sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Na reta final, investida geral na Zona Oeste


Fábio Vasconcellos e Ludmilla de Lima
DEU EM O GLOBO


Região que, com a Zona Norte, concentra 80% dos eleitores é alvo de Paes, Jandira e Gabeira para ir ao 2º turno

Integrantes do PMDB, do PV e do PCdoB já traçaram parte das estratégias de campanha para o último fim de semana antes das eleições. Amanhã e domingo, Eduardo Paes (PMDB) vai intensificar as visitas a bairros das zonas Norte e Oeste. A Zona Oeste também é o alvo de Jandira Feghali (PCdoB) e Fernando Gabeira (PV). As duas regiões da cidade concentram cerca de 80% do eleitorado carioca e costumam definir eleições. Além de bater o martelo sobre o roteiro, os coordenadores de campanha do PMDB orientaram Paes a evitar responder a qualquer provocação dos adversários, seja nas ruas ou na televisão.


Paes terá novamente a ajuda do governador Sérgio Cabral, que vai participar de eventos com o candidato no domingo. A intenção é ampliar a vantagem do peemedebista nas zonas Norte e Oeste. Cabral estará também na campanha de outros candidatos do partido na Baixada Fluminense, no interior e na televisão, pedindo voto para os vereadores do PMDB.


Gabeira vai almoçar em shoppings da cidade


A briga por uma vaga no segundo turno inclui estratégias inusitadas nesta reta final. Gabeira, por exemplo, promete ir a todos os shoppings da cidade, de olho no eleitor de classe média, que, segundo ele, poderá levá-lo à segunda fase.


- Nesta semana, vamos intensificar na classe média e vamos passar o sábado na Zona Oeste. Vamos intensificar onde somos mais fortes e vamos também reforçar onde somos ainda mais fracos - revelou. - Temos falado muito para a população no rádio e na televisão.


Gabeira planeja ainda investir mais o tempo em áreas de grande aglomeração. Segundo ele, a idéia é "não necessariamente falar com todo mundo, mas ser visto e ver todo mundo":


- Vou começar indo a calçadões e áreas de aglomeração, como praias no fim de semana. Mas, na última semana, o melhor caminho, e pela minha experiência histórica esta semana vamos ter chuva, é visitar todos os shoppings. Vou almoçar em cada um deles.


No sábado, a agenda será concentrada na Zona Oeste - Campo Grande e Santa Cruz. Estão previstas visitas a áreas de milícia, como a Favela do Barbante, onde o candidato já esteve. A grande novidade para esta reta final é o jipe apelidado de Gabeirão, que será utilizado nos deslocamentos.


Jandira vai reforçar campanha na Zona Oeste


Jandira Feghali vai investir até domingo na Zona Oeste. Ela, no entanto, promete intercalar as agendas na região com campanha em outras áreas da cidade. No domingo, por exemplo, vai às zonas Oeste e Sul. Mas o foco agora é o eleitor que ela classifica como "de menor grau de informação e renda".


- A Zona Oeste foi a área em que eu mais estive. Mas vamos intensificar em cima do carro (uma caminhonete), porque assim conseguimos atingir uma área maior - conta a candidata, argumentando que essa é a melhor forma de dar visibilidade à campanha e atrair os indecisos. - O eleitor decide quando ouve, fala com você. Quando você fala para ele, ele faz um recall das suas propostas. Não temos a visibilidade na rua como campanhas milionárias têm.


Jandira já vem reforçando o discurso popular nas favelas que têm visitado. A todo tempo, ela é citada como a candidata que pode derrotar "a elite que mora na Barra". Jandira também intensificou os ataques a adversários, principalmente a Paes, a quem chama de "almofadinha" e de candidato do governador Cabral, muito criticado por ela.


- Vamos governar para quem precisa, do lado de cá da Central - dizia Jandira, ao microfone, esta semana na Zona Oeste. - Quantas mulheres aqui dirigem kombis e são agredidas pela polícia do Cabral?


A candidata ainda repete a todo momento sua aliança de anos com o presidente Lula. O tema serve de pretexto para mais ataques a Paes:


- Chamavam o Lula de ladrão. Agora que ele está bem, chamam de amigo.


Sérgio Cabral começa o sábado numa caminhada em Duque de Caxias para ajudar o prefeito Washington Reis (PMDB). Vai ainda a Nova Iguaçu, São João de Meriti e Belford Roxo.

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1098&portal=

Teatro político


Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


NOVA YORK. O que seria um "dia histórico", com a reunião dos candidatos à Presidência e a cúpula do Congresso dos dois maiores partidos para chancelar, na presença do presidente George W. Bush, um acordo também histórico para aprovar um pacote de medidas econômicas destinadas a estancar a crise financeira nos Estados Unidos, acabou sendo tachado de "um teatro político". Tanto o democrata Barack Obama, que havia se comprometido a falar depois da reunião na Casa Branca, quanto o republicano John McCain, saíram por portas laterais para não encontrar os jornalistas. Relatos de participantes da reunião davam conta de um clima "de disputa", uma tensão que não estava prevista pela manhã.

A mudança repentina de humor coincidiu com a chegada do senador John McCain a Washington. Três horas antes do encontro "histórico", que colocou na mesma sala da Casa Branca, pela primeira vez, o presidente em exercício e os dois candidatos a sucedê-lo, líderes dos democratas e republicanos deram uma declaração conjunta comemorando a chegada a um acordo sobre o pacote econômico.

Antes mesmo de a reunião na Casa Branca terminar, porém, o senador Richard Selby, republicano do Alabama, dirigiu-se aos jornalistas nos jardins da Casa Branca para anunciar que não havia nenhum acordo assegurado.

Lá dentro, soube-se depois, a reunião se desenrolava em um ambiente inesperadamente disputado, em que os líderes republicanos colocavam-se contra a posição do presidente Bush, que presidia a reunião com uma aparência abatida.

A alegação dos democratas é que o eleitorado estava se manifestando muito fortemente, através de mensagens telefônicas e pela internet, contra o plano apresentado pelo secretário de Tesouro Henry Paulson.

O deputado Barney Frank, democrata de Massachusetts, presidente do Comitê de Finanças, que pela manhã anunciara o acordo, saiu da reunião na Casa Branca claramente irritado com a posição de McCain que, segundo ele, falou pouco e de maneira nada clara: "Não entendi qual é a sua posição", disse o deputado, insinuando que McCain não se posicionara justamente para não ter que assumir compromissos.

Os republicanos alegam que estão tentando fazer um pacote econômico que proteja "os interesses das famílias, dos idosos, do pequeno comerciante e de todos os contribuintes". Os democratas, que têm a maioria no Congresso, não querem aprovar o pacote sem a participação dos republicanos, mesmo que tenham votos para tal.

Mas, estão muito mais dispostos a ajudar a Casa Branca a encontrar uma saída para a crise do que os republicanos, especialmente mais empenhados na viabilização da candidatura de McCain. Com a crise econômica explodindo, a candidatura republicana ficou mais vulnerável, e voltou a cair nas pesquisas de opinião.

Ao mesmo tempo, os democratas no Congresso foram muito mais agressivos que os republicanos no início da discussão do pacote econômico apresentado pelo secretário do Tesouro e pelo presidente do Banco Central, Ben Bernanke.

Deve-se a eles a inclusão no pacote da proteção aos devedores de hipotecas e a redução de salário dos executivos das empresas que forem ajudadas.

Somente quando se convenceram de que o acordo que estava sendo encaminhado favoreceria aos democratas é que os republicanos passaram a boicotá-lo, mesmo com a pressão pessoal a favor do presidente Bush. A expressão abatida com que Bush apareceu na televisão, na abertura da reunião, é a melhor definição de sua fraqueza atual.

Um presidente impopular em final de mandato não recebe o apoio nem mesmo de seu próprio partido. Seu abraço é o de um afogado que pode levar ao afogamento o seu salvador. Seu beijo é o beijo da morte, nem os antigos aliados o querem.

Por isso, a reunião em plena Casa Branca foi tão tensa, e a tentativa de se chegar a um consenso antes da reunião, para que nela houvesse apenas a formalização dos acordos, foi atropelada, ao que tudo indica, por orientação do próprio John McCain, que resolveu tentar tirar partido da situação econômica que, até o momento, só o tem atrapalhado.

E a maneira como os republicanos, que se preparam para disputar também eleições na Câmara e no Senado, com previsão de serem atropelados pelos democratas, estão tratando a atual administração em fim de mandato mostra bem quem eles consideram culpado pela quase inevitável derrota de McCain.

Mas nem todo movimento que parece inteligente surte esse efeito junto ao eleitorado. A decisão de suspender a campanha presidencial e adiar o primeiro debate foi muito mal recebida, inclusive entre parte de seus próprios eleitores.

As televisões passaram o dia de ontem mostrando a reação de eleitores de diversos estados, a grande maioria acusando McCain de fugir da discussão e de estar menosprezando a opinião pública.

McCain também cancelou uma aparição no programa de David Letterman na CBS e foi duramente criticado pelo apresentador: "O que ele pretende fazer se houver uma crise quando for presidente? Adiar a Presidência?".

A ofensiva dos republicanos para retomar a dianteira nos debates sobre o pacote econômico tem a ver com essa tentativa de reverter a situação, levando à opinião pública a idéia de que a candidatura McCain não tem a ver com a administração Bush. Uma ginástica política com poucas probabilidades de dar certo.

A galinha do vizinho


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Chame-se de inferioridade, complexo de vira-lata ou fatalismo decorrente de anos de experiência no ramo.

Dê-se ao fenômeno qualquer nome, a realidade é que por aqui o cidadão medianamente informado acompanha com interesse cada lance da eleição norte-americana, examina com rigor os movimentos de John McCain e Barack Obama, mas não se mostra tão exigente quando se trata de julgar o desempenho dos candidatos a governos do Brasil.

Basta perceber o espaço que os especialistas dedicam aos dois cenários. E não vale o argumento de que nos Estados Unidos neste ano disputa-se o comando do mundo enquanto nossos embates não envolvem mais que lideranças de paróquia.

Na eleição presidencial ocorre o mesmo e essa comparação é a que realmente interessa para estabelecer claramente as diferenças.

A reação de McCain e Barack frente à crise econômica eletriza as atenções. Iniciada a segunda fase de queda nas bolsas, o democrata anunciou ajustes em seu programa de governo, o republicado parou tudo para ajudar o seu governo a aprovar o pacote de U$ 700 bilhões no Congresso e o presidente George W. Bush chamou os dois para discutir o plano em Washington.

Seria demagogia, hipocrisia, simulação, golpe publicitário, falsa preocupação? Não interessa a motivação. O foco, de qualquer modo é a solução. A nenhum dos dois candidatos ocorre usar a crise para prometer uma solução mágica caso sejam eleitos.

Tampouco lhes passaria pela cabeça escrever, como sugeriu em sua despedida de Nova York o presidente Luiz Inácio da Silva, uma “carta ao povo americano”, no modelo da “carta aos brasileiros” de 2002, mediante a qual o PT renegava sua história e acariciava os mercados.

No caso, Obama e McCain estão imunes a suspeitas porque nenhum deles chegou a candidato prometendo virar os Estados Unidos do avesso.

Aliás, se o tivessem feito muito provavelmente não chegariam às convenções dos respectivos partidos. Comportam-se, lá como cá, de acordo com as demandas do eleitorado.

Na campanha americana tudo é importante: a economia, a política internacional, os conflitos mundiais, a destinação do dinheiro dos impostos, o meio ambiente, as questões sociais, raciais, a atitude da família dos candidatos e, sobretudo, o conteúdo das palavras dos propriamente ditos.

Na brasileira, interessa o programa eleitoral mais bem produzido, o marqueteiro mais esperto, a tirada mais bem elaborada, a promessa bem sacada. Enunciados quanto mais ocos, mais bem aceitos. Já problemas intrincados, idéias com começo, meio e fim, cobranças pesadas não sensibilizam, antes atemorizam o eleitor brasileiro.

Adaptação


O deputado José Genoino divulga nota atribuindo o sucesso do presidente Lula a um bem planejado e executado plano de governo. Segundo ele, a oposição, “desnorteada”, busca explicações na “superstição” e no “sobrenatural”, dizendo que o presidente simplesmente “tem sorte”.

O deputado anda confuso e esquecido.

Quem celebra a própria sorte é o presidente. A oposição, e aí Genoino tem razão, desnorteada, embarca nessa versão, cujo propósito subjacente é alimentar a crendice da contraposição entre Lula e o infortúnio.

Há cinco anos o mesmo Genoino desenhava assim o projeto do PT ao chegar à Presidência: eleger muitas prefeituras, ocupar cada vez mais governos de Estados e transformar o Brasil uma sociedade de hegemonia petista. Política, social e culturalmente falando.

Marta outra vez

Nada nesse mundo parece capaz de tirar Marta Suplicy do segundo turno da eleição paulistana, ao mesmo tempo em que a briga na seara tucana praticamente põe nas mãos dela a prefeitura.

Porém, em nome da prudência conviria à candidata não tripudiar. Dançar, cantar vitória, caprichar nas ironias é bom, mas depois de tudo garantido. A precipitação não raro faz dos dias de abundância vésperas de carência absoluta.

Na dúvida, pergunte-se a Fernando Henrique Cardoso o efeito da fotografia sentando na cadeira de prefeito um dia antes de perder a eleição de prefeito para Jânio Quadros em 1985.

Hoje o inimigo de Marta não é Alckmin nem Kassab. É o temperamento.

Morreu de velho

Embora Gilberto Kassab não tenha dado um “golpe” em José Serra para ser o vice em 2004, como alega Geraldo Alckmin, a escolha não foi amena. Decidido que o vice seria do então PFL, Serra e o PSDB escolheram José Aristodemo Pinotti.

Presidente do partido, Jorge Bornhausen vetou Pinotti por causa de seu coração tucano de quatro costados e convocou Kassab. Quer dizer, noves fora lealdades adquiridas a posteriori, o hoje prefeito foi posto na aliança Serra sob a ótica da conveniência de confiar desconfiando.

Notas de campanha

Sergio Costa
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

RIO DE JANEIRO - Os quatro primeiros colocados na eleição do Rio, vistos do lado de cá da campanha, de quem é obrigado a observá-los: Eduardo Paes (PMDB): segue o modelo Sérgio Cabral ao falar com jornalistas. Toda pergunta que lhe fazem é sempre "muito importante", mas só responde o que quer e aproveita para anunciar que vai fazer mais postos de saúde 24 horas.

Marcelo Crivella (PRB): no discurso, é bispo licenciado da sua igreja, mas não perde o jeito pastoral ao segurar as mãos do interlocutor. Já pediu a Deus que abençoasse até traficante em favela. Mora no coração de Lula, seu pastor para garantir que nada nos faltará aqui.

Jandira Feghali (PC do B): domou os cabelos, mas não o temperamento. Com um mau humor contagiante, dificilmente deixa de responder a alguma pergunta sem bater boca com o repórter. Contrariada, arranca os cabelos.

Fernando Gabeira (PV): responde com a serenidade de quem não esconde as rugas. Afinal, levou tiro na ditadura e pilotou -amarradão- trem urbano no exílio sueco, divertindo-se ao não parar em certas estações. Tem proposta para tudo e decidiu, agora, ir para o corpo-a-corpo além da zona sul. Vai de jipe -o "Gabeirão"- para o safári eleitoral na periferia. Demorou.

Qual deles vai ganhar é outra conversa. Quando ouço alguém condicionar o voto a quem tem chance, lembro logo de um antigo contínuo de redação. Ao fim de uma apuração, com jornal numa mão e a "cola" que levara para a cabine na outra, ele conferia em voz alta o resultado das urnas."Presidente: acertei; governador: errei; senador: errei; deputado federal: acertei; deputado estadual: acertei". E sério, no fim:

"Só errei dois!", exultava, enquanto sábios ao redor explodiam de rir.

Eleição, para ele, era feito loteria.

Pensando bem, faz sentido.

O debate pauta o segundo turno


Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL

Depois de ler linha por linha, o caderno da edição de ontem do JB sobre o primeiro e único debate para valer entre os 10 candidatos a prefeito desta ex-capital do país e atual capital do Estado do Rio de Janeiro, confirmei a convicção pessoal que a reforma política será o tema dominante no mano a mano do provável segundo turno.

De quase tudo trataram os candidatos em quatro horas de confrontos em defesa das suas propostas para arrumar a cidade na sua dramática decadência. Mas se trocarmos as siglas que identificam os partidos de cada um dos candidatos, poucos perceberiam a dança das letras.

Claro, há exceções: ninguém engoliria sem protesto se os candidatos de notória linha de esquerda, como Jandira Feghali do PCdoB, Fernando Gabeira do PV ou Chico Alencar do PSOL forem sumariamente transferidos para os partidos de centro ou que se inclinam para a direita. E na contramão seria inviável matricular a revelia o candidato Marcelo Crivella do PRB em um dos partidos do balaio da esquerda.

Ressalve-se que os candidatos a prefeito não têm a menor culpa pela mixórdia partidária, filha dileta da decência ética e moral que afeta os três poderes, com a inquestionável primazia do Legislativo.

Daqui até a eleição, no domingo, dia 5 de outubro, a campanha, com o empurrão do debate do JB, ganhará fôlego que as próxima pesquisas devem registrar.

Como é improvável a decisão no primeiro turno, a reforma política terá amplo espaço no segundo turno, com a carga dupla de emoção que racha a opinião pública: a derrubada do muro em que se equilibram os indecisos amplia a discussão que dissipa as dúvidas.

Não há tempo a perder. A atropelada na reta final está com munição de sobra para impor aos candidatos o aprofundamento dos temas que mexem com a vida da população da capital e de cada município.

Certamente o sucesso da iniciativa do JB lança a moda de debates em todos os meios de comunicação por todo o país. E se o modelo não precisa ser copiado, será difícil inventar novidade com risco de não dar certo.

Para o segundo turno, com uma hora bem programada na divisão de blocos óbvios, os finalistas poderão aprofundar as suas propostas, responder às perguntas de jornalistas, convidados e do público; trocar farpas no confronto direto e os 10 minutos clássicos para as conclusões no recado direto ao eleitor.

Se o prazo é curto, mais uma razão para aproveitá-lo. Seja nos últimos e escassos minutos do inqualificável horário de propaganda eleitoral, pelos finalistas do segundo turno e por quem pretende continuar na militância política.

Baixaria não dá votos, desmoraliza a já tão desacreditada política, com o Congresso exposto na sucessão de escândalos e na orgia das mordomias, das vantagens, dos benefícios e demais desatinos da semana de três dias úteis.

O Rio clama por socorro. E começa a descrer das soluções miraculosas, improvisadas nos apertos críticos de competições ou de congressos internacionais. A pretensão de sediar a Olimpíada de 2014 soa como uma insensatez que, talvez ainda possa ser superada pelos futuros governos da capital e do estado.

Este é o desafio que o debate do JB colocou como a prioridade absoluta dos compromissos dos candidatos a administrar o Rio e a todos os municípios e estados do país.

O candidato Fernando Gabeira botou o dedo na ferida na sentença perfeita: "A solução não vem de um governo ou pessoa. Precisamos de uma frente".

Pois a hora é esta. A legalização da união entre homossexuais pode ser submetida à votação no Congresso a qualquer hora. Mas, francamente, não é uma prioridade de aflitiva urgência.

A prefeitura de SP e a Presidência do Brasil


Alberto Carlos Almeida
DEU NO VALOR ECONÔMICO

O que tem a ver a sucessão em São Paulo e a eleição presidencial daqui a dois anos? Muitos vão dizer que se Marta Suplicy vencer em São Paulo será um enfraquecimento da candidatura José Serra. Outros mencionarão que, se Marta for eleita, ela tentará ser candidata a presidente, competindo com Dilma Roussef pela indicação do PT. Nada disso importa. O que há de importante na eleição de São Paulo e tem a ver com a eleição presidencial, seja qual for o vencedor, Marta ou Kassab, serão os mapas de votação. Tudo indica que eles mostrarão que o PT é muito forte na periferia, nas áreas mais pobres, e o PSDB e os Democratas nas áreas menos pobres da cidade.

Em 2002 a votação de Lula foi muito homogênea em todos os grupos sociais. Em 2006 a mudança foi grande: Lula foi muito mais votado entre os mais pobres e o candidato do PSDB mais votado, em termos relativos, entre os de renda mais elevada.

A principal marca do PT é a de partido que defende as pessoas mais pobres e necessitadas. Lula foi retirante, operário e sindicalista. Faz parte de uma nova elite de poder, uma elite que veio de baixo. Isso não é monopólio de Lula, grande parte do PT tem trajetória semelhante, ainda que poucos sejam ex-operários. O nome do partido traz a palavra "trabalhadores" e antes de chegar à Presidência as posições de Lula e do PT eram extremamente intransigentes na defesa dos interesses dos mais pobres. Desde sua fundação, nos anos 1980, até a vitória de 2002 foram aproximadamente 20 anos construindo uma marca, a marca de defesa do social.

Assim, é possível analisar a trajetória do PT antes de conquistar a Presidência da República exclusivamente como uma trajetória de comunicação: o PT construiu uma marca. Bateu-se insistentemente - e de forma intransigente - na mesma tecla: defesa de aumentos salariais reais, erradicação da miséria, caravanas da cidadania, enfim, toda sorte de discursos e de ações que colocassem o partido claramente ao lado dos mais pobres.

Em 2002, Lula foi eleito presidente. O que ocorreu desde então? A marca não se perdeu. O presidente e seu governo mantiveram a marca do partido: programas Fome Zero, Bolsa Família, ProUni, crédito consignado. Enfim, foram tomadas várias medidas para incluir os pobres no sistema bancário, universitário, no mercado de trabalho formal e coisas desse tipo. Os pobres agradeceram elegendo Lula novamente em 2006.

Não basta botar o ovo, é preciso cacarejar. Tudo o que o governo faz na área social, por menor que seja, é alardeado com vigor. Não estou afirmando que sejam programas abrangentes ou extremamente úteis. Interessa-me aqui, apenas, o efeito que isso tem na comunicação e na formação de imagem. Lula e o PT, mesmo com Aerolula, Mensalão, Lulinha, aumento dos gastos públicos e outras medidas e acontecimentos condenáveis e pouco consensuais, ainda com tudo isso, ambos conseguiram preservar e até mesmo exacerbar a imagem de partido comprometido com a população mais pobre.

Voltemos à eleição de São Paulo. A campanha de Paulo Maluf para a prefeitura, em que pese o fato de não ter chance de vitória e servir apenas para pôr o nome dele em evidência visando à eleição para deputado federal, é uma campanha das antigas, da época em que o social não era a prioridade. Maluf fala em obras, obras e mais obras. Fala das obras que fez e das que vai fazer. Foi-se o tempo em que um candidato era eleito em razão das obras viárias que fazia e prometia. Hoje, em São Paulo, será eleito aquele que for mais persuasivo no que tange ao tema social e mais especificamente no que diz respeito à saúde. Aquele que persuadir o eleitor que vai resolver o problema da saúde tende a vencer as eleições. Portanto, não será Maluf.

No passado, muitos pobres analfabetos não votavam. O voto do analfabeto foi permitido somente em 1988. No passado, os pobres que votavam eram mais conformados com o próprio destino do que são hoje. Eles não conectavam o voto à possibilidade de melhoria de vida. Era uma sociedade menos móvel, baseada mais na família e na comunidade local do que em qualquer outra instituição.

À medida que as pessoas aumentam a escolaridade, passam a ver o mundo de maneira diferente. Em todos os lugares do mundo os menos escolarizados acham que não adianta nada se associar para pressionar o governo. É só aumentar um pouco a escolaridade ou passar, por alguma razão, a participar de um sindicato, como fez Lula, que os pobres mudam de crença: passam a achar que o voto deles pode mudar o próprio destino, a acreditar que, se pressionarem o governo, vão obter algum tipo de ganho ou benefício. Maluf era eleito pelos pobres do passado. Lula foi eleito e reeleito pelos pobres de hoje.

Qualquer que seja o candidato a presidente do PSDB, Serra ou Aécio Neves, é previsível hoje, neste mês, qual será o principal discurso do candidato petista, a sua principal marca: cuidar dos pobres. Não será mais Lula a cuidar dos pobres, mas será um candidato com a bênção do Bolsa Família, do ProUni, da conta bancária, etc. É previsível o discurso do candidato governista: quem fez isso e isso pelos pobres vai continuar fazendo, desta vez aquilo e aquilo.

Já há sinais acerca desse "aquilo". Lula anunciou que vai construir centenas de Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) em todo o Brasil. A UPA é o principal símbolo do programa de saúde levado a cabo por Sérgio Cabral no governo estadual do Rio. As UPAs atingem em cheio o principal problema social de praticamente qualquer município e Estado: a saúde pública.

Nosso país tem esta grande dificuldade: massificar o acesso, dar acesso aos pobres a coisas que eles não tinham ou têm. O governo Fernando Henrique fez isso ao baixar a inflação, colocou comida na mesa do pobre. Os símbolos da época, todos se recordam, foram o frango, o queijo e o iogurte. Fernando Henrique fez mais: deu acesso ao telefone. Não importa qual meio é utilizado para isso, se a privatização ou não, o que importa é que, por um longo período, o PSDB disputou com o PT a agenda de realizações para os pobres, o esforço de dar acesso aos pobres a bens e serviços que eles nunca tiveram.

Nem tudo são flores nesse caminho. Caíram os preços das passagens aéreas e o caos aéreo se instalou. Quando estava chegando a hora de os pobres começarem a voar, os preços subiram novamente e o sistema voltou a "funcionar corretamente". É irônico, mas foi exatamente o que aconteceu. Isso revela a dificuldade que o Brasil tem, toda vez que as soluções envolvem o setor público, de massificar o acesso dos pobres a bens e serviços.

Caíram os preços das passagens aéreas e o sistema entrou em colapso; ampliou-se o crédito, mais carros foram comprados e nossas cidades entraram em colapso; foi criado o SUS e universalizado o acesso à saúde e o sistema entrou em colapso. Esse é o país aristocrático chamado Brasil, que tem dificuldade em massificar as coisas. O PT se propõe a fazer isso, mas nem sempre as intenções levam ao fato.

Ocorre que será esse o discurso - o discurso do social - da sucessão presidencial, sucessão que na sua primeira simulação, exatos dois anos antes da eleição presidencial, põe a desconhecida Dilma Roussef com 8% das intenções de voto, 30 pontos porcentuais abaixo do candidato mais forte do PSDB, o governador José Serra. Aécio tem menos votos do que Serra por um único e exclusivo motivo: o recall dele é menor, ele é menos conhecido nacionalmente do que o governador de São Paulo. Ambos, porém, vão precisar de argumentos - na área social - para enfrentar o discurso petista.

Tome-se o exemplo de São Paulo. É útil, sem duvida, ter visibilidade nacional aprovando uma lei restritiva ao fumo; lei que, aliás, conta com ampla aprovação nacional. Porém, seria mais útil, em termos de comunicação e de marketing, transformar São Paulo no primeiro Estado livre da pobreza e da miséria.

Isso não é possível, é verdade. Trata-se de uma peça de comunicação. Mas é possível, sim, fazer um amplo programa de grande impacto, com início em 2009 e término em, por exemplo, 2029, visando a acabar com as favelas, resolver o tempo de espera na saúde, melhorar a educação, enfim, atingir objetivos ambiciosos em todas as áreas sociais importantes. São Paulo tem recursos para isso e os gestores do PSDB têm a competência.

Note-se, esse exemplo de programa de ação combinado com comunicação moveria o PSDB para mais perto do novo centro político do Brasil. Mais do que isso, poria a nossa direita, assim como fez a direita em todos os países europeus depois de perder o poder para os partidos de esquerda, em melhores condições de enfrentar a marca social do PT. É possível que o principal tema dos próximos 20 anos da política brasileira seja o tema do social. Ocorreu assim no pós-guerra europeu. Esse longo ciclo foi rompido apenas nos anos 1970, depois do governo de Margaret Thatcher na Grã-Bretanha.

Em todo esse período a direita européia, para enfrentar a esquerda em igualdade de condições, caminhou para a esquerda, caminhou para o social. Isso havia acontecido antes mesmo da Segunda Guerra Mundial, durante o período do assim chamado "todos os governos burgueses" na Alemanha. Foram os partidos de direita, na república de Weimar, que mais adotaram políticas de redistribuição de renda. Os conservadores da época avaliaram que isso era necessário para que fosse possível enfrentar o partido social-democrata alemão.

Afirma-se que aprender com os nossos acertos é obrigação, mas aprender com os acertos dos outros é sabedoria. Acertar, neste caso, ocupar o terreno do adversário. Hoje, do ponto de vista do PSDB, ocupar o terreno do adversário é ter muitos e muitos votos na extrema zona leste e zona sul paulistanas e no que ela representa Brasil afora.

Alberto Carlos Almeida, sociólogo e professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" (Record).

Os santinhos com Lula


Maria Cristina Fernandes
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Vinte dos 26 prefeitos de capital são candidatos à reeleição. Em apenas três cidades (São Paulo, Manaus e Salvador) esses prefeitos que disputam a chance de um novo mandato não lideram. Somando-se aos candidatos favoritos dos atuais prefeitos de Belo Horizonte e Recife, tem-se 19 capitais em que as pesquisas, nesta última semana que antecede as eleições, revelam tendência de manutenção do mesmo grupo político no poder.

Tomando por referência 2004, quando em apenas oito capitais os prefeitos foram reeleitos e em outras quatro foram conduzidos ao cargo sucessores aliados, a tendência conservadora das urnas de 5 de outubro parece a grande novidade das eleições. O que o retrospecto das disputas no conjunto dos 5.564 municípios do país mostra, no entanto, é que as capitais aderem a um comportamento eleitoral já observado no resto do país. A taxa de reeleição dos prefeitos que se recandidataram em todo o país foi de 58%, tanto em 2000 quanto em 2004. As pesquisas nas capitais sugerem que essa tendência pode vir a ser acentuada nacionalmente.

Se há mais chances de reeleição é porque também há um maior número de recandidaturas. Nos números da Confederação Nacional dos Municípios, dos 4.368 prefeitos que têm o direito de disputar reeleição, 77% são candidatos. A base dos elegíveis a um novo mandato este ano é maior do que em 2004 - quando dois mil prefeitos já reeleitos estavam fora do jogo - e menor do que a de 2000, quando todos tiveram o direito de se recandidatar, mas apenas 62% o fizeram.

Se mais prefeitos decidiram se recandidatar é porque avaliam ter maiores chances do que seus antecessores. Não há como dissociar esta maior disposição dos prefeitos em testar suas chances nas urnas à maior satisfação dos eleitores.

Na página do PT na internet há uma ampla avaliação das mudanças na relação entre União e municípios nos últimos anos que pode ajudar a entender essa percepção mais benfazeja do eleitorado. Em resumo: o Fundo de Participação dos Municípios ganhou R$ 14 bilhões em quatro anos, o ISS ampliou sua base e já representa quase metade das receitas próprias dos municípios e a partilha da Cide acrescentou R$ 143 milhões anuais aos cofres municipais.

Nos grotões, o ano de 2004 iniciou-se com apenas 4% dos municípios atendendo a 75% de toda a população alvo do Bolsa Família. Em 2008 esta fatia de beneficiários está espalhada em 92% dos municípios. Nas cidades com população superior a 150 mil habitantes, onde se incluem todas as capitais que hoje capitaneiam a conservação do poder, tem o PAC, inexistente em 2004. Aí se incluem obras de metrô em quatro capitais (BH, Fortaleza, Recife e Salvador), 165 projetos de urbanização de favelas (41% em obras) e 314 projetos de abastecimento de água e saneamento (31% em obras).

Todas essas obras têm contrapartida estadual e municipal e o eleitor de 2008 parece mais satisfeito do que o de 2004 com todas as esferas de poder. Mas a lufada de boa vontade passa com muito mais força pelo Palácio do Planalto. A comparação das pesquisas CNT/Sensus de setembro de 2008 com a do mesmo mês de 2004 indica que a avaliação positiva de todos os governantes cresceu, mas a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aumentou quase quatro vezes mais do que a dos prefeitos e sete vezes mais que a dos governadores (ver gráfico acima).

É isso que tem alimentado o folclore da campanha, como a comerciante Ledinalva da Silva no horário eleitoral do PSDB em Cuiabá dizendo que o prefeito, candidato à reeleição, ajuda tanto os pobres quanto seu irmão presidente da República, ou mesmo a propaganda por telefone de uma vereadora do PT em Angra dos Reis (RJ), suspensa pela justiça eleitoral, em que o locutor imita a voz do presidente da República.

Mas as conseqüências vão além do folclore. PSDB e DEM são, respectivamente, os partidos com o menor percentual de recandidatos. E os partidos da base lulista, recordistas em número de prefeitos que tentam a reeleição, capitaneiam a lufada de vento conservador que ameaça varrer as urnas de 5 de outubro.

Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras

A crise financeira: e agora, quem pagará a conta?


Yoshiaki Nakano
DEU NO VALOR ECONÔMICO


A crise financeira nos EUA parece ter atingido o chamado "momento Minsky". O presidente Bush anunciou, pela TV, que se as medidas de socorro não forem tomadas imediatamente, as consequências para a economia americana serão severas. Com o colapso dos preços dos ativos financeiros, seus efeitos negativos sobre os consumidores poderão ser amplificados pelo "acelerador financeiro" com contração generalizada de crédito, desacelerando a demanda agregada já em queda. A proposta do secretário de Tesouro, que pediu ao Congresso plenos poderes para gastar US$ 700 bilhões para comprar "ativos podres", deverá ser aprovada, mas encontra resistências, pois não define quem pagará o prejuízo.

A atual crise foi inaugurada com o pedido de falência do Ownit Mortgage Solutions no dia 28 de dezembro de 2006, quando a bolha imobiliária estoura e os preços dos imóveis começam a cair. Chega também o momento em que milhares e milhares de famílias, no segmento subprime, não conseguem pagar as suas prestações e começam a perder as suas casas com a execução de hipotecas (as chamadas foreclosures). O governo republicano tanto permitiu a criação da bolha, como assistiu, com indiferença, o colapso do subprime, e ainda permitiu a sua propagação para os bancos, pelo canal da securitização de hipotecas e transferência de riscos. Estes passam a anunciar prejuízos, desencadeando uma crise de confiança e contração de liquidez.

Grandes instituições financeiras que carregavam títulos com garantias hipotecárias problemáticas, como Bear Stearns, Fannie Mae, Freddie Mac, entram em colapso, e o governo intervém massivamente injetando liquidez, quando o problema não era só de liquidez. Havia originalmente problemas de solvência e de supervisão do sistema. Assim, entra-se num processo em que a perda de valor das garantias (valor do imóvel) desencadeia um círculo vicioso de desconfiança por problemas de regulação/supervisão e informação, provocando queda no preços dos ativos e levando as pessoas a venderem seus ativos - e, em consequência, os preços caem mais ainda. As instituições financeiras não conseguem mais se financiar no mercado e, com crescente aversão ao risco e incerteza, entra-se na armadilha da liquidez. Por mais que o Fed injete liquidez, o mercado para estes ativos não volta, nem se estabelece um piso de preços; ninguém quer assumir riscos, todos preferem acumular liquidez. As instituições financeiras, sofrendo prejuízos, assistem seus balanços e capital próprio encolherem, não conseguem mais se recapitalizar e precisam se desalavancar.

Assim, a crise entra numa nova fase, atingindo, por contágio, instituições sadias, e uma contração generalizada de crédito atinge o setor real da economia. Agora, é preciso um enfrentamento do verdadeiro problema e um tratamento de todo o sistema, e não de suas partes. Na proposta Paulson/Bernanke, o Tesouro compraria os ativos ilíquidos/podres, retirando-os dos balanços das instituições financeiras, o que poderia devolver-lhes a confiança, recompondo a liquidez no mercado ao restituir a eles a capacidade de criação de crédito. O grande problema aqui é como estabelecer os preços destes ativos podres. Se for por leilão bem conduzido, supervisionado e transparente, como querem os democratas, é provável que o deságio seja enorme. Uma referência de mercado são os preços atingidos no leilão de ativos da Merrill Lynch, que foi de 22% do preço de face. Neste caso, é provável que os bancos não participem - se participarem, vão para falência e o custo, em impostos para o cidadão, será pequeno. Os acionistas e investidores pagarão a conta. Se o preço de compra dos ativos podres for próximo ao valor de face, como quer o secretário do Tesouro, quem pagará a conta é o cidadão. O Tesouro subsidiará os acionistas e investidores. Qualquer destas escolhas terá também efeitos diferenciados na futura trajetória da economia.

Walter Bagehot, editor da revista The Economist no Século XIX, propôs uma regra de política respeitada até hoje. O Banco Central deve emprestar livremente para bancos em dificuldade, mas com garantia de alta qualidade - como títulos do Tesouro - e sempre cobrando taxas de juros punitivas. Algo próximo aconteceu com o Bear Stearns. O Fed emprestou US$ 30 bilhões para salvá-lo e transferi-lo para o JP Morgan Chase. Se as garantias forem boas, o cidadão não pagará nada. Os acionistas perderam praticamente tudo e os administradores foram certamente substituídos.

O Fed vem aplicando uma variante desta regra, que certamente Bagehot não concordaria. Criou novos programas, emprestando livremente aos bancos em dificuldades com baixas taxas de juros e grande flexibilidade nas garantias, visando preservar o mercado, isto é, o investidor. Se este se sentir mais seguro, os bancos poderão voltar a operar, recompor seu capital, sua solidez e voltar a emprestar normalmente. Evidentemente, quem paga a conta inicialmente é o contribuinte, mas o argumento é de que, no final, ele também sairá ganhando, se forem evitadas a crise e a recessão. Os recentes casos de Fannie Mae, Freddie Mac, Morgan Stanley e Goldman Sachs representam socorros flexíveis e generosos casos desta categoria. Na verdade, é preciso lembrar que o Fed, ao abaixar dramaticamente a taxa de juros, está dando um subsídio para os acionistas, além do custo que terá o cidadão, com uma taxa de inflação muito mais elevada, já captada pelos investidores que a embutiram nas taxas mais longas.

No caso do Lehman Brothers, o tratamento foi bem diferente. A crise foi resultado da ganância por bônus milionários de administradores irresponsáveis, e os acionistas fecharam os olhos para obter dividendos polpudos. Assim, abusaram da alavancagem e de operações que não constam em seus balanços, comprando títulos lastreados em hipotecas subprime com elevados retornos e financiando-os com emissão "comercial papers". E ainda desconfia-se que tenham praticado fraudes. Falência e FBI para os responsáveis!

Mas agora a crise avançou e não são alguns bancos que estão em dificuldade, mas todo o sistema está ameaçado. As políticas acima não se aplicam mais. É preciso muito mais. O socorro proposto por Paulson/Bernanke não resolverá o problema da recapitalização dos bancos, muito menos a questão da supervisão e gestão de risco. Certamente, será o primeiro socorro sistêmico, mas tentativo e improvisado. Outros virão, mas, aparentemente, o atual modelo de negócio bancário é que foi colocado em cheque.


Yoshiaki Nakano é ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP, escreve hoje excepcionalmente.

PT denuncia Múcio por “abuso” do cargo


Joana Rozowykwiat
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Do alto do seu estratégico posto de ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro (PTB) tem percorrido o Estado levando todo o seu prestígio às campanhas dos candidatos que defende nessa eleição, mas também causando muito desconforto e indignação em alguns petistas. Eles reclamam que o ministro estaria “abusando” da sua posição no governo, alardeando que seria representante do presidente Lula no apoio a postulações que não contam com a adesão do PT e, pior, muitas vezes, são patrocinadas por siglas como DEM e PSDB. Para frear esse tipo de situação, o presidente estadual do partido, Jorge Perez, enviou um ofício ao diretório nacional, pedindo que o próprio Lula seja informado do assunto.

Pelo menos quatro cidades se queixaram formalmente de José Múcio: Jaqueira, Palmares, Condado e São João. Para provar o que estaria ocorrendo, o diretório municipal de São João enviou a gravação do guia eleitoral de rádio do município. No áudio, o ministro teria afirmado que o candidato Pedro Antonio Barbosa (PTB), cujo vice é Luiz Gonzaga (DEM), é o verdadeiro candidato de Lula, contrapondo-se a Antonio de Pádua (PSB), que tem como companheiro de chapa, Hugo Cabral (PT).

“O ministro chega anunciando que o presidente Lula mandou dizer que o candidato dele é Pedro Barbosa. Afirma que ele próprio é a pessoa que abre as portas do gabinete de Lula. Acho que ele virou porteiro agora. Ministro não é para dizer esse tipo de coisa, que confunde a população. O PT é o partido de Lula e tem outro candidato em São João”, reagiu Hugo Cabral.

Em Condado, a reclamação é a mesma. O petista José Cláudio é candidato a vice na chapa encabeçada pelo PSB e afirma que, nos dois eventos que participou na cidade, José Múcio teria se colocado como representante não apenas de Lula, mas do PT. “Temos gravado o pronunciamento dele, em setembro, dizendo que ele é o único que pode representar o PT de Lula. Isso é absurdo. Ele nunca teve nada a ver com o PT”, indigna-se. José Cláudio avalia que o ministro está sendo “infiel”, ao falar pelo presidente. “Lula devia era tirar ele da pasta”, sugere.

Mais diplomático, o presidente estadual do PT lembra que o fato de o partido estar coligado com o PTB de Múcio não significa que ele pode falar pelo partido e pelo presidente. “A aliança não autoriza essa postura, nem faz com que tenhamos que calar. Em função de uma coligação, não podemos desrespeitar limites políticos”, apontou.

Ressaltando que respeita o ministro, o dirigente alertou: “Ele não pode abusar da condição de ministro para passar informações erradas, criando situações constrangedoras para o próprio presidente. O Lula é presidente da Nação, mas é filiado ao PT, considera esse o seu partido e apóia as candidaturas do PT”. Segundo ele, as manifestações do ministro não têm anuência do presidente, tampouco do PT, claro.

Jorge Perez encaminhou a cópia do áudio do guia eleitoral de São João ao presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, para que o presidente Lula seja informado do que se passaria no Estado. Quem também se queixou do ministro foi deputado federal Fernando Ferro (PT), que já foi procurado por petistas de Itambé, Camutanga e Ibirajuba para as mesmas reclamações. “O PT tem um candidato na cidade e o ministro defende os nomes do DEM e do PSDB. E estaria dizendo que o verdadeiro PT não seria aquele da cidade. É muito desagradável”, lamenta. O JC não conseguiu entrar em contato, ontem, com o ministro José Múcio Monteiro.