ela vem, há pelo menos cinco anos, realizando seminários em parceria não apenas com o Instituto Teotônio Vilela, do PSDB, mas também com a Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini, do PDT. Nossos objetivos – das fundações e do instituto – têm sido o de trocar idéias e propostas, em torno das grandes questões nacionais, além de discutir convergências e divergências existentes entre as correntes socialista, social-democrata e trabalhista (publicações de alguns desses seminários estão lhe sendo encaminhadas, para seu conhecimento).

Quanto ao seminário “E agora, Brasil?”, que começamos a delinear entre o ITV e a FAP, pretende discutir a crise financeira e econômica mundial e suas repercussões aqui, o Brasil pós-Lula e apontar os caminhos para que se materializem as reformas que os brasileiros há muito aguardam.

Francisco Almeida
Diretor administrativo da Fundação Astrojildo Pereira

PSDB + PPS

Panorama Político :: Ilimar Franco
DEU EM O GLOBO

Estão avançados os entendimentos para o PPS se incorporar ao PSDB. O governador José Serra e o ex-deputado Roberto Freire têm conversado bastante. Para os quadros do PPS, a união é uma questão de sobrevivência. Para os tucanos, um reforço para as eleições presidenciais de 2010. Essa negociação leva em conta a aprovação do fim das coligações nas eleições proporcionais e a abertura de uma janela para a troca de partidos.

Os dois partidos farão agenda comum

As direções do PSDB e do PPS consideram que já existe entre eles uma convergência programática. Por isso, decidiram construir juntos uma proposta de agenda para o país, que será a base do programa de governo de José Serra. Os presidentes do Instituto Teotônio Vilela, deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES), e da Fundação Astrogildo Pereira, Francisco Almeida, estão organizando um grande seminário para o primeiro semestre do ano que vem. "Muitos ex-comunistas do PSDB, como eu, estão entusiasmados com a fusão, que praticamente já existe no bloco de oposição ao governo Lula", afirma Vellozo Lucas.

Lula diz que Dilma é a candidata, mas 'não será fácil' ganhar em 2010

Leonencio Nossa, ROMA
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Em entrevista a jornais italianos, ele elogia ‘potencial extraordinário’ da petista, que o acompanha em visita ao papa

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, recebeu a “bênção” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como sua candidata na disputa pelo Palácio do Planalto em 2010. Mas o presidente reconheceu que não será “fácil ganhar”. Em entrevista a cinco diários italianos publicada ontem, Lula deu a largada na sucessão presidencial. “Eu, na verdade, tenho um nome na cabeça, o de Dilma, chefe da Casa Civil do governo. Ainda não falei com ela, mas creio que poderá ser uma boa candidata”, disse, segundo o Corriere della Sera. “Queria que o Brasil, depois de mim, fosse governado por uma mulher, e já existe a pessoa ideal: Dilma Rousseff”, afirmou, no registro do La Repubblica.

O jornal Il Manifesto publicou outro trecho da declaração do presidente. “Creio que o PT deve construir uma base sólida para levar adiante o projeto que estamos implantando no Brasil”, disse Lula, segundo o diário. “O partido vai discutir sua candidatura e eu, já repeti mais de uma vez, direi que a minha ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, tem potencial extraordinário para ser a candidata. Mas a coisa mais importante para nós é construir antes uma aliança entre diversas partes e um programa sólido”, ressaltou. “Se continuar a onda sobre a qual no movemos, o governo chegará à data das eleições em posição de força.”

Diante da repercussão da entrevista de Lula aos jornais italianos, uma Dilma sorridente, de terninho preto, apareceu na área residencial do Vaticano com o presidente e outros três ministros, para uma audiência com o papa Bento XVI. Minutos antes de ser cumprimentada pelo papa, ela chegou a sorrir para jornalistas.

Horas depois, numa entrevista para jornalistas brasileiros na sede da embaixada em Roma, o presidente tentou amenizar as declarações sobre Dilma, mas acabou reforçando o que havia dito.
“O que eu disse para eles (jornalistas italianos) eu digo para vocês (brasileiros): tenho de construir uma candidatura da base aliada e ligada ao governo”, afirmou. “Quem conhece a ministra sabe que ela tem potencial e poderá ser escolhida pelos partidos da base e pelo PT.”

Aliados reagem à escolha de Lula

Maria Lima
DEU EM O GLOBO

Oposição diz que presidente não poderá culpar partidos por antecipar sucessão

BRASÍLIA. As declarações do presidente Lula à imprensa italiana, de que gostaria de ser sucedido, na Presidência, pela ministra Dilma Rousseff, provocaram mal-estar entre aliados, que se sentiram atropelados, críticas da oposição e desconforto no seu próprio partido. O presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP), disse que o presidente manifestou sua preferência, mas que o partido tem um rito de escolha do candidato, ao qual Dilma teria de se submeter. Berzoini disse ainda que ainda é cedo para falar em nomes para 2010:

- Todos sabem que a ministra Dilma é a candidata preferida do presidente. Mas o PT tem seu processo democrático interno de escolha. A preferência do presidente tem peso, mas o rito do PT comporta outras opções. E os aliados vão trabalhar em cima de nomes com possibilidades. É bom ter referência. Mas é cedo para falar em nomes.

Sobre a superexposição de Dilma tanto tempo antes da eleição, Berzoini disse que esse é um risco, já que, antes mesmo de ela ser escolhida já é alvo da oposição. O ministro da Justiça, Tarso Genro, que já teve pretensões de ser candidato, fez um comentário curto sobre as declarações do presidente:

- Sempre que achei que o presidente tinha dito alguma coisa arriscada, eu estava errado e ele estava certo.

Presidente já citou nome de Henrique Meirelles

Segundo líderes, em reunião recente Lula brincou que, diante da crise, o melhor nome para brigar com o tucano José Serra seria o do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.

- Foi a última cartada de Lula para ver se Dilma emplaca. Mas, primeiro, ele tem que perguntar o que os aliados acham. Numa crise dessas, só quem pode enfrentar Serra no mesmo nível de debate é Meirelles - diz Luciano Castro (PR-RO).

Já o líder do PSB, senador Renato Casagrande (ES), diz que o partido quer fortalecer o nome de Ciro Gomes (PSB-CE):

- Dilma tem que ir para o sereno em 2009, para ver se agüenta as intempéries da campanha. O PSB vai fortalecer o nome do Ciro. É importante que a gente tenha alternativas.

O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), concorda que, antes de formalizar uma eventual candidatura, Dilma tem de ser testada:

- Os outros pré-candidatos já estão aí expostos. Então, nada melhor que um banho de sol na ministra.

Na oposição, causou estranheza o fato de que o próprio Lula tenha antecipado o debate sobre sua sucessão, com risco para a governabilidade.

- É a primeira vez que vejo um presidente lançar seu sucessor com dois anos de antecedência. Agora não vai mais poder dizer que é a oposição que está antecipando o debate e atrapalhando a governabilidade - disse o líder do DEM, senador Agripino Maia.


Ao anunciar Dilma, Lula se precipita e prejudica governabilidade, diz Coruja


William Passos
DEU NO PORTAL DO PPS

“A oposição, agora, mais do que nunca intensificará a vigilância sobre os atos do governo para afastar os de caráter eleitoral”, garantiu o líder do PPS.


Ao comentar a declaração de Lula que anunciou a ministra Dilma Roussef como a candidata do PT à sua sucessão, o líder do PPS na Câmara, deputado Fernando Coruja (SC) disse que o presidente quer antecipar o “jogo” e que a precipitação prejudicará a governabilidade.

Lula disse na Itália que será a primeira eleição desde 1989 em que ele não será candidato, mas que está empenhado em participar da escolha de seu sucessor dentro do PT.

Ainda de acordo com o líder do PPS, “se Lula quer começar o debate eleitoral, que está previsto para 2010, antes do tempo, a oposição se vê obrigada a fazer o mesmo”.

Coruja diz que a estratégia do Planalto é tornar a ministra mais conhecida, por isso, é possível que o governo tente vincular seus projetos à imagem dela.

Dilma, segundo as pesquisas de intenção de voto, não ultrapassa os 10%. Já governador de São Paulo, José Serra (PSDB), que também deverá disputar o pleito, tem 38% da preferência do eleitorado.

“A oposição, agora, mais do que nunca intensificará a vigilância sobre os atos do governo para afastar os de caráter eleitoral”, garantiu.

O objetivo é denunciar o uso da máquina administrativa para beneficiar o PT e, conseqüentemente, a ministra candidata.

A volta por cima


Merval Pereira
DE EM O GLOBO


NOVA YORK. Enquanto o candidato republicano à Presidência, John McCain, retoma sua característica de fazer brincadeiras autodepreciativas, dizendo que tem dormido como um bebê desde a derrota e acorda chorando a cada duas horas, no interior do Partido Republicano começa a disputa para uma reestruturação partidária, e a figura chave para esse futuro é a polêmica candidata a vice, a governadora do Alaska Sarah Palin. Recente pesquisa do Rasmussen Reports mostra que, ao contrário do que assessores da campanha derrotada andaram espalhando, a base do partido não considera Palin a responsável pela derrota.

Nada menos do que 69% dos eleitores republicanos acham que ela ajudou a chapa, e, quando citam qual seria o candidato ideal para o partido em 2012, 64% citam o nome da governadora do Alaska.

Ridicularizada em programas humorísticos como o "Saturday Night Live", em que a comediante Tina Faye celebrizou-se com sua caricatura, e considerada como "um tiro no pé" do Partido Republicano, pela incapacidade explícita de assumir o governo dos Estados Unidos em caso de necessidade, seus aliados mostram estudos que indicam que, na verdade, a "pitbull de batom" Sarah Palin, como ela se definiu na convenção republicana, fez uma grande diferença a favor de McCain entre o eleitorado feminino.

Enquanto o candidato republicano perdeu 11 pontos entre o eleitorado masculino branco, entre as mulheres brancas sua perda foi de apenas quatro pontos, sempre comparando com a votação de 2004 de George W. Bush.

Para esses analistas conservadores, a presença de Palin na chapa fez com que milhões de mulheres brancas se sentissem representadas como mães e mulheres trabalhadoras.

Ela se transformou na estrela do partido, e líder inconteste da ala tradicionalista, que prega, como defendeu ontem no discurso da reunião dos governadores republicanos, a volta aos valores tradicionais.

Para esses, os republicanos perderam a eleição porque se desviaram do seu credo original, a começar pelo governo de Bush, um governo que ocupou um espaço exagerado na vida nacional, e encerrando com a escolha de um republicano liberal como John McCain.

Em seu discurso de ontem, que foi o ponto alto da reunião dos governadores, Sarah Palin voltou a tocar nos pontos básicos da pregação mais conservadora do partido: corte de impostos, governo pequeno e controle da imigração, juntamente com temas do dia-a-dia das comunidades, como reformas da educação e do sistema de saúde.

Há um outro grupo no partido, chamado de "reformista", que entende que a mudança tem que ser profunda, para adaptar os valores tradicionais à realidade de um novo mundo, assim como fez o Partido Conservador inglês, que passou a dar mais atenção à questão do meio ambiente, por exemplo, em vez de negar os problemas que existem, como faz Palin.

O Partido Republicano não poderia mais ignorar os jovens eleitores e os hispânicos, que se mostraram uma força na eleição de Obama. E também não poderia continuar a se colocar contra regiões inteiras do país, como também fez Sarah Palin, que acusou a elite americana de se posicionar contra os interesses reais do americano médio.

Voltar para o governo do Alaska, que é a opção mais à mão, seria "sair da primeira classe e ir para a classe econômica" na definição dos dirigentes do partido, que já se movimentam para encontrar um atalho que mantenha a exposição nacional que Sarah Palin conseguiu.

Uma das saídas seria ir para o Senado, numa complicada manobra que está sendo abortada pela recontagem de votos. No estado da governadora, o senador Ted Stevens, condenado por sete crimes um dia antes da eleição, está sendo ultrapassado na recontagem de votos pelo candidato democrata Mark Begich, governador de Anchorage.

Se o republicano vencer ao final, ele tentará reverter as condenações, mas a direção do Senado já avisou que ele será expulso. Nesse caso, deverá ser convocada uma nova eleição dentro de 60 a 90 dias, e a governadora Palin poderia se candidatar a uma exposição nacional em Washington.

Um dos papéis mais importantes para consolidar o futuro político de Sarah Palin será comandar uma mobilização das bases eleitorais, especialmente no recrutamento de militantes partidários e o alistamento eleitoral, a exemplo do trabalho de longo prazo que fez a campanha de Obama, dois anos antes da eleição presidencial, surpreendendo até mesmo a direção do Partido Democrata, que perdeu o controle da legenda diante da participação maciça de novos eleitores recrutados por Obama.

Pesquisas indicam que a presença maior de eleitores democratas novos fez a diferença na eleição do dia 4 de novembro. O comparecimento dos democratas às urnas aumentou na mesma proporção que decaiu a presença dos republicanos. Os eleitores registrados aumentaram em 6 milhões, e o comparecimento maciço dos eleitores negros, que geralmente são ausentes em grande número, fez a diferença a favor de Obama.

Os "tradicionalistas" consideram que Sarah Palin tem um papel semelhante ao que teve, nos anos 80 do século passado, o ex-presidente Ronald Reagan: o de trazer para o partido os eleitores jovens e os independentes.

Foi nessa época também que grupos conservadores, como a Associação Nacional do Rifle e a Maioria Moral, aprofundaram suas ações políticas e recrutaram pelo país novos afiliados ao Partido Republicano, como nos últimos dois anos a campanha de Barack Obama fez a favor dos democratas, criando inclusive uma rede independente de apoiadores através da internet que se mostrou de extrema utilidade, não apenas no recolhimento de fundos de campanha como na propagação de mensagens políticas.

Números que falam


Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


SÃO PAULO - Zander Navarro, notável acadêmico, hoje na universidade britânica de Sussex, manda e-mail com o que chama de "ilustração dramática" do "ritmo desenfreado de apropriação da riqueza nas últimas décadas, o que gerou aumento na desigualdade".

Alguns números: 1 - A renda dos 1.125 bilionários do planeta (US$ 4,4 trilhões) supera a renda somada de metade da população adulta do planeta. Se se quiser comparar com o Brasil, 1.125 bilionários têm uma renda que é quatro vezes tudo o que 180 milhões de brasileiros produzem de bens e serviços.

2 - Segundo o Instituto para Estudos de Política, os executivos-chefes das 500 maiores corporações dos EUA ganharam em 2007, em média, US$ 10,5 milhões, 344 vezes o pagamento do trabalhador norte-americano típico.

Já os gerentes dos 50 fundos de hedge e de "private equity" receberam cada um US$ 588 milhões, mais do que 19 mil vezes o salário-tipo do norte-americano.

3 - Em agosto de 2008, a Exxon, a maior companhia do planeta, registrava lucros recordes à taxa de US$ 90 mil POR MINUTO. Os rendimentos do Wal-Mart batiam, em 2007, o produto nacional bruto da Grécia; os da Toyota superavam o da Venezuela.

Não pense que o Brasil escapa, não. Por muito que o governo cultive a lenda da queda da desigualdade, o Ipea acaba de divulgar estudo mostrando que só em 2011 o rendimento do trabalho voltará a ter a participação na riqueza nacional que tinha em 1990 (45,4%).

Mesmo que volte, continuará atrás do capital, embora o número de capitalistas seja obviamente bem inferior ao de assalariados.

No governo Lula, aliás, a queda da participação do trabalho no bolo da riqueza nacional acentuou-se até 2004, só começando a se recuperar a partir de 2005.Todos esses números dispensam opinião. Falam sozinhos.

O "Big One" finalmente chegou


Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Os preços das commodities já regrediram aos níveis de 2002, eliminando todos os ganhos dos últimos anos

ECONOMISTAS importantes vêm há muito tempo -alguns há mais de oito anos- alertando para uma grande correção na economia norte-americana em razão de seus déficits externos crescentes. Alguns chamaram esse movimento de "The Big One", em homenagem ao grande terremoto previsto para acontecer na região de Los Angeles. Esse abalo sísmico econômico seria a conseqüência de um vigoroso e inevitável aumento na taxa de poupança do consumidor, única forma conhecida para ajustar a conta corrente norte-americana.

Os medos foram crescendo nos últimos anos por causa da verdadeira orgia de crédito ocorrida nos Estados Unidos, que aumentou progressivamente a armadilha financeira. Nesse período, a relação entre o endividamento das famílias e o PIB chegou ao número incrível de 130%. Não por outra razão, o déficit na conta corrente atingiu quase US$ 800 bilhões, cerca de 6% do PIB.

Esses números representam o outro lado da moeda da expansão descontrolada do crédito ao consumidor.

Muito embora o "Big One" tenha sido antecipado, sua ocorrência agora não tem nada a ver com as previsões de uns poucos iluminados. Para esses, seria a desconfiança dos mercados e dos investidores em relação ao dólar que provocaria um movimento tectônico na economia norte-americana, a partir do colapso de sua moeda. Entretanto a correção macroeconômica está ocorrendo com o dólar forte e em processo continuado de valorização em relação a todas as moedas do mundo, com exceção do iene japonês. Esqueceram de que a moeda reserva não é facilmente substituível, especialmente em um mundo em recessão.

Mas o que interessa ao analista econômico de hoje não são as causas desse movimento, mas suas conseqüências sobre a economia global. E elas serão dramáticas nos próximos anos.

Segundo algumas avaliações, o processo de correção do comportamento do consumidor americano só deve se estabilizar quando a taxa de poupança chegar a algo como 7% do PIB. A velocidade desse ajuste dependerá das condições do crédito bancário ao longo dos próximos meses. Até o novo equilíbrio, a redução dos gastos dos americanos deverá subtrair cerca de 4% do crescimento da maior economia do mundo.

Isso implica dizer que os Estados Unidos devem crescer a taxas menores do que 1% ao ano, se esse processo se realizar ao longo dos próximos três anos. Se ele ocorrer em prazo mais curto, devido à recuperação mais lenta do crédito, a recessão pode se espalhar por 2009 e por um bom pedaço de 2010. A política fiscal também será um elemento importante para definir o perfil do ajuste.

Essa nova dinâmica dos Estados Unidos terá repercussão muito importante no mundo emergente e principalmente no Brasil. No cenário de uma recessão mais prolongada, os preços das commodities devem permanecer deprimidos, reduzindo os termos de troca de nossa economia.

Os preços das commodities já regrediram aos níveis de 2002, eliminando todos os ganhos dos últimos anos. Em outras palavras, ficamos mais pobres e perdemos a possibilidade de continuar importando bens industriais de consumo e investimentos na intensidade atual.

Essa nova situação nos obriga a repensar nossa política econômica e a deixar a euforia dos últimos anos para trás. No terceiro trimestre deste ano, a economia brasileira cresceu cerca de 6% em termos anualizados. Temos de nos preparar para números bem mais baixos para os próximos anos.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 65, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

Luvas de pelica


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O Supremo Tribunal Federal passou duas reprimendas no Congresso. Elegantes, mas muito bem passadas: confirmou a inconstitucionalidade do troca-troca de partidos e ressaltou que tomava posição a respeito porque o Legislativo é inerte.

Mostrou-se também debochado ao reagir marcando para o quanto antes sua decisão sobre a fidelidade partidária, mas no sentido oposto ao da Constituição: abrindo um espaço para mudanças sem justa causa.

Ou melhor, em causa própria.

Ao contrário do sofisma invocado como justificativa para a liberalidade, não há vedação total a mudanças de partidos. No entendimento do STF, são perfeitamente aceitas quando há criação, fusão ou incorporação de partidos, reiterados desvios em relação ao programa original da legenda ou em casos de discriminação grave contra o filiado - esteja ou não no exercício de um mandato.

Mas o Parlamento não se contenta com isso, no que é acompanhado pelo Palácio do Planalto. Ou vice-versa. Ambos querem mesmo recuperar o poder de fazer os partidos funcionarem ao ritmo das sanfonas, inflando uns e desinflando outros, de acordo com as necessidades do Executivo.

A regra tal como está garante a liberdade de trânsito entre legendas por motivação doutrinária, mas veda aquelas trocas orientadas pelo pragmatismo, no pior e mais pejorativo sentido do termo.

A Justiça expôs as coisas com toda a clareza e muita paciência. O TSE tomou a primeira decisão em março de 2007, o Supremo confirmou a sentença em outubro, no início de 2008 o tribunal eleitoral reiterou a decisão no exame de um caso concreto no início de 2008 e agora acaba de dar o que se imaginava seria a última palavra antes de o Parlamento cumprir o ditame legal.

Mas, não. O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, de pronto pediu tempo para “entender a decisão” e 24 horas depois resolveu repreender o presidente do TSE por ter o ministro Carlos Ayres Britto tido a ousadia de se referir à lentidão do Legislativo no cumprimento de suas tarefas.

Sugeriu que a Justiça carecia de moral para falar sobre demoras nos outros Poderes e ponderou que os parlamentares não costumam fazer o mesmo em relação à morosidade do Judiciário.

Ora, a lentidão da Justiça há muito é assunto recorrente, abordado em toda parte - no Legislativo, inclusive - e já diagnosticado como produto de uma estrutura ultrapassada sob todos os aspectos. Diferente da vagarosidade deliberada e seletiva do Congresso.

Ali as coisas acontecem à velocidade das vontades. Tomemos o próprio caso da fidelidade. O Congresso empurra o assunto com a barriga há mais de 15 anos, mas, quando o Judiciário toma uma decisão contrária aos interesses dos parlamentares num instante eles arrumaram tempo, esforço e consenso para quebrar a austeridade da regra original.

Quando querem, fazem, quando não querem ficam parados ou, como no caso da fidelidade, desfazem. O Parlamento optou por se atritar com o Judiciário na questão. Perdeu, por cabeça torta e vista curta, a chance de ganhar um pouco de moral.

Oficialmente

Não é nada trivial, ao contrário, é singularmente espantosa a declaração do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, de que a corrupção grassa na Fundação Nacional de Saúde.

Temporão não contou nenhuma novidade, mas admitiu sua incapacidade de intervir no funcionamento da Funasa. Ao mesmo tempo, deu recibo oficial às denúncias sobre desvios de dinheiro na fundação comandada pelo PMDB - mais especificamente por um afilhado do senador Renan Calheiros - e ainda se pôs na condição de cúmplice do partido ao qual é filiado.

O ministro falou de manhã durante uma reunião com índios, cuja política de saúde é executada pela Funasa, tentou consertar a declaração à tarde, mas era tarde.

Inverossímil a desculpa de que havia se referido a gestões passadas diante da afirmativa anterior: “As denúncias de escândalo, corrupção, desvio de dinheiro estão todos os dias na imprensa. A situação é muito grave, não podemos deixar como está, temos de mudar”.

Seria o caso de o chefe - o presidente da República, não o do PMDB - chamá-lo para esclarecer o que se passa: se há no comando da pasta da Saúde um ministro leviano ou se está lá um homem honesto premido pelas circunstâncias a resistir no cargo a fim de proteger o restante do ministério da sanha dos fisiológicos.

Na segunda hipótese, o herói da resistência receberia todo apoio de cima para desbaratar a referida gang que seria presa numa espetacular operação da Polícia Federal, e expulsa do PMDB com humilhação.

Isso no mundo irreal. No real, Temporão deverá apresentar suas desculpas, atribuir o desabafo a um mal-entendido dos jornais, enquanto o PMDB aproveita o ensejo para espalhar boatos sobre sua insatisfação com o desempenho do ministro.
Dia seguinte a vida segue como se nada houvera.

Resposta mesquinha

EDITORIAL
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Congresso precisa votar reforma política, e não mecanismos para burlar fidelidade partidária decidida pelo Supremo

A CRÔNICA das "reformas políticas" que vêm sendo implantadas de modo assistemático e anômalo no país ganhou mais um capítulo. A previsível reafirmação, pelo Supremo Tribunal Federal, das regras sobre a fidelidade partidária -norma criada pela corte em outubro de 2007 e regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral em seguida- deflagrou uma lamentável reação corporativista no Congresso.

Deputados e senadores pretendem aprovar um atalho legal que lhes devolva a faculdade de mudar de partido impunemente. A idéia -que demonstra como parlamentares são inventivos quando se trata de legislar em causa própria- é criar uma "janela" para o troca-troca. Como maio é o mês das noivas e outubro, o das crianças, todo setembro que antecedesse um ano eleitoral seria o mês da infidelidade tolerada na política.

Pelo projeto do deputado Flávio Dino (PC do B-MA), durante esses 30 dias senadores, deputados, vereadores, prefeitos, governadores e até o presidente da República poderiam mudar de legenda sem correr o risco de perder o mandato. A iniciativa está tão eivada de esperteza, no sentido macunaímico do termo, que soa como um acinte, uma caçoada que ofende não só o público, mas a própria decisão do STF.

A corte constitucional decidiu, há mais de um ano, que o mandato dos políticos eleitos no sistema proporcional (deputados e vereadores) pertence ao partido. Mais tarde, o TSE estendeu a possibilidade de perda do cargo a senadores, prefeitos, governadores e presidente que trocassem de legenda. A entrada do Judiciário nessa seara, tipicamente legislativa, decerto não foi o melhor caminho para acabar com a distorção da infidelidade partidária generalizada.

A intervenção do Supremo criou, ademais, outros problemas, que já começam a aparecer. Mais de 2.000 processos em torno da perda de cargos eletivos por troca de legendas já entopem os escaninhos do TSE. Em cada caso, os ministros da corte terão de decidir se a cassação é devida ou se ele pode ser enquadrado nas exceções -perseguição pessoal, mudança substancial do programa partidário, criação de novas siglas- admitidas pelo órgão. Juízes começarão a resolver pendências bastante subjetivas, características do jogo político.

Não há hipótese, contudo, de o Supremo voltar atrás na decisão tomada, ao menos no curto prazo. Como a cartada ensaiada no Congresso, a "janela de infidelidade", afronta brutalmente o pressuposto de que o mandato pertence ao partido, é provável que seja fulminada pelo STF caso se transforme em lei.

A licença de 30 dias para traições partidárias é uma resposta ridícula ao desafio que se impõe ao Congresso -cuja inação de mais de uma década na reforma política permitiu que o Supremo atendesse a alguns anseios da sociedade. Para que ocupem o centro desse debate, local que lhes é de direito, os legisladores precisam mirar mais alto e aprovar projetos que alterem os mecanismos de escolha de representantes populares no país, caso do sistema distrital misto.

A fidelidade reafirmada

EDITORIAL
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Por 9 votos a 2, o Supremo Tribunal Federal (STF) colocou uma pá de cal sobre o argumento de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) extrapolou de suas atribuições e infringiu a Constituição ao decidir, em 27 de março do ano passado, respondendo a uma consulta do então PFL, que os mandatos parlamentares não pertencem aos que os exercem, mas aos partidos pelos quais se elegeram. (Mais tarde, o TSE estendeu esse princípio aos eleitos para cargos executivos.) O Supremo avalizou ainda a resolução da Justiça Eleitoral, aprovada em outubro daquele ano, que determina e define os procedimentos para a cassação e a substituição dos mandatários infiéis às suas legendas. A mudança só será validada nos casos em que for provocada por desvio do programa partidário, discriminação pessoal, fusão ou criação de siglas. Este foi o segundo pronunciamento do STF a respeito.

Também em outubro de 2007, a Corte ratificou a tese da primazia dos partidos sobre os integrantes de suas bancadas nas câmaras legislativas, embora tivesse validado as trocas ocorridas até a primeira manifestação do TSE. À época, o ministro Celso de Mello condenou enfaticamente a infidelidade partidária como um desvio ético e político. “O ato traduz um gesto de intolerável desrespeito à vontade soberana do povo”, apontou. A crítica é irrefutável, por mais que se diga que a identidade partidária é o menos decisivo dos critérios que levam os eleitores a fazer as suas escolhas. Mas não é nem sequer um princípio abstrato de moralidade política o que ampara o critério de que o partido é o titular das cadeiras às quais os seus filiados concorreram, tendo portanto pleno direito de reclamar as vagas abertas quando os seus ocupantes migram para outras agremiações.

Trata-se da realidade objetiva do modelo eleitoral brasileiro. Primeiro, ninguém pode ser candidato avulso: os partidos são a única via de trânsito para os aspirantes ao voto popular. Além disso, no sistema proporcional em vigor, os eleitos se beneficiam dos votos dados a todos os candidatos da agremiação (ou coligação) e do voto de legenda. Dos 513 deputados federais, por exemplo, apenas 32 não dependeram dos sufrágios dos correligionários ou coligados para se eleger. Mas a traição é aceita porque tende a aumentar as chances de sobrevivência e prosperidade política dos eleitos e dos partidos oportunistas. Nenhum projeto punindo a infidelidade com a perda de mandato prosperou exatamente porque prejudicaria os interessados diretos - seja nas disputas locais, em que o troca-troca abre espaço para ambições e acomoda rivalidades entre as caciquias partidárias, seja, sobretudo, nas relações entre as siglas e os governos de turno.

Por instigação destes ou por iniciativa própria, vereadores, deputados estaduais e federais mudam de partido para tirar proveito de sua adesão ao lado vitorioso nas urnas. A infidelidade, assim, tem sido um mecanismo fundamental para a construção de maiorias parlamentares e o traçado das relações de poder entre os partidos da base governista. Por isso, o Executivo não apenas avança sobre as bancadas oposicionistas (e as oportunistas), como ainda geralmente indica as legendas para as quais os seus aliados de ocasião e os demais devem se bandear. O que mudará com a decisiva última palavra da Justiça? Está claro desde logo que os políticos, embora já sem pretextos para fazê-lo, relutarão em “cortar na carne”, despojando dos seus mandatos os infiéis sem justa causa. Há meses se arrasta na Câmara o caso de um deputado da Paraíba, cuja vaga é reclamada pelo DEM, do qual ele se desfiliou depois do prazo permitido para aderir ao PRB.

O presidente da Casa, Arlindo Chinaglia, se recusou a cumprir a decisão do TSE pela cassação e posse do suplente. Agora, alega que o STF não tratou especificamente dele. Enquanto isso, é dado como certo que o Congresso abrirá uma janela para a infidelidade: no mês anterior às convenções partidárias que definem as candidaturas em cada eleição. O presidente do Supremo, Gilmar Mendes, adverte, porém, que uma lei nesse sentido poderá ser impugnada. Afinal, os mandatos pertencem aos partidos 12 meses por ano - todos os anos.

O poder vai até encontrar limite


Maria Cristina Fernandes
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O Congresso Nacional teve um ano e oito meses para votar uma lei sobre fidelidade partidária e não o fez. Da primeira decisão da Justiça Eleitoral até agora, o Supremo Tribunal Federal se posicionou duas vezes sobre o tema e confirmou decisão do Tribunal Superior Eleitoral de que o mandato do parlamentar pertence ao partido.

O procurador-geral da República foi até onde deu, questionando a constitucionalidade da decisão tomada fora do âmbito parlamentar. Não faltam aos parlamentares exemplos de seu dia a dia para demonstrar que a decisão judicial sequer tangencia as razões da troca de partido. E que nada é mais efetivo sobre o tema do que normatizar a relação das bancadas e o tempo de TV que lhes é destinado. E ainda sem o efeito colateral de reforçar os poderes discricionários das capatazias partidárias.

A incontinência verbal do presidente do Supremo Tribunal Federal, que não se furta a escapulir dos autos para discorrer em manchetes desde o caso Isabela Nardoni até a Lei da Anistia, tem contornos particulares. Como a pororoca e a jabuticabeira, só existe no Brasil, mas não é besteira.

Não há dúvidas de que o mais polêmico período do ativismo judicial no Brasil se alimenta da inércia política. É um parlamento que assiste calado ao ministro Gilmar Mendes fazer declarações como a de que o "Congresso precisa desenvolver racionalidade argumentativa" (Valor, 09/06), tarefa em que o Supremo o substituiria com mais eficiência.

É assim que o ministro, do alto de sua condição de notório conhecedor do controle da constitucionalidade no país, defende o poder dos sábios de toga em detrimento da legitimidade do poder constituído pela vontade popular. É bem verdade que seus representantes a maltratam com freqüência, mas, ao contrário das cortes vitalícias, o eleitor pode mandá-los de volta para casa de quatro em quatro anos.

O Conselho Nacional de Justiça, criado para exercer sobre o Judiciário o controle que no Legislativo é exercido pelas urnas, é comandado pelo mesmo presidente do Supremo e tem dez juízes entre seus 15 integrantes.

O deputado Antonio Carlos Biscaia (PT-RJ), que participou da tramitação do projeto de lei que criou a CNJ, diz que a composição foi a possível naquele momento. "O Poder Judiciário não o aceitava de forma alguma. Temia que violasse sua independência. E se impôs como majoritário em sua composição", lembra o deputado, que até março respondia pela Secretaria Nacional de Justiça.

A mesma busca de consenso que resultou num texto com concessões em excesso ao Judiciário em seu controle externo é, paradoxalmente, o que fundamenta os ministros do Supremo na defesa do seu ativismo. Gilmar Mendes não é o único a defender a necessidade de sua atuação complementar ao Congresso em decorrência de redação em aberto dos projetos, tendência dominante na produção legislativa desde a Constituição de 1988.

Antes de ganhar impulso pela inércia congressual, o ativismo judicial foi fomentado pela ação de parlamentares que passaram a remeter ao Supremo querelas irresolutas na arena política.

E, finalmente, com a reforma do Judiciário, a Corte Suprema, em resposta à cobrança pela morosidade, pediu e levou efeitos vinculantes para suas decisões que, se alcançam razoável consenso em matérias tributária e previdenciária, causam espécie em questões penais, como na resolução sobre algemas. "Foi uma decisão monocrática em período de recesso", diz Biscaia.

Este não é o único período de intenso ativismo judicial do Supremo. De 1964 até o AI-5, a Corte teve uma jurisprudência muito ativista em favor dos direitos humanos. A partir daí conformou-se uma maioria que impôs 35 anos de auto-contenção. Os últimos ministros da geração formalista indicada pelos presidentes militares deixaram a Corte no início do governo Luiz Inácio Lula da Silva.

A renovação de 7 dos 11 ministros do Supremo no governo Lula praticamente reescreveu a Constituição, diz um atento observador da cena jurídica brasiliense que considera esta geração, de longe, a mais ativista da história da Casa.

Sem uma hegemonia clara, e com muitos ministros que, falam, a torto e a direito, fora dos autos, a Casa acaba servindo de parâmetro para todo o Poder Judiciário. E gerando juízes que não se acanham a afirmar em público - "Nós somos a Constituição".

Gilmar Mendes e Fausto De Sanctis estão em lados opostos do balcão mas são filhos deste mesmo ativismo. O primeiro, muito provavelmente, prevalecerá sobre o segundo. Este poder irá até encontrar limites. O presidente da República não os colocará porque pretende terminar seu mandato.

Resta o Congresso. Há obviamente o temor em confrontar um poder que pode vir a julgá-los mas há casos isolados em que o Congresso reviu decisões importantes do Supremo sem que qualquer crise institucional fosse aventada.

Tome-se, por exemplo, a legislação sobre os crimes hediondos. Quem era condenado por este crime cumpria pena em regime fechado. O Supremo decidiu que este condenado tinha direito à progressão da pena, como os demais. O Congresso não gostou e votou lei estabelecendo que os condenados por crime hediondo podem progredir a pena, mas não no mesmo ritmo dos demais. Foi uma boa tradução da harmonia entre os poderes de que fala a Constituição. Aconteceu antes de Gilmar Mendes pontificar.

Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras

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