quarta-feira, 30 de julho de 2008


Marco Aurélio Nogueira escreveu no seu blog:


Meu amigo Luiz Guilherme Paschoalini, num comentário postado dias atrás, fez uma indicação que merece ser socializada.


Ele localizou o filme Antonio Gramsci. I giorni del carcere, de 1977, dirigido por Lino del Fra.


Trata-se de uma tentativa de apresentar os anos vividos por Gramsci na prisão de Turi, em Bari, Itália (julho de 1928 a outubro de 1933), período fundamental para a redação dos Quaderni gramscianos e bastante analisado pelas discordâncias que o mais famoso prisioneiro do fascismo manifestou em relação à teoria stalinista do social-fascismo, aceita então até pelo próprio partido de Gramsci, o PCI, ainda que com reservas.


O filme é bastante datado, foi produzido em preto e branco para a televisão italiana e recebeu o Grande Prêmio do Festival Internacional do Filme de Locarno 1977. Esforça-se para reconstruir em detalhe a época e os personagens, valendo-se de bastante maquiagem, leitura de documentos e flash-backs.


Riccardo Cucciolla faz um Gramsci de peruca e corcunda, numa operação de busca máxima de verossimilhança. Com isso, o filme perde em fantasia e força ficcional, flertando com o documentário mas sem conseguir sê-lo por completo. Sua recepção, portanto, não é unânime, mas vale pelo argumento central, precisamente os anos de Gramsci no cárcere.


Deve ser assistido pelos que se interessam por Gramsci, pelas lutas políticas dos anos de 1920-1930, pela hstória do comunismo.


O filme, falado em italiano e com legendas em espanhol, pode ser acessado no Google Video:

O QUE PENSA A MÍDIA
EDITORIAIS DOS PRINCIPAIS JORNAIS DO BRASIL
http://www.pps.org.br/sistema_clipping/mostra_opiniao.asp?id=1042&portal=

DEU EM O GLOBO


DIFICULDADES E FACILIDADES
Merval Pereira


NOVA YORK. Uma pergunta que não encontra respostas simples, mas que vem dominando as discussões sobre a campanha presidencial americana, é sobre as razões por que o candidato democrata, Barack Obama, apesar de todo o seu sucesso de público, inclusive internacional, e da economia em crise, não consegue deslanchar na preferência dos eleitores, como mostram as pesquisas de opinião. Quando parecia que a bem-sucedida viagem ao exterior havia aberto o caminho para tornar realidade a percepção de que Obama vencerá a eleição de novembro, duas pesquisas do mesmo instituto Gallup embaralharam novamente os dados.

Uma, feita com eleitores registrados, deu-lhe uma vantagem de 9 pontos percentuais, a maior registrada até aqui. Outra, feita para o jornal "USA Today" com os "eleitores potenciais", deu uma vantagem de cinco pontos para o republicano McCain. Demonstrando que ainda existem nuances nessa disputa, o próprio Obama, em uma reunião para angariar fundos para a campanha, admitiu que, embora as indicações sejam de uma vitória em novembro, ainda há muita dificuldade pela frente.

Também o Pew Research Center encontrou dificuldades semelhantes para os dois candidatos. Enquanto McCain tem um déficit de entusiasmo entre seus eleitores, Obama tem um de coesão entre os democratas que apóiam a senadora Hillary Clinton. A favor de McCain está o fato de que ele tem o apoio de quase 80% dos eleitores que votaram em outros republicanos nas primárias. Já Obama conseguiu até agora obter o apoio de apenas 69% dos eleitores da senadora Hillary Clinton. Há um contingente importante (17%) dizendo que votará em McCain, e cerca de 12% ainda indecisos.

Tudo indica que a eleição deste ano terá características próprias, a começar pelo fato de que o comparecimento, que já foi alto nas primárias, será maior ainda na eleição de novembro, pois o interesse dos eleitores continua aumentando.

A percentagem de eleitores que se declaram muito interessados nas eleições atinge 72%, de longe o maior índice desde a campanha de 1988. A proporção dos que se dizem interessados em política este ano é a maior desde a eleição de 1992.

Ao contrário do que vinha acontecendo nas últimas eleições, os eleitores democratas estão mais engajados na campanha que os republicanos, provavelmente como reflexo da possibilidade de voltar ao poder depois de oito anos da administração George W. Bush.

Pela primeira vez desde 1992, quando Bill Clinton foi eleito pela primeira vez, o Pew Center encontrou uma maior proporção de democratas demonstrando alto interesse na campanha. Cerca de 77% dos eleitores democratas mostram-se interessados, índice superior em 18 pontos ao registrado em 2004 entre eles.

Também entre os republicanos o interesse aumentou desde a última eleição presidencial, mas em proporção menor, de 61% para 72%, e é a primeira vez que existem mais eleitores democratas empolgados com a eleição do que republicanos.

Essa tendência pode ser comprovada quando se pesquisa o aumento do interesse entre os eleitores dos partidos desde a última eleição. Enquanto cerca de 70% dos democratas estão mais interessados, apenas 50% dos republicanos se definem como mais interessados hoje que há quatro anos, na reeleição de Bush.

A candidatura de McCain não tem conseguido entusiasmar os eleitores republicanos, e apenas um terço deles se diz extremamente compromissado em votar nele, enquanto essa postura é a de mais da metade dos que dizem que votarão em Obama.

O apoio que Obama está recebendo entre os trabalhadores brancos é o mesmo que receberam Al Gore ou John Kerry, apesar de eles demonstrarem conservadorismo em relação à questão racial. Mas Obama está encontrando menos apoio entre outro setor conservador do eleitorado, os brancos mais velhos.

Mas o maior empecilho contra Obama é mesmo sua falta de experiência administrativa e política. Cerca de 40% dos que não gostam dele alegam essa inexperiência. Mas o candidato republicano também tem um peso grande contra si, o da idade.

A chance de McCain reverter o favoritismo de Obama está nos eleitores independentes e nos classificados como "softs", isto é, que não são militantes de nenhum dos dois partidos e podem mudar seu voto de acordo com as circunstâncias.

Tudo indica que haverá mais mudanças de votos do que houve na eleição passada, quando a esta altura os votos estavam mais consolidados. Os eleitores independentes estão totalmente abertos em suas escolhas, sendo que metade deles se diz indefinida. Os que já escolheram dividem-se igualmente entre os dois candidatos.

É por isso que o republicano McCain apareceu à frente de Obama na pesquisa Gallup/"USA Today" entre os "prováveis eleitores", que são aqueles caracterizados pela constância com que votaram em eleições anteriores, que colocam a eleição entre suas prioridades do momento e demonstram vontade de votar em novembro.

Segundo o Gallup, o número de prováveis eleitores republicanos está crescendo, como resposta à viagem exitosa de Obama e ao que consideram uma cobertura parcial e laudatória da mídia. Se McCain não consegue empolgar seu eleitorado, o tratamento de virtual eleito dado a Obama pode incentivar o eleitor conservador a sair de casa e votar em novembro.

McCain estava seis pontos percentuais atrás de Obama nesse mesmo universo de eleitores há um mês, e agora está na frente, o que mostra pelo menos que ele tem capacidade teórica de reagir.

No entanto, especialistas em pesquisa salientam que, neste momento da campanha, as pesquisas com eleitores registrados são as que refletem melhor a realidade da disputa. E essas mostram uma tendência clara a favor de Obama.

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


ONDE PAROU A MUDANÇA?
Luiz Carlos Azedo


O Bolsa Família virou um mecanismo de reprodução eleitoral do “sistema de poder” que Lula está montando

O Brasil teve dois processos significativos de inclusão de massas à sociedade de consumo, por meio da ação decisiva do Estado. O primeiro, a partir da Era Vargas, ocorreu com a industrialização, a legislação trabalhista e o sindicalismo oficial. O segundo, no governo Lula, com a instituição do Bolsa Família e de outros programas de transferência de renda. Ambos fortaleceram os carismas de seus criadores, os presidentes Getúlio Vargas e Luiz Inácio Lula da Silva. Vargas virou mito graças ao seu suicídio, em agosto de 1954; Lula ainda não é um mito, isso dependerá do desfecho de seu governo.

Adeus às ilusões

O populismo de Vargas subjugou o pensamento da esquerda brasileira, reduzindo-o ao nacionalismo. Combater o latifúndio e o imperialismo, as duas pragas que impediriam a industrialização, na década de 1930, representava ser moderno e progressista. O projeto da esquerda era um capitalismo autárquico, alavancado pelo setor produtivo estatal e liderado pela burguesia nacional, como via para emancipação do país. Apesar dessa retórica, o Brasil se industrializou com forte presença do capital estrangeiro e o latifúndio prosperou com uma agricultura moderna e competitiva. E mais: a maioria da população foi incorporada à produção.

O choque entre esse desenvolvimento real e o nacional-populismo ideológico desaguou no golpe militar de 1964. Os militares no poder fizeram uma reforma do Estado, modernizaram o sistema bancário, integraram o país por meio das rodovias e da comunicação por satélite, expandiram a geração de energia, a siderurgia e a petroquímica, além de estabilizar as relações sociais no campo com o Estatuto da Terra. A concentração de capital, a partir do sistema financeiro, legou ao país uma sociedade mais complexa e, contrariando o “Ame ou deixe-o”, mais pluralista. Dessa contradição emergiu, com a Constituição de 1988, uma democracia de massas (hoje somos 125 milhões de eleitores).

Nova esperança

O Brasil urbano que surgiu dos anos 1990 estava à frente da retórica terceiro-mundista. A desigualdade social exigia respostas novas da democracia: de um lado, um setor moderno da economia, com operários altamente qualificados e uma classe média instruída; de outro, a massa de miseráveis alimentada por sobras da sociedade de consumo e comunidades rurais em regime de subsistência. A Nova República fundada por Tancredo Neves e encarnada por José Sarney havia frustrado a esperança de mudança social. Esse passivo foi a força motriz da eleição de Fernando Collor, que utilizou com maestria as ferramentas do marketing para atropelar os adversários e chegar ao poder. Lançou por terra velhos discursos políticos, agora anacrônicos diante da globalização e da hiperinflação.

Lula (PT), Ulisses Guimarães (MDB), Mário Covas (PSDB), Leonel Brizola (PDT), Roberto Freire (PCB) foram derrotados. Apesar do confisco da poupança, Collor executou um programa econômico liberal cujo eixo foi a abertura comercial. Mas foi um governante desastrado e acabou apeado do poder por esses políticos que havia derrotado, respaldados por um forte movimento de classe média, sobretudo estudantil. Sua agenda de modernização do Estado e da economia, mesmo rejeitada pelo presidente Itamar Franco, foi parar no colo de Fernando Henrique Cardoso, que operou soluções mais competentes e compatíveis com o espírito republicano. A crise de financiamento do setor público foi superada com o programa de privatizações e um duro ajuste fiscal, que incluiu a reforma da Previdência. Pela primeira vez, desde a segunda metade da década de 1960, o país teve uma moeda estável, o Real, o que deu dois mandatos a FHC.

A vitória de Lula nem de longe foi uma ruptura com essa agenda. O “mais do mesmo” — câmbio flutuante, superávit fiscal e juros altos — ainda garante a estabilidade da moeda. A abertura comercial , apesar de assimétrica, continua. Entretanto, Lula é cada vez mais intervencionista na economia e nos grandes negócios cooptou as lideranças sindicais e populares e desmobilizou a sociedade civil. Sua política assistencialista, que “focaliza” o gasto social nos mais pobres e faz a diferença, carrega uma contradição: lançou 46 milhões de pessoas ao consumo, mas não à produção, mantendo-as dependentes do Estado. Com isso, o Bolsa Família virou um mecanismo de reprodução eleitoral do “sistema de poder” que Lula está montando. É aí que parou a mudança.

DEU NO VALOR ECONÔMICO


APENAS UMA JANELA PARA O VELHO TABU
Rosângela Bittar


Sempre que quer criar uma discussão que se esgota nela mesma e incomoda a federação, o governo recorre à reforma tributária, assunto de impasse já tradicional nas relações de estados e municípios com o governo federal. Todos sabem que não dará em nada e se alguma mudança for aprovada, numa legislação separada do conjunto conflitivo, será pontual e, provavelmente, secundária. Mas quando precisa de algo que consuma a discussão na política, em processo interminável e com certeza inconcluso, o governo tira do baú a reforma política. É questão para não ser levada a sério, a não ser que, com a reabertura agora de nova temporada para esta reforma, tenha o governo algum interesse real e objetivo em sua ressurreição.

O presidente Lula atribuiu à reforma política lugar de honra no seu programa de governo para o segundo mandato. Logo, porém, resolveu afastar-se dela, alegando tratar-se de uma atribuição do Congresso Nacional na qual o Executivo não deveria se meter. Diferentes iniciativas e projetos começaram a tramitar e uma reforma básica ficou definida como aquela que regularia a fidelidade partidária e instituiria a lista fechada e o financiamento público de campanhas. Embora votado em primeiro turno na Câmara -nunca havia chegado tão longe -, o projeto neste sentido não tem a mais remota chance de ser retomado e transformado em lei. Resolveu-se, como sempre quando se chega ao impasse destas reformas que nunca andam, retalhar o projeto e considerar cada tema em texto separado, para driblar polêmicas.

O que mais avançou foi o do deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), votado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Esta peça tem a força de uma rasteira na interpretação judicial sobre a fidelidade partidária e acaba resultando na permissão da infidelidade. Na ausência de legislação sobre isto, o Tribunal Superior Eleitoral interpretou as normas e concluiu que o mandato pertence ao partido e não ao candidato, posição confirmada pelo Supremo Tribunal Federal ao analisar recursos.

Pela via judicial, portanto, conseguiu-se uma norma para coibir a infidelidade indecorosa dos políticos brasileiros, alguns transitando por cinco, seis partidos em uma única legislatura. O que o projeto Flávio Dino faz é restabelecer a migração partidária, por um período de trinta dias, um ano antes das eleições, no que se chamou de "janela" em que a troca de partido pode ser feita à vontade, sem respeito aos critérios como os que haviam sido fixados pelo TSE e confirmados pelo STF: criação de novo partido, comprovação de que a legenda alterou sua posição ideológica ou se houver perseguição interna ao político.

Reforma repõe 3º mandato na pauta

Dentro do período da "janela" o troca-troca poderá ser feito plenamente. O projeto Dino, que foi explicado à época como uma restrição mitigada, nada mais é que uma anulação da decisão judicial sobre a fidelidade partidária.

Enquanto o Congresso providencia esta "correção" de um obstáculo legal que não interessa ao fisiologismo das duas Casas, o governo resolveu retomar o assunto para si e, desta vez, sem lembrar ao público, como fizera de outras vezes, que ele é prerrogativa de deputados e senadores. O ministro da Justiça, Tarso Genro, foi escolhido pelo presidente, anuncia-se em plenas férias de julho, para elaborar um projeto de reforma política, em parceira com o ministro José Múcio Monteiro, das Relações Institucionais. A Presidência teria feito isto depois de chegar à conclusão de que "se não tomar a frente, não sai a reforma política".

As contradições evidentes reforçam a desconfiança de que qualquer iniciativa do governo no campo da reforma política tem a certeira intenção de abrir uma "janela" para a volta da discussão e das emendas do terceiro mandato consecutivo para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com esta conversa, a esta altura, o governo estaria, numa definição usada por Leonel Brizola à perfeição, costeando o alambrado para chegar onde quer.

Fora desta interpretação, não dá para levar o anúncio a sério. A história do Brasil está plena de exemplos de tentativas de fazer reformas, que goraram mesmo quando planejadas para entrar em vigor três eleições adiante do seu tempo. O historiador e cientista político Octaciano Nogueira dá o exemplo da cláusula de barreira, estabelecida numa emenda de 13 de outubro de 1978, no período Ernesto Geisel. Em junho de 1982, ano em que estava planejada para entrar em vigor, os parlamentares aprovaram nova emenda adiando-a para 1986; aí, outra emenda empurrou-a para 1990. Veio, então, a Constituinte, a lei dos partidos e, neste outubro de 2008, o país completa 30 anos de tentativas de aplicar a cláusula de barreira, sem sucesso. O mesmo se dá com a fidelidade partidária, que o país só conseguiu uma regra na Justiça, afirma Octaciano.

"O Brasil só adotou até hoje dois sistemas, o majoritário (de 1821 a 1932) e o proporcional (de 1932 para cá). Não se fez outra mudança, o conservadorismo não deixa mudar", diz o professor. Octaciano lembra a constatação a que, com sua experiência, chegou o cientista político italiano Giovani Sartori: "Não houve nenhuma reforma eleitoral, em nenhuma parte do mundo, que tivesse sido feita por aqueles que foram eleitos por um outro sistema. Pelo outro sistema ele sabe que se elege, está lá. Não sabe se, mudando, vai conseguir eleger-se".

Pedido Especial

A parceria secreta entre a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), no caso Daniel Dantas-Supertele, não foi surpresa para quem acompanhou de perto o rito de passagem do cargo do delegado Paulo Lacerda para seu sucessor na direção da PF, Luiz Fernando Correa. Ao sair do posto na Polícia e antes de assumir a direção da Abin, Lacerda fez um único pedido especial ao novo diretor Correa: que mantivesse o delegado Protógenes Queiroz no comando do processo DD. Alegou que ele estava à frente da investigação desde 2004 e a vinha conduzindo com muita competência.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

DEU NO JORNAL DO BRASIL


RESPOSTA AO PREZADO LEITOR
Villas-Bôas Corrêa

Em curto e estimulante recado, publicado na seção Cartas do JB do dia 28, o prezado leitor carioca Marcos André da Silva Caruso, depois de registrar a sua concordância "em gênero, número e grau¨ com os meus comentários políticos – que é o mais gratificante prêmio do exercício da minha profissão – encaixa a sua perplexidade no jeito de quem pergunta: se reconhece que "o voto é uma arma muito poderosa, votar em quem?".

Ora, meu estimado leitor, a sua perplexidade diante do quadro calamitoso deste amargo momento da nossa história republicana de golpes, ditaduras, incompetência, renúncias de presidentes birutas de carteirinha na sucessão de erros que nos levaram ao beco desta mofina campanha eleitoral é absolutamente justa.

Com uma ressalva, que soa como a advertência do risco de uma reação equivocada e que faz o jogo do adversário. Votar em quem? – é uma pergunta que muitos se fazem diante do espelho. E que insinua a resposta escapista do voto em branco.

Ora, a fuga para ficar em paz com a consciência não é uma saída pela porta da frente, mas uma fuga pulando a janela do fundo.

Vamos raciocinar juntos: a quem aproveita o voto em branco? Bem, se a maioria absoluta do eleitorado votasse em branco, em movimento nacional que ganhasse as ruas e, por exemplo, repetisse no Rio o impacto da passeata dos 100 mil ou, em São Paulo, igualasse o recorde do comício da campanha das Diretas Já, certamente que encurralaria o caduco modelo eleitoral no beco da rejeição.

Mas pelo menos até onde a vista enxerga no negrume de tempos de escuridão, está é uma hipótese em que nem a mais ingênua esperança consegue acreditar e muito menos confiar.

O voto que se anula, o eleitor que não vota e que é como se não existisse, abre a larga picada para o desfile dos velhacos dos espertalhões, dos candidatos com a ficha policial mais suja do que o Centro do Rio depois das 20 horas. Baixa o quociente eleitoral para a eleição de vereadores e facilita a eleição de prefeitos que manipulam a máquina municipal.

E qual é a sua cota no protesto que ajuda a eleger o rebotalho de uma fase cinzenta de mais está experiência democrática? Bem, você não correrá o risco de novo arrependimento com o voto que o enganou. Mas é um alívio egoísta e inócuo.

Há alternativas para o voto do eleitor que não foge do seu dever de participar de uma reação conse-qüente, que não se reduza à omissão.

O primeiro passo da caminhada o meu ilustre leitor já deu e que é a raiva santa, a indignação, o desprezo, o nojo pelos responsáveis pela degradação da militância política.

Alimente a raiva com a leitura diária dos jornais e das revistas, dos artigos de escritores e jornalistas da sua confiança. Prepare-se para suportar o suplício do programa de propaganda eleitoral com a atenção crítica sobre o blá-blá-blá de candidatos. Sei que não é fácil. Mas divirta-se com os bestialógicos, selecione a meia dúzia que despertou o seu interesse e busque completar as informações sobre a folha corrida de cada um.

Não esqueça da ração de raiva. Daqui até a eleição no primeiro domingo de outubro, dia 5, o eleitor encontrará o atalho para o voto de protesto, da indignação, da revolta.

Na escolha do candidato, a última encruzilhada: os que tiverem a sorte da sacação de um candidato que encha as medidas votarão com a alma pacificada.

Na dúvida, saia pela portinhola da renovação. Claro, sem abrir a guarda nem afrouxar a desconfiança. O voto no estreante, além de injetar sangue novo no elenco, ajuda à faxina municipal, ensaio para o mutirão estadual e federal de 2010.

DEU NA FOLHA DE S. PAULO


ELEIÇÃO E CIVILIZAÇÃO
Clóvis Rossi


SÃO PAULO - Sempre acreditei que o exercício continuado da democracia teria um efeito pedagógico tão formidável que, ao cabo de um dado tempo e de algumas ou muitas eleições, o Brasil se tornaria um país civilizado.

Continuo acreditando na democracia, mas sou obrigado a admitir que é preciso fé, muita fé.

Jamais poderia imaginar, por exemplo, que as duas maiores e mais ricas cidades do país (São Paulo e Rio de Janeiro) passariam, nas eleições de 2008, as sétimas consecutivas para as capitais, desde que recuperaram, em 1985, o direito de votar para prefeito, por situações que a sabedoria convencional (ou o preconceito convencional) diz serem mais próprias dos grotões (escolha você o grotão que mais lhe apeteça).

Numa cidade, o Rio, fala-se em chamar forças federais para evitar interferências indevidas.

Força federal era algo que só mesmo os rincões perdidos demandavam antigamente. Pode ser até que não seja necessário recorrer a elas. Mas o simples fato de que a hipótese surgiu sem causar o menor escândalo já é desanimador e revelador.

Revela pura e simplesmente que a democracia recuou, em vez de avançar, justamente na cidade que foi durante séculos a grande câmara de eco da pátria.

Em São Paulo, o prefeito Gilberto Kassab dá-se ao desplante de ensaiar "ações", para usar sua própria "novilíngua", destinadas obviamente a evitar que o retrato de suas chances na pesquisa Datafolha fosse feio ou mais feio do que já é. Claro que o prefeito nega. Faz parte do show dos políticos, de todos os partidos, negar mesmo as evidências mais escandalosas.

Nem prefeitos dos grotões recorrem, hoje, a esse tipo de trambique primário. O fato de que o prefeito de São Paulo o faça conta história parecida à do Rio: eleições sucessivas ainda não civilizaram a parte do Brasil que se julga, erroneamente, a mais civilizada.

DEU NO JORNAL DO BRASIL

PARA ACABAR DE VEZ COM OS CURRAIS
Renata Victal

TRE cria grupo de trabalho com Estado e Polícia Federal anuncia reforço no seu efetivo

A união mandará para o Rio, já na próxima semana, homens de outros estados para reforçar o efetivo da Polícia Federal no Estado. O pedido foi feito pelo superintendente do órgão no Rio, Valdinho Jacinto Caetano, que já dá proteção a uma juíza em Magé, conforme revelou edição de ontem do JB, e investiga candidatos e cabos eleitorais que estariam cometendo crimes como o cerceamento do direito de ir e vir em algumas regiões dominadas pelo tráfico ou milícia. Caetano se reuniu ontem com o presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), Roberto Wider, o secretário estadual de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, o comandante geral da PM, Gilson Pitta Lopes, o chefe de Estado Maior da PM, Coronel Antonio Carlos Suarez David, e o chefe de Polícia Civil, Gilberto Ribeiro. Juntos, decidiram formar um grupo de trabalho de inteligência para apurar crimes eleitorais.

– Será um trabalho de inteligência e não de confronto, pois continuamos dentro de um estado de direito e não de exceção – afirmou o desembargador Wider.

O grupo de trabalho será formado por funcionários de cada órgão. Caberá a eles decidir os rumos das investigações. De acordo com Wider, o candidato que se sentir intimidado pode pedir proteção policial ao grupo, que já têm uma próxima reunião marcada para o 15 de agosto.

– O candidato que precisar deve solicitar apoio e este grupo de trabalho vai analisar se há necessidade de segurança ou se o candidato quer apenas fazer propaganda e aparecer dizendo que vai subir em morro – alegou Wider. – Estamos trabalhando para que o Estado tenha normalidade dentro de uma situação de anormalidade. Vivemos um estado de direito onde há algumas irregularidades.

Hoje Wider se encontrará, às 16h, com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Carlos Ayres Britto, e o Ministro da Justiça, Tarso Genro, para discutir a questão em Brasília. Ele levará na mala os dados repassados pela inteligência da cúpula da segurança sobre a atuação do tráfico e da milícia em sete regiões da cidade: Rio das Pedras, Carobinha, Santa Cruz, Jacarepaguá, Rocinha, Vidigal e Complexo do Alemão.

– Vou para saber o que eles pensam em nos oferecer e, com isso, verificar nossas necessidades – avaliou o desembargador, que não descarta nenhum reforço, mas acha desnecessária a presença do Exército nas ruas.

– Não é o caso de encher o Rio de Janeiro com o Exército. Não se descarta nenhum reforço, mas, neste momento, não é necessário – reafirmou Wider. – Não precisamos do Exército, precisamos de inteligência e a Polícia Federal está atuando e já pediu o reforço necessário.


Importância máxima

Segundo o delegado da PF, a Operação Eleição é hoje a mais importante do órgão. Sem citar o número de homens encarregados das investigações ou mesmo a quantidade de pessoas sob a mira de seus agentes, Caetano foi claro ao enfatizar que "todas as denúncias serão apuradas e encaminhadas ao Ministério Público".

– Nossa expectativa é a melhor possível e estamos à disposição da Justiça Eleitoral de forma permanente – disse Caetano. – A eleição é hoje a maior operação que a Polícia Federal faz e o Rio vai ter o tratamento que merece.

Nenhuma das autoridades estaduais que participaram da reunião no TRE fez qualquer pronunciamento sobre o encontro. Pela manhã, em São Paulo, o governador Sérgio Cabral disse ser favorável à presença "imediata" da força-tarefa no Estado como forma de reforçar a segurança do processo eleitoral.

– A força poderia vir imediatamente e ficar inclusive depois das eleições nos ajudando. Em última análise, nós estamos brigando pela garantia do regime democrático – disse Cabral, reafirmando não ter o "complexo" de achar que pedir auxílio significa que o Estado está deficiente. – Não tenho esse complexo, ah, não vou pedir ajuda porque é sinal de que estamos deficientes. Nós precisamos de ajuda sim, de tudo o que vier na direção de colaborar com a segurança pública. Foram anos e anos de crescimento de uma estrutura paralela do crime. E a gente não faz isso de uma hora para outra sem somar forças.

DEU NO JORNAL DO BRASIL


GABEIRA: "SEM A IMPRENSA, NÃO QUERO IR"
Fred Raposo

Um dia após considerar a adoção de uma força-tarefa como solução "paliativa", o deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ) afirmou ontem que não entrará em comunidades em que se sinta ameaçado ou onde precise ser escoltado por autoridades.

-Acho indelicado pedir ajuda neste momento. De que adianta subir o morro até certo ponto com o fotógrafo para, logo em depois, ele ser impedido de continuar, e eu ter que seguir sozinho? Sem a imprensa não quero ir – enfatizou Gabeira.


Aheios à reunião entre a Justiça Eleitoral, a Polícia Federal e a Secretaria de Segurança Pública – que ocorria alguns andares abaixo, no prédio do TRE – Gabeira, seu vice, deputado Luiz Paulo Correa da Rocha e o ex-governador Marcello Alencar conversaram com o juiz Luiz Márcio Victor Alves Pereira, que coordena a fiscalização da propaganda no Estado, a corregedora regional eleitoral, juíza Jacqueline Montenegro, e com o presidente do órgão, Roberto Wider.

- Viemos constatar que há falta de liberdade, que não temos o direito de ir e vir por causa do tráfico ou da milícia. Não viemos pedir proteção para entrar em lugar algum. Se disserem que não podemos subir, a gente volta porque não queremos colocar a vida de ninguém em risco - disse Luiz Paulo.

Gabeira assinalou que a ida dos candidatos às comunidades, junto com a polícia, pode representar ameaça para os próprios moradores, que ficariam desguarnecidos após a saída do grupo.

– Entrar nas comunidades com uma força policial é um entendimento equivocado. Depois todo mundo vai embora, menos o morador, que permanece lá em cima – ponderou o candidato.

O deputado negou que tenha tido problemas com a milícia ou traficantes em sua campanha até o momento. Especulava-se que a agenda de Gabeira para o fim de semana incluiria ida à Vila Cruzeiro, onde jornalistas foram intimidados. Gabeira não confirmou o compromisso, mas fez críticas ao rumo que a eleição está tomando.


– A conclusão é que esta não pode ser uma eleição totalmente democrática.

DEU EM O GLOBO

CRIVELLA CHAMA CANDIDATO SOB SUSPEITA DE ILUMINADO
Flávio Tabak

"Clientelismo só ocorre quando há troca de voto por dinheiro, mas a troca por serviço, não", diz o senador

O candidato do PRB a prefeito do Rio, Marcelo Crivella, visitou ontem as favelas da Chacrinha e do Mato Alto, ambas em Jacarepaguá, acompanhado do vereador e candidato à reeleição Luiz André Deco (PR). Fontes da Polícia Civil informaram que o vereador é investigado sob suspeita de envolvimento com milícias. Os dois subiram os morros, que são controlados por milicianos, num carro aberto que exibia cartazes com as fotos dos candidatos juntos, enquanto uma mulher gritava, pelo alto-falante, "Crivella é 10 em nome de Jesus!".

Depois da caminhada, que durou duas horas, Crivella elogiou os moradores que fazem trabalhos comunitários na região, inclusive Deco, a quem chamou de "iluminado":

- Quero que os eleitores acreditem num dia melhor, como vi agora um exemplo bonito do Sebastião (Dias de Oliveira, coordenador de uma ONG da Chacrinha), e como tenho visto o Deco com seu centro social. São pessoas que iluminam essas trevas que estamos vivendo. Eles iluminam um novo rumo para nosso povo. Política tem que ser feita assim, com idealismo e renúncia. Essa é a que eu quero fazer.

"Na minha região não tem curral eleitoral", diz Deco

Deco terá que apresentar novamente sua certidão criminal ao Tribunal Regional Eleitoral. Segundo o setor de registro do TRE, os documentos do vereador estão com CPF errado ou com dados de outra pessoa. Sempre ao lado de Crivella, Deco, que assumiu o cargo como suplente da deputada federal Suely Santana da Silva (PR-RJ), negou que tenha envolvimento com grupos milicianos e disse não temer ser investigado.

- Na minha região não tem curral eleitoral. Não faço parte de milícia alguma, não sei quem faz nem fico preocupado com isso. A comunidade tem presença de outros candidatos. Não tenho preocupação em ser investigado pela PF ou pelo TRE. Minha comunidade é aberta - afirmou Deco, que disse ter obtido 52% de seus votos (cerca de 21 mil) na região de Jacarepaguá, em 2006. Além de vereador, ele é primeiro suplente de Suely na Câmara dos Deputados.

Após mais um dia percorrendo favelas, Crivella disse que nunca pede autorização para entrar nas comunidades. No sábado, durante uma caminhada do senador, equipes do GLOBO, do "Jornal do Brasil" e de "O Dia" foram rendidas por traficantes na Vila Cruzeiro, que, armados com fuzis, os obrigaram a apagar as fotos.

"O exemplo de Tiradentes me ilumina e me incentiva "

Com ares missionários, o senador citou Tiradentes ao dizer que decide entrar em favelas sem fazer qualquer comunicação, mesmo sob risco:

- Tiradentes arriscou a própria vida porque julgava que a liberdade valia mais do que isso. Não podemos perder a liberdade de ir e vir. É isso que tenho pregado. O exemplo de Tiradentes me ilumina e me incentiva a buscar a liberdade que faz parte da vida.

Sobre currais eleitorais, alvos de investigação do TRE e da PF, Crivella os chamou de "hediondos", sem dizer onde eles existem. Porém, afirmou que há diferença entre o que chamou da atuação de "vereadores altruístas" e os candidatos de currais únicos.

- São hediondos os currais e devem ser desmantelados. Às vezes, num local, as pessoas têm preferência por um candidato, isso é natural quando ele consegue uma obra, luta mais. Só se caracteriza curral no momento em que o outro não pode entrar, aí não é possível. Existe o vereador altruísta, que faz centro comunitário e atende as pessoas. Esses têm respeito nas localidades onde trabalha - disse o senador, que elogia a troca de votos por serviços:

- Clientelismo só ocorre quando há troca de voto por dinheiro, mas a troca por serviço, não. É papel do vereador.