terça-feira, 19 de março de 2024

Carlos Andreazza - A incerta de Lewandowski

O Globo

Ricardo Lewandowski foi a Mossoró. De novo. Para “dar uma incerta”. Ele mesmo de paradeiro recente incerto. E então a incerta — o reaparecimento. Chegou-chegando, com aquela energia boleto-free de juiz aposentado ora parecerista. Para pegar a tropa de surpresa. (E para nos lembrar: há um governo de turno.) Um mês depois da inédita fuga de dois traficantes de presídio federal.

Palavras do ministro da Justiça e Segurança Pública, concluídos os encontros com autoridades sobre as buscas aos criminosos:

— Vim para cobrá-los. Precisava dar uma incerta, como se diz no meio militar. A polícia me garante que serão capturados, mas não sabemos quando.

Cobrado, foi cobrar. Agastado, sobrevoou a caatinga desgastada e assegurou a foto-clichê. Perdido, encontraria outros perdidos. Não os fugitivos. Os que garantem. Garantem a captura. Nalgum momento. “Não sabemos quando.” (A alternativa sendo haver hora marcada para prisão.) Sabemos que o ministro garantista desconfia do garantido — ou não teria passado a revista sem aviso prévio.

Poesia | Belo Belo, de Manuel Bandeira

 

Música | Moacyr Luz - Atravessado

 

segunda-feira, 18 de março de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Desmatamento no Cerrado exige mais de governadores

O Globo

Região continua a bater recordes com omissão e falta de rigor na permissão legal para derrubar vegetação

Os governadores de MaranhãoTocantins, Piauí e Bahia devem explicações sobre o que acontece no Cerrado. A omissão deles é a principal causa do desmatamento descontrolado. A última medição do Inpe registrou 11 mil km2 de vegetação destruída, a maior extensão desde 2015. Os principais focos estão justamente nos quatro estados, região conhecida como Matopiba, onde acontece 75% do desmatamento. Entre 2003 e 2022, uma área do tamanho do Estado de São Paulo foi transformada em lavoura ou pasto. O ritmo atual continua frenético e deverá, em 2024, superar a marca do ano passado.

Na Amazônia, a destruição da floresta costuma ser ilegal, com ação de criminosos em terras da União. O caso do Cerrado é distinto. Estados e municípios emitem documentos dando permissão para derrubar vegetação nativa em propriedades privadas, respeitado o limite de preservação entre 20% e 35% estabelecido no Código Florestal. Como mostrou reportagem do GLOBO, metade dos 2.833 km2 de Cerrado desmatados no Maranhão entre 2022 e 2023 obteve aprovação da Secretaria do Meio Ambiente do estado.

Sergio Lamucci - Atividade surpreende e começa o ano mais forte que o esperado

Valor Econômico

Indicadores mostrando crescimento mais firme da economia surgem num momento em que pesquisas revelam queda na popularidade de Lula

A atividade econômica dá sinais de crescimento mais forte no começo de 2024, depois da estagnação no segundo semestre do ano passado. Em janeiro, o comércio e os serviços avançaram mais do que esperavam os analistas, e a geração de empregos formais foi bem acima do esperado. A arrecadação também foi elevada no primeiro mês do ano, e as estimativas indicam que isso se repetiu em fevereiro.

Os números positivos vêm a público num momento de queda da popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Numa sociedade polarizada politicamente, a economia teria menos peso na avaliação dos governantes pelos eleitores? O tema tem sido discutido exaustivamente neste mês, com a divulgação de pesquisas com piora na aprovação de Lula, que causam desconforto no presidente e em seu entorno. Nesse cenário, cresce o risco de o governo recorrer a medidas populistas, como aumento de gastos, para tentar reverter a situação. Caberá especialmente ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, conter essas pressões, que volta e meia reaparecem na atual gestão.

Bruno Carazza* - A boquinha e a fome: as estatais e seus conselhos

Valor Econômico

Conselhos de administração de empresas atendem a diversos interesses no governo

A semana passada foi repleta de episódios envolvendo a governança corporativa de estatais e de empresas privadas nas quais a União ainda detém algum tipo de ingerência, mesmo que indiretamente.

O retorno de Lula ao poder representou a retomada da visão de que as estatais têm um papel estratégico na promoção do desenvolvimento nacional. Nesse sentido, a nova administração da Petrobras tem sinalizado com a ampliação de seu plano de investimentos e novas diretrizes a respeito de refino, distribuição de combustíveis e transição energética. O episódio mais recente dessa história se deu na atual crise sobre os dividendos.

Se uma mudança de rumos em relação à administração anterior é válida e legítima, ela não deve ser feita à revelia dos demais sócios privados da empresa. Assim, todas as decisões da Petrobras que possam afetar a distribuição de dividendos aos acionistas precisam ser comunicadas com muita transparência, para se evitar as turbulências que vimos no preço das suas ações na última semana.

Maria Cristina Fernandes - Forças Armadas deixaram o país muito perto de um golpe

Valor Econômico

Os ex-comandantes não denunciaram golpismo do ex-presidente, tampouco agiram para coibir a indisciplina interna, como a leniência em relação à carta dos oficiais demonstra

Ficou mais difícil para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) escapar da acusação de golpe de Estado e afronta ao Estado de direito depois do conjunto de depoimentos cujo sigilo foi aberto pelo ministro Alexandre de Moraes. Os ex-comandantes do Exército, Marco Antonio Freire Gomes, e da Aeronáutica, Carlos Almeida Baptista Junior, foram determinantes para evitar a reversão da ordem democrática, mas ainda não está claro se poderiam ter evitado que o país tivesse chegado tão perto de um golpe como, de fato, aconteceu.

Foi Baptista Junior quem pintou de herói o general Freire Gomes ao dizer que o golpe só não aconteceu porque o ex-comandante não havia aderido. Confirmou ainda que o general havia ameaçado o ex-presidente Jair Bolsonaro com uma ordem de prisão, conforme antecipou o Valor em 21/9/2023, se ele tentasse o golpe. No seu depoimento, Freire Gomes se limita a dizer que advertiu o ex-presidente de que ele poderia ser responsabilizado penalmente se tentasse impedir a posse do então presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.

Carlos Pereira* - Sociedades resilientes

O Estado de S. Paulo

Destino da democracia depende de sociedades interdependentes, vibrantes e interligadas

Diante do fracasso das interpretações catastrofistas de que as democracias, inclusive no Brasil, corriam riscos de quebra ou mesmo de erosão com a eleição de líderes populistas de extrema esquerda ou de extrema direita, os estudos agora têm se voltado para explicar o seu oposto; ou seja, por que democracias têm sido tão resilientes, mesmo diante de iniciativas iliberais de populistas de enfraquecê-las.

Por que a maioria dos líderes populistas eleitos não têm conseguido asfixiar a democracia? Que condições políticas, institucionais e sociais neutralizariam ações iliberais de populistas?

Ana Cristina Rosa - Inclusão não é favor

Folha de S. Paulo

Ações de promoção da equidade racial devem ser respeitadas e fomentadas num país racista como o Brasil

Inclusão não é favor. Inclusão é direito! Essa é a principal razão pela qual ações voltadas à promoção da equidade racial devem ser respeitadas, defendidas e fomentadas num país racista como o Brasil.

Nos últimos anos, temos presenciado o aumento de iniciativas para ampliar a inserção social de pretos, pardos e indígenas. O cenário, fruto da ação de movimentos sociais, ainda é tímido se comparado ao nível das desigualdades raciais vigentes. No entanto, tem se mostrado suficiente para provocar irresignação entre quem não convive bem com a ideia de compartilhar direitos que, na prática, sempre constituíram privilégios de uns poucos.

Lygia Maria - Ficção identitária

Folha de S. Paulo

Filme indicado ao Oscar mostra como obsessão da militância por opressão estimula caricaturas de minorias na literatura

Na última década, o Oscar tem buscado premiar mais panfletos sociais e políticos do que filmes. O fenômeno é resultado da ascensão do movimento identitário, que cobra por indicação e premiação de histórias de opressão de minorias, e reclama quando elas não recebem estatuetas.

Mas, neste ano, não se viu a tradicional indignação por um filme dirigido por um negro (Cord Jefferson), com elenco negro e baseado no livro de um escritor negro (Percival Everett) não ter sido premiado nas categorias de melhor filme e ator —venceu em roteiro adaptado.

Camila Rocha* - Disputa pelo legado de Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Michelle Bolsonaro, e seu discurso antissecular, e Tarcísio de Freitas, e seu pragmatismo reacionário, são opções

"Pode ir na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí".

A frase poderia ser de Jair Bolsonaro, mas foi proferida pelo governador de São Paulo. No dia 8 de março, em Genebra, Tarcísio de Freitas foi denunciado ao Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) pela Comissão Arns e pela ONG Conectas em virtude da escalada de violências cometidas durante a Operação Verão.

Durante a reunião do Conselho, Camila Asano, diretora-executiva da Conectas, relatou acusações de execuções sumáriastortura e prisões forjadas, além de apontar a ausência deliberada do uso de câmeras corporais entre os policiais envolvidos.

A operação já é tida como uma das mais letais da história do estado de São Paulo.

Marcus André Melo* - O eleitor está calcificado?

Folha de S. Paulo

A dinâmica incumbente - oposição e a disjunção entre voto presidencial e legislativo sugerem um padrão complexo

Felipe Nunes, um dos mais destacados cientistas políticos brasileiros acaba de publicar, em co-autoria com o jornalista Thomas Traumann, "Biografia do Abismo" onde defendem o argumento de que o eleitorado brasileiro está calcificado.

Trata-se de um argumento desenvolvido originalmente para o caso americano; como mostrei aqui. O primeiro pilar da calcificação é que 1) à semelhança do ocorrido entre democratas e republicanos nos EUA a distância ideológica entre bolsonaristas e petistas se ampliou muito, aumentando para o eleitor o custo de mudar o voto. O segundo é que 2) internamente esses dois grupos de eleitores, nos dois países, estariam cada vez mais homogêneos em termos demográficos —religião, raça— e programáticos. O eleitor petista seria nordestino e pobre.

Fernando Gabeira - Um país em conflito

O Globo

Quantos episódios não estão artificialmente politizados? Quantas amizades não se romperam?

Num artigo sobre pesquisas, mencionei a polarização política como dado constante e crescente no país. Apenas esbocei a necessidade de atenuá-la. É preciso reconhecer que a polarização de certa forma interessa a algumas forças políticas, mas não só a elas. O país rigidamente dividido cria uma espécie de zona de conforto onde, não importa o que se defenda, sempre será bem-visto quem favorecer um dos lados. Criar, portanto, estreitas superfícies de contato em que se possa desenvolver algo em comum é muito difícil e, além do mais, desperta a suspeita de que se está sutilmente trabalhando para um dos lados.

No entanto existe uma infinidade de circunstâncias em que uma espécie de unidade nacional aumenta o potencial do país. Não me refiro apenas aos possíveis inimigos externos que inspirem uma defesa nacional. Parto de situações mais simples, como a epidemia de dengue. No estágio atual, não se pode contar principalmente com vacina. É preciso limpar as casas e desenvolver iniciativas de vizinhança que localizem problemas nos terrenos baldios, residências abandonadas. É preciso um nível mínimo de convivência respeitosa para realizar um trabalho assim.

Demétrio Magnoli - Ucrânia, bandeira branca?

O Globo

‘Bandeira branca’, sugeriu o Papa Francisco. A Ucrânia replicou de imediato: só temos uma bandeira, que é amarela e azul. Na sequência, um tanto constrangido, o Vaticano esclareceu que não propunha a rendição, mas a negociação. De um jeito ou de outro, a intervenção papal reflete a prolongada confusão estratégica do Ocidente.

Lá no início, quando os ucranianos surpreenderam o mundo barrando a ofensiva russa sobre Kiev, os Estados Unidos definiram o objetivo de impor uma derrota estratégica à Rússia. A Ucrânia forneceu um conteúdo a essa meta: reconquistar todas as terras ocupadas pela Rússia desde 2014, inclusive a Crimeia. Putin foi empurrado à escolha entre tudo ou nada.

Poesia | Tecendo a manhã, de João Cabral de Melo Neto

 

Música | Carlos Lyra - Maria Ninguém

 

domingo, 17 de março de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Queda no IDH reflete o descaso da classe política

O Globo

Congresso tem sido incapaz de adotar programa consistente nas áreas críticas para o desenvolvimento humano

Inspirado nas ideias do Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) foi criado para ampliar o entendimento sobre bem-estar. Em vez de atrelar a avaliação de um país apenas à dimensão econômica, com ênfase no PIB per capita, o conceito incorpora estatísticas sobre educação e saúde. O objetivo é ambicioso: medir as condições de os cidadãos conquistarem a capacidade e a oportunidade para ser o que quiserem ser. Os dados sobre o IDH, divulgados anualmente pelas Nações Unidas, fornecem uma oportunidade para políticos no Executivo e no Legislativo refletirem sobre o passado e as prioridades para o futuro.

Os resultados de 2022, último ano do governo Jair Bolsonaro, deveriam motivar um pacto para elevar de forma significativa o desenvolvimento humano no Brasil. A meta deveria ser, no mínimo, atingir o patamar de desenvolvimento classificado como “muito alto”, já alcançado por países como Argentina, Chile e Uruguai. O Brasil, 89º colocado no ranking do IDH, está 20 posições abaixo do necessário para integrar esse grupo. Na América do Sul, ainda continua atrás de Equador e Peru e, pior, perdeu duas posições em relação ao ano anterior.

Paulo Fábio Dantas Neto* - O golpismo em ato de Bolsonaro e a narrativa eleitoral de Lula

Deveremos saber, dentro em pouco, se o presidente Lula estava certo quando disse, em entrevista recente ao SBT News, que o Brasil está polarizado entre duas pessoas (no caso, ele próprio e o ex-presidente Jair Bolsonaro) e não entre dois partidos. A confirmação, ou não, dessa arriscada afirmação poderá vir de consequências da quebra do sigilo, pelo ministro Alexandre Morais, de 27 depoimentos tidos como cruciais dentro do processo relativo à tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023.

Se a divulgação de tais documentos tiver efeito legitimador - perante a sociedade civil e cidadãos nela organizados ou referenciados - de uma decisão judicial rigorosa que impeça o ex-presidente de voltar a ser elegível, não apenas em 2026, mas nos termos de uma proscrição perene, esse efeito mais do que esperado não bastará para testar a pertinência do diagnóstico de Lula. Novidade zero, não haverá razão para se soltar muitos foguetes. Mais adequado seria só dar suspiros de alívio. O juízo da sociedade civil sobre Bolsonaro implicou em majoritária e implacável condenação política já durante seu governo, ainda que no âmbito daquela se conte parte das igrejas evangélicas e das organizações empresariais. Esse juízo teve tradução eleitoral em 2022, como amplo consenso, não como polarização. Bolsonaro uniu contra si (mais do que Lula reuniu a seu favor) amplíssima e incontrastável maioria da sociedade civil, a qual engajou-se na busca de votos dos cidadãos-eleitores que o seu raio de influência alcança.

Merval Pereira - O autogolpe

O Globo

Tudo indica que teremos prisões de alto coturno, que servirão de exemplo para futuras aventuras golpistas

Diz a lenda que o presidente deposto João Goulart deu uma gargalhada quando soube que o Marechal Castelo Branco o substituiria na presidência da República depois do golpe militar de 1964. Castelo Branco teria garantido apoio a Goulart dias antes. Estará o ex-presidente Bolsonaro rindo hoje, ou chorando de raiva, ao tomar conhecimento dos depoimentos à Polícia Federal dos militares quatro estrelas sobre a tentativa de golpe?

De minha parte, fiquei contente de saber que pelo menos os comandantes do Exército e da Aeronáutica reagiram às propostas de golpe ameaçando prender Bolsonaro, no caso do General Freire Gomes, ou classificaram a ideia de ilegal, no caso do Brigadeiro Baptista Junior, que deixou atônito o General Augusto Heleno ao afirmar que não concordaria com um golpe de Estado.

Míriam Leitão - As cenas de um ato ilegal

O Globo

Ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica descortinam a construção de uma tentativa de golpe de Estado liderado pelo ex-presidente Bolsonaro

As cenas são cinematográficas, mas descritas naquele mar de “que” do texto do inquérito policial. O brigadeiro Batista Jr. pilotava o avião voltando a Brasília em 16 de dezembro de 2022. Ao lado dele, o general Heleno, que deixara a festa da formatura do neto no Instituto Tecnológico da Aeronáutica para ir a uma convocação urgente de Bolsonaro. Ali Heleno ficara “atônito”. Numa conversa na sala reservada do ITA, o brigadeiro, o piloto daquele voo, dissera que a FAB não apoiaria o golpe. No dia 14 de dezembro de manhã, o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira convocou os comandantes ao seu gabinete para analisar uma das versões da minuta do golpe. O brigadeiro Batista Jr. perguntou: “Esse documento prevê a não assunção do cargo pelo novo presidente da República?”. O ministro ficou em silêncio. Ele saiu da sala. A minuta ficou sobre a mesa do general. Numa das reuniões convocadas por Jair Bolsonaro para convencer os comandantes militares a apoiá-lo, o general Freire Gomes, do Exército, teria dito ao então presidente que se ele insistisse em atentar contra o regime democrático teria que prendê-lo. Freire Gomes em seu depoimento amenizou. Falou em “responsabilidade penal”.

Bernardo Mello Franco - Golpe à moda antiga

O Globo

Os ex-comandantes deram informações úteis, mas é ingenuidade tratá-los como heróis da pátria

O avanço das investigações da Polícia Federal mostra que Jair Bolsonaro planejou um golpe à moda antiga. Queria usar tanques, caças e fragatas para se manter no poder pela força.

O capitão conspirou com ex-colegas de farda para invalidar o resultado da eleição e impedir a posse de Lula. No caminho, fecharia o TSE, prenderia a cúpula do Judiciário e suspenderia as liberdades civis.

A natureza do golpe era militar. Seu estado-maior reunia três generais da reserva: Braga Netto, vice na chapa derrotada; Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional; e Paulo Sérgio Nogueira, ministro da Defesa.

A trinca dava ordens a outros generais e coronéis. No front civil, o ministro Anderson Torres e o assessor Filipe Martins preparavam minutas de decreto para dar verniz de legalidade à quartelada.

Luiz Carlos Azedo - A história como farsa na tentativa de golpe de Bolsonaro

Correio Braziliense

Bolsonaro foi aconselhado a recuar para não ser preso. Esses conselhos também vieram de ministros do Supremo, de generais legalistas e do governo dos Estados Unidos

Alguém já disse que a história se repete como farsa ou como tragédia. No caso da tentativa de destituição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 8 de janeiro de 2023, uma semana após a posse, poderia ter sido uma tragédia, com a implantação de uma ditadura militar que enfrentaria grande resistência e, para se impor, teria que fazer como os militares argentinos, em 1976, quando o general Jorge Rafael Videla, o almirante Emílio Eduardo Massera e o brigadeiro Orlando Ramón Agosti tomaram o poder e dissolveram o Congresso. Bolsonaro teria que promover uma repressão ainda mais brutal e intensa do que a que ocorreu no Estado Novo e durante o regime militar implantado após o golpe de 1964, que completará 60 anos no próximo dia 31.

Ainda bem, o golpe de 8 de janeiro está mais para uma farsa, um Plano Cohen frustrado. Segundo os depoimentos dos comandantes das Forças Armadas à Polícia Federal — cujo teor integral foi liberado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes —, após as eleições de 2022, Bolsonaro chamou a cúpula militar para reuniões que articulariam um golpe de Estado. O ex-comandante do Exército Freire Gomes disse que o próprio ex-presidente apresentou uma minuta golpista e discutiu seu teor em duas reuniões. O da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, confirmou. Ambos não embarcaram na aventura. O ex-comandante da Marinha Almir Garnier, que ficou calado em seu depoimento, assim como o ex-presidente Jair Bolsonaro, supostamente, só não moveu suas tropas porque seu comandante supremo não deu a ordem.

Dorrit Harazim – Distâncias

O Globo

Quem deve decidir quanto a liderança de Netanyahu é problemática são os próprios israelenses, por óbvio

Na semana passada houve júbilo no grupo de terráqueos que há 47 anos acompanha a odisseia das naves gêmeas Voyager 1 e 2. Consideradas tesouro nacional pelos americanos, elas são as duas “criaturas” mais paparicadas e estimadas da agência espacial dos Estados Unidos (Nasa). Só que, desde novembro último, criador e criatura deixaram de falar a mesma língua. Em vez de transmitir dados por meio da linguagem binária com que fora programada, a Voyager 1 passou a emitir apenas um ruído contínuo, indecifrável, semelhante ao sinal de ocupado de um telefone comum.

O enguiço durou quatro longos meses e parecia prenunciar um tristonho réquiem. Na tarde de quarta-feira, porém, sem avisar, a nave se fez viva, pareceu querer restabelecer o diálogo com os humanos. A partir de alguma localização interestelar, emitiu um sinal que percorreu 22 horas e meia até chegar aos computadores da Nasa, e esse fragmento de linguagem conseguiu ser parcialmente decodificado. Para uma das veteranas do projeto, que acabara de se formar em 1977 quando a primeira sonda foi lançada, o sinal recebido na semana passada lhe deu alegria só comparável ao restabelecimento de um batimento cardíaco.

Elio Gaspari - Lembrai-vos de Pasadena

O Globo

Encrencas têm prazo de maturação e duram anos. Hoje a Petrobras tem na mesa a encrenca da empresa de fertilizantes Unigel. Em 2019, durante o governo Bolsonaro, ela arrendou duas fábricas da Petrobras. Compraria gás e venderia fertilizantes. O mercado virou, a Unigel passou a operar no vermelho e fechou as fábricas. Voltou a operar com um novo contrato que, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), poderá custar à Petrobras R$ 487 milhões.

O contrato, assinado em dezembro de 2023, tem pescoço comprido, corpo malhado e cabeça pequena. Parece uma girafa. A estatal defende a virtude no negócio, mesmo sabendo-se de divergências internas e conhecendo-se a fabricação de uma ameaça de greve na Petrobras para forçar a aprovação do negócio.

Eliane Cantanhêde - Propriedades da melancia

O Estado de S. Paulo

Está confirmado: melancia é indigesta para golpistas e faz bem à democracia

Além de deliciosa, suculenta e refrescante, a ciência política acaba de descobrir outras propriedades da melancia: é indigesta para candidatos a ditador, impede golpes de Estado e faz bem à democracia. Acusados de “melancias” pelos golpistas, oficiais de alta patente não cederam às “ordens”, pressões e constrangimentos do então comandante em chefe das Forças Armadas e, assim, frustraram a decretação de estado de defesa e anulação da posse do presidente legitimamente eleito.

Se a melancia é verde por fora e vermelha por dentro, nenhum dos oficiais legalistas, como o atual comandante do Exército, general Tomás Paiva, é ou seria “vermelho” ou comunista. É ridículo, mais uma farsa, uma fake news grosseira para manipular mentes e corações vazios e suscetíveis a mitos, Messias, salvadores da Pátria. Aqueles oficiais foram apenas o que 100% de militares deveriam ser: legalistas, batendo continência à Constituição e aos poderes constituídos.

Celso Lafer* - FHC e o Real, 30 anos

O Estado de S. Paulo

É justo dizer que, graças à sua atuação, Fernando Henrique Cardoso ampliou até os dias de hoje o controle da sociedade brasileira sobre o seu destino

Há 30 anos teve início o Real, que debelou anos de alta e crônica inflação, com efeito corrosivo no dia a dia da vida das pessoas. Teve um impacto perdurável. Transformou a sociedade brasileira, propiciando a previsibilidade econômica e social das expectativas.

A moeda não serve apenas para comprar e vender. É, como a língua e a bandeira, um símbolo nacional, na observação antropológica de Darcy Ribeiro. Tem, com sua dimensão de credibilidade, uma função aglutinadora fundamental. Foi o que observou FHC em A Arte da Política, livro de reflexão sobre a sua experiência, em que dá relevante destaque ao que foi a tarefa política da implantação do Real, um dos seus duradouros legados para o País.

Vinicius Torres Freire - Inicio de ano melhorzinho

Folha de S. Paulo

Comércio, serviços, emprego, mercado de capitais e receita do governo vão melhor do que o previsto

O jorro de provas de que Jair Bolsonaro tramava o golpe ofuscou notícias de surpresas positivas na economia. Parece mais provável que se chegue neste 2024 pelo menos a um crescimento melhorzinho do que o previsto no final do ano passado: 2% em vez de 1,5%.

São dados apenas de janeiro, sim. Também não podemos nos acostumar a tão pouco —mais sobre isso mais adiante.

O crescimento de 2% parece bom porque somos um paciente que apenas tenta se levantar da cama, muito doente faz dez anos, alguns deles em coma, ainda cheio de males que precisam de tratamento profundo. Mas vamos falar das notícias de que podemos dar mais uns passinhos claudicantes neste ano.

As vendas do comércio e o faturamento do setor de serviços em janeiro cresceram mais do que a previsão mais otimista.

Foi assim também com a criação de empregos formais, pelos registros do Ministério do Trabalho. Os dados do IBGE, sobre o total de empregos e salários, haviam saído faz duas semanas, bons também. A nota negativa ficou com a queda da produção industrial, no entanto nem tão ruim quanto a prevista.

A arrecadação do governo deve ter aumentado de novo, segundo estimativa do Ipea, o instituto federal de pesquisa econômica. Em fevereiro, a receita líquida do governo teria crescido mais de 20% em relação a fevereiro do ano passado, em termos reais (acima da inflação).

Ranier Bragon - Conluio golpista de Bolsonaro teve exemplos e gestos públicos

Folha de S. Paulo

Ameaças de ruptura e questionamentos sem lastro às instituições se acumularam em sua gestão

Assim como em praticamente toda a sua carreira iniciada na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, no final dos anos 80, Jair Bolsonaro (PL) acumulou em seus quatro anos na Presidência da República uma série de atos e manifestações públicas que colocaram no horizonte a possibilidade ou o desejo de uma ruptura institucional.

Descortina-se agora com a delação premiada de seu ajudante de ordens, Mauro Cid, e com os depoimentos de dois de seus comandantes militares, Marco Antônio Freire Gomes (Exército) e Carlos Baptista Júnior (Aeronáutica), a possível tentativa de um golpe de Estado no final de 2022 que lhe permitisse ficar no poder e impedir a posse de Lula (PT).

Tais depoimentos e colaborações, porém, apenas cristalizam algo que ao menos desde 2020 vinha sendo manifestado às claras.

É verdade que desde a campanha de 2018 Bolsonaro já dava declarações de teor antidemocrático, como o questionamento das urnas eletrônicas sem nenhum lastro de suspeita.

O fato, porém, é que a área em frente ao QG (Quartel General do Exército) em Brasília abrigou uma das primeiras manifestações explícitas do ex-presidente, no poder, no sentido de uma ameaça de ruptura.

Muniz Sodré* - Borracha no futuro

Folha de S. Paulo

As massas acordaram para a experiência política, mas sob formas perversas, captadas pela extrema direita

Um estudo revela que 13 milhões de brasileiros deixaram de passar fome em 2023, o custo alto dos alimentos desacelerou, a economia obtém ganhos, a vida democrática supera os sobressaltos, mas decresce a avaliação positiva de Lula (PT). Algo semelhante ocorre nos EUA, onde esses fatores estão normalizados, porém, cresce nas preferências eleitorais a figura de Trump, um delinquente polimorfo. Na Argentina, 60% da população esfomeia, mas é elevado o índice de aprovação de Milei. Na alucinação, osso é filé.

São anomalias. Começa a ficar claro que elas reabrem de algum modo a noção de política. Por menos práticos que sejam pronunciamentos políticos de filósofos, vale evocar as posições públicas de Jurgen Habermas nos anos 1980 contra o neoconservadorismo irracionalista na Alemanha, assim como a sua especulação de que "se tivesse de apostar qual o próximo país que se tornaria fascista, minha aposta poderia ser: os EUA". Sem bola de cristal, anteviu Trump.

Celso Rocha de Barros - Bolsonaro vai preso. E depois?

Folha de S. Paulo

Todo político bolsonarista agora precisa ser confrontado com os depoimentos de Freire Gomes (Exército) e Baptista Jr. (Aeronáutica)

Com a divulgação dos depoimentos da operação Tempus Veritatis, já está claro que Jair Bolsonaro vai ser preso.

Os ex-comandantes do Exército e da Aeronáutica, general Freire Gomes e brigadeiro Baptista Jr., contaram à Polícia Federal que Bolsonaro passou o período entre a derrota para Lula e a fuga para a Disney lhes propondo golpe de Estado.

Em duas reuniões, uma em 7 de dezembro, presidida pelo próprio Jair, e outra em 14 de dezembro, presidida pelo ministro da defesa de Bolsonaro, general Paulo Sérgio, minutas da declaração de golpe (com as limitações correspondentes de liberdade) foram apresentadas aos comandantes das Forças. O da Marinha, Almirante Garnier, teria aceitado, segundo depoimento de seus dois colegas.

Esses testemunhos batem perfeitamente com outras provas de que a polícia já dispõe, como as trocas de mensagens de Mauro Cid e Braga Netto.

Rudolfo Lago - Apesar da crise, União Brasil lidera maior número de capitais

Correio da Manhã

Internamente, a disputa pelo comando do União Brasil literalmente pega fogo. Recentemente, o vice-presidente do partido Antonio Rueda destituiu do comando o deputado federal Luciano Bivar. Em eleição interna, Rueda venceu Bivar por unanimidade, mostrando o isolamento do deputado. Inconformado com o resultado, Bivar o questiona. No meio da briga intensa, as casas de praia de Rueda e de sua irmã, Emília Rueda, foram incendiadas. Rueda acusa Bivar de ter sido o responsável pelo incêndio.

Mas, enquanto os comandantes da legenda se engalfinham, o União Brasil mostra fôlego nas eleições municipais. Avaliando as pesquisas mais recentes nas 26 capitais do país, o Correio da Manhã mostra que o União hoje lidera em seis das capitais: Salvador (BA), Fortaleza (CE), Teresina (PI), Porto Velho (RO), Cuiabá (MT) e Campo Grande (MS).

O PSD, partido liderado pelo secretário de Governo do estado de São Paulo, Gilberto Kassab, vem em segundo, com quatro capitais. Entre elas, o Rio de Janeiro, onde é muito forte a possibilidade de reeleição do prefeito Eduardo Paes. MDB, PL e Podemos lideram em três. Mas o MDB vê agora um empate na maior capital, São Paulo, com o crescimento do prefeito Ricardo Nunes, apontado pelo Datafolha.

O crescimento de Nunes ameaça a única possibilidade do Psol, com Guilherme Boulos, que ainda lidera agora por pequena margem em São Paulo.

E o partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT, só aparece à frente em Goiânia (GO), com a deputada Adriana Accorsi. Mesmo assim, em situação de empate com o senador Vanderlan Cardoso (PSD) e o deputado Gustavo Gayer (PL).

Veja abaixo como está o quadro atualizado das eleições nas capitais:

Poemas e frases; Citações e Pensamentos,.. de Bertolt Brecht

 

Música | Mariene de Castro, Brasil Jazz Sinfônica - Canto das Três Raças

 

sábado, 16 de março de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

O triunfo da democracia

Correio Braziliense

As investigações sobre o 8 de janeiro mostram que as ideias derrotadas por Tancredo ainda encontram adeptos

Tancredo de Almeida Neves (PMDB-MG) foi escolhido presidente da República pelo Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985, em eleição indireta na qual derrotou o candidato do PDS, o deputado Paulo Maluf (SP). Porém, na véspera de tomar posse, em 14 de março daquele ano, foi internado em estado grave, no Hospital de Base de Brasília, e faleceu sem tomar posse na Presidência.

O vice José Sarney assumiu o cargo e comandou um longo processo de transição do regime militar à democracia, concluído com promulgação da Constituição de 1988 e a realização de eleições diretas para a Presidência em 1988, quando foi eleito Collor de Mello. Luiz Inácio Lula da Silva, que hoje exerce seu terceiro mandato à frente do Executivo, fora o candidato derrotado no segundo turno.

A agonia de Tancredo Neves naqueles dias provocou uma comoção nacional: foram sete cirurgias, duas em Brasília e cinco em São Paulo, até o dia 21 de abril daquele ano, quando faleceu. Seu legado como presidente da República eleito foi essencialmente político: derrotou o projeto de institucionalização de um regime autoritário, de características "iliberais", que manteria a tutela militar sobre a República, por meio de artifícios institucionais que a legitimassem.

Cristovam Buarque* - Êxito pessoal, fracasso nacional

Revista Veja

O descaso com a educação faz o país avançar muito pouco

Nos esportes, só comemoramos o vencedor — o segundo colocado não recebe festa. Na educação, porém, consideramos vitória um avanço pessoal, ainda que seja prova de fracasso nacional. A televisão tem mostrado a fala de um jovem brasileiro celebrando ser o primeiro de sua família a ingressar em curso superior. Não há dúvida do sucesso do menino ao ser uma exceção em sua família. Mas seu sucesso pessoal e a publicidade como êxito social são provas do descaso nacional com a educação. Na terceira década do século XXI, duzentos anos depois da independência, quase um século e meio de república, quarenta anos depois da redemocratização, quinze anos de governos de esquerda, o atual ocupante do Planalto comemora o primeiro membro de uma família a ingressar no ensino superior.

Aldo Fornazieri* - A questão evangélica

CartaCapital

Parece que as esquerdas perderam a noção do que significa disputar a hegemonia política e ideológica no País

A recente rodada de pesquisas – Quaest, Ipec e Atlas – mostrou significativa queda na avaliação positiva do governo e de Lula, além de um avanço na rejeição. As declarações do presidente sobre Israel, a inflação de alimentos, percepção de que a economia não vai bem, o incômodo com a insegurança, a corrupção e a pobreza foram os principais temas indicados pelos institutos como causas do crescimento da desaprovação.

Segundo o Ipec, Lula e o governo perderam pontos em seu próprio eleitorado: os nordestinos, as mulheres, as pessoas negras e de baixa renda. O aumento mais expressivo da desaprovação deu-se entre os evangélicos. Desde dezembro, revela a Quaest, ela subiu 6 pontos, passando de 56% para 62%. A aprovação também caiu 6 pontos, passando de 41% para 35%.

Analistas sugerem que esse aumento da reprovação entre evangélicos pode ter se originado nas condenações que Lula fez aos massacres de crianças e mulheres que Israel perpetra em Gaza. De fato, os evangélicos radicais, principalmente nos EUA e no Brasil, têm fortes relações com a extrema-direita israelense, ligada a grupos de judeus ortodoxos e sionistas.

João Gabriel de Lima* - O check-up das democracias

O Globo

A má notícia do relatório do V-Dem é que a maior parte da população do mundo ainda vive sob regimes autoritários

A medicina preventiva recomenda que se faça um check-up anual para aferir indicadores básicos de saúde, como colesterol, glicemia e funções cardíacas. Os institutos que medem a qualidade da democracia divulgam seus relatórios também com periodicidade anual. A metodologia é análoga, baseada numa série de indicadores. Pode-se dizer que é um check-up dos regimes de liberdade.

Entre os relatórios, o mais acurado e mais citado em teses acadêmicas é do instituto sueco V-Dem, divulgado no início do mês. Democracias, em sua definição mais concisa, são regimes em que prevalece a vontade da maioria, por meio de eleições, ao mesmo tempo que protegem os direitos de todos os cidadãos, incluídas as minorias. Estes são, respectivamente, os aspectos “democrático” e “liberal” das democracias. Aos dois vetores básicos o V-Dem acrescenta cerca de 500 indicadores — que incluem participação popular e capacidade de resolver os problemas concretos dos cidadãos — e faz sua classificação.

Pablo Ortellado - Um outro Rafael Braga

O Globo

Muitos talvez não lembrem mais, mas, há dez anos, o Brasil se mobilizou pela soltura de Rafael Braga, único condenado pela participação nos protestos de junho de 2013. Ele era um morador de rua que foi preso no dia 20, em meio a manifestações pela redução das tarifas de transporte na região central do Rio de Janeiro. Foi detido próximo à Central da Brasil com uma garrafa de Pinho Sol e outra de água sanitária e injustamente acusado de portar “coquetéis molotov” para atacar a polícia.

O caso escandalizou o país. Rafael era um morador de rua que vivia na região central e não participava do protesto. As garrafas de plástico com desinfetante e água sanitária que portava obviamente não podiam ser empregadas como coquetéis molotov. Apesar da acusação ridícula, a polícia sustentou seu entendimento, e o Ministério Público encampou a tese, mostrando como os abusos da polícia se entrelaçam com o descuido e os vieses do Judiciário, especialmente se o acusado é pobre, preto e tem condenação anterior. Em dezembro de 2013, Rafael foi condenado a cinco anos de prisão por porte ilegal de artefato incendiário.